main-banner

Jurisprudência


AgRg no AREsp 679986 / PRAGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL2015/0058360-3

Ementa
AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. DESCAMINHO. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. VALOR DO TRIBUTO ILUDIDO. PARÂMETRO DE R$ 10.000,00. ELEVAÇÃO DO TETO, POR MEIO DE PORTARIA DO MINISTÉRIO DA FAZENDA, PARA R$ 20.000,00. INSTRUMENTO NORMATIVO INDEVIDO. FRAGMENTARIEDADE E SUBSIDIARIEDADE DO DIREITO PENAL. INAPLICABILIDADE. LEI PENAL MAIS BENIGNA. NÃO INCIDÊNCIA. AGRAVO PROVIDO. 1. Soa imponderável, contrária à razão e avessa ao senso comum tese jurídica que, apoiada em mera opção de política administrativo-fiscal, movida por interesses estatais conectados à conveniência, à economicidade e à eficiência administrativas, acaba por subordinar o exercício da jurisdição penal à iniciativa da autoridade fazendária. Sobrelevam, assim, as conveniências administrativo-fiscais do Procurador da Fazenda Nacional, que, ao promover o arquivamento, sem baixa na distribuição, dos autos das execuções fiscais de débitos inscritos como Dívida Ativa da União, de valor consolidado igual ou inferior a R$ 10.000,00, impõe, mercê da elástica interpretação dada pela jurisprudência dos tribunais superiores, o que a Polícia deve investigar, o que o Ministério Público deve acusar e, o que é mais grave, o que - e como - o Judiciário deve julgar. 2. Semelhante esforço interpretativo, a par de materializar, entre os jurisdicionados, tratamento penal desigual e desproporcional, se considerada a jurisprudência usualmente aplicável aos autores de crimes contra o patrimônio, consubstancia, na prática, sistemática impunidade de autores de crimes graves, decorrentes de burla ao pagamento de tributos devidos em virtude de importação clandestina de mercadorias, amiúde associada a outras ilicitudes graves (como corrupção, ativa e passiva, e prevaricação) e que importam em considerável prejuízo ao erário e, indiretamente, à coletividade. 3. A partir da Lei n. 10.522/2002, o Ministro da Fazenda não tem mais autorização para, por meio de simples portaria, alterar o valor definido como teto para o arquivamento de execução fiscal sem baixa na distribuição. E a Portaria MF n. 75/2012, que fixa, para aquele fim, o novo valor de R$ 20.000,00 - o qual acentua ainda mais a absurdidade da incidência do princípio da insignificância penal, mormente se considerados os critérios usualmente invocados pela jurisprudência do STF para regular hipóteses de crimes contra o patrimônio - não retroage com o fim de alcançar delitos de descaminho praticados em data anterior à vigência da referida portaria, porquanto não é esta equiparada a lei penal, em sentido estrito, que pudesse, sob tal natureza, reclamar a retroatividade benéfica, conforme disposto no art. 2º, parágrafo único, do CPP. 4. No caso dos autos, a estimativa da elisão tributária relativa às mercadorias apreendidas sem a regular documentação fiscal totaliza a quantia de R$ 15.365,47, excluídos os juros e a multa, não comportando, portanto, a aplicação do princípio da insignificância. Nesse contexto, o aresto recorrido negou vigência ao art. 20 da Lei n. 10.522/2002 e ao art. 334 do Código Penal. 5. Agravo regimental provido para conhecer o recurso especial e lhe dar provimento, a fim de cassar a sentença e o acórdão prolatados na origem e, por conseguinte, determinar o prosseguimento da ação penal promovida pelo Ministério Público Federal contra o recorrido, por crime de descaminho. (AgRg no AREsp 679.986/PR, Rel. Ministro SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, Rel. p/ Acórdão Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, SEXTA TURMA, julgado em 01/10/2015, DJe 04/12/2015)
Acórdão
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da Sexta Turma, prosseguindo no julgamento após o voto-vista do Sr. Ministro Ericson Maranho dando provimento ao agravo regimental, sendo acompanhado pela Sra. Ministra Maria Thereza de Assis Moura, por maioria, dar provimento ao agravo regimental, nos termos do voto do Sr. Ministro Rogerio Schietti Cruz, que lavrará o acórdão. Vencidos os Srs. Ministros Sebastião Reis Júnior e Nefi Cordeiro. Votaram com o Sr. Ministro Rogerio Schietti Cruz os Srs. Ministros Ericson Maranho (Desembargador convocado do TJ/SP) e Maria Thereza de Assis Moura.

Data do Julgamento : 01/10/2015
Data da Publicação : DJe 04/12/2015
Órgão Julgador : T6 - SEXTA TURMA
Relator(a) : Ministro SEBASTIÃO REIS JÚNIOR (1148)
Relator a p acórdão : Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ (1158)
Notas : Princípio da insignificância: aplicado ao crime de descaminho em que o valor do tributo elidido for de R$ 15.365,47 (quinze mil trezentos e sessenta e cinco reais e quarenta e sete centavos).
Informações adicionais : (DECISÃO DO ÓRGÃO JULGADOR) "A partir da Lei n. 10.522/2002, o Ministro da Fazenda não tem mais autorização para, por meio de simples portaria, alterar o valor definido como teto para o arquivamento de execução fiscal sem baixa na distribuição. E a Portaria MF n. 75/2012, que fixa, para aquele fim, o novo valor de R$ 20.000,00 - o qual acentua ainda mais a absurdidade da incidência do princípio da insignificância penal, mormente se considerados os critérios usualmente invocados pela jurisprudência do STF para regular hipóteses de crimes contra o patrimônio - não retroage com o fim de alcançar delitos de descaminho praticados em data anterior à vigência da referida portaria, porquanto não é esta equiparada a lei penal, em sentido estrito, que pudesse, sob tal natureza, reclamar a retroatividade benéfica, conforme disposto no art. 2º, parágrafo único, do CPP". (RESSALVA DE ENTENDIMENTO) (MIN. ROGERIO SCHIETTI CRUZ) "Soa imponderável, contrária à razão e avessa ao senso comum uma tese que, apoiada em mera opção de política administrativo-fiscal, movida por interesses estatais conectados à conveniência, à economicidade e à eficiência administrativas, acaba por subordinar o exercício da jurisdição penal à iniciativa de uma autoridade fazendária. Sobrelevam, assim, as conveniências administrativo-fiscais do Procurador da Fazenda Nacional, que, ao promover o arquivamento, sem baixa, dos autos das execuções fiscais de débitos inscritos como Dívida Ativa da União, de valor consolidado igual ou inferior a R$ 10.000,00, determina, mercê da elástica interpretação dada pela jurisprudência dos tribunais superiores, o que a Polícia deve investigar, o que o Ministério Público deve acusar e, o que é mais grave, o que - e como - o Judiciário deve julgar. Semelhante esforço interpretativo, a par de materializar tratamento penal desigual e desproporcional, se considerada a jurisprudência usualmente aplicável aos autores de crimes contra o patrimônio, consubstancia, na prática, sistemática impunidade de autores de crimes graves decorrentes de burla ao pagamento de tributos devidos em virtude de importação clandestina de mercadorias, amiúde associada a outras ilicitudes graves (como corrupção, ativa e passiva, e prevaricação) e que importam em considerável prejuízo ao erário e, indiretamente, à coletividade". "Não há, por conseguinte, razão plausível em se restringir o âmbito de proteção da norma proibitiva do descaminho (cuja amplitude de tutela alberga outros valores, além da arrecadação fiscal, tão importantes no cenário brasileiro atual), equiparando-o, de forma simples e impositiva, aos crimes tributários". "[...]a opção por deixar de executar a dívida estipulada no quantum mínimo previsto na norma de regência não implica dizer - com o perdão da insistência - que o Estado desiste de receber o crédito fiscal. Não se trata de anistia da dívida tributária, expressamente vedada, aliás, pelo art. 180, I, do CTN (Lei nº 5.172/66), impondo observar que, se se cuidasse de remissão (total ou parcial) do débito fiscal, haveria necessidade de lei autorizadora, sob as circunstâncias indicadas no art. 172 do CTN". (VOTO VISTA) (MIN. ERICSON MARANHO (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/SP)) "[...]é firme neste Pretório o entendimento de que nas hipóteses em que há notória divergência, possível a relativização das exigências formais na demonstração do dissídio, especialmente se o paradigma é desta Corte". (VOTO VENCIDO) (MIN. SEBASTIÃO REIS JÚNIOR) "[...]a análise do tema trazido no recurso especial passa, necessariamente, pela análise da Portaria MF n. 75/12. Entretanto, é inviável, em recurso especial, a discussão acerca da interpretação de portaria, pois não se trata de norma que se enquadra no conceito de lei federal inscrito no art. 105, III, da Constituição da República".
Referência legislativa : LEG:FED DEL:002848 ANO:1940***** CP-40 CÓDIGO PENAL ART:00002 PAR:ÚNICO ART:00334LEG:FED LEI:010522 ANO:2002 ART:00020(ARTIGO 20 COM A REDAÇÃO DADA PELA LEI 11.033/2004)LEG:FED LEI:011033 ANO:2004LEG:FED PRT:000075 ANO:2012 ART:00001 INC:00002(MINISTÉRIO DA FAZENDA - MF)LEG:FED CFB:****** ANO:1988***** CF-1988 CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988 ART:00105 INC:00003 LET:ALEG:FED LEI:005172 ANO:1966***** CTN-66 CÓDIGO TRIBUTÁRIO NACIONAL ART:00172
Veja : (DESCAMINHO - PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA) STJ - REsp 1112748-TO(RECURSO REPETITIVO), REsp 1393317-PR(DESCAMINHO - PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA - ALTERAÇÃO DE LIMITESPELA PORTARIA 75/2012 DO MF) STJ - REsp 1393317-PR(VOTO VISTA - DESCAMINHO - PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA - PARÂMETRODE APLICAÇÃO) STJ - EREsp 966077-GO(VOTO VISTA - RECURSO ESPECIAL - COMPROVAÇÃO DA DIVERGÊNCIAJURISPRUDENCIAL - RELATIVIZAÇÃO DAS EXIGÊNCIAS FORMAIS) STJ - AgRg no AgRg no AREsp 88619-RJ, EDcl no AgRg no REsp 1330229-DF, AgRg no REsp 1043663-SP, REsp 730934-DF(VOTO VENCIDO - RECURSO ESPECIAL - VIOLAÇÃO A PORTARIA MINISTERIAL) STJ - REsp 878792-CE, REsp 1241207-SP
Mostrar discussão