REsp 1406200 / ALRECURSO ESPECIAL2012/0257539-6
RECURSO ESPECIAL. CONTRATO DE PARTICIPAÇÃO EM GRUPO DE CONSÓRCIO.
CONSORCIADO FALECIDO ANTES DO ENCERRAMENTO DO GRUPO. EXISTÊNCIA DE SEGURO PRESTAMISTA CONTRATADO PELA ADMINISTRADORA (ESTIPULANTE).
PRELIMINARES DE ILEGITIMIDADE PASSIVA AD CAUSAM DOS HERDEIROS E DE IMPOSSIBILIDADE JURÍDICA DO PEDIDO. REJEIÇÃO. DEVER DE QUITAÇÃO DAS PRESTAÇÕES FALTANTES QUANDO DO ÓBITO. LIBERAÇÃO IMEDIATA DA CARTA DE CRÉDITO AOS HERDEIROS. CABIMENTO.
1. Os herdeiros de consorciado falecido antes do encerramento do grupo consorcial detêm legitimidade para pleitear a liberação, pela administradora, do montante constante da carta de crédito, quando ocorrido o sinistro coberto por seguro prestamista. Isso porque, mediante a contratação da referida espécie de seguro de vida em grupo (adjeto ao consórcio imobiliário), a estipulante/administradora assegura a quitação do saldo devedor relativo à cota do consorciado falecido, o que representa proveito econômico não só ao grupo (cuja continuidade será preservada), mas também aos herdeiros do de cujus, que, em razão da cobertura do sinistro, passam a ter direito à liberação da carta de crédito. Em tal hipótese, o direito de crédito constitui direito próprio dos herdeiros e não direito hereditário, motivo pelo qual não há falar em legitimidade ativa ad causam do espólio.
2. A preliminar de impossibilidade jurídica do pedido deve ser afastada, ante a flagrante consonância da pretensão extraída da inicial com o conteúdo incontroverso das obrigações estipuladas no contrato de participação em consórcio.
3. A administradora/estipulante do seguro não comprovou, consoante assente na origem, que a consorciada/segurada, antes da contratação, tinha conhecimento de ser portadora de doença preexistente (causa exoneradora do dever de pagamento da indenização securitária), não logrando, assim, demonstrar sua má-fé. Desse modo, revela-se inviável suplantar tal cognição no âmbito do julgamento de recurso especial, ante o óbice da Súmula 7/STJ.
4. Se, nos termos da norma regulamentar vigente à época da contratação (Circular Bacen 2.766/97), era possível o recebimento imediato do crédito pelo consorciado contemplado (por sorteio ou por lance) que procedesse à quitação antecipada do saldo devedor atinente a sua cota, não se revela razoável negar o mesmo direito aos herdeiros de consorciado falecido, vítimas de evento natural, involuntário e deveras traumatizante, ensejador da liquidação antecipada da dívida existente em relação ao grupo consorcial, cujo equilíbrio econômico-financeiro não correu o menor risco.
5. A mesma interpretação se extrai do disposto no artigo 34 da circular retrocitada, segundo a qual "a diferença da indenização referente ao seguro de vida, se houver, após amortizado o saldo devedor do consorciado, será imediatamente entregue pela administradora ao beneficiário indicado pelo titular da cota ou, na sua falta, a seus sucessores".
6. Outrossim, à luz da cláusula geral da função social do contrato (artigo 421 do Código Civil), deve ser observada a dimensão social do consórcio, conciliando-se o bem comum pretendido (aquisição de bens ou serviços por todos os consorciados) e a dignidade humana de cada integrante do núcleo familiar atingido pela morte da consorciada, que teve suas obrigações financeiras (perante o grupo consorcial) absorvidas pela seguradora, consoante estipulação da própria administradora.
7. Ainda que houvesse previsão contratual em sentido contrário, é certo que a incidência das normas consumeristas na relação instaurada entre consorciados e administradora (REsp 1.269.632/MG, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 18.10.2011, DJe 03.11.2011) torna nulo de pleno direito o preceito incompatível com a boa-fé ou a equidade (inciso IV do artigo 51).
8. Consequentemente, os herdeiros da consorciada falecida tinham, sim, direito à liberação imediata da carta de crédito, em razão da impositiva quitação do saldo devedor pelo seguro prestamista, independentemente da efetiva contemplação ou do encerramento do grupo consorcial.
9. Cuidando-se de obrigação contratual, sem termo especificado, a mora da administradora ficou configurada desde a citação, conforme devidamente firmado nas instâncias ordinárias, afastada a alegação de que o inadimplemento somente teria ocorrido após o término do grupo (ocorrido em 2015, depois do ajuizamento da demanda).
10. Recurso especial não provido.
(REsp 1406200/AL, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 17/11/2016, DJe 02/02/2017)
Ementa
RECURSO ESPECIAL. CONTRATO DE PARTICIPAÇÃO EM GRUPO DE CONSÓRCIO.
CONSORCIADO FALECIDO ANTES DO ENCERRAMENTO DO GRUPO. EXISTÊNCIA DE SEGURO PRESTAMISTA CONTRATADO PELA ADMINISTRADORA (ESTIPULANTE).
PRELIMINARES DE ILEGITIMIDADE PASSIVA AD CAUSAM DOS HERDEIROS E DE IMPOSSIBILIDADE JURÍDICA DO PEDIDO. REJEIÇÃO. DEVER DE QUITAÇÃO DAS PRESTAÇÕES FALTANTES QUANDO DO ÓBITO. LIBERAÇÃO IMEDIATA DA CARTA DE CRÉDITO AOS HERDEIROS. CABIMENTO.
1. Os herdeiros de consorciado falecido antes do encerramento do grupo consorcial detêm legitimidade para pleitear a liberação, pela administradora, do montante constante da carta de crédito, quando ocorrido o sinistro coberto por seguro prestamista. Isso porque, mediante a contratação da referida espécie de seguro de vida em grupo (adjeto ao consórcio imobiliário), a estipulante/administradora assegura a quitação do saldo devedor relativo à cota do consorciado falecido, o que representa proveito econômico não só ao grupo (cuja continuidade será preservada), mas também aos herdeiros do de cujus, que, em razão da cobertura do sinistro, passam a ter direito à liberação da carta de crédito. Em tal hipótese, o direito de crédito constitui direito próprio dos herdeiros e não direito hereditário, motivo pelo qual não há falar em legitimidade ativa ad causam do espólio.
2. A preliminar de impossibilidade jurídica do pedido deve ser afastada, ante a flagrante consonância da pretensão extraída da inicial com o conteúdo incontroverso das obrigações estipuladas no contrato de participação em consórcio.
3. A administradora/estipulante do seguro não comprovou, consoante assente na origem, que a consorciada/segurada, antes da contratação, tinha conhecimento de ser portadora de doença preexistente (causa exoneradora do dever de pagamento da indenização securitária), não logrando, assim, demonstrar sua má-fé. Desse modo, revela-se inviável suplantar tal cognição no âmbito do julgamento de recurso especial, ante o óbice da Súmula 7/STJ.
4. Se, nos termos da norma regulamentar vigente à época da contratação (Circular Bacen 2.766/97), era possível o recebimento imediato do crédito pelo consorciado contemplado (por sorteio ou por lance) que procedesse à quitação antecipada do saldo devedor atinente a sua cota, não se revela razoável negar o mesmo direito aos herdeiros de consorciado falecido, vítimas de evento natural, involuntário e deveras traumatizante, ensejador da liquidação antecipada da dívida existente em relação ao grupo consorcial, cujo equilíbrio econômico-financeiro não correu o menor risco.
5. A mesma interpretação se extrai do disposto no artigo 34 da circular retrocitada, segundo a qual "a diferença da indenização referente ao seguro de vida, se houver, após amortizado o saldo devedor do consorciado, será imediatamente entregue pela administradora ao beneficiário indicado pelo titular da cota ou, na sua falta, a seus sucessores".
6. Outrossim, à luz da cláusula geral da função social do contrato (artigo 421 do Código Civil), deve ser observada a dimensão social do consórcio, conciliando-se o bem comum pretendido (aquisição de bens ou serviços por todos os consorciados) e a dignidade humana de cada integrante do núcleo familiar atingido pela morte da consorciada, que teve suas obrigações financeiras (perante o grupo consorcial) absorvidas pela seguradora, consoante estipulação da própria administradora.
7. Ainda que houvesse previsão contratual em sentido contrário, é certo que a incidência das normas consumeristas na relação instaurada entre consorciados e administradora (REsp 1.269.632/MG, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 18.10.2011, DJe 03.11.2011) torna nulo de pleno direito o preceito incompatível com a boa-fé ou a equidade (inciso IV do artigo 51).
8. Consequentemente, os herdeiros da consorciada falecida tinham, sim, direito à liberação imediata da carta de crédito, em razão da impositiva quitação do saldo devedor pelo seguro prestamista, independentemente da efetiva contemplação ou do encerramento do grupo consorcial.
9. Cuidando-se de obrigação contratual, sem termo especificado, a mora da administradora ficou configurada desde a citação, conforme devidamente firmado nas instâncias ordinárias, afastada a alegação de que o inadimplemento somente teria ocorrido após o término do grupo (ocorrido em 2015, depois do ajuizamento da demanda).
10. Recurso especial não provido.
(REsp 1406200/AL, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 17/11/2016, DJe 02/02/2017)Acórdão
Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima
indicadas, acordam os Ministros da Quarta Turma do Superior Tribunal
de Justiça, por unanimidade, negar provimento ao recurso especial,
nos termos do voto do Sr. Ministro Relator.
Os Srs. Ministros Raul Araújo, Maria Isabel Gallotti (Presidente),
Antonio Carlos Ferreira e Marco Buzzi votaram com o Sr. Ministro
Relator.
Data do Julgamento
:
17/11/2016
Data da Publicação
:
DJe 02/02/2017
Órgão Julgador
:
T4 - QUARTA TURMA
Relator(a)
:
Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO (1140)
Referência legislativa
:
LEG:FED LEI:010406 ANO:2002***** CC-02 CÓDIGO CIVIL DE 2002 ART:00051 INC:00004 ART:00421 ART:00765 ART:00766 ART:00794LEG:FED SUM:****** ANO:********* SUM(STJ) SÚMULA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA SUM:000007LEG:FED CIR:002766 ANO:1997 ART:00003 INC:00009 LET:C ART:00019 PAR:ÚNICO ART:00024 ART:00034(BANCO CENTRAL - BACEN)
Veja
:
(QUITAÇÃO DA DÍVIDA DA FALECIDA - OBRIGAÇÃO DE FAZER DA SEGURADORA) STJ - REsp 207176-SP(RECURSO ESPECIAL - MATÉRIA DE ORDEM PÚBLICA - PREQUESTIONAMENTO -NECESSIDADE) STJ - EDcl nos EDcl no AgRg no RE nos EDcl no AgRg no REsp1417392-MG, EREsp 805804-ES, AgRg nos EREsp 1131231-MG, AgRg nos EREsp 1253389-SP, AgRg nos EREsp 999342-SP(PEDIDO DO AUTOR - INTERPRETAÇÃO SISTEMÁTICA) STJ - EDcl no REsp 1331100-BA(SEGURO DE VIDA - DOENÇA PREEXISTENTE - OMISSÃO NO PREENCHIMENTO DOQUESTIONÁRIO - MÁ-FÉ DO SEGURADO - RECUSA DA COBERTURA LÍCITA) STJ - AgInt no REsp 1591212-PR, AgRg nos EDcl no REsp 1299116-SP(GRUPO DE CONSÓRCIO - DESISTENTES OU EXCLUÍDOS - PRAZO DERESTITUIÇÃO) STJ - REsp 1119300-RS (RECURSO REPETITIVO)(RELAÇÃO ENTRE CONSORCIADOS E ADMINISTRADORA - INCIDÊNCIA DAS NORMASCONSUMERISTAS - PRECEITO INCOMPATÍVEL COM A BOA-FÉ OU A EQUIDADE -NULIDADE) STJ - REsp 1269632-MG(GRUPO DE CONSÓRCIO - ESTIPULANTES OU EXCLUÍDOS - RESTITUIÇÃO -TERMO INICIAL DOS JUROS DE MORA) STJ - REsp 1111270-PR(ADMINISTRADORA DE CONSÓRCIO - LEGITMIDADE PASSIVA) STJ - REsp 248135-SP(ESTIPULANTE E SEGURADORA - TEORIA DA APARÊNCIA) STJ - REsp 1402101-RJ
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