REsp 1183133 / RJRECURSO ESPECIAL2010/0039641-4
RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE DE NEGÓCIO JURÍDICO.
ART. 548 DO CC. RENÚNCIA DO CÔNJUGE VIRAGO À INTEGRALIDADE DE SUA MEAÇÃO NA SEPARAÇÃO CONSENSUAL DO CASAL. ACORDO HOMOLOGADO POR SENTENÇA TRANSITADA EM JULGADO. CARACTERIZAÇÃO DE DOAÇÃO. NULIDADE DO NEGÓCIO JURÍDICO. INOCORRÊNCIA. DOADORA COM RENDA SUFICIENTE PARA PRESERVAR PATRIMÔNIO MÍNIMO À SUA SUBSISTÊNCIA.
1. O art. 548 do Código Civil estabelece ser nula a doação de todos os bens sem reserva de parte, ou renda suficiente para a subsistência do doador. A ratio da norma em comento, ao prever a nulidade da doação universal, foi a de garantir à pessoa o direito a um patrimônio mínimo, impedindo que se reduza sua situação financeira à miserabilidade. Nessa linha, acabou por mitigar, de alguma forma, a autonomia privada e o direito à livre disposição da propriedade, em exteriorização da preservação de um mínimo existencial à dignidade humana do benfeitor, um dos pilares da Carta da República e chave hermenêutica para leitura interpretativa de qualquer norma.
2. É possível a doação da totalidade do patrimônio pelo doador, desde que remanesça uma fonte de renda ou reserva de usufruto, ou mesmo bens a seu favor, que preserve um patrimônio mínimo à sua subsistência (CC, art. 548). Não se pode olvidar, ainda, que a aferição da situação econômica do doador deve ser considerada no momento da liberalidade, não sendo relevante, para esse efeito, o empobrecimento posterior do doador.
3. Assim, na situação em concreto é que se poderá aferir se a doação universal (omnium bonorum) deixou realmente o doador sem a mínima disponibilidade patrimonial para sua sobrevivência.
4. Na hipótese, a pretensão não merece prosperar, tomando-se em conta os limites do recurso especial e o somatório das seguintes circunstâncias do caso em concreto: i) reconhecimento da suficiência de fonte de renda à época apta a manter condições mínimas de sobrevivência digna; ii) não ter sido comprovado que a recorrente voltou a residir no imóvel objeto do litígio em razão de sua miserabilidade; iii) o lapso temporal do pedido de nulidade da doação - quase 20 anos após -, o que enfraquece o argumento de estar vivendo por tanto tempo em situação indigna; e iv) o fato de que a separação foi homologada em juízo, sob a fiscalização do representante do Ministério Público.
5. No tocante à doação inoficiosa, como sabido, há nulidade em relação ao quantum da deixa quando se exceder aquilo que poderia ser disposto em testamento (CC, art. 549). No presente caso, o Tribunal de origem chegou à conclusão de que a recorrente não trouxe provas de que o imóvel doado ao cônjuge varão excedia a parte a que a doadora, no momento da liberalidade, poderia dispor em testamento.
Entender de forma diversa demandaria o revolvimento fático-probatório dos autos, o que encontra óbice na Súm. 7 do STJ.
6. Recurso especial não provido.
(REsp 1183133/RJ, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 17/11/2015, DJe 01/02/2016)
Ementa
RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE DE NEGÓCIO JURÍDICO.
ART. 548 DO CC. RENÚNCIA DO CÔNJUGE VIRAGO À INTEGRALIDADE DE SUA MEAÇÃO NA SEPARAÇÃO CONSENSUAL DO CASAL. ACORDO HOMOLOGADO POR SENTENÇA TRANSITADA EM JULGADO. CARACTERIZAÇÃO DE DOAÇÃO. NULIDADE DO NEGÓCIO JURÍDICO. INOCORRÊNCIA. DOADORA COM RENDA SUFICIENTE PARA PRESERVAR PATRIMÔNIO MÍNIMO À SUA SUBSISTÊNCIA.
1. O art. 548 do Código Civil estabelece ser nula a doação de todos os bens sem reserva de parte, ou renda suficiente para a subsistência do doador. A ratio da norma em comento, ao prever a nulidade da doação universal, foi a de garantir à pessoa o direito a um patrimônio mínimo, impedindo que se reduza sua situação financeira à miserabilidade. Nessa linha, acabou por mitigar, de alguma forma, a autonomia privada e o direito à livre disposição da propriedade, em exteriorização da preservação de um mínimo existencial à dignidade humana do benfeitor, um dos pilares da Carta da República e chave hermenêutica para leitura interpretativa de qualquer norma.
2. É possível a doação da totalidade do patrimônio pelo doador, desde que remanesça uma fonte de renda ou reserva de usufruto, ou mesmo bens a seu favor, que preserve um patrimônio mínimo à sua subsistência (CC, art. 548). Não se pode olvidar, ainda, que a aferição da situação econômica do doador deve ser considerada no momento da liberalidade, não sendo relevante, para esse efeito, o empobrecimento posterior do doador.
3. Assim, na situação em concreto é que se poderá aferir se a doação universal (omnium bonorum) deixou realmente o doador sem a mínima disponibilidade patrimonial para sua sobrevivência.
4. Na hipótese, a pretensão não merece prosperar, tomando-se em conta os limites do recurso especial e o somatório das seguintes circunstâncias do caso em concreto: i) reconhecimento da suficiência de fonte de renda à época apta a manter condições mínimas de sobrevivência digna; ii) não ter sido comprovado que a recorrente voltou a residir no imóvel objeto do litígio em razão de sua miserabilidade; iii) o lapso temporal do pedido de nulidade da doação - quase 20 anos após -, o que enfraquece o argumento de estar vivendo por tanto tempo em situação indigna; e iv) o fato de que a separação foi homologada em juízo, sob a fiscalização do representante do Ministério Público.
5. No tocante à doação inoficiosa, como sabido, há nulidade em relação ao quantum da deixa quando se exceder aquilo que poderia ser disposto em testamento (CC, art. 549). No presente caso, o Tribunal de origem chegou à conclusão de que a recorrente não trouxe provas de que o imóvel doado ao cônjuge varão excedia a parte a que a doadora, no momento da liberalidade, poderia dispor em testamento.
Entender de forma diversa demandaria o revolvimento fático-probatório dos autos, o que encontra óbice na Súm. 7 do STJ.
6. Recurso especial não provido.
(REsp 1183133/RJ, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 17/11/2015, DJe 01/02/2016)Acórdão
Prosseguindo no julgamento, após o voto-vista da Ministra Maria
Isabel Gallotti dando provimento ao recurso especial, divergindo do
relator, e os votos dos Ministros Raul Araújo e Antonio Carlos
Ferreira acompanhando o relator, e o voto do Ministro Marco Buzzi no
sentido da divergência, a Quarta Turma, por maioria, negou
povimento ao recurso especial, nos termos do voto do relator.Votaram
vencidos a Sra.Ministra Maria Isabel Gallotti (voto-vista) e o Sr.
Ministro Marco Buzzi.
Os Srs. Ministros Raul Araújo e Antonio Carlos Ferreira votaram com
o Sr. Ministro Relator.
Data do Julgamento
:
17/11/2015
Data da Publicação
:
DJe 01/02/2016RT vol. 966 p. 361
Órgão Julgador
:
T4 - QUARTA TURMA
Relator(a)
:
Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO (1140)
Informações adicionais
:
"[...] é firme a jurisprudência desta Corte no sentido de que
'a anulação da doação no tocante à parcela do patrimônio que
ultrapassa a cota disponível em testamento, a teor do art. 1.176 do
Código Civil, exige que o interessado prove a existência do excesso
no momento da liberalidade'[...]".
(VOTO VENCIDO) (MIN. MARIA ISABEL GALLOTTI)
"[...] embora não seja possível o reexame do conjunto
fático-probatório em recurso especial (Súmula 7/STJ), cabe ao STJ
verificar se dos fatos reconhecidos como provados pelo acórdão
recorrido pode ser extraída a consequência jurídica a eles atribuída
pela instância de origem".
É nula a doação da meação do imóvel, feita pela mulher ao
marido, na separação judicial, no caso em que não houve reserva de
bens ou renda suficiente para a subsistência da doadora. Isso porque
os rendimentos decorrentes do trabalho assalariado desenvolvido pela
mulher à época da doação não satisfazem á exigência legal de reserva
de parte dos bens, ou renda suficiente para a subsistência do
doador. Com efeito, a renda deve provir do patrimônio do doador, ou
de gravame incidente sobre os bens doados. Ademais, a lei tem por
escopo exatamente prevenir o desamparo do doador no futuro,
assegurar-lhe vida independente do donatário, de terceiros ou
necessidade de valer-se do apoio devido pelo Estado aos miseráveis.
"[...] a circunstância de o termo de doação, celebrado em
acordo de separação judicial de partilha de bens [...], ter sido
homologado em Juízo sob a fiscalização do Ministério Público, data
máxima vênia do Relator, não modifica esse entendimento. Isso porque
a referida homologação ocorreu nos autos de processo de separação
judicial consensual, no qual não houve discussão alguma a respeito
da caracterização de doação universal".
Referência legislativa
:
LEG:FED LEI:010406 ANO:2002***** CC-02 CÓDIGO CIVIL DE 2002 ART:00548 ART:00549LEG:FED SUM:*********** SUM(STJ) SÚMULA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA SUM:000007LEG:FED LEI:003071 ANO:1916***** CC-16 CÓDIGO CIVIL DE 1916 ART:01175 ART:01176
Veja
:
(DOAÇÃO UNIVERSAL - RESERVA DE BENS OU RENDA SUFICIENTE ÀSUBSISTÊNCIA) STJ - REsp 34271-SP, REsp 61225-SP, REsp 1361983-SC(DOAÇÃO UNIVERSAL - DIREITO DE FAMÍLIA) STJ - REsp 285421-SP(ANULAÇÃO DA DOAÇÃO - COMPROVAÇÃO DO EXCESSO NO MOMENTO DALIBERALIDADE) STJ - REsp 160969-PE(VOTO VENCIDO - DOAÇÃO UNIVERSAL - RESERVA DE PATRIMÔNIO MÍNIMO PARAA SOBREVIVÊNCIA) STF - RE 102135-RJ
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