HC 361616 / PEHABEAS CORPUS2016/0175120-3
CONSTITUCIONAL E PENAL. HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO ESPECIAL. ROUBOS DUPLAMENTE QUALIFICADOS. ASSOCIAÇÃO CRIMINOSA ARMADA. ADULTERAÇÃO DE SINAL IDENTIFICADOR DE VEÍCULO AUTOMOTOR.
ABSOLVIÇÃO QUANTO AO CRIME DO ART. 288, PARÁGRAFO ÚNICO, DO CP.
REVOLVIMENTO FÁTICO-PROBATÓRIO. DOSIMETRIA. ANÁLISE CONJUNTA DAS CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS. VIOLAÇÃO DO ART. 93, IX, DA CF NÃO EVIDENCIADA. PENAS-BASE ACIMA DO MÍNIMO LEGAL. CARÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO CONCRETA PARA EXASPERAÇÃO PELOS VETORES CULPABILIDADE, MOTIVOS E PERSONALIDADE DO RÉU. SÚMULA 444/STJ. AUMENTO PELAS CIRCUNSTÂNCIAS DO CRIME MANTIDO. CONTINUIDADE DELITIVA ENTRE OS TRÊS ROUBOS. EXASPERAÇÃO EM 1/5 DEVIDA. WRIT NÃO CONHECIDO E HABEAS CORPUS CONCEDIDO, DE OFÍCIO, COM EXTENSÃO DOS EFEITOS AO CORRÉU.
1. Esta Corte e o Supremo Tribunal Federal pacificaram orientação no sentido de que não cabe habeas corpus substitutivo do recurso legalmente previsto para a hipótese, impondo-se o não conhecimento da impetração, salvo quando constatada a existência de flagrante ilegalidade no ato judicial impugnado.
2. Se as instâncias ordinárias, mediante valoração do acervo probatório produzido nos autos, concluíram, de forma fundamentada, que o paciente é membro de associação criminosa armada, a análise das alegações concernentes ao pleito de absolvição demandaria exame detido de provas, inviável em sede de writ.
3. Hipótese na qual ante a presença de provas contundentes da existência de vínculo associativo estável e permanente entre os membros de quadrilha armada composta por, pelo menos, 11 (onze) agentes, que seria responsável por diversos crimes praticados em todo o Nordeste, resta configurada a prática do delito previsto no art. 288, parágrafo único, do Código Penal, ainda que a conduta dos demais integrantes do bando, devidamente identificados na sentença, tenha sido objeto de apuração nos autos de outro processo-crime. 4.
Quanto à suposta violação do art. 93, IX, da Constituição Federal, malgrado os fundamentos declinados para a exasperação das penas-base referentes aos crimes de roubo tenham sido repisados na primeira fase da dosimetria dos crimes de associação criminosa e adulteração de sinal identificador de veículo automotor, não resta evidenciada qualquer ilegalidade no método dosimétrico adotado pelo julgador.
Por certo, a valoração negativa das circunstâncias judiciais que dizem respeito à pessoa do réu demanda a análise dos traços de personalidade, do seu comportamento no meio social no qual está inserido e de sua folha de antecedentes criminais, fatores que, em regra, não guardam relação direta com cada um dos crimes, o que justifica a análise em conjunto de tais moduladoras. Mais: todos os crimes foram cometidos em um mesmo contexto fático, o que igualmente revela a possibilidade de exame simultâneo das circunstâncias judiciais objetivas, que versam sobre elementos concretos das condutas, como na hipótese em apreço. Mister se faz destacar, porém, que eventuais particularidades dos delitos devem ser individualizadas quando da valoração dos motivos, circunstâncias e consequências do crime. 5. Para fins de individualização da pena, a culpabilidade deve ser compreendida como o juízo de reprovabilidade da conduta, ou seja, a maior ou menor censurabilidade do comportamento do réu, não se tratando de verificação da ocorrência dos elementos da culpa, para que se possa concluir pela prática ou não do delito. In casu, contudo, o Julgador de 1º grau limitou-se a afirmar que os agentes são imputáveis e, portanto, tinham plena consciência da natureza delitiva das condutas e deveriam ter agido de forma diversa, o que denotaria o dolo intenso dos réus. Tais razões, todavia, não permitem a exasperação das penas-base à título de culpabilidade, porque traduzem elementos do crime em si e não revelam um maior grau de reprovação da conduta.
6. A jurisprudência desta Corte Superior de Justiça e do Supremo Tribunal Federal no sentido de que inquéritos e processos penais em andamento, ou mesmo condenações ainda não transitadas em julgado, não podem ser negativamente valorados para fins de elevação da reprimenda-base, sob pena de malferimento o princípio constitucional da presunção de não culpabilidade. A propósito, esta é a orientação trazida pelo enunciado na Súmula 444 desta Corte: "É vedada a utilização de inquéritos policiais e de ações penais em curso para agravar a pena-base." 7. O desejo de obtenção de dinheiro fácil é ínsito aos crimes contra o patrimônio e, portanto, já é punido pela própria tipicidade do crime de roubo, não servindo de fundamento idôneo para a exasperação da pena a título de motivos do crime. Além disso, nada de concreto restou consignado no tocante à motivação dos crimes dos arts. 288, parágrafo único, e 311, ambos do Código Penal. 8. As circunstâncias concretas dos delitos revelam o maior grau de censurabilidade das condutas e a periculosidade dos réus, de modo a exigir resposta penal superior, em atendimento ao princípio da proporcionalidade.
9. Nos termos da jurisprudência desta Corte, o grau de exasperação da reprimenda do crime de maior pena será determinado, basicamente, pelo número de infrações penais cometidas. Nesse passo, aplica-se a fração de aumento de 1/6 pela prática de 2 infrações; 1/5, para 3 infrações; 1/4 para 4 infrações; 1/3 para 5 infrações; 1/2 para 6 infrações e 2/3 para 7 ou mais infrações. Considerando os parâmetros acima expostos, o aumento da pena na fração de 1/3 mostra-se excessivo, devendo ser reduzido a 1/5, já que foram cometidos três crimes de roubo.
10. No que se refere ao crime de alteração de sinal identificador de veículo automotor, depreende-se que o Magistrado de 1º grau reconheceu a subsunção da conduta praticada pelo réu ao tipo penal do art. 311 do Código Penal, fulcrado em elementos de convicção amealhados aos autos. Além disso, o Colegiado a quo, no julgamento do apelo defensivo, afastou o aumento correspondente aos motivos e circunstâncias do crime, bem como à personalidade do agente, tendo, porém, mantido a valoração negativa das circunstâncias do crime, o que implicou redução da pena-base para 4 (quatro) anos, que foi tornada definitiva, ante a ausência de elementos a serem sopesados na segunda e na terceira fase do procedimento dosimétrico. Com efeito, nos termos do acima consignado, o modus operandi do crime denota a gravidade concreta do delito, que desborda da própria aos crimes de alteração de sinal identificador de veículo automotor e, portanto, permite a exasperação da básica. 11. Reconhecida a existência de flagrante ilegalidade na dosimetria das reprimendas, deve ser concedida ordem de ofício para o fim de manter a exasperação das penas-base tão somente pelas circunstâncias dos crimes, bem como estabelecer o aumento na fração de 1/5 pela continuidade delitiva entre os delitos de roubo. Outrossim, diante da similitude dos motivos que justificaram do aumento das penas impostas os dois acusados, mister se faz estender os efeitos da ordem ora concedida ao corréu Fábio Gomes.
12. Não conheço do writ, mas concedo habeas corpus, de ofício, para determinar que o Juízo das Execuções proceda à nova dosimetria das penas impostas ao paciente e ao corréu Fábio Gomes, nos moldes do art. 580 do CPP, com o devido decote do aumento referente à valoração negativa da culpabilidade, personalidade e motivos dos crimes, e limitar a exasperação da pena do crime de roubo pela continuidade delitiva a 1/5, mantendo-se, no mais, o decreto condenatório.
(HC 361.616/PE, Rel. Ministro RIBEIRO DANTAS, QUINTA TURMA, julgado em 23/05/2017, DJe 26/05/2017)
Ementa
CONSTITUCIONAL E PENAL. HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO ESPECIAL. ROUBOS DUPLAMENTE QUALIFICADOS. ASSOCIAÇÃO CRIMINOSA ARMADA. ADULTERAÇÃO DE SINAL IDENTIFICADOR DE VEÍCULO AUTOMOTOR.
ABSOLVIÇÃO QUANTO AO CRIME DO ART. 288, PARÁGRAFO ÚNICO, DO CP.
REVOLVIMENTO FÁTICO-PROBATÓRIO. DOSIMETRIA. ANÁLISE CONJUNTA DAS CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS. VIOLAÇÃO DO ART. 93, IX, DA CF NÃO EVIDENCIADA. PENAS-BASE ACIMA DO MÍNIMO LEGAL. CARÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO CONCRETA PARA EXASPERAÇÃO PELOS VETORES CULPABILIDADE, MOTIVOS E PERSONALIDADE DO RÉU. SÚMULA 444/STJ. AUMENTO PELAS CIRCUNSTÂNCIAS DO CRIME MANTIDO. CONTINUIDADE DELITIVA ENTRE OS TRÊS ROUBOS. EXASPERAÇÃO EM 1/5 DEVIDA. WRIT NÃO CONHECIDO E HABEAS CORPUS CONCEDIDO, DE OFÍCIO, COM EXTENSÃO DOS EFEITOS AO CORRÉU.
1. Esta Corte e o Supremo Tribunal Federal pacificaram orientação no sentido de que não cabe habeas corpus substitutivo do recurso legalmente previsto para a hipótese, impondo-se o não conhecimento da impetração, salvo quando constatada a existência de flagrante ilegalidade no ato judicial impugnado.
2. Se as instâncias ordinárias, mediante valoração do acervo probatório produzido nos autos, concluíram, de forma fundamentada, que o paciente é membro de associação criminosa armada, a análise das alegações concernentes ao pleito de absolvição demandaria exame detido de provas, inviável em sede de writ.
3. Hipótese na qual ante a presença de provas contundentes da existência de vínculo associativo estável e permanente entre os membros de quadrilha armada composta por, pelo menos, 11 (onze) agentes, que seria responsável por diversos crimes praticados em todo o Nordeste, resta configurada a prática do delito previsto no art. 288, parágrafo único, do Código Penal, ainda que a conduta dos demais integrantes do bando, devidamente identificados na sentença, tenha sido objeto de apuração nos autos de outro processo-crime. 4.
Quanto à suposta violação do art. 93, IX, da Constituição Federal, malgrado os fundamentos declinados para a exasperação das penas-base referentes aos crimes de roubo tenham sido repisados na primeira fase da dosimetria dos crimes de associação criminosa e adulteração de sinal identificador de veículo automotor, não resta evidenciada qualquer ilegalidade no método dosimétrico adotado pelo julgador.
Por certo, a valoração negativa das circunstâncias judiciais que dizem respeito à pessoa do réu demanda a análise dos traços de personalidade, do seu comportamento no meio social no qual está inserido e de sua folha de antecedentes criminais, fatores que, em regra, não guardam relação direta com cada um dos crimes, o que justifica a análise em conjunto de tais moduladoras. Mais: todos os crimes foram cometidos em um mesmo contexto fático, o que igualmente revela a possibilidade de exame simultâneo das circunstâncias judiciais objetivas, que versam sobre elementos concretos das condutas, como na hipótese em apreço. Mister se faz destacar, porém, que eventuais particularidades dos delitos devem ser individualizadas quando da valoração dos motivos, circunstâncias e consequências do crime. 5. Para fins de individualização da pena, a culpabilidade deve ser compreendida como o juízo de reprovabilidade da conduta, ou seja, a maior ou menor censurabilidade do comportamento do réu, não se tratando de verificação da ocorrência dos elementos da culpa, para que se possa concluir pela prática ou não do delito. In casu, contudo, o Julgador de 1º grau limitou-se a afirmar que os agentes são imputáveis e, portanto, tinham plena consciência da natureza delitiva das condutas e deveriam ter agido de forma diversa, o que denotaria o dolo intenso dos réus. Tais razões, todavia, não permitem a exasperação das penas-base à título de culpabilidade, porque traduzem elementos do crime em si e não revelam um maior grau de reprovação da conduta.
6. A jurisprudência desta Corte Superior de Justiça e do Supremo Tribunal Federal no sentido de que inquéritos e processos penais em andamento, ou mesmo condenações ainda não transitadas em julgado, não podem ser negativamente valorados para fins de elevação da reprimenda-base, sob pena de malferimento o princípio constitucional da presunção de não culpabilidade. A propósito, esta é a orientação trazida pelo enunciado na Súmula 444 desta Corte: "É vedada a utilização de inquéritos policiais e de ações penais em curso para agravar a pena-base." 7. O desejo de obtenção de dinheiro fácil é ínsito aos crimes contra o patrimônio e, portanto, já é punido pela própria tipicidade do crime de roubo, não servindo de fundamento idôneo para a exasperação da pena a título de motivos do crime. Além disso, nada de concreto restou consignado no tocante à motivação dos crimes dos arts. 288, parágrafo único, e 311, ambos do Código Penal. 8. As circunstâncias concretas dos delitos revelam o maior grau de censurabilidade das condutas e a periculosidade dos réus, de modo a exigir resposta penal superior, em atendimento ao princípio da proporcionalidade.
9. Nos termos da jurisprudência desta Corte, o grau de exasperação da reprimenda do crime de maior pena será determinado, basicamente, pelo número de infrações penais cometidas. Nesse passo, aplica-se a fração de aumento de 1/6 pela prática de 2 infrações; 1/5, para 3 infrações; 1/4 para 4 infrações; 1/3 para 5 infrações; 1/2 para 6 infrações e 2/3 para 7 ou mais infrações. Considerando os parâmetros acima expostos, o aumento da pena na fração de 1/3 mostra-se excessivo, devendo ser reduzido a 1/5, já que foram cometidos três crimes de roubo.
10. No que se refere ao crime de alteração de sinal identificador de veículo automotor, depreende-se que o Magistrado de 1º grau reconheceu a subsunção da conduta praticada pelo réu ao tipo penal do art. 311 do Código Penal, fulcrado em elementos de convicção amealhados aos autos. Além disso, o Colegiado a quo, no julgamento do apelo defensivo, afastou o aumento correspondente aos motivos e circunstâncias do crime, bem como à personalidade do agente, tendo, porém, mantido a valoração negativa das circunstâncias do crime, o que implicou redução da pena-base para 4 (quatro) anos, que foi tornada definitiva, ante a ausência de elementos a serem sopesados na segunda e na terceira fase do procedimento dosimétrico. Com efeito, nos termos do acima consignado, o modus operandi do crime denota a gravidade concreta do delito, que desborda da própria aos crimes de alteração de sinal identificador de veículo automotor e, portanto, permite a exasperação da básica. 11. Reconhecida a existência de flagrante ilegalidade na dosimetria das reprimendas, deve ser concedida ordem de ofício para o fim de manter a exasperação das penas-base tão somente pelas circunstâncias dos crimes, bem como estabelecer o aumento na fração de 1/5 pela continuidade delitiva entre os delitos de roubo. Outrossim, diante da similitude dos motivos que justificaram do aumento das penas impostas os dois acusados, mister se faz estender os efeitos da ordem ora concedida ao corréu Fábio Gomes.
12. Não conheço do writ, mas concedo habeas corpus, de ofício, para determinar que o Juízo das Execuções proceda à nova dosimetria das penas impostas ao paciente e ao corréu Fábio Gomes, nos moldes do art. 580 do CPP, com o devido decote do aumento referente à valoração negativa da culpabilidade, personalidade e motivos dos crimes, e limitar a exasperação da pena do crime de roubo pela continuidade delitiva a 1/5, mantendo-se, no mais, o decreto condenatório.
(HC 361.616/PE, Rel. Ministro RIBEIRO DANTAS, QUINTA TURMA, julgado em 23/05/2017, DJe 26/05/2017)Acórdão
Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima
indicadas, acordam os Ministros da Quinta Turma do Superior Tribunal
de Justiça, por unanimidade, não conhecer do pedido e conceder
"Habeas Corpus" de ofício, com extensão ao corréu Fábio Gomes, nos
termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Joel Ilan
Paciornik, Felix Fischer, Jorge Mussi e Reynaldo Soares da Fonseca
votaram com o Sr. Ministro Relator.
SUSTENTOU ORALMENTE: DR. IVANILSON DA SILVA ALBUQUERQUE (P/PACTE)
Data do Julgamento
:
23/05/2017
Data da Publicação
:
DJe 26/05/2017
Órgão Julgador
:
T5 - QUINTA TURMA
Relator(a)
:
Ministro RIBEIRO DANTAS (1181)
Referência legislativa
:
LEG:FED DEL:002848 ANO:1940***** CP-40 CÓDIGO PENAL ART:00059 ART:00288 PAR:ÚNICOLEG:FED CFB:****** ANO:1988***** CF-1988 CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988 ART:00093 INC:00009LEG:FED SUM:****** ANO:********* SUM(STJ) SÚMULA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA SUM:000444
Veja
:
(HABEAS CORPUS - TESE DE ABSOLVIÇÃO - REEXAME DE PROVA) STJ - HC 343107-RS(DOSIMETRIA - EXASPERAÇÃO DA PENA-BASE - INQUÉRITOS E AÇÕES PENAISEM CURSO - SÚMULA 443/STJ) STJ - HC 126137-SP(DOSIMETRIA - FRAÇÃO DE AUMENTO PELA CONTINUIDADE DELITIVA - NÚMERODE INFRAÇÕES PENAIS PRATICADAS) STJ - REsp 1582601-DF
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