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Jurisprudência


HC 237785 / RSHABEAS CORPUS2012/0065052-5

Ementa
CONSTITUCIONAL E PENAL. HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO. FURTO. INSIGNIFICÂNCIA. MULTIREINCIDÊNCIA. VALOR DA RES FURTIVAE NÃO DEMOSTRADO. ÔNUS DO IMPETRANTE. NECESSIDADE DE PROVA PRÉ-CONSTITUÍDA. RELEVANTE LESÃO AO BEM JURÍDICO. DOSIMETRIA. REFORMATIO IN PEJUS. INOCORRÊNCIA. PROCESSOS EM CURSO, SEM TRÂNSITO EM JULGADO. IMPOSSIBILIDADE DE VALORAR NEGATIVAMENTE A PENA-BASE. SÚMULA 444. FIXAÇÃO DA PENA-BASE PELA INSTÂNCIA INFERIORES MAIS BENÉFICA. MANUTENÇÃO. REINCIDÊNCIA. QUANTUM DO AGRAVAMENTO PROPORCIONAL. CONFORMIDADE COM O SISTEMA HIERÁRQUICO DE DOSIMETRIA TRIFÁSICO. HABEAS CORPUS NÃO CONHECIDO. 1. Esta Corte e o Supremo Tribunal Federal pacificaram orientação no sentido de que não cabe habeas corpus substitutivo do recurso legalmente previsto para a hipótese, impondo-se o não conhecimento da impetração, salvo quando constatada a existência de flagrante ilegalidade no ato judicial impugnado, o que não ocorre na espécie. 2. O "princípio da insignificância - que deve ser analisado em conexão com os postulados da fragmentariedade e da intervenção mínima do Estado em matéria penal - tem o sentido de excluir ou de afastar a própria tipicidade penal, examinada na perspectiva de seu caráter material. [...] Tal postulado - que considera necessária, na aferição do relevo material da tipicidade penal, a presença de certos vetores, tais como (a) a mínima ofensividade da conduta do agente, (b) nenhuma periculosidade social da ação, (c) o reduzidíssimo grau de reprovabilidade do comportamento e (d) a inexpressividade da lesão jurídica provocada - apoiou-se, em seu processo de formulação teórica, no reconhecimento de que o caráter subsidiário do sistema penal reclama e impõe, em função dos próprios objetivos por ele visados, a intervenção mínima do Poder Público." (HC n. 84.412-0/SP, STF, Rel. Ministro CELSO DE MELLO, DJU 19.11.2004.) 2. A jurisprudência desta Quinta Turma reconhece que o princípio da insignificância não tem aplicabilidade em casos de reiteração da conduta delitiva, salvo excepcionalmente, quando as instâncias ordinárias entenderem ser tal medida recomendável diante das circunstâncias concretas. 3. In casu, verifica-se multireincidência do réu em crimes patrimoniais, conforme constatado em sentença e acórdão condenatórios, o que demostra desprezo sistemático pelo cumprimento do ordenamento jurídico. Nesse passo, de rigor a inviabilidade do reconhecimento da atipicidade material, por não restarem demonstradas as exigidas mínima ofensividade da conduta e ausência de periculosidade social da ação. 4. O princípio da insignificância baseia-se na necessidade de lesão jurídica expressiva para a incidência do Direito Penal, afastando a tipicidade do delito em certas hipóteses em que, apesar de típica a conduta, ausente dano juridicamente relevante. Sobre o tema, de maneira meramente indicativa e não vinculante, a jurisprudência desta Corte, dentre outros critérios, aponta o parâmetro da décima parte do salário mínimo vigente ao tempo da infração penal, para aferição da relevância da lesão patrimonial. 5. Observa-se que não consta da sentença condenatória e do acórdão ora impugnado o valor da res furtivae, haja vista a ausência de qualquer avaliação. Como o rito especial do habeas corpus exige a juntada de prova-pré-constituída documental para sua instrução, trata-se de ônus probatório do impetrante demostrar cabalmente o valor irrisório da res furtivae, para que se tranque o processo em seu início, pelo reconhecimento da insignificância, até porque o dominus litis não se manifesta em habeas corpus. Não fosse assim, qualquer alegação de fato modificativo, impeditivo ou extintivo do thema decidendum da ação penal seria presumida verdadeira, sem, contudo, o confronto do dominus litis. Por conseguinte, ausente avaliação do valor da coisa, não há, pois, meios de se verificar a inexpressividade da lesão ao bem jurídico, o que obsta, em fundamentação autônoma, o reconhecimento da atipicidade bagatelar. 6. Consoante jurisprudência consolidada desta Corte, não há falar em ilegalidade na dosimetria da pena se as instâncias de origem fundamentaram concretamente a fixação da pena no patamar estabelecido. Nessas condições, inviável, pois, por meio de habeas corpus, aferir o quantum aplicado, sob pena de revolvimento fático-probatório. A Suprema Corte, nesse sentido, entende que a dosagem da pena é submetida aos elementos de convicção judiciais acerca das circunstâncias do crime, cabendo às Cortes Superiores apenas o controle da legalidade e da constitucionalidade dos critérios empregados, a fim de evitar eventuais arbitrariedades. Destarte, o reexame das circunstâncias judiciais e critérios concretos de individualização da pena mostram-se inadequados à estreita via do habeas corpus, pois exigiriam revolvimento probatório. Precedentes. 7. Pela análise da sentença e do acórdão condenatórios, verifica-se inexistir reformatio in pejus, pois o acórdão confirmou a pena-base dosada na sentença. Como o réu é duplamente reincidente, as duas instâncias reconheceram uma condenação transitada em julgado como agravante de reincidência e a outra como maus antecedentes. O acórdão igualmente chancelou a valoração negativa da conduta social do réu, em razão de processo em curso, portanto sem trânsito em julgado. 8. A jurisprudência atual desta Corte, sedimentada no Enunciado de Súmula 444, veda às instâncias inferiores valorar negativamente a pena-base em função de inquéritos ou processos em curso, sem trânsito em julgado, em respeito ao princípio da presunção de não culpa. 9. Patente, pois, a ilegalidade da sentença e acórdão condenatórios em valorar negativamente a conduta social do réu em função de ações penais em curso, sem o trânsito em julgado, motivo pelo qual faz-se necessário readequar a dosimetria. Verifica-se que há condenação transitada em julgada para sustentar a incidência de circunstância negativa de maus antecedentes, valorada em 1/8 (um oitavo) sobre o intervalo da pena em abstrato do preceito secundário, o que corresponderia, por si só, ao acréscimo de 4 (quatro) meses e 15 (quinze) dias à pena mínima em abstrato, resultando na pena-base de 1 (um) ano 4 (quatro) meses e 15 dias. Contudo, considerando duas circunstâncias desfavoráveis, as instâncias inferiores fixaram-na, benevolentemente, em 1 (um) ano e 2 (dois) meses, com acréscimo inferior àquele devido pela incidência de apenas uma circunstância desfavorável, portanto, de rigor a manutenção do acréscimo de 2 (dois) meses, sob pena de reformatio in pejus. 10. Dentro do sistema hierárquico da dosimetria da pena, consagrado pela forma trifásica, as agravantes são circunstâncias de gravidade intermediária, haja vista sua subsidiariedade em relação às qualificadoras e causas de aumento, preponderando apenas sobre as circunstâncias judiciais. Não é por outra razão que doutrina e jurisprudência consagraram o parâmetro indicativo de valoração de cada agravante em 1/6 (um sexto), porquanto corresponde ao menor valor fixado pelo legislador para as causas de aumento, que são preponderantes àquelas e superior ao parâmetro de 1/8 (um oitavo) das circunstâncias judiciais. Ressalta-se que a fração de 1/6 das agravantes não é um absoluta, sendo possível sua exasperação em patamar superior desde que seja fundada em circunstâncias concretas. 11. Conclui-se, pois, que, havendo circunstância judicial desfavorável cuja valoração é passível de ocorrer em etapas posteriores da dosimetria, porquanto prevista igualmente como agravante ou causa de aumento, mostrar-se-ia antissistêmico chegar, nas etapas seguintes, a acréscimos de pena inferiores àquele fixado por ocasião da pena-base. 12. Por essas razões, as agravantes não necessariamente incidem sobre o resultado da pena-base, cujo acréscimo de 1/8 (um oitavo) para cada circunstância negativa multiplica o intervalo de pena decorrente da diferença entre a pena mínima e máxima cominadas ao tipo, para então somar à pena mínima. Portanto, as agravantes incidirão sobre a pena-base se for maior ou igual ao intervalo de pena em abstrato do preceito secundário, caso contrário, malgrado haver pena concreta dosada, as agravantes serão fixada com parâmetro na base de cálculo das circunstâncias judiciais, sob pena de as agravantes serem menos gravosas do que meras circunstâncias judiciais. 13. Os autos evidenciam que houve agravamento da pena-base em 6 (seis) meses, tendo sido a pena-base fixada em 1 (um) ano e 2 (dois) meses, e a base de cálculo das circunstâncias judiciais corresponde a 3 (três) anos, conforme se infere do preceito secundário do crime de furto simples. Percebe-se que o adensamento da pena-base em 6 meses decorreu da incidência da agravante sobre a base de cálculo das circunstâncias judiciais, o que se mostra correto, haja vista que a fixação da pena-base foi inferior ao intervalo da pena em abstrato. 14. Habeas corpus não conhecido. (HC 237.785/RS, Rel. Ministro RIBEIRO DANTAS, QUINTA TURMA, julgado em 10/05/2016, DJe 18/05/2016)
Acórdão
Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da QUINTA TURMA do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, não conhecer do pedido. Os Srs. Ministros Joel Ilan Paciornik, Felix Fischer, Jorge Mussi e Reynaldo Soares da Fonseca votaram com o Sr. Ministro Relator.

Data do Julgamento : 10/05/2016
Data da Publicação : DJe 18/05/2016
Órgão Julgador : T5 - QUINTA TURMA
Relator(a) : Ministro RIBEIRO DANTAS (1181)
Referência legislativa : LEG:FED SUM:****** ANO:********* SUM(STJ) SÚMULA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA SUM:000444
Veja : (PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA - REQUISITOS) STF - HC 844120-SP(PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA - REITERAÇÃO DELITIVA) STJ - EAREsp 221999-RS, AgRg no AREsp 811128-MT(PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA - DÉCIMA PARTE DO SALÁRIO MÍNIMO) STJ - REsp 1577904-RS, HC 342945-SC(HABEAS CORPUS - DOSIMETRIA DA PENA) STJ - HC 342659-SC, HC 167789-SP STF - HC-AgRg 129920, HC 117381(HABEAS CORPUS - DOSIMETRIA DA PENA - MAJORAÇÃO DA PENA-BASE -INQUÉRITOS E PROCESSOS EM CURSO) STJ - HC 318590-SP
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