REsp 545752 / RSRECURSO ESPECIAL2003/0067797-0
RECURSO ESPECIAL. CIVIL. RESPONSABILIDADE CIVIL. FURTO DE CAMINHÃO ESTACIONADO EM PÁTIO DE OFICINA. AUTORIZAÇÃO TÁCITA DA RÉ.
DEVER DE GUARDA E VIGILÂNCIA. RECONHECIMENTO DE CONDUTA NEGLIGENTE DA AUTORA.
CULPA CONCORRENTE. INDENIZAÇÃO. GRAU DE CULPA.
DIMENSIONAMENTO CASO A CASO. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.
1. Na hipótese dos autos, não se tem um daqueles casos comuns, típicos de simples relação de consumo entre cliente e sociedade empresária com estabelecimento dotado de estacionamento para angariar clientela, acerca dos quais esta Corte tem entendimento consolidado na Súmula 130/STJ: "A empresa responde, perante o cliente, pela reparação de dano ou furto de veículo ocorridos em seu estacionamento." 2. O caso é peculiar, pois envolve duas sociedades empresárias e suas atividades típicas, quanto ao bem móvel objeto do dano reclamado, estando cercado de aspectos merecedores de cautelosa apreciação. Analisadas essas circunstâncias, elementos fáticos e probatórios firmados pelas instâncias ordinárias, se, de um lado, não se pode afastar completamente a responsabilidade da oficina ré pela guarda e vigilância decorrentes do ato gracioso, no qual, de boa-fé, autorizou ou admitiu a estadia em seu estacionamento de caminhão pertencente à transportadora autora, de outro lado, tem-se a ocorrência de culpa concorrente da ofendida. O evento danoso decorreu, principalmente, de procedimento culposo, negligente, da parte autora, que deixou de informar à recorrente que deixaria o caminhão por alguns dias sob sua custódia, entregando as chaves e documentando-se minimamente quanto ao ajuste.
3. A sociedade empresária transportadora não pode ficar absolutamente segurada contra riscos inerentes à sua atividade econômica, como os de colisão e furto de caminhão de sua frota, inclusive durante o período de repouso noturno, bastando que estacione, gratuitamente, seus veículos em pátios de oficinas, de postos de gasolina, de restaurantes, hotéis e pousadas e locais assemelhados situados à margem de rodovias, transferindo, com isso, para terceiros comerciantes desavisados os riscos da atividade econômica própria. Na perigosa vida dos que operam nas estradas, a conduta solidária do comerciante que acolhe em estacionamento de estabelecimento situado à margem de rodovia o viajante profissional transportador deve ser estimulada, e não censurada.
4. No contexto, mostram-se adequadas e determinantes para a ocorrência do evento danoso também as condutas negligentes da recorrida-transportadora (teoria da causalidade adequada).
Havendo concorrência de culpas (concorrência de causas ou concorrência de responsabilidades), a indenização deve medir-se conforme a extensão do dano e o grau de cooperação de cada uma das partes à sua eclosão, situação que deve ser dimensionada caso a caso pelo julgador.
5. Na espécie, a recorrente, por seu comportamento culposo, atenuado pela grave negligência da vítima, deverá responder somente pelo prejuízo imediato, o dano emergente do ato ilícito (furto qualificado) praticado por terceiros, ou seja, pelo valor do caminhão, excluindo-se da condenação os lucros cessantes da atividade empresarial da autora.
6. Recurso especial parcialmente provido.
(REsp 545.752/RS, Rel. Ministro RAUL ARAÚJO, QUARTA TURMA, julgado em 17/12/2015, DJe 24/02/2016)
Ementa
RECURSO ESPECIAL. CIVIL. RESPONSABILIDADE CIVIL. FURTO DE CAMINHÃO ESTACIONADO EM PÁTIO DE OFICINA. AUTORIZAÇÃO TÁCITA DA RÉ.
DEVER DE GUARDA E VIGILÂNCIA. RECONHECIMENTO DE CONDUTA NEGLIGENTE DA AUTORA.
CULPA CONCORRENTE. INDENIZAÇÃO. GRAU DE CULPA.
DIMENSIONAMENTO CASO A CASO. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.
1. Na hipótese dos autos, não se tem um daqueles casos comuns, típicos de simples relação de consumo entre cliente e sociedade empresária com estabelecimento dotado de estacionamento para angariar clientela, acerca dos quais esta Corte tem entendimento consolidado na Súmula 130/STJ: "A empresa responde, perante o cliente, pela reparação de dano ou furto de veículo ocorridos em seu estacionamento." 2. O caso é peculiar, pois envolve duas sociedades empresárias e suas atividades típicas, quanto ao bem móvel objeto do dano reclamado, estando cercado de aspectos merecedores de cautelosa apreciação. Analisadas essas circunstâncias, elementos fáticos e probatórios firmados pelas instâncias ordinárias, se, de um lado, não se pode afastar completamente a responsabilidade da oficina ré pela guarda e vigilância decorrentes do ato gracioso, no qual, de boa-fé, autorizou ou admitiu a estadia em seu estacionamento de caminhão pertencente à transportadora autora, de outro lado, tem-se a ocorrência de culpa concorrente da ofendida. O evento danoso decorreu, principalmente, de procedimento culposo, negligente, da parte autora, que deixou de informar à recorrente que deixaria o caminhão por alguns dias sob sua custódia, entregando as chaves e documentando-se minimamente quanto ao ajuste.
3. A sociedade empresária transportadora não pode ficar absolutamente segurada contra riscos inerentes à sua atividade econômica, como os de colisão e furto de caminhão de sua frota, inclusive durante o período de repouso noturno, bastando que estacione, gratuitamente, seus veículos em pátios de oficinas, de postos de gasolina, de restaurantes, hotéis e pousadas e locais assemelhados situados à margem de rodovias, transferindo, com isso, para terceiros comerciantes desavisados os riscos da atividade econômica própria. Na perigosa vida dos que operam nas estradas, a conduta solidária do comerciante que acolhe em estacionamento de estabelecimento situado à margem de rodovia o viajante profissional transportador deve ser estimulada, e não censurada.
4. No contexto, mostram-se adequadas e determinantes para a ocorrência do evento danoso também as condutas negligentes da recorrida-transportadora (teoria da causalidade adequada).
Havendo concorrência de culpas (concorrência de causas ou concorrência de responsabilidades), a indenização deve medir-se conforme a extensão do dano e o grau de cooperação de cada uma das partes à sua eclosão, situação que deve ser dimensionada caso a caso pelo julgador.
5. Na espécie, a recorrente, por seu comportamento culposo, atenuado pela grave negligência da vítima, deverá responder somente pelo prejuízo imediato, o dano emergente do ato ilícito (furto qualificado) praticado por terceiros, ou seja, pelo valor do caminhão, excluindo-se da condenação os lucros cessantes da atividade empresarial da autora.
6. Recurso especial parcialmente provido.
(REsp 545.752/RS, Rel. Ministro RAUL ARAÚJO, QUARTA TURMA, julgado em 17/12/2015, DJe 24/02/2016)Acórdão
Prosseguindo no julgamento, após o voto-vista do Ministro Marco
Buzzi dando provimento ao recurso especial, divergindo do relator, e
o voto da Ministra Maria Isabel Gallotti no sentido da divergência,
e os votos dos Ministros Antonio Carlos Ferreira e Luis Felipe
Salomão acompanhando o relator, a Quarta Turma, por maioria, decide
dar parcial provimento ao recurso especial, nos termos do voto do
relator. Vencidos em parte o Sr. Ministro Marco Buzzi e a Sra.
Ministra Maria Isabel Gallotti.
Data do Julgamento
:
17/12/2015
Data da Publicação
:
DJe 24/02/2016
Órgão Julgador
:
T4 - QUARTA TURMA
Relator(a)
:
Ministro RAUL ARAÚJO (1143)
Informações adicionais
:
(VOTO VENCIDO EM PARTE) (MIN. MARCO BUZZI)
"[...] aplicável ao caso a jurisprudência desta Corte Superior
no sentido de que impossível se responsabilizar o estabelecimento em
casos de delito quando caracterizado o fortuito externo ou, ainda,
em casos nas quais não se aperfeiçoa o contrato de depósito, ainda
que gratuito, pois a prevenção de delitos é, em última análise, da
autoridade pública competente, nos termos do que preconiza o artigo
144, da Constituição da República".
"[...] inviável falar em concorrência de causa/culpa quando
ausente violação de qualquer dever jurídico preexistente por parte
do indigitado causador do dano (demandado), uma vez que a
responsabilização civil subjetiva tem como pressuposto para a sua
ocorrência a conduta culposa lato sensu, que envolve a culpa stricto
sensu (o agente causador do dano pratica o ato com negligência ou
imprudência) e o dolo (ação ou omissão voluntária, vontade
conscientemente dirigida à produção do resultado ilícito)".
Referência legislativa
:
LEG:FED CFB:****** ANO:1988***** CF-1988 CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988 ART:00144
Veja
:
(RESPONSABILIDADE CIVIL - CONTRATO DE DEPÓSITO OU DE GUARDA -INEXISTÊNCIA -ESTACIONAMENTO POR CONTA E RISCO DO PROPRIETÁRIO DO VEÍCULO) STJ - REsp 195092-MT(VOTO VENCIDO EM PARTE - RESPONSABILIDADE CIVIL - CONTRATO DEDEPÓSITO OU DEGUARDA - ESTACIONAMENTO - FURTO - FORTUITO EXTERNO) STJ - AgRg no AgRg no Ag 1102125-RS, REsp 1243970-SE
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