CC 139862 / MTCONFLITO DE COMPETENCIA2015/0091789-9
CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. JUSTIÇA ESTADUAL X JUSTIÇA FEDERAL. INQUÉRITO POLICIAL. TRÁFICO NACIONAL DE ENTORPECENTES, FALSA IDENTIDADE (ART. 307, CP) E USO INDEVIDO DE VESTIMENTA DO EXÉRCITO BRASILEIRO (ART. 172 DO CÓDIGO PENAL MILITAR). ATIPICIDADE DUVIDOSA DA CONDUTA DE INFORMAR PROFISSÃO FALSA A AUTORIDADE POLICIAL RODOVIÁRIA FEDERAL. INEXISTÊNCIA DE CONEXÃO ENTRE OS DELITOS DE TRÁFICO E FALSA IDENTIDADE. DESMEMBRAMENTO DO FEITO EM RELAÇÃO AO DELITO DE COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA MILITAR.
1. Situação em que o investigado, ao ser abordado pela Polícia Rodoviária Federal, trajava vestes do Exército e se identificou como soldado do 2º Batalhão de Fronteira de Cáceres/MT. No entanto, contactado, o órgão militar informou que o investigado de fato prestara serviço militar naquela instituição, porém, já havia sido dispensado há quase dois anos. Além disso, em seu automóvel foram localizados quatro tabletes de cocaína que ele admitiu ter adquirido em Cáceres/MT e planejava deixar em Itaúba/MT.
2. O delito de falsa identidade (art. 307, CP) apresentada perante policiais rodoviários federais, cujo julgamento é de competência da Justiça Federal, pressupõe o fornecimento de informações falsas (errôneas) em relação ao conjunto de características peculiares de uma pessoa determinada, que permite reconhecê-la e individualizá-la, envolvendo o nome, a idade, o estado civil, a filiação, o sexo, entre outros dados, com o intuito de obter vantagem, em proveito próprio ou alheio, ou mesmo causar dano a outrem.
3. No entanto, a doutrina tem defendido que, "Se a pessoa já está identificada, reconhecida individualmente pelo nome e filiação, por exemplo, a menção falsa a outro dado, nesse caso secundário, como a profissão, não serve para configurar o delito." (In Nucci, Guilherme de Souza. Código Penal comentado - 15. ed. rev., atual. e ampl. - Rio de Janeiro: Forense, 2015, pp. 1.303/1.304).
4. No caso concreto, a conduta investigada é de tipicidade duvidosa, na medida em que a despeito de ter informado profissão falsa, que não mais exercia, o investigado parece ter se identificado adequadamente perante a Polícia Rodoviária Federal, tanto que os dados que forneceu foram suficientes para se averiguar a profissão que ele alegava exercer perante o órgão empregador que indicou.
5. As causas modificadoras da competência - conexão e continência - têm como objetivo melhor esclarecer os fatos, auxiliando o juiz a formar seu livre convencimento motivado. Dessarte, só se justifica a alteração da competência originária quando devidamente demonstrada a possibilidade de alcançar os benefícios visados pelos referidos institutos.
6. Ainda que, no caso concreto, se pudesse cogitar de uma aparente conexão teleológica (art. 76, II, do CPP) entre o uso de falsa identidade e o tráfico nacional de entorpecentes, na medida em que a falsa identidade poderia facilitar o tráfico, o julgamento conjunto dos delitos não se revela efetivamente necessário e benéfico, na medida em que eventuais provas e indícios do delito de falsa identidade não terão o condão de influenciar na demonstração da materialidade e da autoria do crime de tráfico de entorpecentes.
7. Dado que o art. 79, I, do CPP veda a reunião de processos, por conexão ou continência, no concurso entre a jurisdição comum e a militar, deve o feito ser desmembrado, em relação ao delito do artigo 172 do Código Penal Militar (Uso indevido de uniforme, distintivo ou insígnia militar por qualquer pessoa), encaminhando-se ao Ministério Público Militar competente a cópia do inquérito para que prossiga, se for o caso, com as investigações referentes ao suposto delito militar. Precedente: (CC 108.024/SC, Rel. Ministra ASSUSETE MAGALHÃES, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 13/11/2013, DJe 11/12/2013) 8. A possibilidade de descoberta de outras provas e/ou evidências, no decorrer das investigações, levando a conclusões diferentes, demonstra não ser possível firmar peremptoriamente a competência definitiva para julgamento do presente inquérito policial. Isso não obstante, tendo em conta que a definição do Juízo competente em tais hipóteses se dá em razão dos indícios coletados até então, revela-se a competência da Justiça Estadual para condução do inquérito policial, no tocante à investigação dos delitos de tráfico nacional de entorpecentes e de falsa identidade (art. 307, CP), e da Justiça Militar, em relação ao delito do artigo 172 do Código Penal Militar (Uso indevido de uniforme, distintivo ou insígnia militar por qualquer pessoa).
9. Conflito conhecido, para declarar competente o Juízo de Direito da 5ª Vara Criminal de Sorriso/MT para dar continuidade às investigações referentes aos delitos, em tese, de tráfico nacional de entorpecentes e de falsa identidade.
(CC 139.862/MT, Rel. Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 25/02/2016, DJe 02/03/2016)
Ementa
CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. JUSTIÇA ESTADUAL X JUSTIÇA FEDERAL. INQUÉRITO POLICIAL. TRÁFICO NACIONAL DE ENTORPECENTES, FALSA IDENTIDADE (ART. 307, CP) E USO INDEVIDO DE VESTIMENTA DO EXÉRCITO BRASILEIRO (ART. 172 DO CÓDIGO PENAL MILITAR). ATIPICIDADE DUVIDOSA DA CONDUTA DE INFORMAR PROFISSÃO FALSA A AUTORIDADE POLICIAL RODOVIÁRIA FEDERAL. INEXISTÊNCIA DE CONEXÃO ENTRE OS DELITOS DE TRÁFICO E FALSA IDENTIDADE. DESMEMBRAMENTO DO FEITO EM RELAÇÃO AO DELITO DE COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA MILITAR.
1. Situação em que o investigado, ao ser abordado pela Polícia Rodoviária Federal, trajava vestes do Exército e se identificou como soldado do 2º Batalhão de Fronteira de Cáceres/MT. No entanto, contactado, o órgão militar informou que o investigado de fato prestara serviço militar naquela instituição, porém, já havia sido dispensado há quase dois anos. Além disso, em seu automóvel foram localizados quatro tabletes de cocaína que ele admitiu ter adquirido em Cáceres/MT e planejava deixar em Itaúba/MT.
2. O delito de falsa identidade (art. 307, CP) apresentada perante policiais rodoviários federais, cujo julgamento é de competência da Justiça Federal, pressupõe o fornecimento de informações falsas (errôneas) em relação ao conjunto de características peculiares de uma pessoa determinada, que permite reconhecê-la e individualizá-la, envolvendo o nome, a idade, o estado civil, a filiação, o sexo, entre outros dados, com o intuito de obter vantagem, em proveito próprio ou alheio, ou mesmo causar dano a outrem.
3. No entanto, a doutrina tem defendido que, "Se a pessoa já está identificada, reconhecida individualmente pelo nome e filiação, por exemplo, a menção falsa a outro dado, nesse caso secundário, como a profissão, não serve para configurar o delito." (In Nucci, Guilherme de Souza. Código Penal comentado - 15. ed. rev., atual. e ampl. - Rio de Janeiro: Forense, 2015, pp. 1.303/1.304).
4. No caso concreto, a conduta investigada é de tipicidade duvidosa, na medida em que a despeito de ter informado profissão falsa, que não mais exercia, o investigado parece ter se identificado adequadamente perante a Polícia Rodoviária Federal, tanto que os dados que forneceu foram suficientes para se averiguar a profissão que ele alegava exercer perante o órgão empregador que indicou.
5. As causas modificadoras da competência - conexão e continência - têm como objetivo melhor esclarecer os fatos, auxiliando o juiz a formar seu livre convencimento motivado. Dessarte, só se justifica a alteração da competência originária quando devidamente demonstrada a possibilidade de alcançar os benefícios visados pelos referidos institutos.
6. Ainda que, no caso concreto, se pudesse cogitar de uma aparente conexão teleológica (art. 76, II, do CPP) entre o uso de falsa identidade e o tráfico nacional de entorpecentes, na medida em que a falsa identidade poderia facilitar o tráfico, o julgamento conjunto dos delitos não se revela efetivamente necessário e benéfico, na medida em que eventuais provas e indícios do delito de falsa identidade não terão o condão de influenciar na demonstração da materialidade e da autoria do crime de tráfico de entorpecentes.
7. Dado que o art. 79, I, do CPP veda a reunião de processos, por conexão ou continência, no concurso entre a jurisdição comum e a militar, deve o feito ser desmembrado, em relação ao delito do artigo 172 do Código Penal Militar (Uso indevido de uniforme, distintivo ou insígnia militar por qualquer pessoa), encaminhando-se ao Ministério Público Militar competente a cópia do inquérito para que prossiga, se for o caso, com as investigações referentes ao suposto delito militar. Precedente: (CC 108.024/SC, Rel. Ministra ASSUSETE MAGALHÃES, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 13/11/2013, DJe 11/12/2013) 8. A possibilidade de descoberta de outras provas e/ou evidências, no decorrer das investigações, levando a conclusões diferentes, demonstra não ser possível firmar peremptoriamente a competência definitiva para julgamento do presente inquérito policial. Isso não obstante, tendo em conta que a definição do Juízo competente em tais hipóteses se dá em razão dos indícios coletados até então, revela-se a competência da Justiça Estadual para condução do inquérito policial, no tocante à investigação dos delitos de tráfico nacional de entorpecentes e de falsa identidade (art. 307, CP), e da Justiça Militar, em relação ao delito do artigo 172 do Código Penal Militar (Uso indevido de uniforme, distintivo ou insígnia militar por qualquer pessoa).
9. Conflito conhecido, para declarar competente o Juízo de Direito da 5ª Vara Criminal de Sorriso/MT para dar continuidade às investigações referentes aos delitos, em tese, de tráfico nacional de entorpecentes e de falsa identidade.
(CC 139.862/MT, Rel. Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 25/02/2016, DJe 02/03/2016)Acórdão
Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima
indicadas, acordam os Ministros da Terceira Seção do Superior
Tribunal de Justiça, por unanimidade, conhecer do conflito e
declarar competente o Suscitado, Juízo de Direito da 5ª Vara
Criminal de Sorriso/MT, para dar continuidade às investigações
referentes aos delitos, em tese, de tráfico nacional de
entorpecentes e de falsa identidade, nos termos do voto do Sr.
Ministro Relator.Os Srs. Ministros Ribeiro Dantas, Ericson Maranho
(Desembargador convocado do TJ/SP), Felix Fischer, Maria Thereza de
Assis Moura, Rogerio Schietti Cruz, Nefi Cordeiro e Gurgel de Faria
votaram com o Sr. Ministro Relator. Ausente, justificadamente, o Sr.
Ministro Jorge Mussi. Presidiu o julgamento o Sr. Ministro Sebastião
Reis Júnior.
Data do Julgamento
:
25/02/2016
Data da Publicação
:
DJe 02/03/2016
Órgão Julgador
:
S3 - TERCEIRA SEÇÃO
Relator(a)
:
Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA (1170)
Referência legislativa
:
LEG:FED DEL:002848 ANO:1940***** CP-40 CÓDIGO PENAL ART:00307LEG:FED DEL:001001 ANO:1969***** CPM-69 CÓDIGO PENAL MILITAR DE 1969 ART:00172LEG:FED DEL:003689 ANO:1941***** CPP-41 CÓDIGO DE PROCESSO PENAL ART:00079 INC:00001
Veja
:
STJ - CC 108024-SC
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