REsp 1528524 / PERECURSO ESPECIAL2015/0080662-2
PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. VIOLAÇÃO AO ART. 535 DO CPC. NÃO OCORRÊNCIA. MULTA POR DESCUMPRIMENTO DE OBRIGAÇÃO ACESSÓRIA. ART. 80 DA LEI Nº 4.502/64. PRAZO DECADENCIAL DO ART. 173, I, DO CTN.
DECADÊNCIA. NÃO OCORRÊNCIA. IPI. SAÍDA DO PRODUTO DO ESTABELECIMENTO COM SUSPENSÃO DO TRIBUTO. DECLARAÇÃO EMITIDA PELO ADQUIRENTE.
AUSÊNCIA DE RESPONSABILIDADE DO VENDEDOR. INTELIGÊNCIA DO ART. 29 DA LEI Nº 10.637/02.
1. Discute-se nos autos a possibilidade de responsabilizar o vendedor pela utilização indevida do regime de suspensão do IPI, quando a empresa adquirente, embora apresente a declaração legalmente exigida de que faz jus ao benefício (art. 29, § 7º, II, da Lei nº 10.637), não preenche os requisitos legais para tanto.
2. Ausência de ofensa ao art. 535 do CPC, tendo em vista que o acórdão recorrido enfrentou a matéria posta em debate na medida necessária para o deslinde da controvérsia, havendo manifestação expressa quanto aos motivos pelos quais não se reconheceu a decadência do lançamento efetuado na hipótese. Não há que se falar, portanto, em negativa de prestação jurisdicional, visto que tal somente se configura quando, na apreciação de recurso, o órgão julgador insiste em omitir pronunciamento sobre questão que deveria ser decidida, e não foi.
3. O presente recurso não discute crédito tributário de IPI, cujo pagamento antecipado atrairia a aplicação do art. 150, § 4º, do CTN, para fins de contagem do prazo decadencial para lançamento de eventual diferença recolhida a menor. Ao contrário, depreende-se dos autos que sequer houve pagamento de IPI na hipótese, tendo em vista que as notas fiscais objeto da autuação cuidam de mercadorias remetidas com suspensão do tributo, na forma do art. 29 da Lei nº 10.637/02, e, também, porque o acórdão recorrido afirmou que ao final da reconstituição da escrita fiscal do IPI, com a adição dos débitos apurados pelas saídas com suspensão do imposto, tida por indevida, não surgiram saldos devedores a cobrar por conta de os saldos credores superarem os valores dos débitos escriturados e apurados.
4. O crédito tributário objeto do presente feito se refere à multa aplicada com base no art. 80 da Lei nº 4.502/64, por falta de lançamento do valor do IPI na respectiva nota fiscal, tratando-se, portanto, de obrigação acessória, cuja constituição se sujeita ao lançamento de ofício previsto no art. 149 do CTN e atrai a regra do art. 173, I, do CTN, para fins de contagem do prazo decadencial.
5. Os fatos geradores da obrigação acessória ocorreram no período de abril a setembro de 2004 e o prazo decadencial para o lançamento de ofício do respectivo crédito teve inicio em 1º de janeiro de 2005, de forma que o lançamento ocorrido em outubro de 2009 não foi atingido pela decadência, haja vista ter sido efetivado antes do decurso do prazo quinquenal de que trata o art. 173, caput, e inciso I, do CTN.
6. O inciso II do § 7º do art. 29 da Lei nº 10.637/02 incumbiu as empresas adquirentes da obrigação de declarar ao vendedor, de forma expressa e sob as penas da lei, que atende a todos os requisitos estabelecidos.
7. No regime de suspensão do IPI, nem a lei de regência, nem a legislação complementar tributária delegaram ao vendedor a incumbência de verificar a veracidade da declaração prestada pelo adquirente, de forma que não pode a autoridade fiscal responsabilizar o vendedor por não ter adotado cautelas para conferir se o estabelecimento adquirente atendia ou não aos requisitos para o gozo do benefício. É que não cabe a atribuição de outros encargos à empresa vendedora, se não há normativa expressa nesse sentido. Com efeito, as obrigações acessórias decorrem da legislação tributária (art. 113, § 3º, CTN), não podendo o Fisco exigir outras prestações que ache necessárias se não há amparo na legislação tributária (leis, tratados ou convenções internacionais, decretos e normas complementares - art. 96 do CTN).
8. Os contratantes são obrigados a guardar, assim na conclusão do contrato, como em sua execução, os princípios de probidade e boa-fé (art. 422 do Código Civil), de forma que a celebração de negócio jurídico pressupõe a confiança no comportamento legítimo das partes, de modo que se uma delas se conduz de forma indevida ou ilegal, quebrando a confiança que lhe foi depositada, a parte que atuou segundo o princípio da boa-fé objetiva não pode ser penalizada pelo comportamento antijurídico da outra, sob pena de subverter a própria atividade comercial e, em última análise, o vetusto conceito de justiça segundo o qual se deve dar a cada um o que lhe é devido, inclusive em relação à distribuição equânime dos ônus que devem ser imputados a cada parte.
9. Recurso especial conhecido e parcialmente provido para desconstituir o crédito tributário e anular o auto de infração que aplicou à recorrente a multa prevista no art. 80 da Lei nº 4.502/64.
(REsp 1528524/PE, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 18/08/2015, DJe 28/08/2015)
Ementa
PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. VIOLAÇÃO AO ART. 535 DO CPC. NÃO OCORRÊNCIA. MULTA POR DESCUMPRIMENTO DE OBRIGAÇÃO ACESSÓRIA. ART. 80 DA LEI Nº 4.502/64. PRAZO DECADENCIAL DO ART. 173, I, DO CTN.
DECADÊNCIA. NÃO OCORRÊNCIA. IPI. SAÍDA DO PRODUTO DO ESTABELECIMENTO COM SUSPENSÃO DO TRIBUTO. DECLARAÇÃO EMITIDA PELO ADQUIRENTE.
AUSÊNCIA DE RESPONSABILIDADE DO VENDEDOR. INTELIGÊNCIA DO ART. 29 DA LEI Nº 10.637/02.
1. Discute-se nos autos a possibilidade de responsabilizar o vendedor pela utilização indevida do regime de suspensão do IPI, quando a empresa adquirente, embora apresente a declaração legalmente exigida de que faz jus ao benefício (art. 29, § 7º, II, da Lei nº 10.637), não preenche os requisitos legais para tanto.
2. Ausência de ofensa ao art. 535 do CPC, tendo em vista que o acórdão recorrido enfrentou a matéria posta em debate na medida necessária para o deslinde da controvérsia, havendo manifestação expressa quanto aos motivos pelos quais não se reconheceu a decadência do lançamento efetuado na hipótese. Não há que se falar, portanto, em negativa de prestação jurisdicional, visto que tal somente se configura quando, na apreciação de recurso, o órgão julgador insiste em omitir pronunciamento sobre questão que deveria ser decidida, e não foi.
3. O presente recurso não discute crédito tributário de IPI, cujo pagamento antecipado atrairia a aplicação do art. 150, § 4º, do CTN, para fins de contagem do prazo decadencial para lançamento de eventual diferença recolhida a menor. Ao contrário, depreende-se dos autos que sequer houve pagamento de IPI na hipótese, tendo em vista que as notas fiscais objeto da autuação cuidam de mercadorias remetidas com suspensão do tributo, na forma do art. 29 da Lei nº 10.637/02, e, também, porque o acórdão recorrido afirmou que ao final da reconstituição da escrita fiscal do IPI, com a adição dos débitos apurados pelas saídas com suspensão do imposto, tida por indevida, não surgiram saldos devedores a cobrar por conta de os saldos credores superarem os valores dos débitos escriturados e apurados.
4. O crédito tributário objeto do presente feito se refere à multa aplicada com base no art. 80 da Lei nº 4.502/64, por falta de lançamento do valor do IPI na respectiva nota fiscal, tratando-se, portanto, de obrigação acessória, cuja constituição se sujeita ao lançamento de ofício previsto no art. 149 do CTN e atrai a regra do art. 173, I, do CTN, para fins de contagem do prazo decadencial.
5. Os fatos geradores da obrigação acessória ocorreram no período de abril a setembro de 2004 e o prazo decadencial para o lançamento de ofício do respectivo crédito teve inicio em 1º de janeiro de 2005, de forma que o lançamento ocorrido em outubro de 2009 não foi atingido pela decadência, haja vista ter sido efetivado antes do decurso do prazo quinquenal de que trata o art. 173, caput, e inciso I, do CTN.
6. O inciso II do § 7º do art. 29 da Lei nº 10.637/02 incumbiu as empresas adquirentes da obrigação de declarar ao vendedor, de forma expressa e sob as penas da lei, que atende a todos os requisitos estabelecidos.
7. No regime de suspensão do IPI, nem a lei de regência, nem a legislação complementar tributária delegaram ao vendedor a incumbência de verificar a veracidade da declaração prestada pelo adquirente, de forma que não pode a autoridade fiscal responsabilizar o vendedor por não ter adotado cautelas para conferir se o estabelecimento adquirente atendia ou não aos requisitos para o gozo do benefício. É que não cabe a atribuição de outros encargos à empresa vendedora, se não há normativa expressa nesse sentido. Com efeito, as obrigações acessórias decorrem da legislação tributária (art. 113, § 3º, CTN), não podendo o Fisco exigir outras prestações que ache necessárias se não há amparo na legislação tributária (leis, tratados ou convenções internacionais, decretos e normas complementares - art. 96 do CTN).
8. Os contratantes são obrigados a guardar, assim na conclusão do contrato, como em sua execução, os princípios de probidade e boa-fé (art. 422 do Código Civil), de forma que a celebração de negócio jurídico pressupõe a confiança no comportamento legítimo das partes, de modo que se uma delas se conduz de forma indevida ou ilegal, quebrando a confiança que lhe foi depositada, a parte que atuou segundo o princípio da boa-fé objetiva não pode ser penalizada pelo comportamento antijurídico da outra, sob pena de subverter a própria atividade comercial e, em última análise, o vetusto conceito de justiça segundo o qual se deve dar a cada um o que lhe é devido, inclusive em relação à distribuição equânime dos ônus que devem ser imputados a cada parte.
9. Recurso especial conhecido e parcialmente provido para desconstituir o crédito tributário e anular o auto de infração que aplicou à recorrente a multa prevista no art. 80 da Lei nº 4.502/64.
(REsp 1528524/PE, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 18/08/2015, DJe 28/08/2015)Acórdão
Vistos, relatados e discutidos esses autos em que são partes as
acima indicadas, acordam os Ministros da SEGUNDA TURMA do Superior
Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas
taquigráficas, o seguinte resultado de julgamento:
"A Turma, por unanimidade, deu parcial provimento ao recurso, nos
termos do voto do(a) Sr(a). Ministro(a)-Relator(a)."
A Sra. Ministra Assusete Magalhães, os Srs. Ministros Humberto
Martins, Herman Benjamin e Og Fernandes votaram com o Sr. Ministro
Relator.
Presidiu o julgamento o Sr. Ministro Og Fernandes.
Data do Julgamento
:
18/08/2015
Data da Publicação
:
DJe 28/08/2015
Órgão Julgador
:
T2 - SEGUNDA TURMA
Relator(a)
:
Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES (1141)
Palavras de resgate
:
IMPOSTO SOBRE PRODUTOS INDUSTRIALIZADOS (IPI).
Referência legislativa
:
LEG:FED LEI:005869 ANO:1973***** CPC-73 CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 1973 ART:00535LEG:FED LEI:005172 ANO:1966***** CTN-66 CÓDIGO TRIBUTÁRIO NACIONAL ART:00096 ART:00113 PAR:00003 ART:00149 ART:00173 INC:00001LEG:FED LEI:010406 ANO:2002***** CC-02 CÓDIGO CIVIL DE 2002 ART:00422LEG:FED LEI:004502 ANO:1964 ART:00080LEG:FED LEI:010637 ANO:2002 ART:00029 PAR:00007 INC:00002LEG:FED INT:000296 ANO:2003 ART:00023 INC:00001(SECRETARIA DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL - SRFB)
Veja
:
(FUNDAMENTAÇÃO DA DECISÃO - TESES VENTILADAS PELAS PARTES - LIVRECONVENCIMENTO DO MAGISTRADO) STJ - AgRg no AREsp 107884-RS(ARGUMENTOS TRAZIDOS PELA PARTE - DESNECESSIDADE DE O MAGISTRADOREBATER TODOS UM A UM) STJ - EDcl no AgRg no AREsp 195246-BA(FUNDAMENTAÇÃO CONTRÁRIA AO INTERESSE DA PARTE - AUSÊNCIA DEOMISSÃO) STJ - REsp 686631-SP, REsp 459349-MG(OBRIGAÇÃO ACESSÓRIA - CONTAGEM DO PRAZO DECADENCIAL) STJ - EDcl no REsp 1384832-RN
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