REsp 1438343 / MSRECURSO ESPECIAL2013/0095665-3
RECURSOS ESPECIAIS. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS AJUIZADA POR ARTISTA PLÁSTICO. ESCULTURA EDIFICADA EM LOGRADOURO PÚBLICO. REPRESENTAÇÃO DA OBRA, SEM AUTORIZAÇÃO DO AUTOR, EM INGRESSOS DE PARTIDA DE FUTEBOL ENTRE A SELEÇÃO BRASILEIRA E A SELEÇÃO VENEZUELANA (ELIMINATÓRIAS DA COPA DO MUNDO FIFA 2010).
1. A Lei 9.610/98 - evidenciando a dissociação entre o suporte físico da obra intelectual e o direito autoral em si - estabelece a regra de que a aquisição do original de uma obra, ou de exemplar, não confere ao adquirente qualquer dos direitos patrimoniais do autor, salvo convenção em contrário entre as partes e os casos excepcionais legalmente previstos (artigo 37).
2. O artigo 77 da referida lei erigiu exceção à supracitada norma, ao dispor que a transferência da propriedade do corpus mechanicum da obra de arte plástica (o quadro, a gravura, a escultura, entre outras formas) implica apenas a transmissão, ao comprador, do direito de expô-la ao público, o que não alcança os direitos morais do autor nem o direito exclusivo de exploração econômica com a sua reprodução, desde que inexistente disposição contratual em sentido diverso.
3. No mesmo sentido, releva-se imprescindível a prévia e expressa autorização do autor, salvo convenção em contrário, para a reprodução da obra sob encomenda, objeto de contrato de prestação de serviços, no qual o encomendante (tomador) apenas sugere o tema ou solicita a criação, sem participar, concretamente, de sua consecução.
4. Nada obstante, o artigo 48 da Lei 9.610/98 autoriza que a obra de arte situada permanentemente em logradouro público seja livremente representada por meio de pinturas, desenhos, fotografias e procedimentos audiovisuais, instituindo, portanto, expressa limitação ao direito patrimonial do artista plástico. Assim, a reprodução meramente ilustrativa da obra situada em local destinado ao uso comum de toda a população (tais como praças, jardins, passeios, hortos, avenidas, ruas, museus, entidades culturais) prescinde de autorização prévia do autor, tendo em vista seu papel eminentemente cultural, capaz de contribuir com a evolução social e o progresso humano.
5. A exceção prevista no supracitado dispositivo legal não autoriza, contudo, o aproveitamento subsequente da representação da obra para fins comerciais (diretos ou indiretos), sem a prévia anuência do autor, ressalvada, entretanto, a hipótese em que o ato de reprodução em si consubstanciar evidente divulgação do patrimônio histórico, cultural, artístico, turístico ou paisagístico. Precedente da Quarta Turma: REsp 951.521/MA, Rel. Ministro Aldir Passarinho Júnior, julgado em 22.03.2011, DJe 11.05.2011.
6. No caso concreto, ao confeccionar ingressos para evento esportivo internacional realizado na cidade de Campo Grande (partida de futebol entre a Seleção Brasileira e a Seleção da Venezuela, válida pelas eliminatórias da Copa do Mundo), a Confederação Brasileira de Futebol - CBF utilizou-se de fotografia de obra de arte edificada na Praça das Araras, na qual retratado o contexto ambiental circundante. A propósito, fotografias com o mesmo conteúdo constam no sítio eletrônico da Prefeitura de Campo Grande, o que demonstra ser a obra de arte representativa do próprio ponto turístico.
7. A reprodução da fotografia da obra nos ingressos da competição revelou-se, diretamente, vinculada ao escopo de divulgação do patrimônio turístico da cidade, sem qualquer reflexo no interesse do público em participar do evento. Ora, certamente, a partida de futebol entre a Seleção Brasileira e a Seleção Venezuelana atrairia público de naturalidade e nacionalidade diversas, bem como a atenção da mídia internacional. A CBF, então, no exercício de sua atividade de produção e promoção de eventos esportivos e de administração da Seleção Brasileira de Futebol (cuja contribuição ao turismo do Brasil é inegável), utilizou-se dos ingressos para promover ponto turístico da cidade onde realizada a competição.
8. Ademais, a utilização da referida fotografia, inexoravelmente, não significou qualquer incremento ao número de espectadores do jogo, mas sim o renome da Seleção Brasileira de Futebol, cujo reconhecimento como patrimônio cultural do país é, inclusive, objeto de projeto de lei na Câmara dos Deputados (PL 1.429/07).
9. Assim, não se verifica a contrafação alegada na inicial, uma vez que a conduta das rés encontra subsunção na norma disposta no artigo 48 da Lei 9.610/98.
10. Recursos especiais das litisconsortes passivas providos para julgar improcedente a pretensão formulada na inicial, condenando o autor ao pagamento das custas e dos honorários advocatícios, estes arbitrados em 10% (dez por cento) sobre o valor da causa.
(REsp 1438343/MS, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 01/12/2016, DJe 22/02/2017)
Ementa
RECURSOS ESPECIAIS. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS AJUIZADA POR ARTISTA PLÁSTICO. ESCULTURA EDIFICADA EM LOGRADOURO PÚBLICO. REPRESENTAÇÃO DA OBRA, SEM AUTORIZAÇÃO DO AUTOR, EM INGRESSOS DE PARTIDA DE FUTEBOL ENTRE A SELEÇÃO BRASILEIRA E A SELEÇÃO VENEZUELANA (ELIMINATÓRIAS DA COPA DO MUNDO FIFA 2010).
1. A Lei 9.610/98 - evidenciando a dissociação entre o suporte físico da obra intelectual e o direito autoral em si - estabelece a regra de que a aquisição do original de uma obra, ou de exemplar, não confere ao adquirente qualquer dos direitos patrimoniais do autor, salvo convenção em contrário entre as partes e os casos excepcionais legalmente previstos (artigo 37).
2. O artigo 77 da referida lei erigiu exceção à supracitada norma, ao dispor que a transferência da propriedade do corpus mechanicum da obra de arte plástica (o quadro, a gravura, a escultura, entre outras formas) implica apenas a transmissão, ao comprador, do direito de expô-la ao público, o que não alcança os direitos morais do autor nem o direito exclusivo de exploração econômica com a sua reprodução, desde que inexistente disposição contratual em sentido diverso.
3. No mesmo sentido, releva-se imprescindível a prévia e expressa autorização do autor, salvo convenção em contrário, para a reprodução da obra sob encomenda, objeto de contrato de prestação de serviços, no qual o encomendante (tomador) apenas sugere o tema ou solicita a criação, sem participar, concretamente, de sua consecução.
4. Nada obstante, o artigo 48 da Lei 9.610/98 autoriza que a obra de arte situada permanentemente em logradouro público seja livremente representada por meio de pinturas, desenhos, fotografias e procedimentos audiovisuais, instituindo, portanto, expressa limitação ao direito patrimonial do artista plástico. Assim, a reprodução meramente ilustrativa da obra situada em local destinado ao uso comum de toda a população (tais como praças, jardins, passeios, hortos, avenidas, ruas, museus, entidades culturais) prescinde de autorização prévia do autor, tendo em vista seu papel eminentemente cultural, capaz de contribuir com a evolução social e o progresso humano.
5. A exceção prevista no supracitado dispositivo legal não autoriza, contudo, o aproveitamento subsequente da representação da obra para fins comerciais (diretos ou indiretos), sem a prévia anuência do autor, ressalvada, entretanto, a hipótese em que o ato de reprodução em si consubstanciar evidente divulgação do patrimônio histórico, cultural, artístico, turístico ou paisagístico. Precedente da Quarta Turma: REsp 951.521/MA, Rel. Ministro Aldir Passarinho Júnior, julgado em 22.03.2011, DJe 11.05.2011.
6. No caso concreto, ao confeccionar ingressos para evento esportivo internacional realizado na cidade de Campo Grande (partida de futebol entre a Seleção Brasileira e a Seleção da Venezuela, válida pelas eliminatórias da Copa do Mundo), a Confederação Brasileira de Futebol - CBF utilizou-se de fotografia de obra de arte edificada na Praça das Araras, na qual retratado o contexto ambiental circundante. A propósito, fotografias com o mesmo conteúdo constam no sítio eletrônico da Prefeitura de Campo Grande, o que demonstra ser a obra de arte representativa do próprio ponto turístico.
7. A reprodução da fotografia da obra nos ingressos da competição revelou-se, diretamente, vinculada ao escopo de divulgação do patrimônio turístico da cidade, sem qualquer reflexo no interesse do público em participar do evento. Ora, certamente, a partida de futebol entre a Seleção Brasileira e a Seleção Venezuelana atrairia público de naturalidade e nacionalidade diversas, bem como a atenção da mídia internacional. A CBF, então, no exercício de sua atividade de produção e promoção de eventos esportivos e de administração da Seleção Brasileira de Futebol (cuja contribuição ao turismo do Brasil é inegável), utilizou-se dos ingressos para promover ponto turístico da cidade onde realizada a competição.
8. Ademais, a utilização da referida fotografia, inexoravelmente, não significou qualquer incremento ao número de espectadores do jogo, mas sim o renome da Seleção Brasileira de Futebol, cujo reconhecimento como patrimônio cultural do país é, inclusive, objeto de projeto de lei na Câmara dos Deputados (PL 1.429/07).
9. Assim, não se verifica a contrafação alegada na inicial, uma vez que a conduta das rés encontra subsunção na norma disposta no artigo 48 da Lei 9.610/98.
10. Recursos especiais das litisconsortes passivas providos para julgar improcedente a pretensão formulada na inicial, condenando o autor ao pagamento das custas e dos honorários advocatícios, estes arbitrados em 10% (dez por cento) sobre o valor da causa.
(REsp 1438343/MS, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 01/12/2016, DJe 22/02/2017)Acórdão
Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima
indicadas, acordam os Ministros da Quarta Turma do Superior Tribunal
de Justiça, por unanimidade, por unanimidade, dar provimento aos
recursos especiais, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator.
Os Srs. Ministros Raul Araújo, Maria Isabel Gallotti (Presidente),
Antonio Carlos Ferreira e Marco Buzzi votaram com o Sr. Ministro
Relator.
Dr(a). GUILHERME COUTINHO SILVA, pela parte RECORRENTE: OUTPLAN
SISTEMAS S/A Dr(a). RICARDO SUSSUMU OGATA, pela parte RECORRENTE:
CONFEDERAÇÃO BRASILEIRA DE FUTEBOL CBF
Data do Julgamento
:
01/12/2016
Data da Publicação
:
DJe 22/02/2017
Órgão Julgador
:
T4 - QUARTA TURMA
Relator(a)
:
Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO (1140)
Referência legislativa
:
LEG:FED LEI:009610 ANO:1998***** LDA-98 LEI DOS DIREITOS AUTORAIS ART:00007 INC:00008 ART:00024 INC:00001 INC:00002 INC:00003 INC:00004 INC:00005 INC:00006 INC:00007 PAR:00001 PAR:00002 ART:00027 ART:00029 INC:00001 INC:00008 ART:00037 ART:00041 ART:00045 ART:00048 ART:00077 ART:00078
Veja
:
(DIREITO AUTORAL - OBRA ALOCADA EM LOCAL PÚBLICO - FINALIDADETURÍSTICA - EXPLORAÇÃO COMERCIAL) STJ - REsp 951521-MA
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