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Jurisprudência


RHC 57366 / BARECURSO ORDINARIO EM HABEAS CORPUS2015/0048315-1

Ementa
PENAL E PROCESSO PENAL. RECURSO EM HABEAS CORPUS. 1. FALSIFICAÇÃO DE DOCUMENTO PÚBLICO. CONTROVÉRSIA SOBRE O TIPO PENAL. TIPIFICAÇÃO QUE INVIABILIZA O BENEFÍCIO DA SUSPENSÃO CONDICIONAL DO PROCESSO. POSSIBILIDADE DE EXAME. 2. CONDUTA DE FALSIFICAR RECEITA. DOCUMENTO COM ASSINATURA FALSA. RECEITUÁRIO DO SERVIÇO SOCIAL DAS ESTRADAS DE FERRO. ENTIDADE PARAESTATAL. SUBSUNÇÃO AO ART. 297, § 2º, DO CP. 3. RECEITA FALSIFICADA PARA AQUISIÇÃO DE ANTIDEPRESSIVO PARA USO PRÓPRIO. NÃO VERIFICAÇÃO DE PREJUÍZO A TERCEIRO. AUSÊNCIA DE BENEFÍCIO INDEVIDO. IRRELEVÂNCIA PENAL. 4. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. NÃO INCIDÊNCIA EM CRIMES CONTRA A FÉ PÚBLICA. EXCEPCIONALIDADE DA HIPÓTESE. 5. RECURSO EM HABEAS CORPUS PROVIDO PARA TRANCAR A AÇÃO PENAL. 1. A adequação típica da conduta imputada na denúncia deve ser feita apenas na ocasião da sentença, momento em que o Magistrado poderá proceder à emendatio ou à mutatio libelli. Dessa forma, não há se falar em análise da adequação típica por ocasião do recebimento da denúncia. Contudo, no caso, verifica-se que a irresignação quanto à tipificação se revela em razão da impossibilidade de a recorrente ser beneficiada com a suspensão condicional do processo. Nesse contexto, não óbice ao exame preambular da adequação da conduta ao tipo imputado, com o objetivo de aferir se a recorrente, de fato, faz jus ao benefício do art. 89 da Lei n. 9.099/1995. 2. É imputada à recorrente a conduta de subtrair receituário e preenchê-lo, falsificando a assinatura da médica. Não se questiona a veracidade da informação constante da receita, ou seja, seu conteúdo ideológico, mas sim a assinatura da médica, a qual é imprescindível à formação da receita em si, envolvendo, portanto, a forma do documento. Ademais, a falsificação ocorreu no âmbito do Serviço Social das Estradas de Ferro, que é entidade paraestatal. Dessa forma, tem-se que a conduta se subsume ao tipo penal do art. 297, § 2º, do Código Penal. 3. A hipótese, no entanto, possui particularidades que não podem passar desapercebidas. Não há dúvidas sobre a gravidade de se falsificar a assinatura de outra pessoa, razão pela qual se trata de tipo penal. Nada obstante, observa-se que o dolo da recorrente, ao falsificar a assinatura da médica no receituário, era o de adquirir remédio antidepressivo para uso próprio. Ou seja, não objetivava prejudicar outrem nem se beneficiar indevidamente, mas apenas adquirir remédio para sua enfermidade. Assim, embora os crimes de uso e de falsificação de documento público não exijam finalidade específica, não é possível limitar a aplicação do direito penal à subsunção formal da conduta ao fato típico. De fato, imprescindível aferir a tipicidade material da conduta, ou seja, sua real aptidão de violar o bem jurídico tutelado, no caso a fé pública, situação que não ficou concretamente demonstrada. 4. Assim, embora seja firme o entendimento do STJ e do STF sobre a impossibilidade de aplicação do princípio da insignificância aos crimes contra a fé pública, as particularidades do caso concreto não atraem a incidência do direito penal. Ademais, revela-se, de plano, "a mínima ofensividade da conduta do agente, a nenhuma periculosidade social da ação, o reduzidíssimo grau de reprovabilidade do comportamento e a inexpressividade da lesão jurídica provocada", a demonstrar a atipicidade material da conduta. De fato, presentes estão os requisitos necessários ao reconhecimento do princípio da insignificância, uma vez que "sua aplicação decorre no sentido de que o direito penal não se deve ocupar de condutas que produzam resultado cujo desvalor - por não importar em lesão significativa a bens jurídicos relevantes - não represente, por isso mesmo, prejuízo importante, seja ao titular do bem jurídico tutelado, seja à integridade da própria ordem social". 5. Recurso em habeas corpus provido, para trancar a ação penal, em virtude da atipicidade material da conduta. (RHC 57.366/BA, Rel. Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, QUINTA TURMA, julgado em 17/11/2016, DJe 28/11/2016)
Acórdão
Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, dar provimento ao recurso, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Ribeiro Dantas, Joel Ilan Paciornik, Felix Fischer e Jorge Mussi votaram com o Sr. Ministro Relator.

Data do Julgamento : 17/11/2016
Data da Publicação : DJe 28/11/2016
Órgão Julgador : T5 - QUINTA TURMA
Relator(a) : Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA (1170)
Referência legislativa : LEG:FED LEI:009099 ANO:1995***** LJE-95 LEI DOS JUIZADOS ESPECIAIS CÍVEIS E CRIMINAIS ART:00089LEG:FED DEL:002848 ANO:1940***** CP-40 CÓDIGO PENAL ART:00297 PAR:00002 ART:00299 PAR:ÚNICO
Veja : (EMENDATIO LIBELLI - RECEBIMENTO DA DENÚNCIA - NÃO CABIMENTO) STJ - HC 258581-RS(ENTIDADE PARAESTATAL - INCOMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL) STJ - AgRg no RMS 48061-DF
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