APn 741 / DFAÇÃO PENAL2014/0094193-8
PENAL E PROCESSUAL PENAL. AÇÃO PENAL ORIGINÁRIA. DENÚNCIA POR CRIMES DE FALSIFICAÇÃO DE SELO OU SINAL PÚBLICO (ART. 296, § 1º, III, DO CPB) EM CONCURSO COM O DELITO DE PREVARICAÇÃO (ART. 319, DO CPB), PRATICADOS POR SUBPROCURADOR-GERAL DA REPÚBLICA. ATIPICIDADE APONTADA PELA DEFESA NÃO EVIDENCIADA. RECEBIMENTO DA DENÚNCIA.
1. Narra a peça acusatória que, entre os dias 10/5/2012 e 15/2/2013, o denunciado, de forma livre e consciente, fez uso indevido do brasão da República e dos dísticos "Ministério Público Federal" e "Procuradoria-Geral da República", que, agrupados no cabeçalho de expedientes oficiais, conformam a identidade visual e institucional do Ministério Público Federal, ao expedir dez ofícios, dirigidos a autoridades da Receita Federal do Brasil e do Departamento de Polícia Federal do Distrito Federal, com a finalidade de tutelar interesse individual privado. Alega que o denunciado invocou sua condição funcional, solicitando, nos mencionados ofícios, abertura de ação fiscal e instauração de inquérito policial em face de pessoas desprovidas de prerrogativa de foro, o que caracterizou atuação fora das atribuições do seu cargo de Subprocurador-Geral da República, em contrariedade ao que dispõem os arts. 66 e 70 da Lei Complementar n. 75/93.
2. A leitura dos fatos narrados, em consonância com os elementos mínimos coligidos aos autos denotam adequação típica e lastro probatório mínimo.
3. Com relação ao crime de falsificação de selo ou sinal público, na forma de "uso indevido", faz-se necessário dar prosseguimento à persecutio criminis, pois evidenciada a admissibilidade da acusação.
Isso porque a atuação dos Subprocuradores-Gerais, descrita na lei de regência, subsume-se aos casos que envolvam autoridades com prerrogativa de foro. Os instrumentos de atuação ministerial (inquérito civil, requisição de diligências investigatórias e instauração de inquérito policial, requisição de procedimentos administrativos etc.), certamente, não podem desbordar da sua finalidade. Cada agente de poder pertencente ao Parquet deve se utilizar dos referidos meios no estrito âmbito de suas atribuições e para os fins institucionais da nobre Instituição. Não se pode converter em um mecanismo de vingança privada.
4. No que diz respeito ao crime de prevaricação, também há necessidade de continuidade da persecução. Não é demais relembrar que o interesse pessoal "é qualquer proveito ou vantagem obtido pelo agente, de índole patrimonial ou moral [...]", e o sentimento pessoal "por sua vez, é a posição afetiva do funcionário público relativamente às pessoas ou coisas a que se refere a conduta a ser praticada ou omitida" (MASSON, Cléber. Código Penal Comentado, 2ª edição, São Paulo: Método, 2014, pág. 1146). Portanto, em sendo confirmadas as acusações, da forma em que narradas, haveria a prática de conduta, contra disposição expressa de lei, para satisfação de sentimento (se visava apenas punição dos agentes que o contrariou) e/ou interesse pessoal (se visava também, obliquamente, proveito patrimonial).
5. A medida cautelar de afastamento do cargo, por ora, não se justifica, por ausência de periculum in mora. Significaria aplicar, antecipadamente, efeito não automático da condenação (art. 92 do CPB), tratando-se de verdadeira punição antecipada.
6. Denúncia recebida.
(APn 741/DF, Rel. Ministro OG FERNANDES, CORTE ESPECIAL, julgado em 03/06/2015, DJe 17/08/2015)
Ementa
PENAL E PROCESSUAL PENAL. AÇÃO PENAL ORIGINÁRIA. DENÚNCIA POR CRIMES DE FALSIFICAÇÃO DE SELO OU SINAL PÚBLICO (ART. 296, § 1º, III, DO CPB) EM CONCURSO COM O DELITO DE PREVARICAÇÃO (ART. 319, DO CPB), PRATICADOS POR SUBPROCURADOR-GERAL DA REPÚBLICA. ATIPICIDADE APONTADA PELA DEFESA NÃO EVIDENCIADA. RECEBIMENTO DA DENÚNCIA.
1. Narra a peça acusatória que, entre os dias 10/5/2012 e 15/2/2013, o denunciado, de forma livre e consciente, fez uso indevido do brasão da República e dos dísticos "Ministério Público Federal" e "Procuradoria-Geral da República", que, agrupados no cabeçalho de expedientes oficiais, conformam a identidade visual e institucional do Ministério Público Federal, ao expedir dez ofícios, dirigidos a autoridades da Receita Federal do Brasil e do Departamento de Polícia Federal do Distrito Federal, com a finalidade de tutelar interesse individual privado. Alega que o denunciado invocou sua condição funcional, solicitando, nos mencionados ofícios, abertura de ação fiscal e instauração de inquérito policial em face de pessoas desprovidas de prerrogativa de foro, o que caracterizou atuação fora das atribuições do seu cargo de Subprocurador-Geral da República, em contrariedade ao que dispõem os arts. 66 e 70 da Lei Complementar n. 75/93.
2. A leitura dos fatos narrados, em consonância com os elementos mínimos coligidos aos autos denotam adequação típica e lastro probatório mínimo.
3. Com relação ao crime de falsificação de selo ou sinal público, na forma de "uso indevido", faz-se necessário dar prosseguimento à persecutio criminis, pois evidenciada a admissibilidade da acusação.
Isso porque a atuação dos Subprocuradores-Gerais, descrita na lei de regência, subsume-se aos casos que envolvam autoridades com prerrogativa de foro. Os instrumentos de atuação ministerial (inquérito civil, requisição de diligências investigatórias e instauração de inquérito policial, requisição de procedimentos administrativos etc.), certamente, não podem desbordar da sua finalidade. Cada agente de poder pertencente ao Parquet deve se utilizar dos referidos meios no estrito âmbito de suas atribuições e para os fins institucionais da nobre Instituição. Não se pode converter em um mecanismo de vingança privada.
4. No que diz respeito ao crime de prevaricação, também há necessidade de continuidade da persecução. Não é demais relembrar que o interesse pessoal "é qualquer proveito ou vantagem obtido pelo agente, de índole patrimonial ou moral [...]", e o sentimento pessoal "por sua vez, é a posição afetiva do funcionário público relativamente às pessoas ou coisas a que se refere a conduta a ser praticada ou omitida" (MASSON, Cléber. Código Penal Comentado, 2ª edição, São Paulo: Método, 2014, pág. 1146). Portanto, em sendo confirmadas as acusações, da forma em que narradas, haveria a prática de conduta, contra disposição expressa de lei, para satisfação de sentimento (se visava apenas punição dos agentes que o contrariou) e/ou interesse pessoal (se visava também, obliquamente, proveito patrimonial).
5. A medida cautelar de afastamento do cargo, por ora, não se justifica, por ausência de periculum in mora. Significaria aplicar, antecipadamente, efeito não automático da condenação (art. 92 do CPB), tratando-se de verdadeira punição antecipada.
6. Denúncia recebida.
(APn 741/DF, Rel. Ministro OG FERNANDES, CORTE ESPECIAL, julgado em 03/06/2015, DJe 17/08/2015)Acórdão
Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima
indicadas, acordam os Ministros da CORTE Especial do Superior
Tribunal de Justiça, por maioria, receber a denúncia e, por
unanimidade, indeferir o pedido de afastamento do réu de seu cargo,
nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Quanto ao recebimento da
denúncia, os Srs. Ministros Luis Felipe Salomão, Mauro Campbell
Marques, Benedito Gonçalves, Raul Araújo, Felix Fischer, Laurita
Vaz, Humberto Martins, Maria Thereza de Assis Moura, Herman Benjamin
e Jorge Mussi votaram com o Sr. Ministro Relator. Votou vencido o
Sr. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho.
Quanto ao pedido de afastamento, os Srs. Ministros Luis Felipe
Salomão, Mauro Campbell Marques, Benedito Gonçalves, Raul Araújo,
Felix Fischer, Laurita Vaz, Humberto Martins, Maria Thereza de Assis
Moura, Herman Benjamin, Napoleão Nunes Maia Filho e Jorge Mussi
votaram com o Sr. Ministro Relator.
Ausentes, justificadamente, os Srs. Ministros Nancy Andrighi e João
Otávio de Noronha.
Sustentaram oralmente o Dr. José Adonis Callou de Araujo Sá,
Subprocurador-Geral da República, e o Dr. Moacir Guimarães Morais
Filho, em causa própria.
Data do Julgamento
:
03/06/2015
Data da Publicação
:
DJe 17/08/2015
Órgão Julgador
:
CE - CORTE ESPECIAL
Relator(a)
:
Ministro OG FERNANDES (1139)
Informações adicionais
:
"[...]o esgotamento de processo disciplinar não constitui
condição objetiva de punibilidade ou condição de procedibilidade
para exercício da ação penal (o que caracterizaria um pressuposto
processual específico). Não se verifica, pois, nesse ponto, falta de
pressuposto processual. Como é cediço, a Constituição Federal de
1988, no art. 129, inciso I, assegura ao Ministério Público a
titularidade privativa na promoção da ação penal pública. O
ordenamento jurídico consagra a independência entre as esferas
administrativa e penal, podendo o Ministério Público, tomando
conhecimento de ilícito penal de ação pública incondicionada, com
indícios suficientes de materialidade e autoria, desde logo formular
denúncia, independentemente de oitiva na esfera administrativa
disciplinar, instauração de inquérito policial ou qualquer
providência pré-processual".
Não configura incoerência na sistemática do ordenamento penal,
a configurar "bis in idem", a imputação dos crimes de falsificação
de selo e sinais oficiais e prevaricação simultaneamente ao acusado.
Isso porque, os bens jurídicos protegidos pelos crimes em evidência
são diversos e de similar relevância, visto que a imputação da
falsificação de selo e sinais oficiais visa proteger a fé pública, a
confiança na genuinidade de documentos, sinais e símbolos utilizados
na multiplicidade de relações diárias, a convicção geral na
autenticidade e valor dos documentos e atos prescritos para relações
coletivas e, por outro lado, a imputação do crime de prevaricação
busca proteção da Administração Pública, cujos interesses
perseguidos não se compactuam com o comportamento do funcionário
público que descumpre seus deveres, com propósitos de satisfação de
interesses pessoais, prejudicando o desenvolvimento normal e regular
da atividade administrativa.
(VOTO VENCIDO) (MIN. NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO)
Não é cabível o recebimento de denúncia de prevaricação na
hipótese em que não há elementos que comprovem o elemento anímico, o
dolo da conduta, especialmente quando houve insucesso das sanções
administrativas tentadas contra o agente. Isso porque, estimar que a
sua conduta se eleva à condição de crime, faz submeter a pessoa ao
"strepitu judici" sem que esteja claramente delineada a presença do
dolo, na ação pessoal.
Referência legislativa
:
LEG:FED CFB:****** ANO:1988***** CF-1988 CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988 ART:00129 INC:00001LEG:FED DEL:002848 ANO:1940***** CP-40 CÓDIGO PENAL ART:00092 ART:00296 PAR:00001 INC:00003 PAR:00002 ART:00319LEG:FED LCP:000075 ANO:1993***** EMPU-93 ESTATUTO DO MINISTÉRIO PÚBLICO DA UNIÃO ART:00066 ART:00070LEG:FED LCP:000035 ANO:1979***** LOMAN-79 LEI ORGÂNICA DA MAGISTRATURA NACIONAL ART:00007 ART:00008 ART:00027 PAR:00003 ART:00029
Veja
:
(AÇÃO PENAL - ALEGAÇÃO DE NÃO ESGOTAMENTO DE PROCESSO DISCIPLINAR -CONDIÇÃO DE PUNIBILIDADE) STJ - RHC 48477-PR, AgRg no RMS 33949-PE(CONFLITO APARENTE DE NORMAS - INCOERÊNCIA SISTEMÁTICA DOORDENAMENTO - "BIS IN IDEM" - BEM JURÍDICO TUTELADO DIVERSO) STJ - RHC 48695-SE, APn 719-DF, RHC 31077-MA(DIREITO PENAL - REQUISIÇÃO DE DADOS SIGILOSOS - SATISFAÇÃO DEINTERESSE PESSOAL - PREVARICAÇÃO) STJ - APn 642-DF
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