TRF3 0005002-79.2011.4.03.6002 00050027920114036002
PROCESSUAL CIVIL. SENTENÇA NÃO SUJEITA À REMESSA NECESSÁRIA. ART. 475,
§2º, DO CPC/1973. CONSTITUCIONAL. ASSISTÊNCIA SOCIAL. PAGAMENTO
DE ATRASADOS. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL AO IDOSO E À PESSOA COM
DEFICIÊNCIA. ART. 203, V, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. IMPEDIMENTO
DE LONGO PRAZO INCONTROVERSO. BENEFÍCIO DE VALOR MÍNIMO PAGO AO
IDOSO. EXCLUSÃO. ART. 34, PARÁGRAFO ÚNICO, DA LEI Nº 10.741/03. APLICAÇÃO
POR ANALOGIA. PRECEDENTES JURISPRUDENCIAIS DO STJ (REPRESENTATIVO DE
CONTROVÉRSIA). STF. DECLARAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE DO § 3º DO
ART. 20 DA LEI Nº 8.472/93, SEM PRONÚNCIA DE NULIDADE. IMPOSSIBILIDADE
DE APLICAÇÃO ISOLADA. ANÁLISE DA MISERABILIDADE EM CONJUNTO COM DEMAIS
FATORES. AFASTADA SITUAÇÃO DE RISCO. RENDA FAMILIAR SUFICENTE PARA COBRIR
TODOS OS SEUS GASTOS. PLANO FUNERÁRIO COM DESCONTOS EM EXAMES E CONSULTAS
MÉDICAS. OBTENÇÃO DE MEDICAMENTOS VIA SUS. MORADIA PRÓPRIA. RESIDÊNCIA
EM BAIRRO COM AFASTALMENTO E SANEAMENTO BÁSICO. PROXIMIDADE A EQUIPAMENTOS
PÚBLICOS DE SAÚDE, EDUCAÇÃO E ASSISTENCIAL SOCIAL. CONDIÇÕES DE
HABITABILIDADE SATISFATÓRIAS. DEVER DE AUXÍLIO, EM PRIMEIRO LUGAR, É DA
FAMÍLIA. MÍNIMO EXISTENCIAL GARANTIDO. HIPOSSUFICIÊNCIA ECONÔMICA NÃO
DEMONSTRADA. LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ. ABUSO DO DIREITO DE RECORRER. NÃO
CONFIGURADO. REMESSA NECESSÁRIA NÃO CONHECIDA. APELAÇÃO DO INSS
PROVIDA. SENTENÇA REFORMADA. AÇÃO JULGADA IMPROCEDENTE. REVOGAÇÃO DA
TUTELA ANTECIPADA. INVERSÃO DOS ÔNUS DE SUCUMBÊNCIA, COM SUSPENSÃO DOS
EFEITOS. DEVER DE PAGAMENTO SUSPENSO. GRATUIDADE DA JUSTIÇA.
1 - Não cabimento da remessa necessária no presente caso. A sentença
submetida à apreciação desta Corte foi proferida em 12/12/2013,
sob a égide, portanto, do Código de Processo Civil de 1973. No caso,
houve condenação do INSS na concessão e no pagamento dos atrasados de
benefício assistencial, no valor de um salário mínimo, desde a data do
estudo socioeconômico, de 25/05/2013 (fls. 111/114).
2 - Constata-se, portanto, que desde o termo inicial do benefício (25/05/2013)
até a data da prolação da sentença - 12/12/2013 - passaram-se pouco mais
de 6 (seis) meses, totalizando assim 6 (seis) prestações no valor de um
salário mínimo, que, mesmo que devidamente corrigidas e com a incidência
dos juros de mora e verba honorária, ainda se afigura inferior ao limite
de alçada estabelecido na lei processual (art. 475, §2º, do CPC/1973).
3 - O art. 203, V, da Constituição Federal instituiu o benefício de amparo
social, assegurando o pagamento de um salário mínimo mensal à pessoa
com deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à
própria manutenção ou de tê-la provida por sua família.
4 - A Lei nº 8.742/93 e seus decretos regulamentares estabeleceram os
requisitos para a concessão do benefício, a saber: pessoa deficiente ou
idoso com 65 anos ou mais e que comprove possuir renda familiar per capita
inferior a ¼ do salário mínimo.
5 - Pessoa com deficiência é aquela incapacitada para o trabalho, em
decorrência de impedimentos de longo prazo de natureza física, mental,
intelectual ou sensorial, os quais, em interação com uma ou mais barreiras,
podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade
de condições com as demais pessoas, na dicção do art. 20, §2º, com a
redação dada pela Lei nº 13.146, de 06 de julho de 2015.
6 - A Lei Assistencial, ao fixar a renda per capita, estabeleceu uma
presunção da condição de miserabilidade, não sendo vedado comprovar a
insuficiência de recursos para prover a manutenção do deficiente ou idoso
por outros meios de prova. Precedente jurisprudencial do Superior Tribunal
de Justiça em sede de recurso representativo de controvérsia.
7 - No que diz respeito ao limite de ¼ do salário mínimo per capita
como critério objetivo para comprovar a condição de miserabilidade,
o Plenário do Supremo Tribunal Federal, no julgamento da Reclamação nº
4374/PE, reapreciou a decisão proferida em sede de controle concentrado de
constitucionalidade (ADI nº 1.232-1/DF), declarando a inconstitucionalidade
parcial, sem pronúncia de nulidade, do art. 20, § 3º, da Lei nº 8.742/93.
8 - Pleiteia a autora a concessão do benefício assistencial, uma vez que,
segundo alega, é incapaz e não possui condições de manter seu próprio
sustento ou de tê-lo provido por sua família.
9 - O impedimento de longo prazo restou incontroverso, na medida em que o
INSS não impugnou o capítulo da sentença que o atestou, nem foi conhecida
a remessa necessária.
10 - O estudo social, realizado em 25 de maio de 2013 (fls. 111/114),
informou que o núcleo familiar era formado pela demandante, sua irmã e seu
sobrinho. Conforme relato da assistente social, a residência em que a autora
morava era "uma casa de propriedade da irmã, em bom estado de conservação,
construção de alvenaria, forrada, pintura antiga, possui quatro cômodos,
um banheiro, cercada com muro de alvenaria. Os fornecimentos de água e luz
são da rede pública, o lixo é coletado 3x na semana, o escoamento sanitário
é realizado por fossa séptica. As ruas em torno possuem asfalto. A família
não possui TV por assinatura e nem telefone fixo, apenas celular. Nenhum
membro da família possui automóvel ou moto. Os móveis da casa são os
básicos e em bom estado de conservação. No bairro a disposição dos
serviços de posto de saúde e escolas. O CRAS- Centro de Referência de
Assistência Social se localiza em um bairro vizinho" (sic).
11 - A renda mensal do núcleo familiar, segundo as informações prestadas
à assistente, decorria do salário auferido pela irmã da autora,
VANILDE MIRANDA ROBERTO DA SILVA, no importe de R$690,00, pouco acima do
salário mínimo vigente (R$678,00 - ano exercício de 2013). No entanto,
informações extraídas do Cadastro Nacional de Informações - CNIS, as
quais se encontram acostadas às fls. 147/149 dos autos, dão conta que,
em realidade, em maio de 2013 (competência abril/2013), a irmã da autora
percebeu a remuneração de R$1.015,38. As despesas noticiadas, por sua vez,
envolvendo gastos com alimentação, gás, água, luz, plano funerário,
medicamentos, calçados e roupas, cingiam a aproximadamente R$715,00 mensais.
12 - Nota-se, portanto, que os rendimentos da família eram mais do que
suficientes para arcar com todos os seus gastos, sobrando, inclusive, valor
para o pagamento de plano funerário, o qual, segundo a assistente social,
incluía descontos em exames e consultas.
13 - De outro lado, cumpre destacar que extrato do mesmo Cadastro supra,
em consonância com extrato do Sistema HISCREWEB, os quais seguem anexos aos
autos, dão conta que a genitora da requerente, ANNA MIRANDA ROBERTO, percebia,
no momento da visita da assistente social, dois benefícios previdenciários,
de pensão por morte e aposentadoria por invalidez rural, ambos no valor de
um salário mínimo. Portanto, assim como a irmã da autora, também poderia
ajudar sua filha. Lembre-se, nesse sentido, que o benefício assistencial
de prestação continuada existe para auxiliar a sobrevivência das pessoas
portadoras de incapacidade, por idade avançada, ou outras restrições
físicas ou psíquicas para o trabalho e que não possuam parentes próximos
em condições de lhes prover o sustento. O dever, portanto, é, em primeiro
lugar, da família.
14 - Alie-se, como elemento de convicção, que a autora percebia alguns
medicamentos, de forma gratuita, do poder público, além de residir próximo
a equipamentos públicos de saúde, educação e assistência social, em
bairro com asfaltamento e saneamento básico.
15 - As condições de habitabilidade se mostravam satisfatórias. O imóvel,
apesar de simples, era próprio, construído em alvenaria, estava em bom
estado de conservação e, ainda, era guarnecido com mobiliário que atendia
ao menos as necessidades básicas da família.
16 - Por todo o exposto, em minuciosa análise do conjunto fático probatório,
verifica-se que o núcleo familiar não se enquadrava na concepção legal
de hipossuficiência econômica, não fazendo jus, portanto, a herdeira da
autora, ao pagamento de quaisquer atrasados de benefício assistencial.
17 - O benefício assistencial de prestação continuada é auxílio que
deve ser prestado pelo Estado, portanto, por toda a sociedade, in extremis,
ou seja, nas específicas situações que preencham os requisitos legais
estritos, bem como se e quando a situação de quem o pleiteia efetivamente
o recomende, no que se refere ao pouco deixado pelo legislador para a livre
interpretação do Poder Judiciário.
18 - Ainda que o magistrado sensibilize-se com a situação apresentada
pela parte autora e compadeça-se com a horripilante realidade a que são
submetidos os trabalhadores em geral, não pode determinar à Seguridade a
obrigação de pagamento de benefício, que independe de contribuição, ou
seja, cujo custeio sairá da receita do órgão pagador - contribuições
previdenciárias e sociais - e cujos requisitos mínimos não foram
preenchidos, sob pena de criar perigoso precedente que poderia causar de
vez a falência do já cambaleado Instituto Securitário.
19 - O benefício em questão, que independe de custeio, não se destina à
complementação da renda familiar baixa e a sua concessão exige do julgador
exerça a ingrata tarefa de distinguir faticamente entre as situações de
pobreza e de miserabilidade, eis que tem por finalidade precípua prover a
subsistência daquele que o requer.
20 - No que diz respeito à litigância de má-fé, o então vigente Código
de Processo Civil de 1973 disciplinava suas hipóteses de ocorrência,
a saber: deduzir pretensão ou defesa contra texto expresso de lei ou fato
incontroverso; alterar a verdade dos fatos; usar do processo para conseguir
objetivo ilegal; opuser resistência injustificada ao andamento do processo;
proceder de modo temerário em qualquer incidente ou ato do processo;
provocar incidentes manifestamente infundados; e interpuser recurso com
intuito manifestamente protelatório expresso (art. 17). Excetuadas as
circunstâncias acima previstas, o exercício do direito de ação, e de
seu desdobramento - o direito de recorrer, por si só, não se presta a
caracterizar a litigância de má-fé, desde que justo o motivo que ensejou o
acionamento do Poder Judiciário, independentemente de seu êxito ou não. In
casu, vê-se que o INSS não incidiu em comportamento apto à subsunção
a quaisquer das hipóteses de cabimento da condenação referida, máxime
considerando a complexidade da prova e as considerações apresentadas pelo
perito judicial, além da própria procedência do recurso. Assim, não se
verificou abuso no direito de defesa, consubstanciado na apresentação de
argumentação flagrantemente irrazoável em sede recursal.
21 - Condenada a parte autora no ressarcimento das despesas processuais
eventualmente desembolsadas pela autarquia, bem como nos honorários
advocatícios, arbitrados em 10% (dez por cento) do valor atualizado da causa,
ficando a exigibilidade suspensa por 5 (cinco) anos, desde que inalterada a
situação de insuficiência de recursos que fundamentou a concessão dos
benefícios da assistência judiciária gratuita, a teor do disposto nos
arts. 11, §2º, e 12, ambos da Lei nº 1.060/50, reproduzidos pelo §3º
do art. 98 do CPC.
22 - Remessa necessária não conhecida. Apelação do INSS
provida. Sentença reformada. Ação julgada improcedente. Revogação da
tutela antecipada. Inversão dos ônus de sucumbência, com suspensão dos
efeitos. Dever de pagamento suspenso. Gratuidade da justiça.
Ementa
PROCESSUAL CIVIL. SENTENÇA NÃO SUJEITA À REMESSA NECESSÁRIA. ART. 475,
§2º, DO CPC/1973. CONSTITUCIONAL. ASSISTÊNCIA SOCIAL. PAGAMENTO
DE ATRASADOS. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL AO IDOSO E À PESSOA COM
DEFICIÊNCIA. ART. 203, V, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. IMPEDIMENTO
DE LONGO PRAZO INCONTROVERSO. BENEFÍCIO DE VALOR MÍNIMO PAGO AO
IDOSO. EXCLUSÃO. ART. 34, PARÁGRAFO ÚNICO, DA LEI Nº 10.741/03. APLICAÇÃO
POR ANALOGIA. PRECEDENTES JURISPRUDENCIAIS DO STJ (REPRESENTATIVO DE
CONTROVÉRSIA). STF. DECLARAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE DO § 3º DO
ART. 20 DA LEI Nº 8.472/93, SEM PRONÚNCIA DE NULIDADE. IMPOSSIBILID...
Data do Julgamento
:
11/03/2019
Data da Publicação
:
19/03/2019
Classe/Assunto
:
ApReeNec - APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA - 1962175
Órgão Julgador
:
SÉTIMA TURMA
Relator(a)
:
DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO
Comarca
:
TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
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