REsp 1657576 / PRRECURSO ESPECIAL2017/0046801-7
PENAL E PROCESSUAL PENAL. RECURSO ESPECIAL. DELITO DO ART. 334, § 1º, ''B", DO CÓDIGO PENAL, COM A REDAÇÃO DADA PELA LEI N. 4.729/65.
INTERNALIZAÇÃO DE MERCADORIA PROIBIDA SEM O REGISTRO ESPECIAL.
LIBERDADE PROVISÓRIA. FIANÇA. GARANTIA PRESTADA EM DINHEIRO.
RESTITUIÇÃO. DESCONTADOS OS ENCARGOS LEGAIS. ORIGEM LÍCITA.
COMPROVAÇÃO. NEXO DE CAUSALIDADE COM O CRIME EM QUESTÃO.
INEXISTÊNCIA DE PREVISÃO LEGAL. ANALOGIA IN BONAM PARTEM.
INCIDÊNCIA. INVERSÃO DO ÔNUS PROBATÓRIO. IMPOSSIBILIDADE. APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO IN DUBIO PRO REO. RECURSO PROVIDO.
1. In casu, o recorrente foi condenado pelo crime do art. 334, § 1º, 'b', do Código Penal, com a redação dada pela Lei n. 4.729/65 (internalização de mercadoria proibida de importação sem o devido registro especial) - 340.000 (trezentos e quarenta mil) maços de cigarros de origem paraguaia, avaliados em R$ 132.423,20 (cento e trinta e dois mil, quatrocentos e vinte e três reais e vinte centavos) -, à pena de 1 (um) ano e 15 (quinze) dias de reclusão, substituída por duas restritivas de direitos.
2. Fixada e prestada a fiança na forma da lei, o Tribunal de origem, mantendo a r. sentença, condicionou a devolução do seu saldo à comprovação da licitude, cogitando ter relação com a prática delituosa. A defesa interpôs recurso especial, sustentando a ilegalidade dessa determinação.
3. Nos termos do art. 330 do Código de Processo Penal, a fiança é uma garantia real, consistente no depósito de determinada importância em dinheiro, arbitrada pela autoridade competente, que tem como finalidade assegurar a liberdade provisória do preso em flagrante e garantir o seu comparecimento aos atos do processo, enquanto este durar.
4. A fiança pode ser perdida em sua totalidade, sendo o saldo recolhido ao fundo penitenciário, nos casos em que, após o trânsito em julgado da sentença condenatória, o acusado não se apresentar para o início do cumprimento da pena definitivamente imposta. O CPP ainda prevê os casos de cassação; de reforço da caução e, ainda; de quebra. In casu, não se está a tratar de qualquer dessas hipóteses.
5. Cumpre ressaltar que não há previsão legal que condicione a comprovação da origem lícita dos valores depositados a título de fiança à devolução do numerário remanescente (deduzidos os encargos).
6. É cediço que a lei processual penal admite a interpretação e aplicação analógica para aquilo que o legislador previu em situação semelhante e em igualdade de condições, sempre em obediência aos direitos fundamentais e à segurança jurídica, para que não se traduza em uma analogia in malam partem, conforme se extrai do art.
3º do Código de Processo Penal.
7. O órgão acusador não trouxe aos autos qualquer prova da origem da fiança, não havendo se falar em inversão do ônus probatório, pois se está a cogitar a existência de crime - utilização de recursos ilícitos para resguardo da liberdade - em que se pressupõe a presunção de inocência, devendo o acusador provar a existência do fato e de sua autoria.
8. A falta de elementos de convicção que demonstrem ligação do acusado com o fato delituoso podem gerar, no julgador, dúvida acerca do nexo causal. Assim, deve ser invocado o princípio do in dubio pro reo, devendo o fato ser resolvido em favor do imputado, uma vez que a culpa penal deve restar plenamente comprovada, em razão da presunção de inocência. Isso porque, a garantia da liberdade deve prevalecer sobre a pretensão punitiva do Estado, princípio este que está implícito no inciso VII do art. 386 do Código de Processo Penal.
9. Assim, inexistindo provas da vinculação ou do nexo causal entre o crime praticado e a fiança prestada, a consequência lógica é a liberação da garantia, já que esta perdeu seu objeto com a finalização do processo condenatório, nos termos do art. 347 do Código de Processo Penal.
10. Recurso especial provido.
(REsp 1657576/PR, Rel. Ministro JOEL ILAN PACIORNIK, QUINTA TURMA, julgado em 20/06/2017, DJe 30/06/2017)
Ementa
PENAL E PROCESSUAL PENAL. RECURSO ESPECIAL. DELITO DO ART. 334, § 1º, ''B", DO CÓDIGO PENAL, COM A REDAÇÃO DADA PELA LEI N. 4.729/65.
INTERNALIZAÇÃO DE MERCADORIA PROIBIDA SEM O REGISTRO ESPECIAL.
LIBERDADE PROVISÓRIA. FIANÇA. GARANTIA PRESTADA EM DINHEIRO.
RESTITUIÇÃO. DESCONTADOS OS ENCARGOS LEGAIS. ORIGEM LÍCITA.
COMPROVAÇÃO. NEXO DE CAUSALIDADE COM O CRIME EM QUESTÃO.
INEXISTÊNCIA DE PREVISÃO LEGAL. ANALOGIA IN BONAM PARTEM.
INCIDÊNCIA. INVERSÃO DO ÔNUS PROBATÓRIO. IMPOSSIBILIDADE. APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO IN DUBIO PRO REO. RECURSO PROVIDO.
1. In casu, o recorrente foi condenado pelo crime do art. 334, § 1º, 'b', do Código Penal, com a redação dada pela Lei n. 4.729/65 (internalização de mercadoria proibida de importação sem o devido registro especial) - 340.000 (trezentos e quarenta mil) maços de cigarros de origem paraguaia, avaliados em R$ 132.423,20 (cento e trinta e dois mil, quatrocentos e vinte e três reais e vinte centavos) -, à pena de 1 (um) ano e 15 (quinze) dias de reclusão, substituída por duas restritivas de direitos.
2. Fixada e prestada a fiança na forma da lei, o Tribunal de origem, mantendo a r. sentença, condicionou a devolução do seu saldo à comprovação da licitude, cogitando ter relação com a prática delituosa. A defesa interpôs recurso especial, sustentando a ilegalidade dessa determinação.
3. Nos termos do art. 330 do Código de Processo Penal, a fiança é uma garantia real, consistente no depósito de determinada importância em dinheiro, arbitrada pela autoridade competente, que tem como finalidade assegurar a liberdade provisória do preso em flagrante e garantir o seu comparecimento aos atos do processo, enquanto este durar.
4. A fiança pode ser perdida em sua totalidade, sendo o saldo recolhido ao fundo penitenciário, nos casos em que, após o trânsito em julgado da sentença condenatória, o acusado não se apresentar para o início do cumprimento da pena definitivamente imposta. O CPP ainda prevê os casos de cassação; de reforço da caução e, ainda; de quebra. In casu, não se está a tratar de qualquer dessas hipóteses.
5. Cumpre ressaltar que não há previsão legal que condicione a comprovação da origem lícita dos valores depositados a título de fiança à devolução do numerário remanescente (deduzidos os encargos).
6. É cediço que a lei processual penal admite a interpretação e aplicação analógica para aquilo que o legislador previu em situação semelhante e em igualdade de condições, sempre em obediência aos direitos fundamentais e à segurança jurídica, para que não se traduza em uma analogia in malam partem, conforme se extrai do art.
3º do Código de Processo Penal.
7. O órgão acusador não trouxe aos autos qualquer prova da origem da fiança, não havendo se falar em inversão do ônus probatório, pois se está a cogitar a existência de crime - utilização de recursos ilícitos para resguardo da liberdade - em que se pressupõe a presunção de inocência, devendo o acusador provar a existência do fato e de sua autoria.
8. A falta de elementos de convicção que demonstrem ligação do acusado com o fato delituoso podem gerar, no julgador, dúvida acerca do nexo causal. Assim, deve ser invocado o princípio do in dubio pro reo, devendo o fato ser resolvido em favor do imputado, uma vez que a culpa penal deve restar plenamente comprovada, em razão da presunção de inocência. Isso porque, a garantia da liberdade deve prevalecer sobre a pretensão punitiva do Estado, princípio este que está implícito no inciso VII do art. 386 do Código de Processo Penal.
9. Assim, inexistindo provas da vinculação ou do nexo causal entre o crime praticado e a fiança prestada, a consequência lógica é a liberação da garantia, já que esta perdeu seu objeto com a finalização do processo condenatório, nos termos do art. 347 do Código de Processo Penal.
10. Recurso especial provido.
(REsp 1657576/PR, Rel. Ministro JOEL ILAN PACIORNIK, QUINTA TURMA, julgado em 20/06/2017, DJe 30/06/2017)Acórdão
Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima
indicadas, acordam os Ministros da Quinta Turma do Superior Tribunal
de Justiça, por unanimidade, conhecer do recurso e lhe dar
provimento, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator.
Os Srs. Ministros Felix Fischer, Jorge Mussi, Reynaldo Soares da
Fonseca e Ribeiro Dantas votaram com o Sr. Ministro Relator.
Data do Julgamento
:
20/06/2017
Data da Publicação
:
DJe 30/06/2017
Órgão Julgador
:
T5 - QUINTA TURMA
Relator(a)
:
Ministro JOEL ILAN PACIORNIK (1183)
Referência legislativa
:
LEG:FED DEL:003689 ANO:1941***** CPP-41 CÓDIGO DE PROCESSO PENAL ART:00003 ART:00330 ART:00336 ART:00338 ART:00339 ART:00340 INC:00001 INC:00002 INC:00003 PAR:ÚNICO ART:00341 INC:00001 INC:00002 INC:00003 INC:00004 INC:00005 ART:00342 ART:00343 ART:00344 ART:00345 ART:00346 ART:00347 ART:00386 INC:00007
Veja
:
(MATÉRIA PENAL - ÔNUS PROBATÓRIO) STJ - REsp 1501842-PR, REsp 1059132-AC
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