REsp 1405989 / SPRECURSO ESPECIAL2012/0139716-1
PENAL E PROCESSUAL PENAL. CRIME CONTRA O SISTEMA FINANCEIRO. ART. 6º DA LEI 7.492/86. INDUZIR OU MANTER EM ERRO INVESTIDOR. ESTELIONATO.
CONFLITO APARENTE DE NORMAS PENAIS. CRITÉRIO DA ESPECIALIDADE. ABALO DA CONFIANÇA INERENTE ÀS RELAÇÕES NEGOCIAIS NO MERCADO IMOBILIÁRIO.
DOSIMETRIA DA PENA. CONDUTA SOCIAL E PERSONALIDADE. FUNDAMENTAÇÃO INIDÔNEA. CIRCUNSTÂNCIAS E CONSEQUÊNCIAS DO CRIME GRAVOSAS. DELITO PRATICADO EM DIVERSOS PAÍSES. ORGANIZAÇÃO ESTRUTURADA. DIVERSAS VÍTIMAS. ATENUANTE INOMINADA. NÃO INCIDÊNCIA. CRIME CONTINUADO.
IMPOSSIBILIDADE. DELITOS DE ESPÉCIES DISTINTAS. ART. 288 DO CP.
SUPERVENIÊNCIA DA PRESCRIÇÃO. RECURSO PARCIALMENTE CONHECIDO E, NESSA EXTENSÃO, PROVIDO.
1. O art. 6º da Lei 7.492/86 prevê como crime contra o Sistema Financeiro Nacional a conduta de induzir ou manter em erro sócio, investidor ou repartição pública competente, relativamente a operação ou situação financeira, sonegando-lhes informação ou prestando-a falsamente.
2. Há clara distinção em relação ao delito de estelionato. O delito do art. 6º da Lei 7.492/86 constitui crime formal (não é necessária a ocorrência de resultado, eventual prejuízo econômico caracteriza mero exaurimento), e não material; não prevê o especial fim de agir do sujeito ativo (para si ou para outrem); não exige, como elemento obrigatório, o meio fraudulento (artifício, ardil, etc.), apenas a prestação de informação falsa ou omissão de informação verdadeira.
3. Eventual conflito aparente de normas penais resolve-se pelo critério da especialidade do delito contra o Sistema Financeiro (art. 6º da Lei 7.492/86) em relação ao estelionato (art. 171 do CP).
4. Patente o dano ao Sistema Financeiro Nacional, pois abalada a confiança inerente às relações negociais no mercado mobiliário, induzindo em erro investidores que acreditaram na existência e na legitimidade de quem se apresentou como instituição financeira.
5. O art. 59 do CP elenca oito circunstâncias a balizar a atividade do magistrado na primeira fase de dosimetria da pena.
6. A conduta social constitui o comportamento do réu na comunidade, ou seja, entre a família, parentes e vizinhos. Não se vincula ao próprio fato criminoso, mas à inserção do agente em seu meio social, não se confundindo com seu modo de vida no crime.
7. A valoração negativa da personalidade do agente exige a existência de elementos concretos e suficientes nos autos que demonstrem, efetivamente, a maior periculosidade do réu aferível a partir de sua índole, atitudes, história pessoal e familiar, etapas de seu ciclo vital e social, etc (AgRg no REsp 1301226/PR, Rel.
Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, SEXTA TURMA, julgado em 11/03/2014, DJe 28/03/2014).
8. O fato de os delitos terem sido praticados em diversos países (Brasil, Argentina e Uruguai), com vítimas espalhadas pelo mundo, por meio de organização altamente estruturada, denota maior gravidade das circunstâncias e conseqüências dos crimes.
9. O mero fato de ser estrangeiro não pressupõe o desconhecimento da lei, desautorizando a aplicação da atenuante prevista no art. 65, II, do CP.
10. Na atenuante inominada, circunstância relevante, anterior ou posterior ao delito, não disposta em lei, mas que influencia no juízo de reprovação do autor, não são avaliados os antecedentes criminais, já previstos como circunstância judicial do art. 59 do CP.
11. Há continuidade delitiva quando o agente, mediante mais de uma ação ou omissão, pratica crimes da mesma espécie e, em razão das condições de tempo, lugar, maneira de execução e outras semelhantes, devam os delitos seguintes ser havidos como continuação do primeiro (art. 71 do CP).
12. Não sendo os delitos dos arts. 6º da Lei 7.492/86 e 1º da Lei 9.613/98 da mesma espécie, inviável a incidência da regra do crime continuado.
13. Superveniência da prescrição da pretensão punitiva quanto ao delito do art. 288 do CP.
14. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa extensão, provido. Extinta a punibilidade dos três recorrentes, pela prescrição da pretensão punitiva, em relação ao delito do art. 288 do CP.
(REsp 1405989/SP, Rel. Ministro SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, Rel. p/ Acórdão Ministro NEFI CORDEIRO, SEXTA TURMA, julgado em 18/08/2015, DJe 23/09/2015)
Ementa
PENAL E PROCESSUAL PENAL. CRIME CONTRA O SISTEMA FINANCEIRO. ART. 6º DA LEI 7.492/86. INDUZIR OU MANTER EM ERRO INVESTIDOR. ESTELIONATO.
CONFLITO APARENTE DE NORMAS PENAIS. CRITÉRIO DA ESPECIALIDADE. ABALO DA CONFIANÇA INERENTE ÀS RELAÇÕES NEGOCIAIS NO MERCADO IMOBILIÁRIO.
DOSIMETRIA DA PENA. CONDUTA SOCIAL E PERSONALIDADE. FUNDAMENTAÇÃO INIDÔNEA. CIRCUNSTÂNCIAS E CONSEQUÊNCIAS DO CRIME GRAVOSAS. DELITO PRATICADO EM DIVERSOS PAÍSES. ORGANIZAÇÃO ESTRUTURADA. DIVERSAS VÍTIMAS. ATENUANTE INOMINADA. NÃO INCIDÊNCIA. CRIME CONTINUADO.
IMPOSSIBILIDADE. DELITOS DE ESPÉCIES DISTINTAS. ART. 288 DO CP.
SUPERVENIÊNCIA DA PRESCRIÇÃO. RECURSO PARCIALMENTE CONHECIDO E, NESSA EXTENSÃO, PROVIDO.
1. O art. 6º da Lei 7.492/86 prevê como crime contra o Sistema Financeiro Nacional a conduta de induzir ou manter em erro sócio, investidor ou repartição pública competente, relativamente a operação ou situação financeira, sonegando-lhes informação ou prestando-a falsamente.
2. Há clara distinção em relação ao delito de estelionato. O delito do art. 6º da Lei 7.492/86 constitui crime formal (não é necessária a ocorrência de resultado, eventual prejuízo econômico caracteriza mero exaurimento), e não material; não prevê o especial fim de agir do sujeito ativo (para si ou para outrem); não exige, como elemento obrigatório, o meio fraudulento (artifício, ardil, etc.), apenas a prestação de informação falsa ou omissão de informação verdadeira.
3. Eventual conflito aparente de normas penais resolve-se pelo critério da especialidade do delito contra o Sistema Financeiro (art. 6º da Lei 7.492/86) em relação ao estelionato (art. 171 do CP).
4. Patente o dano ao Sistema Financeiro Nacional, pois abalada a confiança inerente às relações negociais no mercado mobiliário, induzindo em erro investidores que acreditaram na existência e na legitimidade de quem se apresentou como instituição financeira.
5. O art. 59 do CP elenca oito circunstâncias a balizar a atividade do magistrado na primeira fase de dosimetria da pena.
6. A conduta social constitui o comportamento do réu na comunidade, ou seja, entre a família, parentes e vizinhos. Não se vincula ao próprio fato criminoso, mas à inserção do agente em seu meio social, não se confundindo com seu modo de vida no crime.
7. A valoração negativa da personalidade do agente exige a existência de elementos concretos e suficientes nos autos que demonstrem, efetivamente, a maior periculosidade do réu aferível a partir de sua índole, atitudes, história pessoal e familiar, etapas de seu ciclo vital e social, etc (AgRg no REsp 1301226/PR, Rel.
Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, SEXTA TURMA, julgado em 11/03/2014, DJe 28/03/2014).
8. O fato de os delitos terem sido praticados em diversos países (Brasil, Argentina e Uruguai), com vítimas espalhadas pelo mundo, por meio de organização altamente estruturada, denota maior gravidade das circunstâncias e conseqüências dos crimes.
9. O mero fato de ser estrangeiro não pressupõe o desconhecimento da lei, desautorizando a aplicação da atenuante prevista no art. 65, II, do CP.
10. Na atenuante inominada, circunstância relevante, anterior ou posterior ao delito, não disposta em lei, mas que influencia no juízo de reprovação do autor, não são avaliados os antecedentes criminais, já previstos como circunstância judicial do art. 59 do CP.
11. Há continuidade delitiva quando o agente, mediante mais de uma ação ou omissão, pratica crimes da mesma espécie e, em razão das condições de tempo, lugar, maneira de execução e outras semelhantes, devam os delitos seguintes ser havidos como continuação do primeiro (art. 71 do CP).
12. Não sendo os delitos dos arts. 6º da Lei 7.492/86 e 1º da Lei 9.613/98 da mesma espécie, inviável a incidência da regra do crime continuado.
13. Superveniência da prescrição da pretensão punitiva quanto ao delito do art. 288 do CP.
14. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa extensão, provido. Extinta a punibilidade dos três recorrentes, pela prescrição da pretensão punitiva, em relação ao delito do art. 288 do CP.
(REsp 1405989/SP, Rel. Ministro SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, Rel. p/ Acórdão Ministro NEFI CORDEIRO, SEXTA TURMA, julgado em 18/08/2015, DJe 23/09/2015)Acórdão
Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima
indicadas, acordam os Ministros da Sexta Turma do Superior Tribunal
de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a
seguir, prosseguindo no julgamento após o voto-vista da Sra.
Ministra Maria Thereza de Assis Moura acompanhando o voto do Sr.
Ministro Nefi Cordeiro, no que foi acompanhada pelos Srs. Ministros
Rogerio Schietti Cruz e Ericson Maranho (Desembargador Convocado do
TJ/SP), por maioria, conhecer, em parte, do recurso especial e,
nessa extensão, dar-lhe parcial provimento apenas para reduzir a
pena imposta a D M para 8 anos, 4 meses e 10 dias de reclusão, em
regime inicial fechado, e 35 dias-multa e a A J A P T para 3 anos, 9
meses de reclusão, em regime inicial semiaberto, e 18 dias-multa, e,
de ofício, declarar extinta a punibilidade dos três recorrentes,
pela prescrição da pretensão punitiva, em relação ao delito do art.
288 do CP, nos termos do voto do Sr. Ministro Nefi Cordeiro, que
lavrará o acórdão. Vencido o Sr. Ministro Relator. Votaram com o
Sr. Ministro Nefi Cordeiro os Srs. Ministros Rogerio Schietti Cruz,
Ericson Maranho (Desembargador convocado do TJ/SP) e Maria Thereza
de Assis Moura.
Data do Julgamento
:
18/08/2015
Data da Publicação
:
DJe 23/09/2015
Órgão Julgador
:
T6 - SEXTA TURMA
Relator(a)
:
Ministro SEBASTIÃO REIS JÚNIOR (1148)
Relator a p acórdão
:
Ministro NEFI CORDEIRO (1159)
Informações adicionais
:
"[...]quanto à vetorial do comportamento das vítimas, entendeu
o acórdão não estar configurada a torpeza bilateral, a ensejar a
redução da pena-base[...].
A reversão das premissas assentadas no acórdão implicaria
revisão do conjunto fático-probatório, providência inadmissível na
via eleita, atraindo a incidência da Súmula 7/STJ".
"Em relação à incidência da agravante prevista no art. 62, I,
do CP, aplicável ao agente que promove ou organiza a cooperação no
crime ou dirige a atividade dos demais agentes[...].
Registrado pelas instâncias ordinárias que o recorrente exerce
liderança, não é possível a revisão do julgado em recurso especial,
pois demandaria o reexame fático-probatório, o que encontra óbice na
Súmula 7/STJ".
(VOTO VENCIDO) (MIN. SEBASTIÃO REIS JÚNIOR)
"Para que haja o enquadramento da conduta no art. 6º da Lei n.
7.492/1986, o sujeito ativo, necessariamente, deve possuir
informações ou ser ligado a instituição financeira que opera no
mercado de capitais ou, ainda, operar no mercado financeiro como
pessoa física, por força do disposto no art. 1º, § 2º, da mesma Lei,
o que não está presente no caso".
"Ressalto ser firme a jurisprudência desta Corte, no sentido da
inexistência de crime contra o Sistema Financeiro Nacional, mas,
sim, de crime de estelionato, na hipótese em que o autor do delito,
com a intenção preordenada de se apropriar dos valores, usa empresa
de fachada para captação de recursos de investidores, feita sob a
promessa de maiores rendimentos".
"Verifico [...] estar ausente outra elementar do tipo do art.
6º da Lei n. 7.492/1986, que é justamente a informação acerca do
sistema financeiro sonegada ou omitida. Para que haja o crime do
art. 6º da Lei n. 7.492/1986, é necessária a existência de
informação relevante acerca da instituição ou operação financeira. E
mais, precisa ser verdadeira, para que, ao ser falseada ou omitida,
induza em erro os sócios, investidores ou a repartição pública
competente".
Na hipótese em que a imputação pelo o crime contra o sistema
financeiro nacional, art. 6 da lei 7.492/1996, foi readequado
tipicamente para a conduta de estelionato, art. 171 do CPB, não é
possível a imputação pelo crime de lavagem de capitais, quando foi
cometido antes da alteração da lei 12.683/2012. Isso porque, antes
da alteração legislativa, o crime de estelionato não era considerado
como crime antecedente à Lavagem de Capitais, conforme entendimento
firmado nesta Corte.
Não é possível a imputação pelo crime de lavagem de capitais,
através da conduta antecedente "praticado por organização
criminosa", redação anterior à lei 12.683/2012. Isso porque não
existe no ordenamento jurídico a tipificação formal do crime de
"organização criminosa", conforme entendimento firmado por esta
Corte Superior.
Referência legislativa
:
LEG:FED LEI:007492 ANO:1986***** LCCSF-86 LEI DOS CRIMES CONTRA O SISTEMA FINANCEIRO NACIONAL ART:00001 INC:00002 ART:00006 ART:00025LEG:FED DEL:002848 ANO:1940***** CP-40 CÓDIGO PENAL ART:00059 ART:00062 INC:00001 ART:00065 INC:00002 ART:00071 ART:00171LEG:FED SUM:*********** SUM(STJ) SÚMULA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA SUM:000007LEG:FED LEI:009613 ANO:1998 ART:00001 INC:00006 INC:00007(ARTIGO 01 COM A REDAÇÃO ANTERIOR À DADA PELA LEI 12.683/2012)LEG:FED LEI:012683 ANO:2012
Veja
:
(LEI DOS CRIMES CONTRA O SISTEMA FINANCEIRO NACIONAL - APLICAÇÃO APESSOAS FÍSICAS E JURÍDICAS) STJ - HC 221233-PR STF - HC 93368(DIREITO PENAL - DOSIMETRIA - PERSONALIDADE DO AGENTE - VALORAÇÃONEGATIVA) STJ - AgRg no REsp 1301226-PR(VOTO VENCIDO - DIREITO PENAL - EMPRESA DE FACHADA - CAPTAÇÃO DERECURSO DE INVESTIDORES - APROPRIAÇÃO DE VALORES - TIPIFICAÇÃOCRIMINAL) STJ - CC 23123-RS, CC 27631-RS, CC 36513-SP, CC 25669-RS, CC 21471-DF(VOTO VENCIDO - LAVAGEM DE DINHEIRO - CRIME ANTECEDENTE -ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA - CONDUTA ANTERIOR À MODIFICAÇÃO DA LEI12.683/2012) STJ - REsp 1170545-RJ, REsp 1252770-RS, RHC 41588-SP
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