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Jurisprudência


EDcl no REsp 1447705 / RSEMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO RECURSO ESPECIAL2014/0071923-2

Ementa
PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO RECURSO ESPECIAL. ACLARATÓRIOS RECEBIDOS COMO AGRAVO REGIMENTAL. PRINCÍPIO DA FUNGIBILIDADE RECURSAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA AJUIZADA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL. TUTELA DE DIREITOS INDIVIDUAIS HOMOGÊNEOS. MILITARES E EX-MILITARES DAS FORÇAS ARMADAS ACOMETIDOS DE DOENÇA MENTAL INCAPACITANTE DURANTE A PRESTAÇÃO DO SERVIÇO MILITAR. INEXISTÊNCIA DE RELAÇÃO JURÍDICA BASE. NECESSIDADE DE EXAME INDIVIDUALIZADO DE CADA SITUAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE DE CONFERIR INTERPRETAÇÃO ÚNICA AOS DISPOSITIVOS LEGAIS. AUSÊNCIA DE RELEVÂNCIA SOCIAL OBJETIVA DO BEM JURÍDICO TUTELADO. AUSÊNCIA DE INTERESSE DE AGIR DO PARQUET. AGRAVO REGIMENTAL PROVIDO. 1. Não se depreendendo das razões aventadas qual seria efetivamente a obscuridade, omissão ou contradição vislumbrada pela embargante, mas o nítido propósito de rediscutir a tese jurídica adotada singularmente, a irresignação deve ser recebida como se agravo regimental. 2. O exame da controvérsia não encontra óbice nas Súmulas 7/STJ e 283/STF, vez que o exame da questão dispensa a análise da situação específica de cada militar acometido ou que venha a ser acometido de alienação mental, posto que na presente via, não serão analisadas as peculiaridades de cada caso, bem como tendo em vista que o Parquet impugnou especificamente todos os fundamentos do acórdão recorrido. 3. Cinge-se a controvérsia recursal acerca da existência ou não de interesse de agir do Ministério Público Federal para a promoção de ação civil pública na defesa de direito individuais homogêneos de militares e ex-militares das Forças Armadas que adquiriram alguma espécie de doença mental durante o serviço militar e são posteriormente licenciados do serviço militar, sem direito à reforma ex offício ou a tratamento médico, ao pretexto de que a moléstia não guardaria relação de causa e efeito com o serviço militar e que a doença não decorreria das atividades castrenses, pois preexistentes, embora tenham aflorado em período posterior. 4. A jurisprudência do STJ firmou-se no sentido de reconhecer a legitimidade do Ministério Público e a adequação da ação civil pública, tanto para a tutela de direitos e interesses difusos e coletivos, quanto para a proteção dos direitos individuais homogêneos, ainda que disponíveis e divisíveis, quando presente a relevância social objetiva do bem jurídico tutelado ou a massificação do conflito em si considerado. 5. Por direitos direitos individuais homogêneos entende-se àqueles de que são titulares um número de pessoas ainda não identificada, mas passível de ser determinado em momento posterior, e que derivam de uma origem comum, do que decorre a sua homogeneidade. 6. In casu, cingindo-se a pretensão autoral ao reconhecimento do direito de reforma ex offício àqueles militares e ex-militares acometidos de doença mental durante a prestação do serviço militar, quando julgados incapazes, definitivamente, para o serviço castrense, mesmo quando a moléstia for anterior ao ingresso nas Forças Armadas, não há que se falar em tutela de interesses ou direitos individuais homogêneos, isto porque tal pretensão não decorre de uma origem comum, inexistindo, desse modo, uma relação jurídica base a uni-los, já que cada militar foi alvo de uma decisão administrativa específica que, analisando particularmente a sua situação, deliberou pelo seu licenciamento e não por sua reforma. 7. A negativa do direito à reforma ex offício "não deriva de uma mesma relação jurídica, mas de cada relação jurídica individualizada, onde as circunstâncias de fato são absolutamente particulares. Não se vislumbra, destarte, um liame comum (de fato ou de direito) entre os pretensos beneficiários do comando judicial, [...]. Ora, este direito não derivaria de uma idêntica situação fática (que, pelo contrário, é particularíssima, ante a imensa gama de abrangência das moléstias que podem conduzir à alienação mental e da forma como as mesmas podem apresentar-se)", conforme bem decidiu a MM. Juíza Federal Substituta, Dra. Ana Maria Wiclert Theisen, na sentença singular. 8. A revisão do ato de licenciamento do militar acometido por alienação mental incapacitante demanda a análise particularizada da situação de cada militar, sob o risco de estar-se por fixar uma interpretação única para a legislação de regência, criando um modelo padronizado para esses casos e impossibilitando a Administração Militar de analisar as peculiaridades de cada caso. 9. Não há dúvidas acerca da gravidade da situação dos militares que, acometidos por doença mental, vem a ser desligados do serviço militar e colocados à própria sorte, nem se está dizer que é deferida à Administração Militar o direito de livremente licenciar esses militares. Não é isso! O que se quer dizer é que tais situações devem ser examinadas de forma individualizada e não através de uma ação coletiva, a fim de formar-se um título genérico a abarcar todo e qualquer militar acometido por doença mental, ainda mais porque a solução genérica pretendida pelo Ministério Público acabaria por desconsiderar a prova pericial e outras que devem ser aferidas em demandas individuais, onde se verificará qual a moléstia que acomete o militar, o momento da sua eclosão, se é anterior ou não ao ingresso no serviço castrense, o grau de incapacidade para o serviço militar e para a vida civil, questões estas que merecem particular exame, não podendo serem objeto de tutela coletiva. 10. Além do mais, a pretensão autoral, no sentido de que seja reconhecido o direito à reforma ex offício dos eventuais beneficiados da presente ação coletiva, impossibilitaria o exame da relação de causa e efeito entre a alienação mental e o serviço militar, o que é indispensável, especialmente quando os arts. 94 e 124 da Lei 6.880/1980 e o art. 31, § 2°, da 4.375/1964, autorizam a "anulação da incorporação" ao serviço militar obrigatório nos casos em que tenham sido verificadas irregularidades no recrutamento, ou a "desincorporação", no caso do militar estar incapacitado definitivamente para o serviço militar em razão de moléstia preexistente, dispondo ainda o Decreto 57.654/1996, no § 2° do seu art. 139, que "se ficar apurado que a causa ou irregularidade preexistia à data da incorporação, esta será anulada e nenhum amparo do Estado caberá ao incorporado". 11. Revela-se inviável o pleito autoral quando busca a aplicação indiscriminada do instituto da reforma, de forma genérica, sem observância das especificações da legislação militar, ainda mais quando se tratam de direitos estritamente individuais que não podem ser tratados de maneira uniforme, sob pena de transmudar institutos de direito militar expressamente previstos em lei. 12. A observância da legislação militar impõe que as situações sejam examinadas caso a caso, e não de forma genérica. Não pode a Administração ser obrigada a proceder atos de reforma sem que sejam observadas as peculiaridades de cada caso e seu enquadramento em cada uma das possíveis hipóteses legais, especialmente porque a concessão do ato de reforma ex offício depende da homologação da inspeção de saúde por Junta Superior de Saúde, na forma do que dispõe o art. 108, § 2°, da Lei 6.880/1980. 13. Não se está a afastar a legitimidade ou o interesse de agir do Ministério Público em ações coletivas que tenham por objeto demandas previdenciárias, tampouco se afasta a possibilidade de formação de coisa julgada nacional ou de tratamento diferenciado entre militares e civis, contudo, o presente caso guarda peculiaridades, que devem ser consideradas. 14. Não há relevância social objetiva do bem jurídico tutelado, a fim de reconhecer a legitimidade do Ministério Público para promover a apresente ação coletiva na tutela de direitos individuais homogêneos dos militares, isto porque, a despeito da gravidade da situação, tais direitos não possuem relevância social objetiva apta a possibilitar a sua tutela coletiva, porquanto referem-se a direitos que se restringem a meros interesses de particulares, no caso dos militares prejudicados, e não se referem a direitos cuja preservação ou tutela o ordenamento jurídico consagre como indispensáveis para a sociedade como um todo, para o seu progresso material, institucional e moral. 15. Com vênias do Ministro Relator, embargos de declaração recebidos como agravo regimental, ao qual se dá provimento, para restabelecer o acórdão regional. (EDcl no REsp 1447705/RS, Rel. Ministro OG FERNANDES, Rel. p/ Acórdão Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 17/09/2015, DJe 04/12/2015)
Acórdão
Vistos, relatados e discutidos esses autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da SEGUNDA TURMA do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas, o seguinte resultado de julgamento:, "Prosseguindo-se no julgamento, após o voto-vista do Sr. Ministro Humberto Martins, acompanhando a divergência inaugurada pelo Sr. Ministro Mauro Campbell Marques, a Turma, por unanimidade, recebeu os embargos de declaração como agravo regimental e, por maioria, deu-lhe provimento, nos termos do voto do Sr. Ministro Mauro Campbell Marques. Vencido o Sr. Ministro Og Fernandes." Votaram com o Sr. Ministro Mauro Campbell Marques a Sra. Ministra Assusete Magalhães e o Sr. Ministro Humberto Martins. Ausente, ocasionalmente, o Sr. Ministro Herman Benjamin.

Data do Julgamento : 17/09/2015
Data da Publicação : DJe 04/12/2015
Órgão Julgador : T2 - SEGUNDA TURMA
Relator(a) : Ministro OG FERNANDES (1139)
Relator a p acórdão : Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES (1141)
Informações adicionais : (VOTO VENCIDO) (MIN. OG FERNANDES) "[...] a controvérsia que diz respeito à idoneidade da presente ação civil pública, cuja pretensão de direito material envolve a possibilidade da reforma dos militares acometidos de doença mental, quando incapazes, definitivamente, para o serviço ativo dentro das instituições militares. [...] a atuação do Ministério Público destina-se a garantir a eficácia dos direitos e interesses de toda a categoria dos militares, incluindo-se os conscritos, os temporários e os de carreira. Trata-se, portanto, de direitos individuais homogêneos, diante da excepcional natureza jurídica que os reveste".
Referência legislativa : LEG:FED SUM:*********** SUM(STJ) SÚMULA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA SUM:000007LEG:FED SUM:*********** SUM(STF) SÚMULA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL SUM:000283LEG:FED LEI:007347 ANO:1985***** LACP-85 LEI DE AÇÃO CIVIL PÚBLICA ART:00021(COM A REDAÇÃO DADA PELA LEI 8.078/1990)LEG:FED LEI:008078 ANO:1990***** CDC-90 CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR ART:00081 PAR:ÚNICO INC:00003LEG:FED LEI:006880 ANO:1980***** EMIL-80 ESTATUTO DOS MILITARES ART:00094 ART:00106 INC:00002 ART:00108 INC:00005 PAR:00002 ART:00124LEG:FED LEI:004375 ANO:1964 ART:00031 PAR:00001 PAR:00002 LET:CLEG:FED DEC:057654 ANO:1966 ART:00139 PAR:00002
Veja : (AÇÃO CIVIL PÚBLICA - DEFESA DE DIREITOS INDIVIDUAIS HOMOGÊNEOS -RELEVÂNCIA SOCIAL DO BEM JURÍDICO TUTELADO) STJ - REsp 1005587-PR, REsp 1185867-AM, AgRg no AgRg no REsp 1167377-SC, EREsp 1185867-AM, REsp 1243195-RS STF - RE 163231
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