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Jurisprudência


REsp 1252770 / RSRECURSO ESPECIAL2011/0107213-8

Ementa
PENAL. RECURSO ESPECIAL. QUADRILHA, TENTATIVA DE FURTO QUALIFICADO E LAVAGEM DE DINHEIRO. ART. 288 DO CP. ELEMENTO SUBJETIVO DO INJUSTO. FIM ESPECÍFICO DE COMETER SÉRIE INDETERMINADA DE CRIMES. ART. 1°, VII, DA LEI N. 9.613/1998, ANTES DO ADVENTO DA LEI N. 12.850/2013. INEXISTÊNCIA DE CONCEITUAÇÃO DE ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA NO DIREITO PÁTRIO. OMISSÃO NÃO SUPRIDA PELA CONVENÇÃO DE PALERMO. ATIPICIDADE DA CONDUTA. EXTENSÃO AOS CORRÉUS CONDENADOS PELO MESMO DELITO. CRIME IMPOSSÍVEL. MONITORAMENTO POLICIAL. APLICAÇÃO DAS SÚMULAS N. 282 E 356 DO STF. DOSIMETRIA. VIOLAÇÃO DO ART. 59 DO CP QUANTO ÀS VETORIAIS PERSONALIDADE E MOTIVOS DO CRIME. COMPENSAÇÃO DA CONFISSÃO COM A AGRAVANTE DO ART. 62, I, DO CP. NÃO INDICAÇÃO DO DISPOSITIVO FEDERAL VIOLADO. SÚMULA N. 284 DO STF. ATOS EXECUTÓRIOS. CARACTERIZAÇÃO. REGIME PRISIONAL E SUBSTITUIÇÃO DA PENA. SÚMULAS N. 282 E 356 DO STF. RECURSO ESPECIAL DO MINISTÉRIO PÚBLICO NÃO PROVIDO. RECURSOS DEFENSIVOS PARCIALMENTE CONHECIDOS E, NESSA EXTENSÃO, PARCIALMENTE PROVIDOS PARA ALGUNS RECORRENTES E NÃO PROVIDOS PARA OUTROS. 1. Para a configuração do crime de quadrilha é imprescindível a comprovação do elemento subjetivo do injusto, qual seja, o fim específico de cometer uma série indeterminada de crimes, que a instância antecedente, soberana na análise dos fatos, concluiu não ter sido comprovada na espécie. 2. A teor do art. 1° do CP, é incabível a criminalização da conduta constante no art. 1°, VII, da Lei n. 9.613/98, antes do advento da Lei n. 12.683/2012, época em que não havia no ordenamento pátrio lei que incriminasse a organização criminosa, lacuna que, consoante moderna jurisprudência do Supremo Tribunal Federal e da Sexta Turma, não pode ser suprida pela Convenção de Palermo. Atipicidade da conduta, com extensão do decisum aos demais corréus condenados pelo mesmo delito. 3. A alegação de crime impossível em decorrência do monitoramento policial não foi objeto de análise pela instância antecedente e nem sequer foram opostos embargos de declaração para ventilar a matéria. Aplicação das Súmulas n. 282 e 356 do STF. 4. Quanto à dosimetria, não há ilegalidade no ponto em que o julgador sopesou, de forma desfavorável, a culpabilidade do agente que "auxiliou no financiamento da empreitada, bem como coordenava diretamente as atividades", pois evidenciado o maior grau de reprovabilidade da conduta, quando comparada, por exemplo com aquela praticada pelos agentes que apenas escavaram o túnel, como trabalhadores braçais. 5. Também em relação às circunstâncias e às consequências do crime, foi justificada a individualização da pena, pois o Tribunal de origem destacou a complexa logística do crime, o emprego de significativos recursos (inclusive a aquisição do imóvel onde era escavado o túnel), o envolvimento de mais de 30 pessoas, o recrutamento de diversos foragidos do sistema prisional e indivíduos com extensa ficha criminal, além dos danos causados durante a construção do túnel no subsolo de uma das principais ruas do centro da capital gaúcha, demandando, inclusive, o dispêndio de recursos públicos da municipalidade para reparar a via pública, mediante colocação de 80 toneladas de concreto para reparar o solo urbano. 6. Devem ser decotados, na primeira etapa da dosimetria, os aumentos relativos a personalidade e motivos do crime, pois inquéritos e ações penais em curso não podem evidenciar os maus antecedentes ou a personalidade desfavorável do agente, sob pena de malferimento ao princípio da não culpabilidade, e o fim criminoso de tentar subtrair valores, mesmo que vultosos, é inerente ao tipo penal de furto. 7. O pleito de compensação entre a confissão e a agravante do art. 62, I, do CP não comporta conhecimento, pois o recorrente deixou de apontar o dispositivo federal eventualmente violado. Aplicação, por analogia, da Súmula n. 284 do STF. 8. A distinção entre atos preparatórios e executórios é tormentosa e exige uma conjugação de critérios, tendo como ponto de partida a teoria objetivo-formal, de Beling, associada a outros parâmetros subjetivos e objetivos (como a complementação sob a concepção natural, proposta por Hans Frank), para que, consoante o tirocínio do julgador, seja possível definir se, no caso concreto, foram exteriorizados atos tão próximos do início do tipo que, conforme o plano do autor, colocaram em risco o bem jurídico tutelado. 9. Tal solução é necessária para se distinguir o começo da execução do crime, descrito no art. 14, II, do CP e o começo de execução da ação típica. Quando o agente penetra no verbo nuclear, sem dúvida, pratica atos executórios. No entanto, comportamentos periféricos que, conforme o plano do autor, uma vez externados, evidenciam o risco relevante ao bem jurídico tutelado também caracterizam início da execução do crime. 10. Não houve violação do art. 14, II, do CP, pois os atos externados ultrapassaram meros atos de cogitação ou de preparação e expuseram a perigo real o bem jurídico protegido pela norma penal, inclusive com a execução da qualificadora do furto. Os recorrentes, mediante complexa logística, escavaram por dois meses um túnel de 70,30 metros entre o prédio que adquiriram e o cofre da instituição bancária, cessando a empreitada, em decorrência de prisão em flagrante, quando estavam a 12,80 metros do ponto externo do banco, contexto que evidencia, de forma segura, a prática de atos executórios. 11. Os pedidos de alteração do regime prisional e substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos não podem ser conhecidos, à míngua do necessário prequestionamento. Súmulas n. 282 e 356 do STF. 12. A iminência da consumação do crime justifica, a teor do art. 14, II, do CP, o percentual mínimo de redução de pena, na terceira etapa da dosimetria. Ademais, reanalisar o iter criminis percorrido ensejaria exame de fatos e provas, vedado no recurso especial, conforme Súmula n. 7 do STJ. 13. Recurso especial do Ministério Público não provido. Recurso especial de Jean Ricardo Galian parcialmente conhecido e, nessa parte, parcialmente provido para reconhecer a atipicidade da conduta constante no art. 1°, VII, da Lei n. 9.613/98, antes do advento da Lei n. 12.683/2012, e redimensionar a reprimenda do crime de furto tentado qualificado para 3 anos de reclusão e 60 dias-multa. Decisão que reconheceu a atipicidade do crime do art. 1°, VII, da Lei n. 9.613/1998 estendida, a teor do art. 580 do CPP, aos corréus RAIMUNDO DE SOUZA PEREIRA, JAMES XIMENDES DA SILVA, FABRÍSIO OLIVEIRA SANTOS e DJALMA LIRA DE JESUS, com fulcro no art. 580 do CPP. Recursos especiais de Fabrísio Oliveira Santos e Lucivaldo Laurindo parcialmente conhecidos e, nessa parte, providos para reconhecer a atipicidade da conduta constante no art. 1°, VII, da Lei n. 9.613/98, antes do advento da Lei n. 12.683/2012. Recursos especiais de Rodenilson Leite Alves, Cláudio Roberto Ferreira, Reginaldo Amaro Brasil, Ricardo Rodrigues de Oliveira, Ricardo Laurindo Costa, José Ronaldo Martins, Amarildo Dias Rocha, Maria Célia Pereira Moreira e Ricardo Pereira dos Santos parcialmente conhecidos e, nessa extensão, não providos. (REsp 1252770/RS, Rel. Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, SEXTA TURMA, julgado em 24/03/2015, DJe 26/03/2015)
Acórdão
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da Sexta Turma, por unanimidade, negar provimento ao recurso especial do Ministério Público. Quanto ao recurso especial de Jean Ricardo Galian, conhecer parcialmente e, nessa parte, dar-lhe parcial provimento, nos termos do voto do eminente Sr. Ministro Relator. Decisão que reconheceu a atipicidade do crime do art. 1º, VII, da Lei n. 9.613/98, estendida, a teor do art. 580 do Código de Processo Penal, aos corréus Raimundo de Sousa Pereira, James Ximendes da Silva, Fabrísio de Oliveira Santos e Djalma Lira de Jesus. Ao recurso especial de Fabrísio de Oliveira Santos e Lucivaldo Laurindo conhecer parcialmente e, nessa parte, dar-lhe provimento, nos termos do voto do eminente Sr. Ministro Relator. Aos recursos especiais de Rodenilson Leite Alves, Cláudio Roberto Ferreira, Reginaldo Amaro Brasil, Ricardo Rodrigues de Oliveira, Ricardo Laurindo Costa, José Ronaldo Martins, Amarildo Dias Rocha, Maria Célia Pereira Moreira e Ricardo Pereira dos Santos, conhecer parcialmente e, nessa extensão, negar-lhes provimento. Os Srs. Ministros Nefi Cordeiro, Ericson Maranho (Desembargador convocado do TJ/SP), Maria Thereza de Assis Moura e Sebastião Reis Júnior (Presidente) votaram com o Sr. Ministro Relator.

Data do Julgamento : 24/03/2015
Data da Publicação : DJe 26/03/2015
Órgão Julgador : T6 - SEXTA TURMA
Relator(a) : Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ (1158)
Palavras de resgate : PRINCÍPIO DA LEGALIDADE.
Referência legislativa : LEG:FED LEI:009034 ANO:2005(REVOGADA PELA LEI 12.850/2013)LEG:FED LEI:012850 ANO:2013LEG:FED DEC:005015 ANO:2004LEG:FED LEI:009613 ANO:1998 ART:00001 INC:00007LEG:FED LCP:000105 ANO:2001 ART:00001 PAR:00004 INC:00009LEG:INT CVC:****** ANO:2000***** CCOT CONVENÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS CONTRA O CRIMEORGANIZADO TRANSNACIONAL ART:00002 LET:A ART:00005(CONVENÇÃO DE PALERMO, PROMULGADA PELO DECRETO 5.015/2004)LEG:FED LCP:000105 ANO:2001 ART:00001 PAR:00004 INC:00009LEG:FED CFB:****** ANO:1988***** CF-1988 CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988 ART:00005 INC:00039 INC:00046LEG:FED REC:000003 ANO:2006(CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA - CNJ)LEG:FED LEI:012683 ANO:2012LEG:FED DEL:002848 ANO:1940***** CP-40 CÓDIGO PENAL ART:00001 ART:00014 INC:00002 ART:00059 ART:00288LEG:FED DEL:003689 ANO:1941***** CPP-41 CÓDIGO DE PROCESSO PENAL ART:00387 ART:00580LEG:FED SUM:*********** SUM(STF) SÚMULA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL SUM:000282 SUM:000284 SUM:000356
Veja : (CRIME DE QUADRILHA - ELEMENTOS - CONFIGURAÇÃO TÍPICA) STF - HC 72992(ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA - TIPO PENAL PRÓPRIO - NECESSIDADE -ATIPICIDADE) STF - AP 470, RHC 124082 STJ - RHC 38674-SP(CRIME IMPOSSÍVEL - TESE NÃO ANALISADA PELA CORTE DE ORIGEM) STJ - HC 234872-RS(AUMENTO FUNDAMENTADO E PROPORCIONAL DA PENA BASE - REEXAME DASCIRCUNSTÂNCIAS DO DELITO - IMPOSSIBILIDADE - MATÉRIAFÁTICO-PROBATÓRIA) STJ - REsp 1307166-SP(DIMINUIÇÃO DA PENA - IMINÊNCIA DA CONSUMAÇÃO - PERCENTUAL MÍNIMO DEREDUÇÃO) STJ - HC 305263-SP(REEXAME DO GRAU DE CONSUMAÇÃO - MATÉRIA FÁTICO-PROBATÓRIA) STJ - AgRg no AREsp 501775-PE
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