REsp 1476051 / PERECURSO ESPECIAL2014/0211278-1
PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. CONTRIBUIÇÃO DE INTERVENÇÃO NO DOMÍNIO ECONÔMICO. CIDE-COMBUSTÍVEIS. GÁS LIQUEFEITO DE PETRÓLEO (GLP). GÊNERO QUE ABRANGE AS ESPÉCIES BUTANO E PROPANO. INTELIGÊNCIA DO ART. 3º, V, DA LEI 10.336/2001.
HISTÓRICO DA DEMANDA 1. A questão controvertida diz respeito à autuação fiscal que acarretou o lançamento da Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (Cide) relativa às importações dos gases butano e propano realizadas no período de janeiro a outubro de 2002, cujo valor inscrito na CDA atingia, em 14.7.2010, R$125.972.024,97 (cento e vinte e cinco milhões, novecentos e setenta e dois mil, vinte e quatro reais e noventa e sete centavos).
ENTENDIMENTO DO RELATOR 2. O e. Ministro Relator negou provimento ao Recurso Especial, com base no entendimento de que a Lei 10.336/2001 e a Instrução Normativa SRF 107/2001, que a regulamentou, não se referem à tributação sobre os gases propano e butano, de modo que a IN SRF 219/2002, que passou a expressamente incluir tais derivados do petróleo, ofendeu o princípio da tipicidade fechada, previsto no art. 108, § 1º, do CTN.
EXEGESE DO ART. 3º, V, DA LEI 10.336/2001 INCONTROVERSA ENTRE AS PARTES 3. Prescreve o art. 3º, V, da Lei 10.336/2001: "A Cide tem como fatos geradores as operações, realizadas pelos contribuintes referidos no art. 2o, de importação e de comercialização no mercado interno de: (...) V - gás liqüefeito de petróleo, inclusive o derivado de gás natural e de nafta".
4. O termo "gás liquefeito de petróleo" a um só tempo designa gênero e espécie de derivado daquele tipo de combustível. A Nomenclatura Comum do Mercosul estabelece o código 2711 para o gênero "gás liquefeito de petróleo", prevendo os seguintes códigos para as espécies que importam no caso concreto: 2711.12.10 para o gás propano, 2711.13.10 para o gás butano e 2711.19.10 para o gás liquefeito do petróleo.
5. Já nos idos de 1990, o Gás Liquefeito de Petróleo vinha assim definido na Portaria 843/31.10.1990 do Ministério da Infraestrutura: "Art. 2º. Denomina-se Gás Liqüefeito de Petróleo (GLP) o conjunto de hidrocarbonetos com três ou quatro átomos de carbono (propano, propeno, butano e buteno), podendo apresentar-se isoladamente ou em mistura entre si e com pequenas frações de outros hidrocarbonetos, conforme norma ABNT NB-324".
6. Isso, por si só, já demonstra que todos os derivados acima integram o conceito de gás liquefeito de petróleo.
7. É interessante notar, de todo modo, que, embora a recorrida Petrobras afirme que "Gás liquefeito de petróleo" é exclusivamente o gás vulgarmente conhecido como "de cozinha", mantém em sua página eletrônica (internet) acesso a um manual de informações técnicas sobre o aludido produto, GLP, no qual esclarece expressamente na sua página 4, item 3, quais são os tipos de Gás liquefeito de petróleo: GLP, propano comercial, propano especial, butano comercial e butano especial. A informação pode ser obtida no endereço eletrônico http://sites.petrobras.com.br/minisite/assistenciatecnica/public/dow nloads/manual-tecnico-gas-liquefeito-petrobras-assistencia-tecnica-p etrobras.pdf.
8. De fato, não há lógica alguma em reduzir a interpretação do termo "Gás liquefeito de petróleo" apenas ao gás de cozinha. Fosse essa a intenção, caberia ao legislador, em respeito aos arts. 111, II, e 176 do CTN, fixar as condições para isenção tributária em relação às demais variedades integrantes do gênero GLP.
9. Em conclusão, a previsão especificada na IN SRF 219/2002 constitui ato normativo de conteúdo meramente explicativo, que não instituiu ou extinguiu tributo, mas apenas deu aplicabilidade integral ao art. 3º, V, da Lei 10.336/2001.
10. Se não houve violação ao princípio da legalidade, tampouco é possível cogitar de infringência à irretroatividade, pois o art. 16 da Lei 10.336/2001 define a sua entrada em vigor para o dia de sua publicação (20.12.2001), com a produção de efeitos a partir de 1º.1.2002. O art. 3º da IN SRF 219/10.10.2002, ao dispor que as alterações por ela promovidas produzem efeitos "para os fatos geradores ocorridos a partir de 1º de janeiro de 2002", naturalmente, nada mais faz além de repetir o disposto no art. 16 da Lei 10.336/2001.
11. Recurso Especial provido.
(REsp 1476051/PE, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, Rel. p/ Acórdão Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 23/02/2016, DJe 10/10/2016)
Ementa
PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. CONTRIBUIÇÃO DE INTERVENÇÃO NO DOMÍNIO ECONÔMICO. CIDE-COMBUSTÍVEIS. GÁS LIQUEFEITO DE PETRÓLEO (GLP). GÊNERO QUE ABRANGE AS ESPÉCIES BUTANO E PROPANO. INTELIGÊNCIA DO ART. 3º, V, DA LEI 10.336/2001.
HISTÓRICO DA DEMANDA 1. A questão controvertida diz respeito à autuação fiscal que acarretou o lançamento da Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (Cide) relativa às importações dos gases butano e propano realizadas no período de janeiro a outubro de 2002, cujo valor inscrito na CDA atingia, em 14.7.2010, R$125.972.024,97 (cento e vinte e cinco milhões, novecentos e setenta e dois mil, vinte e quatro reais e noventa e sete centavos).
ENTENDIMENTO DO RELATOR 2. O e. Ministro Relator negou provimento ao Recurso Especial, com base no entendimento de que a Lei 10.336/2001 e a Instrução Normativa SRF 107/2001, que a regulamentou, não se referem à tributação sobre os gases propano e butano, de modo que a IN SRF 219/2002, que passou a expressamente incluir tais derivados do petróleo, ofendeu o princípio da tipicidade fechada, previsto no art. 108, § 1º, do CTN.
EXEGESE DO ART. 3º, V, DA LEI 10.336/2001 INCONTROVERSA ENTRE AS PARTES 3. Prescreve o art. 3º, V, da Lei 10.336/2001: "A Cide tem como fatos geradores as operações, realizadas pelos contribuintes referidos no art. 2o, de importação e de comercialização no mercado interno de: (...) V - gás liqüefeito de petróleo, inclusive o derivado de gás natural e de nafta".
4. O termo "gás liquefeito de petróleo" a um só tempo designa gênero e espécie de derivado daquele tipo de combustível. A Nomenclatura Comum do Mercosul estabelece o código 2711 para o gênero "gás liquefeito de petróleo", prevendo os seguintes códigos para as espécies que importam no caso concreto: 2711.12.10 para o gás propano, 2711.13.10 para o gás butano e 2711.19.10 para o gás liquefeito do petróleo.
5. Já nos idos de 1990, o Gás Liquefeito de Petróleo vinha assim definido na Portaria 843/31.10.1990 do Ministério da Infraestrutura: "Art. 2º. Denomina-se Gás Liqüefeito de Petróleo (GLP) o conjunto de hidrocarbonetos com três ou quatro átomos de carbono (propano, propeno, butano e buteno), podendo apresentar-se isoladamente ou em mistura entre si e com pequenas frações de outros hidrocarbonetos, conforme norma ABNT NB-324".
6. Isso, por si só, já demonstra que todos os derivados acima integram o conceito de gás liquefeito de petróleo.
7. É interessante notar, de todo modo, que, embora a recorrida Petrobras afirme que "Gás liquefeito de petróleo" é exclusivamente o gás vulgarmente conhecido como "de cozinha", mantém em sua página eletrônica (internet) acesso a um manual de informações técnicas sobre o aludido produto, GLP, no qual esclarece expressamente na sua página 4, item 3, quais são os tipos de Gás liquefeito de petróleo: GLP, propano comercial, propano especial, butano comercial e butano especial. A informação pode ser obtida no endereço eletrônico http://sites.petrobras.com.br/minisite/assistenciatecnica/public/dow nloads/manual-tecnico-gas-liquefeito-petrobras-assistencia-tecnica-p etrobras.pdf.
8. De fato, não há lógica alguma em reduzir a interpretação do termo "Gás liquefeito de petróleo" apenas ao gás de cozinha. Fosse essa a intenção, caberia ao legislador, em respeito aos arts. 111, II, e 176 do CTN, fixar as condições para isenção tributária em relação às demais variedades integrantes do gênero GLP.
9. Em conclusão, a previsão especificada na IN SRF 219/2002 constitui ato normativo de conteúdo meramente explicativo, que não instituiu ou extinguiu tributo, mas apenas deu aplicabilidade integral ao art. 3º, V, da Lei 10.336/2001.
10. Se não houve violação ao princípio da legalidade, tampouco é possível cogitar de infringência à irretroatividade, pois o art. 16 da Lei 10.336/2001 define a sua entrada em vigor para o dia de sua publicação (20.12.2001), com a produção de efeitos a partir de 1º.1.2002. O art. 3º da IN SRF 219/10.10.2002, ao dispor que as alterações por ela promovidas produzem efeitos "para os fatos geradores ocorridos a partir de 1º de janeiro de 2002", naturalmente, nada mais faz além de repetir o disposto no art. 16 da Lei 10.336/2001.
11. Recurso Especial provido.
(REsp 1476051/PE, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, Rel. p/ Acórdão Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 23/02/2016, DJe 10/10/2016)Acórdão
Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima
indicadas, acordam os Ministros da SEGUNDA Turma do Superior
Tribunal de Justiça: "Prosseguindo-se no julgamento, após o
voto-vista do Sr. Ministro Mauro Campbell Marques, acompanhando a
divergência inaugurada pelo Sr. Ministro Herman Benjamin, dando
provimento ao recurso e o voto da Sra. Ministra Assusete Magalhães,
no mesmo sentido da divergência, a Turma, por maioria, deu
provimento ao recurso, nos termos do voto do Sr. Ministro Herman
Benjamin, que lavrará o acórdão. Vencido o Sr. Ministro Humberto
Martins."
Votaram com o Sr. Ministro Herman Benjamin o Sr. Ministro Mauro
Campbell Marques e a Sra. Ministra Assusete Magalhães (Presidente).
Não participou do julgamento a Sra. Ministra Diva Malerbi
(Desembargadora convocada do TRF da 3a. Região), nos termos do art.
162, § 4º, do RISTJ.
Data do Julgamento
:
23/02/2016
Data da Publicação
:
DJe 10/10/2016
Órgão Julgador
:
T2 - SEGUNDA TURMA
Relator(a)
:
Ministro HUMBERTO MARTINS (1130)
Relator a p acórdão
:
Ministro HERMAN BENJAMIN (1132)
Informações adicionais
:
(VOTO VENCIDO) (MIN. HUMBERTO MARTINS)
Não merece reforma o entendimento do Tribunal de origem no
sentido de que não pode ser cobrada a CIDE sobre a importação de gás
propano ou de gás butano, já que não há tal previsão na Lei
10.336/2001, abrangendo o texto legal apenas a incidência do tributo
sobre a importação de GLP. Isso porque, nos termos do § 1º do artigo
108 do CTN, o emprego da analogia não poderá resultar na exigência
de tributo não previsto em lei. Deve ser observado o princípio da
tipicidade fechada, de maneira que, sem lei expressa, não se pode
ampliar os elementos que formam o fato gerador.
Não é possível, em recurso especial, analisar as disposições
contidas nas Instruções Normativas SRF 107/2001 e 219/2002. Isso
porque se tratam de atos normativos secundários produzidos por
autoridades administrativas e não se enquadram no conceito de lei
federal previsto no artigo 105, inciso III, da Constituição Federal.
Referência legislativa
:
LEG:FED LEI:010336 ANO:2001 ART:00001 PAR:00001 INC:00001 INC:00002 INC:00003 ART:00003 INC:00005 ART:00016LEG:FED LEI:005172 ANO:1966***** CTN-66 CÓDIGO TRIBUTÁRIO NACIONAL ART:00108 PAR:00001LEG:FED INT:000107 ANO:2001(SECRETARIA DA RECEITA FEDERAL - SRF)LEG:FED INT:000219 ANO:2002 ART:00003(SECRETARIA DA RECEITA FEDERAL - SRF)LEG:FED PRT:000843 ANO:1990 ART:00002(MINISTÉRIO DA INFRAESTRUTURA - MI)LEG:FED NPF:****** ANO:1995(NORMA DE CLASSIFICAÇÃO DE MERCADORIAS - CAPÍTULO 27 - CÓDIGO 2711)LEG:FED CFB:****** ANO:1988***** CF-1988 CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988 ART:00105 INC:00003 LET:A
Veja
:
(VOTO VENCIDO - PRINCÍPIO DA TIPICIDADE FECHADA - COBRANÇA DETRIBUTO EXPRESSAMENTE PREVISTO EM LEI) STJ - REsp 816512-PI(VOTO VENCIDO - RECURSO ESPECIAL - ANÁLISE DE INSTRUÇÕES NORMATIVAS- NÃO ENQUADRAMENTO NO CONCEITO DE LEI FEDERAL) STJ - AgRg no REsp 933351-RS, REsp 759714-RS, AgRg no REsp 763227-SC, EDcl no Ag 1397926-PR
Sucessivos
:
EDcl no REsp 1476051 PE 2014/0211278-1 Decisão:21/02/2017
DJe DATA:27/04/2017
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