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Jurisprudência


MS 15783 / DFMANDADO DE SEGURANÇA2010/0180329-4

Ementa
SANCIONADOR. MANDADO DE SEGURANÇA. TÉCNICO DO INSS. PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR. DEMISSÃO APLICADA POR DECISÃO MINISTERIAL NÃO RESPALDADA EM PRÉVIA MANIFESTAÇÃO DA COMISSÃO PROCESSANTE. SERVIDORA PÚBLICA ACUSADA DE SE VALER DO CARGO PARA LOGRAR PROVEITO PESSOAL. NÃO DEMONSTRAÇÃO DA OBTENÇÃO DE QUALQUER VANTAGEM, BENESSE OU PREBENDA ILÍCITA. CONCESSÃO INDEVIDA DE APENAS 12 BENEFÍCIOS PREVIDENCIÁRIOS AO LONGO DE 27 ANOS DE SERVIÇO PRESTADOS DE MANEIRA EXEMPLAR, SENDO 12 NO PRÓPRIO INSS. DOLO OU MÁ-FÉ NA CONDUTA DA SERVIDORA NÃO COMPROVADOS. MERO ERRO PROCEDIMENTAL, CONSISTENTE NA VALORAÇÃO EQUIVOCADA DAS PROVAS MATERIAIS APRESENTADAS PELO SEGURADO PARA OBTENÇÃO DE BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. A EVENTUAL FRAUDE NA PRODUÇÃO DA DOCUMENTAÇÃO APRESENTADA NÃO PODE SER IMPUTADA Á SERVIDORA IMPETRANTE, QUE, ALIÁS, DETINHA CONCEITO FUNCIONAL IRREPREENSÍVEL. CONFIGURADA AFRONTA AOS PRINCÍPIOS DA INOCÊNCIA, DA PROPORCIONALIDADE E DA RAZOABILIDADE. PENA DISSONANTE DAS PREMISSAS DO DIREITO SANCIONADOR. SEGURANÇA CONCEDIDA, PARA DETERMINAR A IMEDIATA REINTEGRAÇÃO DA SERVIDORA NO SEU CARGO DESDE A IMPETRAÇÃO DA SEGURANÇA. RESSALVA DO PONTO DE VISTA DO RELATOR QUANTO AOS EFEITOS FINANCEIROS. 1. A atividade administrativa sancionadora, em face do seu conteúdo materialmente jurisdicional, deve se revestir, sob a pena de nulidade, do respeito religioso a todos os princípios regentes da processualística contemporânea. Não se dispensa do promovente da imputação o ônus de provar a ocorrência justificadora da sanção pretendida, ônus esse que abrange todos os elementos da conduta infracional, inclusive, a produção de lesão e a inspiração dolosa: sem isso o ato reputado infracional não existe no mundo empírico. 2. Por força dos princípios da proporcionalidade, da dignidade da pessoa humana e da não-culpabilidade, aplicáveis ao regime jurídico disciplinar, não há juízo de discricionariedade no ato administrativo que impõe sanção a Servidor Público, em razão de infração disciplinar. Dest'arte, o controle jurisdicional é amplo, de modo a conferir garantia a todos os Servidores contra eventual arbítrio, não se limitando, portanto, somente aos aspectos formais, como algumas correntes doutrinárias ainda defendem. 3. O Poder Judiciário pode e deve sindicar amplamente, em Mandado de Segurança, o ato administrativo que aplica a sanção de demissão a Servidor Público, para verificar (i) a efetiva ocorrência dos ilícitos imputados ao Servidor e (ii) mensurar a adequação da reprimenda à gravidade da infração disciplinar. 4. Cuida-se de Mandado de Segurança impetrado por Servidora do INSS, acusada de conceder equivocadamente 12 benefícios previdenciários, a Trabalhadores Rurais ou seus dependentes, contrariando a legislação previdenciária aplicável ao caso. 5. Da leitura dos depoimentos prestados pelos segurados supostamente beneficiados, verifica-se que as doze testemunhas ouvidas são categóricas em afirmar que sequer conheciam a Servidora, não tendo qualquer natureza de relacionamento com a imputada, relatando, tão somente, terem sido atendidos por ela na Agência do INSS. 6. Igualmente, verifica-se dos processos de revisão realizados pelo INSS que em todos os casos de deferimento do benefício, havia início de prova material e entrevista do Segurado, não ficando evidente nenhum erro flagrante ou teratológico; ressalte-se que a eventualidade de fraude na elaboração ou na produção dos documentos apresentados ao INSS, para a obtenção do benefício, não pode ser imputada à Servidora Previdenciária, até mesmo porque os seus vícios - a caso existentes - não eram identificáveis à primeira vista. A convicção íntima da autoridade sancionadora, por mais veemente que seja não basta para dar suporte a qualquer tipo de punição, pois, para tanto, se exige a prova perfeita da infração e do seu praticante. 7. Se, de um lado, é inegável que a impetrante efetivamente concedeu de maneira equivocada 12 benefícios previdenciários a Trabalhadores Rurais, de outro, a própria Comissão Processante reconheceu que não ficou comprovada má-fé ou dolo na conduta da Servidora, além de pontuar que em 27 anos de carreira pública não havia qualquer ocorrência que desabonasse a sua conduta. É inaceitável as alegadas fraudes documentais, quaisquer que sejam, possam ser imputadas a quem efetivamente não as praticou, no caso, a Servidora do INSS, ora impetrante. 8. Registre-se, ainda, que em todos os 12 casos examinados pela Comissão Processante os benefícios concedidos irregularmente relacionavam-se a Trabalhadores Rurais, ou seja, benefíciários especiais do sistema previdenciário. 9. Ora, até mesmo a prática judiciária previdenciária nos mostra o quão subjetiva e controversa pode ser a análise do preenchimento dos requisitos para a caracterização do segurado especial. Não sendo difícil supor que a apresentação de determinados documentos poderia firmar a convicção da Servidora para concessão do benefício. 10. Todo esse cenário, sobretudo a falta de comprovação de má-fé ou dolo nas concessões administrativas, deve ser levado em consideração no caso sob apreço, em que a Servidora foi severamente punida, em razão de ter concedido equivocadamente 12 benefícios previdenciários. 11. Neste aspecto, merece destaque o fato de que em sua agência de trabalho havia apenas mais um Servidor, o que torna claro que a demanda de trabalho deveria ser muito grande, não sendo as inconsistências detectadas um desvio flagrante de conduta. Aponto, a título de esclarecimento, que à época dos fatos o Estado do Mato Grosso do Sul possuía apenas 18 agências do INSS (atualmente são 37), assim, não é difícil imaginar a demanda de serviço na agência em que a Servidora atuava. 12. Na hipótese dos autos, fica fácil perceber que a conduta da impetrante não estava caracterizada pelo elemento doloso de malferir a legalidade, tampouco causar danos a terceiros ou beneficiar-se, porquanto todas as testemunhas foram categóricas em afirmar que não lhe repassaram qualquer valor para a concessão do benefício. 13. Neste contexto, revela-se acintosamente desproporcional e desarrazoada a pena de demissão impingida à impetrante pela Autoridade Impetrada, dissonante dos princípios jurídicos que devem nortear a aplicação das normas do Direito Sancionador, diante dos meandros circunstanciais em que a conduta foi praticada, bem como suas razões e consequências. 14. Segurança concedida, para determinar reintegração da Servidora impetrante nos quadros funcionais, bem como o pagamento imediato das parcelas vencidas, desde a impetração da Segurança. (MS 15.783/DF, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 24/05/2017, DJe 30/06/2017)
Acórdão
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, prosseguindo o julgamento, por unanimidade, conceder a segurança para anular o ato de demissão e determinar a reintegração da servidora impetrante nos quadros funcionais, restringidos os efeitos financeiros do mandamus às parcelas vencidas a partir da impetração, nos termos do reajuste feito pelo Sr. Ministro Relator no seu voto e com a ressalva do seu ponto de vista. Os Srs. Ministros Og Fernandes (voto-vista), Mauro Campbell Marques, Assusete Magalhães, Sérgio Kukina, Regina Helena Costa e Gurgel de Faria votaram com o Sr. Ministro Relator. Não participaram do julgamento os Srs. Ministros Francisco Falcão e Benedito Gonçalves.

Data do Julgamento : 24/05/2017
Data da Publicação : DJe 30/06/2017
Órgão Julgador : S1 - PRIMEIRA SEÇÃO
Relator(a) : Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO (1133)
Informações adicionais : O termo inicial do pagamento de parcelas vencidas referentes à remuneração de servidora pública reintegrada ao cargo é a data da impetração do mandado de segurança em que foi anulado o ato de demissão, de acordo com a orientação firmada na Primeira Seção do STJ. (VOTO VISTA) (MIN. OG FERNANDES) "No atinente aos efeitos financeiros da impetração, há regramento expresso contido no art. 14, § 4º, da Lei 12.016/2009, estabelecendo que 'o pagamento de vencimentos e vantagens pecuniárias assegurados em sentença concessiva de mandado de segurança a servidor público da administração direta ou autárquica federal, estadual e municipal somente será efetuado relativamente às prestações que se vencerem a contar da data do ajuizamento da inicial'. Dessarte, ainda que haja precedentes isolados desta Corte admitindo a retroação dos efeitos econômicos do mandado de segurança à data da prática do ato ilegal, tenho que a redação do normativo explicitada acima não dá margem para esse viés hermenêutico, ante a clareza do comando insculpido no art. 14, § 4º, da Lei 12.016/2009, o qual apenas permite o pagamento das prestações que se vencerem a partir do ajuizamento da demanda. Ademais, essa é a orientação que há muito prevalece nesta Corte Superior de Justiça,[...]". (RESSALVA DE ENTENDIMENTO) (MIN. NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO) "[...] defendo, quanto aos efeitos patrimoniais do Mandado de Segurança que visa anulação de ato administrativo, que o pagamento deveria se dar desde a publicação da Portaria de Demissão até a data do efetivo retorno ao cargo público. Entendimento que encontra eco em alguns precedentes desta Corte,[...]".
Referência legislativa : LEG:FED LEI:008112 ANO:1990***** RJU-90 REGIME JURÍDICO DOS SERVIDORES PÚBLICOS CIVIS DAUNIÃO ART:00117 INC:00009 ART:00132 INC:00013LEG:FED LEI:012016 ANO:2009***** LMS-09 LEI DO MANDADO DE SEGURANÇA ART:00014 PAR:00004
Veja : (PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR - CONTROLE JURISDICIONAL AMPLO- PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE, DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA EDA CULPABILIDADE) STF - MS 20999(MANDADO DE SEGURANÇA - ANULAÇÃO DE DEMISSÃO - PAGAMENTO DOSVENCIMENTOS - TERMO INICIAL - DATA DA IMPETRAÇÃO DO MANDADO DESEGURANÇA) STJ - MS 22489-DF, MS 18353-DF, AgInt no AREsp 487692-TO(RESSALVA DE ENTENDIMENTO - MANDADO DE SEGURANÇA - ANULAÇÃO DEDEMISSÃO - PAGAMENTO DOSVENCIMENTOS) STJ - AgRg no REsp 1248427-SP, AgRg no RMS 24782-MG, AgRg no REsp 1164514-AM, MS 12397-DF
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