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Jurisprudência


REsp 1578479 / SCRECURSO ESPECIAL2016/0022584-0

Ementa
RECURSO ESPECIAL. CARTÃO DE CRÉDITO. CLONAGEM. FALSIFICAÇÃO DE DOCUMENTO. TIPICIDADE. FATO COMETIDO ANTES DA ENTRADA EM VIGOR DA LEI N. 12.737/2012. INSERÇÃO DO PARÁGRAFO ÚNICO AO ART. 298 DO CÓDIGO PENAL. ELEMENTO NORMATIVO "DOCUMENTO". LEI INTERPRETATIVA QUE EXPLICITOU O ENTENDIMENTO JURISPRUDENCIAL JÁ CONSOLIDADO. RECURSO PROVIDO. 1. O tipo previsto no art. 298 do Código Penal descreve o elemento normativo "documento", a implicar uma atitude especial do intérprete, exigindo-lhe um pouco mais que a simples percepção de sentidos, delimitando-se o alcance e o sentido do texto legal existente. 2. A jurisprudência, antes da entrada em vigor da Lei n. 12.737/2012, passou ao largo do assento discutido neste caso (se a falsificação de cartão de crédito poderia se enquadrar como falsificação de documento particular). A presença do elemento normativo "documento" possibilitou ao aplicador da lei compreender que o cartão de crédito ou bancário enquadrar-se-ia no conceito de documento particular, para fins de tipificação da conduta, principalmente porque dele constam dados pessoais do titular e da própria instituição financeira (inclusive na tarja magnética) e que são passíveis de falsificação. Isso pode ser constatado pelo fato de os inúmeros processos que aportaram nesta Corte antes da edição da referida lei e que tratavam de falsificação de documento particular em casos de "clonagem" de cartão de crédito não haverem reconhecido a atipicidade da conduta. 3. Assim, a inserção do parágrafo único ao art. 298 do Código Penal apenas ratificou e tornou explícito o entendimento jurisprudencial da época, relativamente ao alcance do elemento normativo "documento", clarificando que cartão de crédito é considerado documento. Não houve, portanto, uma ruptura conceitual que justificasse considerar, somente a partir da edição da Lei n. 12.737/2012, cartão de crédito ou de débito como documento. Seria incongruente, a prevalecer a tese da atipicidade anterior à referida lei, reconhecer que todos os casos anteriores assim definidos pela jurisprudência, por meio de legítima valoração de elemento normativo, devam ser desconstituídos justamente em face da edição de uma lei interpretativa que veio em apoio à própria jurisprudência já então dominante. 4. Recurso especial provido. (REsp 1578479/SC, Rel. Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, Rel. p/ Acórdão Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, SEXTA TURMA, julgado em 02/08/2016, DJe 03/10/2016)
Acórdão
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da Sexta Turma, prosseguindo no julgamento após o voto-vista antecipado do Sr. Ministro Rogerio Schietti Cruz dando provimento ao recurso especial, no que foi acompanhado pelos Srs. Ministros Nefi Cordeiro e Antonio Saldanha Palheiro, e o voto do Sr. Ministro Sebastião Reis Júnior negando provimento ao recurso especial, por maioria, dar provimento ao recurso, nos termos do voto do Sr. Ministro Rogerio Schietti Cruz, que lavrará o acórdão. Vencidos a Sra. Ministra Relatora e o Sr. Ministro Sebastião Reis Júnior. Votaram com o Sr. Ministro Rogerio Schietti Cruz os Srs. Ministros Nefi Cordeiro e Antonio Saldanha Palheiro.

Data do Julgamento : 02/08/2016
Data da Publicação : DJe 03/10/2016
Órgão Julgador : T6 - SEXTA TURMA
Relator(a) : Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA (1131)
Relator a p acórdão : Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ (1158)
Informações adicionais : "Em regra, prevalece a irretroatividade da lei nova - não há, portanto, efeitos pretéritos e só vale para o futuro -, em homenagem à segurança jurídica e, consequentemente, à segurança do indivíduo e da sociedade, evitando-se o caos nas relações jurídicas, fruto de uma instabilidade provocada por alterações repentinas da legislação ou de regras no julgamento. [...] Tal raciocínio, porém, se considerado isoladamente, conduziria à ideia de que a previsão contida no parágrafo único do art. 298 do Código Penal não poderia retroagir e, nesse ponto, surgiria um imbróglio, na medida em que a jurisprudência nunca oscilou quanto ao reconhecimento de que cartão de crédito é documento para fins do 'caput' do referido artigo. [...] a jurisprudência era uníssona em reconhecer que cartão de crédito era documento para fins do 'caput' do art. 298 do Código Penal, o que implica dizer que a Lei n. 12.737/2012 apenas reproduziu, com palavras mais inequívocas, a jurisprudência daquela época, tratando-se, portanto, de lei interpretativa exemplificativa, porquanto o conceito de 'documento' previsto no caput não deixou de conter outras interpretações possíveis". (VOTO VENCIDO) (MIN. MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA) "[...] o cartão de crédito ou débito não se enquadra no conceito de documento de que cuida o 'caput' do artigo 298 do Código Penal, eis que não se trata de escrito destinado a exposição de fato ou declaração de vontade, constituindo um meio de pagamento à vista ou parcelado de produtos e serviços [...]". "[...] a inclusão, pela Lei n° 12.737/2012, do parágrafo único ao artigo 298 do Código Penal não teve intuito meramente exemplificativo ao equiparar cartão de crédito e débito a documento particular. Na verdade, objetivou o legislador tipificar condutas que anteriormente constituíam meros atos preparatórios para a prática de delitos patrimoniais, tais como o estelionato e outros, passando a constituir a falsificação dos referidos cartões um delito de perigo abstrato equiparado ao de falsificação de documento particular". "Em sendo assim, há de ser mantido o acórdão recorrido, que absolveu o recorrido por atipicidade de conduta praticada no ano de 2007, uma vez que 'antes da Lei n° 12.737 o cartão de crédito não era considerado documento particular para fins penais', tratando-se de norma que só pode ser aplicada aos fatos ocorridos após sua vigência, em atenção ao princípio da irretroatividade da lei penal mais gravosa".
Referência legislativa : LEG:FED DEL:002848 ANO:1940***** CP-40 CÓDIGO PENAL ART:00298 PAR:ÚNICO(ARTIGO 298, PARÁGRAFO ÚNICO, COM A REDAÇÃO DADA PELA LEI12.737/2012)LEG:FED LEI:012737 ANO:2012LEG:FED LEI:012527 ANO:2011***** LAI-11 LEI DE ACESSO À INFORMAÇÃO ART:00004 INC:00002
Veja : (CLONAGEM DE CARTÃO DE CRÉDITO - FATO ANTERIOR À LEI 12.737/2012 -FALSIFICAÇÃO DE DOCUMENTO PARTICULAR) STJ - HC 116356-GO, RHC 19936-RJ, RHC 13415-CE, HC 27520-GO STF - HC 102971, HC 82582
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