HC 198375 / BAHABEAS CORPUS2011/0038000-6
HABEAS CORPUS. MALVERSAÇÃO DE VERBA PÚBLICA FEDERAL. CONVÊNIO FIRMADO COM O MINISTÉRIO DA SAÚDE. CONSTRUÇÃO DE DOIS POSTOS DE SAÚDE. DENÚNCIA POR CRIME TIPIFICADO NO ART. 92 DA LEI N. 8666/93 E NO ART. 299 DO CP. TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL. EXCEPCIONALIDADE.
ALEGAÇÃO DE AUSÊNCIA DE JUSTA CAUSA. NÃO OCORRÊNCIA. DOLO ESPECÍFICO DE LESÃO AO ERÁRIO E PREJUÍZO MINIMAMENTE DEMONSTRADOS. NECESSIDADE DE EXAME FÁTICO-PROBATÓRIO. INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL. VERBAS ORIUNDAS DA UNIÃO E SUJEITAS À FISCALIZAÇÃO FEDERAL. SÚMULA 208/STJ. ALEGAÇÕES DE NULIDADES AFASTADAS. AUSÊNCIA DE FLAGRANTE ILEGALIDADE. HABEAS CORPUS NÃO CONHECIDO.
1. Em razão da excepcionalidade do trancamento da ação penal, tal medida somente se verifica possível quando ficar demonstrado, de plano e sem necessidade de dilação probatória, a total ausência de indícios de autoria e prova da materialidade delitiva, a atipicidade da conduta ou a existência de alguma causa de extinção da punibilidade. É certa, ainda, a possibilidade do referido trancamento nos casos em que a denúncia for inepta, não atendendo o que dispõe o art. 41 do Código de Processo Penal - CPP, o que não impede a propositura de nova ação desde que suprida a irregularidade.
2. A denúncia, de forma clara, imputa ao paciente a conduta de, uma semana após término do procedimento licitatório, sub-rogar a totalidade da execução da obra para empresa - que não participara da Tomada de Preço por não possuir a idoneidade fiscal exigida no edital - e que tinha como sócio-gerente um primo do acusado. Nos termos da inicial acusatória o paciente ainda teria emitido aceitação definitiva da obra licitada antes da sua conclusão, ou seja, teria inserido declaração falsa na prestação de contas ao Ministério da Saúde, com o intuito de justificar o pagamento à empresa sub-contratada, pertencente a seu parente. Nesse contexto, a autorização do recebimento integral dos recursos por obra inacabada configura, em tese, intenção de causar dano ao erário. Assim, resta suprida a exigência da demonstração mínima de dolo específico de dano ao erário e do prejuízo causado, não merecendo reparos a decisão da autoridade apontada como coatora, que houve por bem deflagrar a ação penal.
3. As condutas descritas na denúncia se amoldam aos tipos penais cuja prática foi imputada ao paciente, não sendo possível afirmar que a conduta praticada é atípica, ao menos na via eleita, na qual é inadimissível a incursão no acervo probatório. Foram demonstrados indícios suficientes de autoria aptos para a inauguração da ação penal, com o recebimento da denúncia.
4. A acurada leitura do Convênio n. 2200/2002 revela que o mesmo foi celebrado entre o Ministério da Saúde e o Município de São Desidério/BA, representado pelo paciente, visando fortalecer o Sistema Único de Saúde - SUS, cabendo à União, o controle e fiscalização do objeto do contrato. Nesse ponto, a Terceira Seção desta Corte Superior já afirmou que, em se tratando do verbas oriundas da União e destinadas ao Sistema Único da Saúde, tais recursos ficam sujeitos à fiscalização federal, fixando, assim, a competência da Justiça Federal, nos termos da Súmula 208 do Superior Tribunal de Justiça - STJ. Precedentes.
Ademais a Cláusula Nona do referido Convênio evidencia a necessidade de a Municipalidade prestar contas à União. A tese de que a competência para julgar o feito seria da Justiça Estadual - sob o argumento de que as verbas já teriam sido incorporadas ao patrimônio do Município - é incompatível com a cláusula expressa existente no contrato acerca da necessidade de prestação de constas à União.
5. Constata-se dos autos que o advogado do paciente compareceu à sessão que deliberou sobre o recebimento da denúncia e apresentou sustentação oral. Diante disso não se verifica nenhum prejuízo ao exercício da ampla defesa e, consequentemente, não há nulidade a ser reconhecida no fato de o paciente não ter sido intimado pessoalmente para a respectiva sessão.
7. O fato de o regimento interno do TRF da 1ª Região dispensar a publicação do acórdão no caso de recebimento da denúncia, também não obsta a ampla defesa, porque, conforme informado pelo Juízo da Vara Criminal em Barreira/BA a correspondente Ata foi disponibilizada no e-DJF1 em 05/11/2010, com validade de publicação no dia 8/11/2010, sendo certo, ainda, que o advogado compareceu pessoalmente na sessão, tomando conhecimento direto dos fundamentos jurídicos que embasaram o recebimento da denúncia.
Ordem de habeas corpus denegada.
(HC 198.375/BA, Rel. Ministro JOEL ILAN PACIORNIK, QUINTA TURMA, julgado em 15/12/2016, DJe 10/02/2017)
Ementa
HABEAS CORPUS. MALVERSAÇÃO DE VERBA PÚBLICA FEDERAL. CONVÊNIO FIRMADO COM O MINISTÉRIO DA SAÚDE. CONSTRUÇÃO DE DOIS POSTOS DE SAÚDE. DENÚNCIA POR CRIME TIPIFICADO NO ART. 92 DA LEI N. 8666/93 E NO ART. 299 DO CP. TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL. EXCEPCIONALIDADE.
ALEGAÇÃO DE AUSÊNCIA DE JUSTA CAUSA. NÃO OCORRÊNCIA. DOLO ESPECÍFICO DE LESÃO AO ERÁRIO E PREJUÍZO MINIMAMENTE DEMONSTRADOS. NECESSIDADE DE EXAME FÁTICO-PROBATÓRIO. INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL. VERBAS ORIUNDAS DA UNIÃO E SUJEITAS À FISCALIZAÇÃO FEDERAL. SÚMULA 208/STJ. ALEGAÇÕES DE NULIDADES AFASTADAS. AUSÊNCIA DE FLAGRANTE ILEGALIDADE. HABEAS CORPUS NÃO CONHECIDO.
1. Em razão da excepcionalidade do trancamento da ação penal, tal medida somente se verifica possível quando ficar demonstrado, de plano e sem necessidade de dilação probatória, a total ausência de indícios de autoria e prova da materialidade delitiva, a atipicidade da conduta ou a existência de alguma causa de extinção da punibilidade. É certa, ainda, a possibilidade do referido trancamento nos casos em que a denúncia for inepta, não atendendo o que dispõe o art. 41 do Código de Processo Penal - CPP, o que não impede a propositura de nova ação desde que suprida a irregularidade.
2. A denúncia, de forma clara, imputa ao paciente a conduta de, uma semana após término do procedimento licitatório, sub-rogar a totalidade da execução da obra para empresa - que não participara da Tomada de Preço por não possuir a idoneidade fiscal exigida no edital - e que tinha como sócio-gerente um primo do acusado. Nos termos da inicial acusatória o paciente ainda teria emitido aceitação definitiva da obra licitada antes da sua conclusão, ou seja, teria inserido declaração falsa na prestação de contas ao Ministério da Saúde, com o intuito de justificar o pagamento à empresa sub-contratada, pertencente a seu parente. Nesse contexto, a autorização do recebimento integral dos recursos por obra inacabada configura, em tese, intenção de causar dano ao erário. Assim, resta suprida a exigência da demonstração mínima de dolo específico de dano ao erário e do prejuízo causado, não merecendo reparos a decisão da autoridade apontada como coatora, que houve por bem deflagrar a ação penal.
3. As condutas descritas na denúncia se amoldam aos tipos penais cuja prática foi imputada ao paciente, não sendo possível afirmar que a conduta praticada é atípica, ao menos na via eleita, na qual é inadimissível a incursão no acervo probatório. Foram demonstrados indícios suficientes de autoria aptos para a inauguração da ação penal, com o recebimento da denúncia.
4. A acurada leitura do Convênio n. 2200/2002 revela que o mesmo foi celebrado entre o Ministério da Saúde e o Município de São Desidério/BA, representado pelo paciente, visando fortalecer o Sistema Único de Saúde - SUS, cabendo à União, o controle e fiscalização do objeto do contrato. Nesse ponto, a Terceira Seção desta Corte Superior já afirmou que, em se tratando do verbas oriundas da União e destinadas ao Sistema Único da Saúde, tais recursos ficam sujeitos à fiscalização federal, fixando, assim, a competência da Justiça Federal, nos termos da Súmula 208 do Superior Tribunal de Justiça - STJ. Precedentes.
Ademais a Cláusula Nona do referido Convênio evidencia a necessidade de a Municipalidade prestar contas à União. A tese de que a competência para julgar o feito seria da Justiça Estadual - sob o argumento de que as verbas já teriam sido incorporadas ao patrimônio do Município - é incompatível com a cláusula expressa existente no contrato acerca da necessidade de prestação de constas à União.
5. Constata-se dos autos que o advogado do paciente compareceu à sessão que deliberou sobre o recebimento da denúncia e apresentou sustentação oral. Diante disso não se verifica nenhum prejuízo ao exercício da ampla defesa e, consequentemente, não há nulidade a ser reconhecida no fato de o paciente não ter sido intimado pessoalmente para a respectiva sessão.
7. O fato de o regimento interno do TRF da 1ª Região dispensar a publicação do acórdão no caso de recebimento da denúncia, também não obsta a ampla defesa, porque, conforme informado pelo Juízo da Vara Criminal em Barreira/BA a correspondente Ata foi disponibilizada no e-DJF1 em 05/11/2010, com validade de publicação no dia 8/11/2010, sendo certo, ainda, que o advogado compareceu pessoalmente na sessão, tomando conhecimento direto dos fundamentos jurídicos que embasaram o recebimento da denúncia.
Ordem de habeas corpus denegada.
(HC 198.375/BA, Rel. Ministro JOEL ILAN PACIORNIK, QUINTA TURMA, julgado em 15/12/2016, DJe 10/02/2017)Acórdão
Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima
indicadas, acordam os Ministros da Quinta Turma do Superior Tribunal
de Justiça, por unanimidade, denegar a ordem.
Os Srs. Ministros Felix Fischer, Jorge Mussi, Reynaldo Soares da
Fonseca e Ribeiro Dantas votaram com o Sr. Ministro Relator.
Data do Julgamento
:
15/12/2016
Data da Publicação
:
DJe 10/02/2017
Órgão Julgador
:
T5 - QUINTA TURMA
Relator(a)
:
Ministro JOEL ILAN PACIORNIK (1183)
Informações adicionais
:
"[...] a Jurisprudência do STJ tem exigido que na denúncia
esteja minimamente descrita a vontade de acarretar prejuízos aos
cofres públicos, no caso de imputação da prática do delito descrito
no art. 92 da Lei 8666/93, muito embora referido tipo penal não
descreva dolo específico, por não conter a expressão 'com o fim de',
'com o intuito de' ou 'visando' causar dano ao erário".
"A conglobação dos fatos descritos na denúncia recomenda que,
neste momento, a dúvida deve ser interpretada em favor da sociedade,
de modo que a circunstâncias e elementos constitutivos do tipo devem
ser melhor aferidas no curso da ação penal, sob o crivo do
contraditório".
Referência legislativa
:
LEG:FED DEL:003689 ANO:1941***** CPP-41 CÓDIGO DE PROCESSO PENAL ART:00041LEG:FED SUM:****** ANO:********* SUM(STJ) SÚMULA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA SUM:000208 SUM:000209LEG:FED LEI:008666 ANO:1993***** LC-93 LEI DE LICITAÇÕES ART:00092LEG:FED DEL:002848 ANO:1940***** CP-40 CÓDIGO PENAL ART:00299
Veja
:
(DENÚNCIA - ART. 92 DA LEI 8.666/93 - DANO AO ERÁRIO - DESCRIÇÃO) STJ - HC 329227-SP(ART. 92 DA LEI 8.666/93 - DENÚNCIA - IN DUBIO PRO SOCIETATE) STJ - REsp 1373009-MA(ART. 92 DA LEI 8.666/93 - DENÚNCIA - CERTEZA SOBRE ELEMENTOSUBJETIVO) STJ - RHC 59287-RS(COMPETÊNCIA - VERBA DA UNIÃO DESTINADA AO SUS - FISCALIZAÇÃOFEDERAL) STJ - AgRg no CC 122555-RJ(COMPETÊNCIA - VERBA DA UNIÃO DESTINADA AO SUS - INCORPORAÇÃO AOMUNICÍPIO) STF - RE-AGR 696533(PROCESSO PENAL - ALEGAÇÃO DE NULIDADE - DEMONSTRAÇÃO DE PREJUÍZO) STJ - RHC 45365-RS, AgRg no REsp 1368634-SP
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