HC 189672 / RJHABEAS CORPUS2010/0204485-4
HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO PRÓPRIO. NÃO CABIMENTO.
ESTUPRO E ATENTADO VIOLENTO AO PUDOR. PRÁTICA DELITIVA ANTERIOR À LEI N. 12.015/09. RECURSO DE APELAÇÃO DA ACUSAÇÃO. APLICAÇÃO DA NOVATIO LEGIS PELO TRIBUNAL ESTADUAL. AGRAVAMENTO DA PENA IMPOSTA NA SENTENÇA. WRIT QUE PLEITEIA A ADEQUAÇÃO DA DOSIMETRIA DA PENA A PATAMARES MAIS JUSTOS. FIXAÇÃO DA PENA ALÉM DO MÁXIMO COMINADO EM ABSTRATO PELO TIPO PENAL EM RAZÃO DA INCIDÊNCIA DE AGRAVANTE.
IMPOSSIBILIDADE. APLICAÇÃO RETROATIVA DA LEI N. 12.051/09 PARA AGRAVAR A PENA. FLAGRANTE ILEGALIDADE. RECONHECIMENTO DE CRIME ÚNICO COM VALORAÇÃO NEGATIVA DOS ATOS DIVERSOS DA CONJUNÇÃO CARNAL NA FIXAÇÃO DA PENA-BASE. POSSIBILIDADE DESDE QUE RESPEITADA A PROIBIÇÃO À REFORMATIO IN PEJUS. SITUAÇÃO DOS AUTOS EM QUE A APLICAÇÃO INTEGRAL DA LEI N. 12.051/09 FOI PREJUDICIAL AO RÉU. IMPOSSIBILIDADE DE COMBINAÇÃO DE LEIS. ORDEM CONCEDIDA DE OFÍCIO PARA RESTABELECER A PENA FIXADA NA SENTENÇA CONFORME LEGISLAÇÃO VIGENTE À ÉPOCA DOS FATOS.
1. Por se tratar de habeas corpus substitutivo de recurso próprio, a impetração não deve ser conhecida, segundo a atual orientação jurisprudencial do Supremo Tribunal Federal e do próprio Superior Tribunal de Justiça, sem prejuízo da verificação das alegações expostas na inicial, ante a possibilidade de se verificar a existência de flagrante constrangimento ilegal.
2. A jurisprudência desta Corte Superior é firme no sentido de que o habeas corpus não se presta a rever o juízo discricionário do Magistrado na fixação da pena, que deve atender à singularidade do caso concreto. Assim, a alteração a dosimetria da pena deve se restrita aos casos de flagrante desproporcionalidade ou erro de técnica, o que se verifica na espécie.
4. Na segunda etapa do sistema trifásico, o acórdão fixou a pena acima do máximo legal, a despeito de a incidência de agravante poder elevar a reprimenda apenas até o patamar máximo cominado abstratamente no tipo. A Lei n. 12.015/09 estabeleceu no preceito secundário do art. 213 (estupro) a pena de 6 a 10 anos, entretanto, na espécie, ao incidir a agravante da reincidência, o Tribunal a quo fixou, na segunda fase da dosimetria, a pena de 10 anos e 6 meses de reclusão. O aumento da pena acima do máximo previsto no tipo penal é permitido somente na terceira fase da dosimetria da pena, mediante o reconhecimento de causas de aumento. Precedentes.
4. No caso concreto, ainda que se corrija o erro técnico de dosimetria da pena, fixando-a em 10 anos de reclusão, a aplicação retroativa da Lei n. 12.015/09 permanecerá prejudicial ao réu, uma vez que o Juízo de primeiro grau fixou a pena de 9 anos e 4 meses de reclusão, considerando a lei vigente à data dos fatos.
3. A Corte estadual pode agravar a pena do réu atendendo ao pleito do Parquet, desde que sob fundamentação idônea. Havendo pedido ministerial para o recrudescimento da pena, pode haver reformatio in pejus, todavia há de se observar também as regras que norteiam o conflito de leis penais no tempo. Portanto, não se pode ignorar o conteúdo dos arts. 1º e art. 2º do Código Penal - CP, que, em consonância com o art. 5º, incisos XXXIX e XL, da Constituição Federal - CF, consagram duas máximas do Direito Penal: "não há crime sem lei anterior que o defina" e "a lei não retroagirá, salvo para beneficiar o réu".
5. Conforme firme jurisprudência do STJ, não é possível retroagir a Lei n. 12.015/09 apenas para possibilitar o reconhecimento do crime único, aplicando-se o preceito secundário menos gravoso da lei anterior, o que implicaria indevida combinação de normas.
Precedentes.
6. Diante do cotejo das duas penas aplicadas, constata-se que, na singularidade do caso concreto, a aplicação retroativa da Lei n.
12.015/09, de forma integral, foi prejudicial ao réu, configurando flagrante ilegalidade. Por essa razão, deve ser restabelecida a pena fixada na sentença. Nesse ponto, observo ser inequívoco que o édito condenatório de primeiro grau aplicou a legislação vigente à época dos fatos na sua integralidade, até porque a sentença foi proferida anteriormente às inovações legislativas implantadas nos crimes contra a dignidade sexual.
7. Habeas corpus substitutivo não conhecido. De ofício, concedo a ordem para determinar que seja restabelecida a sentença que fixou a pena em 9 anos e 4 meses de reclusão, no regime inicial fechado.
(HC 189.672/RJ, Rel. Ministro JOEL ILAN PACIORNIK, QUINTA TURMA, julgado em 25/10/2016, DJe 07/11/2016)
Ementa
HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO PRÓPRIO. NÃO CABIMENTO.
ESTUPRO E ATENTADO VIOLENTO AO PUDOR. PRÁTICA DELITIVA ANTERIOR À LEI N. 12.015/09. RECURSO DE APELAÇÃO DA ACUSAÇÃO. APLICAÇÃO DA NOVATIO LEGIS PELO TRIBUNAL ESTADUAL. AGRAVAMENTO DA PENA IMPOSTA NA SENTENÇA. WRIT QUE PLEITEIA A ADEQUAÇÃO DA DOSIMETRIA DA PENA A PATAMARES MAIS JUSTOS. FIXAÇÃO DA PENA ALÉM DO MÁXIMO COMINADO EM ABSTRATO PELO TIPO PENAL EM RAZÃO DA INCIDÊNCIA DE AGRAVANTE.
IMPOSSIBILIDADE. APLICAÇÃO RETROATIVA DA LEI N. 12.051/09 PARA AGRAVAR A PENA. FLAGRANTE ILEGALIDADE. RECONHECIMENTO DE CRIME ÚNICO COM VALORAÇÃO NEGATIVA DOS ATOS DIVERSOS DA CONJUNÇÃO CARNAL NA FIXAÇÃO DA PENA-BASE. POSSIBILIDADE DESDE QUE RESPEITADA A PROIBIÇÃO À REFORMATIO IN PEJUS. SITUAÇÃO DOS AUTOS EM QUE A APLICAÇÃO INTEGRAL DA LEI N. 12.051/09 FOI PREJUDICIAL AO RÉU. IMPOSSIBILIDADE DE COMBINAÇÃO DE LEIS. ORDEM CONCEDIDA DE OFÍCIO PARA RESTABELECER A PENA FIXADA NA SENTENÇA CONFORME LEGISLAÇÃO VIGENTE À ÉPOCA DOS FATOS.
1. Por se tratar de habeas corpus substitutivo de recurso próprio, a impetração não deve ser conhecida, segundo a atual orientação jurisprudencial do Supremo Tribunal Federal e do próprio Superior Tribunal de Justiça, sem prejuízo da verificação das alegações expostas na inicial, ante a possibilidade de se verificar a existência de flagrante constrangimento ilegal.
2. A jurisprudência desta Corte Superior é firme no sentido de que o habeas corpus não se presta a rever o juízo discricionário do Magistrado na fixação da pena, que deve atender à singularidade do caso concreto. Assim, a alteração a dosimetria da pena deve se restrita aos casos de flagrante desproporcionalidade ou erro de técnica, o que se verifica na espécie.
4. Na segunda etapa do sistema trifásico, o acórdão fixou a pena acima do máximo legal, a despeito de a incidência de agravante poder elevar a reprimenda apenas até o patamar máximo cominado abstratamente no tipo. A Lei n. 12.015/09 estabeleceu no preceito secundário do art. 213 (estupro) a pena de 6 a 10 anos, entretanto, na espécie, ao incidir a agravante da reincidência, o Tribunal a quo fixou, na segunda fase da dosimetria, a pena de 10 anos e 6 meses de reclusão. O aumento da pena acima do máximo previsto no tipo penal é permitido somente na terceira fase da dosimetria da pena, mediante o reconhecimento de causas de aumento. Precedentes.
4. No caso concreto, ainda que se corrija o erro técnico de dosimetria da pena, fixando-a em 10 anos de reclusão, a aplicação retroativa da Lei n. 12.015/09 permanecerá prejudicial ao réu, uma vez que o Juízo de primeiro grau fixou a pena de 9 anos e 4 meses de reclusão, considerando a lei vigente à data dos fatos.
3. A Corte estadual pode agravar a pena do réu atendendo ao pleito do Parquet, desde que sob fundamentação idônea. Havendo pedido ministerial para o recrudescimento da pena, pode haver reformatio in pejus, todavia há de se observar também as regras que norteiam o conflito de leis penais no tempo. Portanto, não se pode ignorar o conteúdo dos arts. 1º e art. 2º do Código Penal - CP, que, em consonância com o art. 5º, incisos XXXIX e XL, da Constituição Federal - CF, consagram duas máximas do Direito Penal: "não há crime sem lei anterior que o defina" e "a lei não retroagirá, salvo para beneficiar o réu".
5. Conforme firme jurisprudência do STJ, não é possível retroagir a Lei n. 12.015/09 apenas para possibilitar o reconhecimento do crime único, aplicando-se o preceito secundário menos gravoso da lei anterior, o que implicaria indevida combinação de normas.
Precedentes.
6. Diante do cotejo das duas penas aplicadas, constata-se que, na singularidade do caso concreto, a aplicação retroativa da Lei n.
12.015/09, de forma integral, foi prejudicial ao réu, configurando flagrante ilegalidade. Por essa razão, deve ser restabelecida a pena fixada na sentença. Nesse ponto, observo ser inequívoco que o édito condenatório de primeiro grau aplicou a legislação vigente à época dos fatos na sua integralidade, até porque a sentença foi proferida anteriormente às inovações legislativas implantadas nos crimes contra a dignidade sexual.
7. Habeas corpus substitutivo não conhecido. De ofício, concedo a ordem para determinar que seja restabelecida a sentença que fixou a pena em 9 anos e 4 meses de reclusão, no regime inicial fechado.
(HC 189.672/RJ, Rel. Ministro JOEL ILAN PACIORNIK, QUINTA TURMA, julgado em 25/10/2016, DJe 07/11/2016)Acórdão
Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima
indicadas, acordam os Ministros da Quinta Turma do Superior Tribunal
de Justiça, por unanimidade, não conhecer do pedido e conceder de
ofício, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator.
Os Srs. Ministros Felix Fischer, Jorge Mussi, Reynaldo Soares da
Fonseca e Ribeiro Dantas votaram com o Sr. Ministro Relator.
Data do Julgamento
:
25/10/2016
Data da Publicação
:
DJe 07/11/2016
Órgão Julgador
:
T5 - QUINTA TURMA
Relator(a)
:
Ministro JOEL ILAN PACIORNIK (1183)
Referência legislativa
:
LEG:FED LEI:012015 ANO:2009LEG:FED DEL:002848 ANO:1940***** CP-40 CÓDIGO PENAL ART:00001 ART:00002 ART:00068 ART:00213LEG:FED CFB:****** ANO:1988***** CF-1988 CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988 ART:00005 INC:00039 INC:00040
Veja
:
(HABEAS CORPUS - JUÍZO DISCRICIONÁRIO - FIXAÇÃO DA PENA -IMPOSSIBILIDADE) STJ - HC 362589-MA, HC 350734-RJ(PENA DEFINITIVA SUPERIOR À PENA MÁXIMA ABSTRATA - INCIDÊNCIA DEMAJORANTES - TERCEIRA FASE DA DOSIMETRIA) STJ - HC 279197-SP(ESTUPRO E ATENTADO VIOLENTO AO PUDOR - LEI N° 12.015/09 - CRIMEÚNICO - LEI PENAL MAIS BENÉFICA - RETROATIVIDADE - NOVA DOSIMETRIADA PENA) STJ - HC 321496-SP, HC 308188-SP(ESTUPRO E ATENTADO VIOLENTO AO PUDOR - CRIME ÚNICO - DOSIMETRIA -COMBINAÇÃO DE LEIS) STJ - EREsp 1094499-MG, REsp 1230525-DF
Mostrar discussão