HC 367506 / MGHABEAS CORPUS2016/0216809-0
PENAL E PROCESSO PENAL. HABEAS CORPUS. 1. IMPETRAÇÃO SUBSTITUTIVA DO RECURSO PRÓPRIO. NÃO CABIMENTO. 2. OPERAÇÃO AEQUALIS. INCOMPETÊNCIA DA JUSTIÇA ESTADUAL. SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA. 3. PRISÃO PREVENTIVA.
ILEGALIDADE DA FUNDAMENTAÇÃO. CONVENIÊNCIA DA INSTRUÇÃO. APLICAÇÃO DA LEI PENAL. 4. VENDA DE APARTAMENTO. MUDANÇA DE RESIDÊNCIA. ATO DA VIDA COTIDIANA. INTUITO DE FRUSTRAR A COLHEITA DE PROVAS. MERA PROJEÇÃO. AUSÊNCIA DE ELEMENTO CONCRETO. 5. CONDIÇÃO FINANCEIRA PRIVILEGIADA. POSSIBILIDADE DE FUGA. ARGUMENTO GENÉRICO. AUSÊNCIA DE INDICATIVO CONCRETO. POSSIBILIDADE DE ENTREGA DO PASSAPORTE. MEDIDA MENOS GRAVOSA. 6. DECURSO DO TEMPO. MUDANÇA DO GRUPO POLÍTICO NA ADMINISTRAÇÃO. PRISÃO QUE NÃO SE REVELA MAIS CONTEMPORÂNEA NEM INDISPENSÁVEL. 7. PACIENTE PRIMÁRIO. SAÚDE DEBILITADA. CAUTELARES DIVERSAS DA PRISÃO. MEDIDAS SUFICIENTES. 8. HABEAS CORPUS NÃO CONHECIDO. ORDEM CONCEDIDA DE OFÍCIO.
1. O Supremo Tribunal Federal e o Superior Tribunal de Justiça, diante da utilização crescente e sucessiva do habeas corpus, passaram a restringir sua admissibilidade quando o ato ilegal for passível de impugnação pela via recursal própria, sem olvidar a possibilidade de concessão da ordem, de ofício, nos casos de flagrante ilegalidade.
2. A matéria relativa à incompetência da Justiça Estadual para julgar os fatos relativos à "Operação Aequalis" não foi analisada pelo Tribunal de origem, que se limitou a analisar a legalidade da prisão cautelar. Dessa forma, revela-se inviável o exame inaugural do tema pelo Superior Tribunal de Justiça, sob pena de indevida supressão de instância.
3. O ordenamento jurídico autoriza a segregação cautelar, com a finalidade de instrumentalizar o processo penal, nas hipóteses em que ficarem demonstrados os pressupostos e os requisitos para aplicação da medida extrema, a qual deve ser devidamente fundamentada em elementos concretos. Dessa forma, quando objetivamente demonstrado o intento do agente de frustrar o direito de investigar e de punir, tem-se justificada a decretação da medida extrema. Na hipótese dos autos, a motivação declinada pelas instâncias ordinárias diz respeito à possibilidade de o paciente prejudicar a instrução processual ou frustrar a aplicação da lei penal. Os elementos concretos que subsidiam referida justificativa dizem respeito à mudança de endereço do paciente e à venda do apartamento em que residia, o que revelaria a destruição de provas, bem como ao fato de possuir boa situação financeira, o que denotaria a possibilidade de fuga.
4. A alegada situação de embaraço à instrução processual criminal era na verdade simples fato da vida cotidiana, consistente na mudança de endereço e venda de imóvel. De fato, o imóvel foi colocado à venda em 20/1/2016, em site na internet, com acesso público, antes mesmo de o paciente ter conhecimento das investigações. Por óbvio, a colocação de um imóvel à venda demonstra a intenção de desocupá-lo a qualquer momento. Ademais, a mudança foi previamente agendada no condomínio e realizada por empresa especializada, o que denota não se tratar de ação clandestina ou ilegal. Dessarte, verifica-se que os elementos apresentados para justificar a prisão cautelar, consistentes na venda de imóvel e mudança de endereço, não revelam, por si só, o intuito de frustrar a colheita de provas. Na verdade, o órgão acusador faz uma projeção de que o paciente atuou com o propósito de dificultar o levantamento de provas, entretanto, não apresenta nenhum elemento concreto apto a subsidiar sua conclusão.
5. A referência genérica ao fato de o paciente possuir condição financeira privilegiada não autoriza, por si só, a conclusão de que poderá frustrar a aplicação da lei penal. Note-se que, mais uma vez, as instâncias ordinárias se valem de argumento genérico que não tem o condão de demonstrar, de forma concreta, que o paciente tem a intenção de sair do país simplesmente porque possui recursos financeiro para tanto. Outrossim, a entrega do passaporte já elide referida possibilidade, cuidando-se, ademais, de medida menos gravosa.
6. A investigação criminal refere-se a fatos ocorridos nos anos de 2012 a 2014, em um governo estadual findo, que não tem mais qualquer possibilidade de interferir na atual Administração mineira, exercida notoriamente por outro grupo político, o que, em princípio, afasta igualmente a atualidade e a urgência da prisão preventiva. Como é cediço, a prisão cautelar deve vir sempre baseada em fundamentação concreta e atual, isto é, em elementos vinculados à realidade. Nem a gravidade abstrata do delito, nem meras conjecturas servem de motivação para a medida extrema. Outrossim, "a urgência intrínseca da prisão preventiva impõe a contemporaneidade dos fatos justificadores aos riscos que se pretende com a prisão evitar". (HC 349.159/MT, Rel. Ministro Nefi Cordeiro, Sexta Turma, julgado em 07/04/2016, DJe 19/04/2016).
7. O paciente é primário e se encontra com a saúde debilitada - hipertenso e diagnóstico de diabetes mellitus, com quadro de hiperglicemia severa e sintomática, evoluindo com perda de peso, intolerância a alimentação, hiporexia, aneroxia, adinamia e outros males. Logo, na análise da segregação cautelar em tela, não se pode apenas afastar tal aspecto, com argumentos meramente formais. Assim, diante da situação pessoal do paciente, aliada ao decurso do tempo e à evolução dos fatos, tem-se que a medida extrema já não se faz indispensável, podendo ser eficazmente substituída por medidas alternativas, nos termos dos arts. 282 e 319 do Código de Processo Penal.
8. Habeas corpus não conhecido. Ordem concedida de ofício, confirmando a liminar deferida, para substituir a prisão preventiva por medidas cautelares previstas no art. 319, incisos I, III, IV, e 320 do Código de Processo Penal.
(HC 367.506/MG, Rel. Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, QUINTA TURMA, julgado em 04/05/2017, DJe 10/05/2017)
Ementa
PENAL E PROCESSO PENAL. HABEAS CORPUS. 1. IMPETRAÇÃO SUBSTITUTIVA DO RECURSO PRÓPRIO. NÃO CABIMENTO. 2. OPERAÇÃO AEQUALIS. INCOMPETÊNCIA DA JUSTIÇA ESTADUAL. SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA. 3. PRISÃO PREVENTIVA.
ILEGALIDADE DA FUNDAMENTAÇÃO. CONVENIÊNCIA DA INSTRUÇÃO. APLICAÇÃO DA LEI PENAL. 4. VENDA DE APARTAMENTO. MUDANÇA DE RESIDÊNCIA. ATO DA VIDA COTIDIANA. INTUITO DE FRUSTRAR A COLHEITA DE PROVAS. MERA PROJEÇÃO. AUSÊNCIA DE ELEMENTO CONCRETO. 5. CONDIÇÃO FINANCEIRA PRIVILEGIADA. POSSIBILIDADE DE FUGA. ARGUMENTO GENÉRICO. AUSÊNCIA DE INDICATIVO CONCRETO. POSSIBILIDADE DE ENTREGA DO PASSAPORTE. MEDIDA MENOS GRAVOSA. 6. DECURSO DO TEMPO. MUDANÇA DO GRUPO POLÍTICO NA ADMINISTRAÇÃO. PRISÃO QUE NÃO SE REVELA MAIS CONTEMPORÂNEA NEM INDISPENSÁVEL. 7. PACIENTE PRIMÁRIO. SAÚDE DEBILITADA. CAUTELARES DIVERSAS DA PRISÃO. MEDIDAS SUFICIENTES. 8. HABEAS CORPUS NÃO CONHECIDO. ORDEM CONCEDIDA DE OFÍCIO.
1. O Supremo Tribunal Federal e o Superior Tribunal de Justiça, diante da utilização crescente e sucessiva do habeas corpus, passaram a restringir sua admissibilidade quando o ato ilegal for passível de impugnação pela via recursal própria, sem olvidar a possibilidade de concessão da ordem, de ofício, nos casos de flagrante ilegalidade.
2. A matéria relativa à incompetência da Justiça Estadual para julgar os fatos relativos à "Operação Aequalis" não foi analisada pelo Tribunal de origem, que se limitou a analisar a legalidade da prisão cautelar. Dessa forma, revela-se inviável o exame inaugural do tema pelo Superior Tribunal de Justiça, sob pena de indevida supressão de instância.
3. O ordenamento jurídico autoriza a segregação cautelar, com a finalidade de instrumentalizar o processo penal, nas hipóteses em que ficarem demonstrados os pressupostos e os requisitos para aplicação da medida extrema, a qual deve ser devidamente fundamentada em elementos concretos. Dessa forma, quando objetivamente demonstrado o intento do agente de frustrar o direito de investigar e de punir, tem-se justificada a decretação da medida extrema. Na hipótese dos autos, a motivação declinada pelas instâncias ordinárias diz respeito à possibilidade de o paciente prejudicar a instrução processual ou frustrar a aplicação da lei penal. Os elementos concretos que subsidiam referida justificativa dizem respeito à mudança de endereço do paciente e à venda do apartamento em que residia, o que revelaria a destruição de provas, bem como ao fato de possuir boa situação financeira, o que denotaria a possibilidade de fuga.
4. A alegada situação de embaraço à instrução processual criminal era na verdade simples fato da vida cotidiana, consistente na mudança de endereço e venda de imóvel. De fato, o imóvel foi colocado à venda em 20/1/2016, em site na internet, com acesso público, antes mesmo de o paciente ter conhecimento das investigações. Por óbvio, a colocação de um imóvel à venda demonstra a intenção de desocupá-lo a qualquer momento. Ademais, a mudança foi previamente agendada no condomínio e realizada por empresa especializada, o que denota não se tratar de ação clandestina ou ilegal. Dessarte, verifica-se que os elementos apresentados para justificar a prisão cautelar, consistentes na venda de imóvel e mudança de endereço, não revelam, por si só, o intuito de frustrar a colheita de provas. Na verdade, o órgão acusador faz uma projeção de que o paciente atuou com o propósito de dificultar o levantamento de provas, entretanto, não apresenta nenhum elemento concreto apto a subsidiar sua conclusão.
5. A referência genérica ao fato de o paciente possuir condição financeira privilegiada não autoriza, por si só, a conclusão de que poderá frustrar a aplicação da lei penal. Note-se que, mais uma vez, as instâncias ordinárias se valem de argumento genérico que não tem o condão de demonstrar, de forma concreta, que o paciente tem a intenção de sair do país simplesmente porque possui recursos financeiro para tanto. Outrossim, a entrega do passaporte já elide referida possibilidade, cuidando-se, ademais, de medida menos gravosa.
6. A investigação criminal refere-se a fatos ocorridos nos anos de 2012 a 2014, em um governo estadual findo, que não tem mais qualquer possibilidade de interferir na atual Administração mineira, exercida notoriamente por outro grupo político, o que, em princípio, afasta igualmente a atualidade e a urgência da prisão preventiva. Como é cediço, a prisão cautelar deve vir sempre baseada em fundamentação concreta e atual, isto é, em elementos vinculados à realidade. Nem a gravidade abstrata do delito, nem meras conjecturas servem de motivação para a medida extrema. Outrossim, "a urgência intrínseca da prisão preventiva impõe a contemporaneidade dos fatos justificadores aos riscos que se pretende com a prisão evitar". (HC 349.159/MT, Rel. Ministro Nefi Cordeiro, Sexta Turma, julgado em 07/04/2016, DJe 19/04/2016).
7. O paciente é primário e se encontra com a saúde debilitada - hipertenso e diagnóstico de diabetes mellitus, com quadro de hiperglicemia severa e sintomática, evoluindo com perda de peso, intolerância a alimentação, hiporexia, aneroxia, adinamia e outros males. Logo, na análise da segregação cautelar em tela, não se pode apenas afastar tal aspecto, com argumentos meramente formais. Assim, diante da situação pessoal do paciente, aliada ao decurso do tempo e à evolução dos fatos, tem-se que a medida extrema já não se faz indispensável, podendo ser eficazmente substituída por medidas alternativas, nos termos dos arts. 282 e 319 do Código de Processo Penal.
8. Habeas corpus não conhecido. Ordem concedida de ofício, confirmando a liminar deferida, para substituir a prisão preventiva por medidas cautelares previstas no art. 319, incisos I, III, IV, e 320 do Código de Processo Penal.
(HC 367.506/MG, Rel. Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, QUINTA TURMA, julgado em 04/05/2017, DJe 10/05/2017)Acórdão
Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima
indicadas, acordam os Ministros da Quinta Turma do Superior Tribunal
de Justiça, por unanimidade, não conhecer do pedido e conceder
"Habeas Corpus" de ofício, nos termos do voto do Sr. Ministro
Relator. Os Srs. Ministros Ribeiro Dantas, Joel Ilan Paciornik,
Felix Fischer e Jorge Mussi votaram com o Sr. Ministro Relator.
PRESENTE NA TRIBUNA: DR. ESTEVÃO FERREIRA DE MELO (P/PACTE)
Data do Julgamento
:
04/05/2017
Data da Publicação
:
DJe 10/05/2017
Órgão Julgador
:
T5 - QUINTA TURMA
Relator(a)
:
Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA (1170)
Notas
:
Processo referente à Operação Aequalis.
Referência legislativa
:
LEG:FED DEL:003689 ANO:1941***** CPP-41 CÓDIGO DE PROCESSO PENAL ART:00282 ART:00312 ART:00319 ART:00320
Veja
:
(HABEAS CORPUS - SUPRESSÃO DE INSTÂNCIAS) STJ - HC 211499-GO(PRISÃO PREVENTIVA - FUNDAMENTAÇÃO ABSTRATA) STJ - RHC 68562-PA(PRISÃO PREVENTIVA - FUNDAMENTAÇÃO ABSTRATA - BOA CONDIÇÃOFINANCEIRA) STJ - HC 110917-RJ(PRISÃO PREVENTIVA - CARÁTER EXCEPCIONAL) STF - HC 126815, HC 130254, HC 127823-PR STJ - RHC 72117-RS
Sucessivos
:
HC 369514 MG 2016/0230023-4 Decisão:04/05/2017
DJe DATA:10/05/2017
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