REsp 1512647 / MGRECURSO ESPECIAL2013/0162883-2
DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. VIOLAÇÃO DE DIREITOS AUTORAIS.
REDE SOCIAL. ORKUT. RESPONSABILIDADE CIVIL DO PROVEDOR (ADMINISTRADOR). INEXISTÊNCIA, NO CASO CONCRETO. ESTRUTURA DA REDE E COMPORTAMENTO DO PROVEDOR QUE NÃO CONTRIBUÍRAM PARA A VIOLAÇÃO DE DIREITOS AUTORAIS. RESPONSABILIDADES CONTRIBUTIVA E VICÁRIA. NÃO APLICAÇÃO. INEXISTÊNCIA DE DANOS QUE POSSAM SER EXTRAÍDOS DA CAUSA DE PEDIR. OBRIGAÇÃO DE FAZER. INDICAÇÃO DE URL'S. NECESSIDADE.
APONTAMENTO DOS IP'S. OBRIGAÇÃO DO PROVEDOR. ASTREINTES. VALOR.
AJUSTE.
1. Os arts. 102 a 104 da Lei n. 9.610/1998 atribuem responsabilidade civil por violação de direitos autorais a quem fraudulentamente "reproduz, divulga ou de qualquer forma utiliza" obra de titularidade de outrem; a quem "editar obra literária, artística ou científica" ou a quem "vender, expuser a venda, ocultar, adquirir, distribuir, tiver em depósito ou utilizar obra ou fonograma reproduzidos com fraude, com a finalidade de vender, obter ganho, vantagem, proveito, lucro direto ou indireto, para si ou para outrem".
2. Em se tratando de provedor de internet comum, como os administradores de rede social, não é óbvia a inserção de sua conduta regular em algum dos verbos constantes nos arts. 102 a 104 da Lei de Direitos Autorais. Há que investigar como e em que medida a estrutura do provedor de internet ou sua conduta culposa ou dolosamente omissiva contribuíram para a violação de direitos autorais.
3. No direito comparado, a responsabilidade civil de provedores de internet por violações de direitos autorais praticadas por terceiros tem sido reconhecida a partir da ideia de responsabilidade contributiva e de responsabilidade vicária, somada à constatação de que a utilização de obra protegida não consubstanciou o chamado fair use.
4. Reconhece-se a responsabilidade contributiva do provedor de internet, no cenário de violação de propriedade intelectual, nas hipóteses em que há intencional induzimento ou encorajamento para que terceiros cometam diretamente ato ilícito. A responsabilidade vicária tem lugar nos casos em que há lucratividade com ilícitos praticados por outrem e o beneficiado se nega a exercer o poder de controle ou de limitação dos danos, quando poderia fazê-lo.
5. No caso em exame, a rede social em questão não tinha como traço fundamental o compartilhamento de obras, prática que poderia ensejar a distribuição ilegal de criações protegidas. Conforme constatado por prova pericial, a arquitetura do Orkut não provia materialmente os usuários com os meios necessários à violação de direitos autorais. O ambiente virtual não constituía suporte essencial à pratica de atos ilícitos, como ocorreu nos casos julgados no direito comparado, em que provedores tinham estrutura substancialmente direcionada à violação da propriedade intelectual. Descabe, portanto, a incidência da chamada responsabilidade contributiva.
6. Igualmente, não há nos autos comprovação de ter havido lucratividade com ilícitos praticados por usuários em razão da negativa de o provedor exercer o poder de controle ou de limitação dos danos, quando poderia fazê-lo, do que resulta a impossibilidade de aplicação da chamada teoria da responsabilidade vicária.
7. Ademais, não há danos materiais que possam ser imputados à inércia do provedor de internet, nos termos da causa de pedir. Ato ilícito futuro não pode acarretar ou justificar dano pretérito. Se houve omissão culposa, são os danos resultantes dessa omissão que devem ser recompostos, descabendo o ressarcimento, pela Google, de eventuais prejuízos que a autora já vinha experimentando antes mesmo de proceder à notificação.
8. Quanto à obrigação de fazer - retirada de páginas da rede social indicada -, a parte autora também juntou à inicial outros documentos que contêm, de forma genérica, URLs de comunidades virtuais, sem a indicação precisa do endereço interno das páginas nas quais os atos ilícitos estariam sendo praticados. Nessas circunstâncias, a jurisprudência da Segunda Seção afasta a obrigação do provedor, nos termos do que ficou decidido na Rcl 5.072/AC, Rel. p/ acórdão Ministra NANCY ANDRIGHI, DJe 4/6/2014.
9. A responsabilidade dos provedores de internet, quanto a conteúdo ilícito veiculado em seus sites, envolve também a indicação dos autores da informação (IPs).
10. Nos termos do art. 461, §§ 5º e 6º, do CPC, pode o magistrado a qualquer tempo, e mesmo de ofício, alterar o valor ou a periodicidade das astreintes em caso de ineficácia ou insuficiência ao desiderato de compelir o devedor ao cumprimento da obrigação.
Valor da multa cominatória ajustado às peculiaridades do caso concreto.
11. "Embargos de declaração manifestados com notório propósito de prequestionamento não têm caráter protelatório" (Súmula n. 98/STJ).
12. Recurso especial parcialmente provido.
(REsp 1512647/MG, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 13/05/2015, DJe 05/08/2015)
Ementa
DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. VIOLAÇÃO DE DIREITOS AUTORAIS.
REDE SOCIAL. ORKUT. RESPONSABILIDADE CIVIL DO PROVEDOR (ADMINISTRADOR). INEXISTÊNCIA, NO CASO CONCRETO. ESTRUTURA DA REDE E COMPORTAMENTO DO PROVEDOR QUE NÃO CONTRIBUÍRAM PARA A VIOLAÇÃO DE DIREITOS AUTORAIS. RESPONSABILIDADES CONTRIBUTIVA E VICÁRIA. NÃO APLICAÇÃO. INEXISTÊNCIA DE DANOS QUE POSSAM SER EXTRAÍDOS DA CAUSA DE PEDIR. OBRIGAÇÃO DE FAZER. INDICAÇÃO DE URL'S. NECESSIDADE.
APONTAMENTO DOS IP'S. OBRIGAÇÃO DO PROVEDOR. ASTREINTES. VALOR.
AJUSTE.
1. Os arts. 102 a 104 da Lei n. 9.610/1998 atribuem responsabilidade civil por violação de direitos autorais a quem fraudulentamente "reproduz, divulga ou de qualquer forma utiliza" obra de titularidade de outrem; a quem "editar obra literária, artística ou científica" ou a quem "vender, expuser a venda, ocultar, adquirir, distribuir, tiver em depósito ou utilizar obra ou fonograma reproduzidos com fraude, com a finalidade de vender, obter ganho, vantagem, proveito, lucro direto ou indireto, para si ou para outrem".
2. Em se tratando de provedor de internet comum, como os administradores de rede social, não é óbvia a inserção de sua conduta regular em algum dos verbos constantes nos arts. 102 a 104 da Lei de Direitos Autorais. Há que investigar como e em que medida a estrutura do provedor de internet ou sua conduta culposa ou dolosamente omissiva contribuíram para a violação de direitos autorais.
3. No direito comparado, a responsabilidade civil de provedores de internet por violações de direitos autorais praticadas por terceiros tem sido reconhecida a partir da ideia de responsabilidade contributiva e de responsabilidade vicária, somada à constatação de que a utilização de obra protegida não consubstanciou o chamado fair use.
4. Reconhece-se a responsabilidade contributiva do provedor de internet, no cenário de violação de propriedade intelectual, nas hipóteses em que há intencional induzimento ou encorajamento para que terceiros cometam diretamente ato ilícito. A responsabilidade vicária tem lugar nos casos em que há lucratividade com ilícitos praticados por outrem e o beneficiado se nega a exercer o poder de controle ou de limitação dos danos, quando poderia fazê-lo.
5. No caso em exame, a rede social em questão não tinha como traço fundamental o compartilhamento de obras, prática que poderia ensejar a distribuição ilegal de criações protegidas. Conforme constatado por prova pericial, a arquitetura do Orkut não provia materialmente os usuários com os meios necessários à violação de direitos autorais. O ambiente virtual não constituía suporte essencial à pratica de atos ilícitos, como ocorreu nos casos julgados no direito comparado, em que provedores tinham estrutura substancialmente direcionada à violação da propriedade intelectual. Descabe, portanto, a incidência da chamada responsabilidade contributiva.
6. Igualmente, não há nos autos comprovação de ter havido lucratividade com ilícitos praticados por usuários em razão da negativa de o provedor exercer o poder de controle ou de limitação dos danos, quando poderia fazê-lo, do que resulta a impossibilidade de aplicação da chamada teoria da responsabilidade vicária.
7. Ademais, não há danos materiais que possam ser imputados à inércia do provedor de internet, nos termos da causa de pedir. Ato ilícito futuro não pode acarretar ou justificar dano pretérito. Se houve omissão culposa, são os danos resultantes dessa omissão que devem ser recompostos, descabendo o ressarcimento, pela Google, de eventuais prejuízos que a autora já vinha experimentando antes mesmo de proceder à notificação.
8. Quanto à obrigação de fazer - retirada de páginas da rede social indicada -, a parte autora também juntou à inicial outros documentos que contêm, de forma genérica, URLs de comunidades virtuais, sem a indicação precisa do endereço interno das páginas nas quais os atos ilícitos estariam sendo praticados. Nessas circunstâncias, a jurisprudência da Segunda Seção afasta a obrigação do provedor, nos termos do que ficou decidido na Rcl 5.072/AC, Rel. p/ acórdão Ministra NANCY ANDRIGHI, DJe 4/6/2014.
9. A responsabilidade dos provedores de internet, quanto a conteúdo ilícito veiculado em seus sites, envolve também a indicação dos autores da informação (IPs).
10. Nos termos do art. 461, §§ 5º e 6º, do CPC, pode o magistrado a qualquer tempo, e mesmo de ofício, alterar o valor ou a periodicidade das astreintes em caso de ineficácia ou insuficiência ao desiderato de compelir o devedor ao cumprimento da obrigação.
Valor da multa cominatória ajustado às peculiaridades do caso concreto.
11. "Embargos de declaração manifestados com notório propósito de prequestionamento não têm caráter protelatório" (Súmula n. 98/STJ).
12. Recurso especial parcialmente provido.
(REsp 1512647/MG, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 13/05/2015, DJe 05/08/2015)Acórdão
Prosseguindo o julgamento, após o voto-vista antecipado da Sra.
Ministra Maria Isabel Gallotti dando parcial provimento ao recurso
especial em maior extensão, e a adequação do voto do Sr. Ministro
Relator para acompanhar esse entendimento, a Segunda Seção, por
unanimidade, deu parcial provimento ao recurso especial, nos termos
do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Paulo de Tarso
Sanseverino, Maria Isabel Gallotti (voto-vista), Antonio Carlos
Ferreira, Ricardo Villas Bôas Cueva, Marco Buzzi, Marco Aurélio
Bellizze, Moura Ribeiro e João Otávio de Noronha votaram com o Sr.
Ministro Relator.
Presidiu o julgamento o Sr. Ministro Raul Araújo.
Data do Julgamento
:
13/05/2015
Data da Publicação
:
DJe 05/08/2015RMP vol. 58 p. 371
Órgão Julgador
:
S2 - SEGUNDA SEÇÃO
Relator(a)
:
Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO (1140)
Informações adicionais
:
"[...]o montante da multa cominatória deve guardar
proporcionalidade com o valor da obrigação principal cujo
cumprimento se busca, sob pena de a parcela pecuniária ser mais
atrativa ao credor que a própria tutela específica".
Referência legislativa
:
LEG:FED LEI:012965 ANO:2014***** INTER-14 MARCO CIVIL DA INTERNET ART:00019 PAR:00001LEG:FED LEI:009610 ANO:1998***** LDA-98 LEI DOS DIREITOS AUTORAIS ART:00102 ART:00104LEG:FED LEI:005869 ANO:1973***** CPC-73 CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 1973 ART:00461 PAR:00006
Veja
:
(REPARAÇÃO CIVIL - PROVEDORES DE INTERNET - RESPONSABILIDADE PORMENSAGENS POSTADAS EM SEUS SITES) STJ - REsp 1501187-RJ, REsp 1337990-SP(OBRIGAÇÃO DE FAZER - PROVEDOR DE INTERNET - RETIRADA DE PÁGINA DOAR - INDICAÇÃO IMPRECISA DA "URL") STJ - Rcl 5072-AC(RESPONSABILIDADE - PROVEDOR DE INTERNET - CONTEÚDO VINCULADO EMSEUS SITES - INDICAÇÃO DOS AUTORES DA INFORMAÇÃO) STJ - REsp 1306157-SP, REsp 1308830-RS(ASTREINTES - REEXAME A QUALQUER TEMPO - PROPORCIONALIDADE) STJ - AgRg no AREsp 246755-MG, AgRg no AREsp 363280-RS
Mostrar discussão