REsp 1595018 / RJRECURSO ESPECIAL2015/0078685-1
RECURSO ESPECIAL DAS CONCESSIONÁRIAS. ADMINISTRATIVO E CONSUMIDOR.
AÇÃO CIVIL PÚBLICA. CONCESSÃO DE TRANSPORTE COLETIVO MUNICIPAL. LEI BRASILEIRA DE INCLUSÃO DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA (LEI N.
13.146/2015). ACESSIBILIDADE. RECONFIGURAÇÃO DOS ÔNIBUS PARA RESERVA DE ASSENTOS PREFERENCIAIS ANTES DA ROLETA. RESPONSABILIDADE OPERACIONAL E LEGAL DA CONCESSIONÁRIA PELOS SERVIÇOS PÚBLICOS PRESTADOS QUANTO À ADEQUAÇÃO, EFICIÊNCIA, SEGURANÇA E, SE ESSENCIAIS, CONTINUIDADE (ART. 22, CAPUT E PARÁGRAFO ÚNICO, DO CDC).
ALEGAÇÃO DE NECESSIDADE DE MANUTENÇÃO DO EQUILÍBRIO ECONÔMICO-FINANCEIRO DO CONTRATO. NÃO DEMONSTRAÇÃO.
1. Na origem, o Instituto Brasileiro de Direitos da Pessoa com Deficiência - IBDD, ora recorrido, ajuizou ação civil pública contra concessionárias de transporte coletivo municipal e o Município do Rio de Janeiro, ora recorrentes. O IBDD pleiteia a condenação das concessionárias em obrigação de fazer consistente na imediata reconfiguração interna de todos os ônibus urbanos da cidade do Rio de Janeiro para acessibilidade das pessoas com deficiência, reservando-se assentos especiais antes da roleta (dois de cada lado), nos termos da legislação vigente, sob pena de multa em favor da entidade autora de 5 (cinco) cadeiras de rodas por ônibus não adequado, cabendo ao Município o dever de fiscalizar.
2. A Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (Lei n.
13.146/2015) define acessibilidade como "possibilidade e condição de alcance para utilização, com segurança e autonomia, de espaços, mobiliários, equipamentos urbanos, edificações, transportes, informação e comunicação, inclusive seus sistemas e tecnologias, bem como de outros serviços e instalações abertos ao público, de uso público ou privados de uso coletivo, tanto na zona urbana como na rural, por pessoa com deficiência ou com mobilidade reduzida" (art.
3º, inc. I). E ainda: "A acessibilidade é direito que garante à pessoa com deficiência ou com mobilidade reduzida viver de forma independente e exercer seus direitos de cidadania e de participação social" (art. 53).
3. As concessionárias de transporte coletivo sujeitam-se à Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência, a qual, ao tratar do direito ao transporte da pessoa com deficiência ou mobilidade reduzida, estabelece a igualdade de acesso entre todos, vedando-se obstáculos e barreiras que impeçam ou dificultem o gozo desse direito (art. 46, §§ 1º e 2º, e art. 48 da Lei n. 13.146/2015).
4. Paralelamente ao contrato de prestação de serviço público celebrado com a Administração, as concessionárias de transporte coletivo também são fornecedoras no mercado de consumo, o que envolve a responsabilidade pelo fornecimento de serviços com adequação, eficiência, segurança e, se essenciais, continuidade (art. 22, caput e parágrafo único, do CDC).
5. No tocante à invocação da teoria da imprevisão pelas concessionárias a gerar o desequilíbrio contratual, o edital e o contrato de concessão devem conter regras claras quanto ao preço do serviço e os critérios para reajuste e revisão tarifária, considerando-se mantido o equilíbrio econômico-financeiro, nos termos do art. 10 da Lei de Concessões, sempre que atendidas as condições do contrato.
6. A necessidade de manutenção do equilíbrio econômico-financeiro do contrato não justifica o afastamento do dever de observância das obrigações constitucionais e infraconstitucionais impostas às concessionárias de transporte público, de modo que eventual inviabilidade de adimplemento contratual deve ser efetivamente demonstrada na via própria.
Recurso especial das concessionárias improvido.
RECURSO ESPECIAL DO MUNICÍPIO DO RIO DE JANEIRO. PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. CONCESSÃO DE SERVIÇO PÚBLICO DE TRANSPORTE COLETIVO MUNICIPAL. ACESSIBILIDADE AOS DEFICIENTES FÍSICOS. RECONFIGURAÇÃO DA FROTA DE ÔNIBUS PARA RESERVA DE ASSENTOS PREFERENCIAIS ANTES DA ROLETA. INEXISTÊNCIA DE VÍCIOS NO ACÓRDÃO RECORRIDO. DEVER DE FISCALIZAÇÃO POR PARTE DO MUNICÍPIO. EXISTÊNCIA DE INTERESSE PÚBLICO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. ART. 18 DA LEI N.
7.347/1985.
1. Não há omissão no acórdão recorrido quando o Tribunal examina todas as questões levantadas pela parte, ainda que em sentido contrário ao pretendido.
2. Nos termos da Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência, compete ao gestor público responsável pela prestação do serviço emitir o certificado de acessibilidade às empresas de transporte coletivo de passageiros (art. 46, § 3º, da Lei n.
13.146/2015).
3. Ao delegar um serviço público mediante concessão, não deve o poder concedente se eximir de fiscalizar e exigir o cumprimento do contrato administrativo no qual é parte.
4. A isenção de honorários prevista no art. 18 da Lei n. 7.347/1985 aproveita somente ao autor da ação civil pública que não tenha agido de má-fé, não beneficiando o réu.
Recurso especial do Município do Rio de Janeiro parcialmente conhecido e, nessa parte, improvido.
(REsp 1595018/RJ, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, julgado em 18/08/2016, DJe 29/08/2016)
Ementa
RECURSO ESPECIAL DAS CONCESSIONÁRIAS. ADMINISTRATIVO E CONSUMIDOR.
AÇÃO CIVIL PÚBLICA. CONCESSÃO DE TRANSPORTE COLETIVO MUNICIPAL. LEI BRASILEIRA DE INCLUSÃO DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA (LEI N.
13.146/2015). ACESSIBILIDADE. RECONFIGURAÇÃO DOS ÔNIBUS PARA RESERVA DE ASSENTOS PREFERENCIAIS ANTES DA ROLETA. RESPONSABILIDADE OPERACIONAL E LEGAL DA CONCESSIONÁRIA PELOS SERVIÇOS PÚBLICOS PRESTADOS QUANTO À ADEQUAÇÃO, EFICIÊNCIA, SEGURANÇA E, SE ESSENCIAIS, CONTINUIDADE (ART. 22, CAPUT E PARÁGRAFO ÚNICO, DO CDC).
ALEGAÇÃO DE NECESSIDADE DE MANUTENÇÃO DO EQUILÍBRIO ECONÔMICO-FINANCEIRO DO CONTRATO. NÃO DEMONSTRAÇÃO.
1. Na origem, o Instituto Brasileiro de Direitos da Pessoa com Deficiência - IBDD, ora recorrido, ajuizou ação civil pública contra concessionárias de transporte coletivo municipal e o Município do Rio de Janeiro, ora recorrentes. O IBDD pleiteia a condenação das concessionárias em obrigação de fazer consistente na imediata reconfiguração interna de todos os ônibus urbanos da cidade do Rio de Janeiro para acessibilidade das pessoas com deficiência, reservando-se assentos especiais antes da roleta (dois de cada lado), nos termos da legislação vigente, sob pena de multa em favor da entidade autora de 5 (cinco) cadeiras de rodas por ônibus não adequado, cabendo ao Município o dever de fiscalizar.
2. A Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (Lei n.
13.146/2015) define acessibilidade como "possibilidade e condição de alcance para utilização, com segurança e autonomia, de espaços, mobiliários, equipamentos urbanos, edificações, transportes, informação e comunicação, inclusive seus sistemas e tecnologias, bem como de outros serviços e instalações abertos ao público, de uso público ou privados de uso coletivo, tanto na zona urbana como na rural, por pessoa com deficiência ou com mobilidade reduzida" (art.
3º, inc. I). E ainda: "A acessibilidade é direito que garante à pessoa com deficiência ou com mobilidade reduzida viver de forma independente e exercer seus direitos de cidadania e de participação social" (art. 53).
3. As concessionárias de transporte coletivo sujeitam-se à Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência, a qual, ao tratar do direito ao transporte da pessoa com deficiência ou mobilidade reduzida, estabelece a igualdade de acesso entre todos, vedando-se obstáculos e barreiras que impeçam ou dificultem o gozo desse direito (art. 46, §§ 1º e 2º, e art. 48 da Lei n. 13.146/2015).
4. Paralelamente ao contrato de prestação de serviço público celebrado com a Administração, as concessionárias de transporte coletivo também são fornecedoras no mercado de consumo, o que envolve a responsabilidade pelo fornecimento de serviços com adequação, eficiência, segurança e, se essenciais, continuidade (art. 22, caput e parágrafo único, do CDC).
5. No tocante à invocação da teoria da imprevisão pelas concessionárias a gerar o desequilíbrio contratual, o edital e o contrato de concessão devem conter regras claras quanto ao preço do serviço e os critérios para reajuste e revisão tarifária, considerando-se mantido o equilíbrio econômico-financeiro, nos termos do art. 10 da Lei de Concessões, sempre que atendidas as condições do contrato.
6. A necessidade de manutenção do equilíbrio econômico-financeiro do contrato não justifica o afastamento do dever de observância das obrigações constitucionais e infraconstitucionais impostas às concessionárias de transporte público, de modo que eventual inviabilidade de adimplemento contratual deve ser efetivamente demonstrada na via própria.
Recurso especial das concessionárias improvido.
RECURSO ESPECIAL DO MUNICÍPIO DO RIO DE JANEIRO. PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. CONCESSÃO DE SERVIÇO PÚBLICO DE TRANSPORTE COLETIVO MUNICIPAL. ACESSIBILIDADE AOS DEFICIENTES FÍSICOS. RECONFIGURAÇÃO DA FROTA DE ÔNIBUS PARA RESERVA DE ASSENTOS PREFERENCIAIS ANTES DA ROLETA. INEXISTÊNCIA DE VÍCIOS NO ACÓRDÃO RECORRIDO. DEVER DE FISCALIZAÇÃO POR PARTE DO MUNICÍPIO. EXISTÊNCIA DE INTERESSE PÚBLICO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. ART. 18 DA LEI N.
7.347/1985.
1. Não há omissão no acórdão recorrido quando o Tribunal examina todas as questões levantadas pela parte, ainda que em sentido contrário ao pretendido.
2. Nos termos da Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência, compete ao gestor público responsável pela prestação do serviço emitir o certificado de acessibilidade às empresas de transporte coletivo de passageiros (art. 46, § 3º, da Lei n.
13.146/2015).
3. Ao delegar um serviço público mediante concessão, não deve o poder concedente se eximir de fiscalizar e exigir o cumprimento do contrato administrativo no qual é parte.
4. A isenção de honorários prevista no art. 18 da Lei n. 7.347/1985 aproveita somente ao autor da ação civil pública que não tenha agido de má-fé, não beneficiando o réu.
Recurso especial do Município do Rio de Janeiro parcialmente conhecido e, nessa parte, improvido.
(REsp 1595018/RJ, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, julgado em 18/08/2016, DJe 29/08/2016)Acórdão
Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima
indicadas, acordam os Ministros da Segunda Turma do Superior
Tribunal de Justiça "A Turma, por unanimidade, conheceu em parte do
recurso do Município do Rio de Janeiro e, nessa parte, negou-lhe
provimento; negou provimento ao recurso de Erig Transporte Ltda e
Outros, nos termos do voto do(a) Sr(a). Ministro(a)-Relator(a)."
Os Srs. Ministros Herman Benjamin, Assusete Magalhães (Presidente) e
Diva Malerbi (Desembargadora convocada do TRF da 3a. Região) votaram
com o Sr. Ministro Relator.
Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Mauro Campbell Marques.
Data do Julgamento
:
18/08/2016
Data da Publicação
:
DJe 29/08/2016
Órgão Julgador
:
T2 - SEGUNDA TURMA
Relator(a)
:
Ministro HUMBERTO MARTINS (1130)
Informações adicionais
:
"Registre-se que é sabido que, na República Federativa do
Brasil, a independência e a harmonia entre os Poderes da União
(Legislativo, Executivo e Judiciário) é um princípio fundamental.
Incontáveis vezes, porém, o Supremo Tribunal Federal tem
decidido que, ante a demora do Poder competente, o Poder Judiciário
poderá determinar, em caráter excepcional, a implementação de
políticas públicas de interesse social - principalmente nos casos
que visem a resguardar a supremacia da dignidade da pessoa humana -,
sem que isso configure invasão da discricionariedade dos demais
Poderes ou afronta à reserva do possível [...]".
Referência legislativa
:
LEG:FED CFB:****** ANO:1988***** CF-1988 CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988 ART:00175 PAR:ÚNICO INC:00004LEG:FED LEI:008078 ANO:1990***** CDC-90 CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR ART:00022 PAR:ÚNICOLEG:FED LEI:007347 ANO:1995 ART:00018LEG:FED LEI:008987 ANO:1995 ART:00010 ART:00031 INC:00001 INC:00004LEG:FED LEI:013146 ANO:2015 ART:00003 INC:00001 ART:00046 PAR:00001 PAR:00002 ART:00048 ART:00053
Veja
:
(POLÍTICAS PÚBLICAS DE INTERESSE SOCIAL - IMPLEMENTAÇÃO - PODERJUDICIÁRIO - CARÁTER EXCEPCIONAL) STF - ARE-AGR 839629-DF, ARE-AGR 894085-SP, ARE-AGR 886710-SE(CONTRATO ADMINISTRATIVO - TRANSPORTE PÚBLICO COLETIVO - EQUILÍBRIOECONÔMICO-FINANCEIRO - DEVER DE OBSERVÂNCIA DAS OBRIGAÇÕES IMPOSTAS) STJ - EDcl no AgRg no REsp 1108628-PE, AgRg nos EDcl no REsp 799250-MG, REsp 1054390-DF, AgRg no REsp 758619-MG(AÇÃO CIVIL PÚBLICA - HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS - ISENÇÃO) STJ - AgRg nos EREsp 1221756-RJ, EDcl no REsp 748242-RJ
Mostrar discussão