RMS 36943 / RJRECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA2012/0005627-2
ADMINISTRATIVO E AMBIENTAL. RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. MANDADO DE SEGURANÇA PREVENTIVO. PESCA AMADORA. PORTARIA N-35, da SUDEPE, de 22/12/1988. REVOGAÇÃO PARCIAL PELAS PORTARIAS IBAMA 30, DE 23/05/2003, E 4, DE 19/03/2009. PESCA AMADORA SUBAQUÁTICA COM UTILIZAÇÃO DE ARBALETE. POSSIBILIDADE. RESTRIÇÃO POR NORMAS ESTADUAIS. NECESSIDADE DE OBSERVÂNCIA. ART. 16 DA PORTARIA IBAMA 4, DE 19/03/2009. LIMITE DE CAPTURA E TRANSPORTE DE PEIXE POR PESCADOR AMADOR. INSTRUMENTO DE PROTEÇÃO AO MEIO AMBIENTE. RECURSO ORDINÁRIO PROVIDO.
I. Trata-se de Recurso Ordinário em Mandado de Segurança, interposto por SANDRO CAETANO DE MESQUITA, em 13/10/2011, com fundamento no art. 105, II, b, da CF/88, contra acórdão do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, prolatado em Mandado de Segurança preventivo, publicado em 30/09/2011.
II. Pretende o impetrante, ora recorrente, que o impetrado se abstenha de impedi-lo de praticar, como pescador amador, detentor de licença do Ministério da Pesca e Aquicultura, a pesca amadora subaquática com arbalete, no entorno da Ilha Grande e adjacências, no litoral do Rio de Janeiro, desde que em apneia e sem a utilização de equipamentos de respiração artificial. Sustenta que, por ser pescador amador, está incluído na exceção à proibição de pesca, até a distância de 1.000 metros ao redor e ao largo da Ilha Grande e de outras Ilhas e enseadas do litoral do Rio de Janeiro, citadas no art. 1º, I e II, da Portaria N-35/1988 - SUDEPE, exceção constante do § 1º do art. 1º da aludida Portaria.
III. A Portaria N-35, da SUDEPE, de 22/12/1988, foi editada, pela extinta autarquia federal, com o intuito de proteger áreas de reprodução e crescimento de peixes, crustáceos e moluscos, proibindo, em seu art. 1º, I e II, a pesca, até a distância de 1.000 (um mil) metros ao redor e ao largo dos acidentes geográficos representados pelas Ilhas Grande, da Gipoia, dos Porcos, do Sandri, da Barra, Comprida, Cunhambebe, Cavaco e Caieira, assim como pelas enseadas de Bracui, Gipoia, Sapuiba e Ariró, pertencentes à Baía da Ribeira, situados no Estado do Rio de Janeiro.
IV. A mesma Portaria excepcionou, da referida proibição, os pescadores artesanais ou amadores que utilizem, para o exercício da pesca, linha de mão ou vara, linha e anzol, com ou sem molinete, bem como as atividades de maricultura.
V. A referida Portaria, editada pela Superintendência do Desenvolvimento da Pesca - SUDEPE - autarquia federal extinta, em 22/02/1989, sucedida pelo INSTITUTO DO MEIO AMBIENTE E DOS RECURSOS NATURAIS RENOVÁVEIS - IBAMA, conforme estatuído na Lei 7.732, de 22/02/1989 -, foi parcialmente revogada, de forma sucessiva, pelas Portarias IBAMA 30, de 23/05/2003, e 4, de 19/03/2009, que estabeleceram normas gerais para o exercício da pesca amadora, em todo o território nacional.
VI. Nesse contexto, em conformidade com o art. 3º, III, da Portaria IBAMA 4, de 19/03/2009, permite-se a realização da pesca amadora subaquática, com ou sem auxílio de embarcações, com utilização de espingarda de mergulho ou arbalete, sendo vedado o emprego de aparelhos de respiração artificial, respeitada a limitação de captura e transporte por pescador amador, constante do art. 6º da mesma Portaria.
VII. De qualquer sorte, deve ser obedecida a limitação constante do art. 9º do Decreto estadual 20.172, de 01/07/1994 - que proíbe a exploração da pesca em locais favoráveis à desova, de desenvolvimento de larvas ou pós-larvas, de alimentação de espécies cujos estoques estejam abaixo do necessário à sua manutenção, e os considerados como refúgio para espécies -, por se cuidar de norma estadual mais restritiva, cuja observância é imposta pelo art. 16 da Portaria IBAMA 4, de 19/03/2009.
VIII. Da interpretação teleológica dos mencionados institutos normativos, infere-se que a utilização de arbalete, sem auxílio de respirador, para realização da pesca amadora subaquática, conforme previsto nas normas regulamentadoras da matéria (Portaria IBAMA 30, de 23/05/2003, posteriormente revogada pela Portaria IBAMA 4, de 19/03/2009), não desvirtua o espírito da Portaria N-35, da SUDEPE, de 22 de dezembro de 1988, consubstanciado na proteção das áreas de reprodução e crescimento de peixes, crustáceos e moluscos e com o fito de evitar a pesca comercial, com efeitos predatórios, nos locais que o ato normativo da extinta SUDEPE menciona.
IX. Por outro lado, a Portaria IBAMA 4, de 19/03/2009, em seu art.
6º, estabelece limite de captura e transporte de peixes por pescador amador também como mecanismo de proteção ao meio ambiente, evidenciando-se a inadequação da restrição da pesca amadora subaquática em apneia, com utilização de arbalete, sem auxílio de respirador, sob pena de afronta ao princípio da proporcionalidade, postulado também orientador do Direito Administrativo, para que não haja a adoção de medidas restritivas desnecessárias para o alcance do interesse público.
X. Apreciando caso análogo, entendeu o STJ existente direito líquido e certo do recorrente, pescador amador, detentor de licença do órgão federal competente, à pesca amadora subaquática em apneia, com arbalete, nos locais mencionados no art. 1º da Portaria N-35/1988 - SUDEPE, destacando que "a Portaria Sudepe é de 1988. (...) o fato de a Portaria Sudepe N-35, ao livrar da proibição de pesca comercial os pescadores artesanais e amadores, não ter feito menção a este artefato (o arbalete) diz respeito unicamente a sua inexistência à época em que editada esta portaria (1988), e não à real vontade regulamentadora de vedar a pesca subaquática amadora com o uso do arbalete. Não há, pois, caráter restritivo, mas apenas lacuna relativa a desenvolvimento técnico. (...) o conceito de 'pesca artesanal' não vem definido pela Portaria Sudepe, mas sim pela Portaria do Ibama retro transcrita e, neste conjunto de normas, a pesca amadora é simplesmente aquela que não possui finalidade comercial. (...) o art. 1º da Portaria Sudepe permite a pesca com anzóis, tipo de pesca amadora que, na Portaria do Ibama pode ser classificada como pesca amadora desembarcada ou embarcada - conforme se utilize ou não de embarcações. Quer dizer: até o uso de embarcações não é suficiente para afastar o amadorismo, de modo que o mero uso de arbalete, sob a perspectiva da razoabilidade na proteção do meio ambiente aquático (especialmente sob o aspecto da necessidade e da proporcionalidade em sentido estrito), também não o pode ser" (STJ, RMS 33.562/RJ, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, DJe de 24/08/2011).
XI. Recurso Ordinário provido.
(RMS 36.943/RJ, Rel. Ministra ASSUSETE MAGALHÃES, SEGUNDA TURMA, julgado em 09/08/2016, DJe 10/10/2016)
Ementa
ADMINISTRATIVO E AMBIENTAL. RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. MANDADO DE SEGURANÇA PREVENTIVO. PESCA AMADORA. PORTARIA N-35, da SUDEPE, de 22/12/1988. REVOGAÇÃO PARCIAL PELAS PORTARIAS IBAMA 30, DE 23/05/2003, E 4, DE 19/03/2009. PESCA AMADORA SUBAQUÁTICA COM UTILIZAÇÃO DE ARBALETE. POSSIBILIDADE. RESTRIÇÃO POR NORMAS ESTADUAIS. NECESSIDADE DE OBSERVÂNCIA. ART. 16 DA PORTARIA IBAMA 4, DE 19/03/2009. LIMITE DE CAPTURA E TRANSPORTE DE PEIXE POR PESCADOR AMADOR. INSTRUMENTO DE PROTEÇÃO AO MEIO AMBIENTE. RECURSO ORDINÁRIO PROVIDO.
I. Trata-se de Recurso Ordinário em Mandado de Segurança, interposto por SANDRO CAETANO DE MESQUITA, em 13/10/2011, com fundamento no art. 105, II, b, da CF/88, contra acórdão do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, prolatado em Mandado de Segurança preventivo, publicado em 30/09/2011.
II. Pretende o impetrante, ora recorrente, que o impetrado se abstenha de impedi-lo de praticar, como pescador amador, detentor de licença do Ministério da Pesca e Aquicultura, a pesca amadora subaquática com arbalete, no entorno da Ilha Grande e adjacências, no litoral do Rio de Janeiro, desde que em apneia e sem a utilização de equipamentos de respiração artificial. Sustenta que, por ser pescador amador, está incluído na exceção à proibição de pesca, até a distância de 1.000 metros ao redor e ao largo da Ilha Grande e de outras Ilhas e enseadas do litoral do Rio de Janeiro, citadas no art. 1º, I e II, da Portaria N-35/1988 - SUDEPE, exceção constante do § 1º do art. 1º da aludida Portaria.
III. A Portaria N-35, da SUDEPE, de 22/12/1988, foi editada, pela extinta autarquia federal, com o intuito de proteger áreas de reprodução e crescimento de peixes, crustáceos e moluscos, proibindo, em seu art. 1º, I e II, a pesca, até a distância de 1.000 (um mil) metros ao redor e ao largo dos acidentes geográficos representados pelas Ilhas Grande, da Gipoia, dos Porcos, do Sandri, da Barra, Comprida, Cunhambebe, Cavaco e Caieira, assim como pelas enseadas de Bracui, Gipoia, Sapuiba e Ariró, pertencentes à Baía da Ribeira, situados no Estado do Rio de Janeiro.
IV. A mesma Portaria excepcionou, da referida proibição, os pescadores artesanais ou amadores que utilizem, para o exercício da pesca, linha de mão ou vara, linha e anzol, com ou sem molinete, bem como as atividades de maricultura.
V. A referida Portaria, editada pela Superintendência do Desenvolvimento da Pesca - SUDEPE - autarquia federal extinta, em 22/02/1989, sucedida pelo INSTITUTO DO MEIO AMBIENTE E DOS RECURSOS NATURAIS RENOVÁVEIS - IBAMA, conforme estatuído na Lei 7.732, de 22/02/1989 -, foi parcialmente revogada, de forma sucessiva, pelas Portarias IBAMA 30, de 23/05/2003, e 4, de 19/03/2009, que estabeleceram normas gerais para o exercício da pesca amadora, em todo o território nacional.
VI. Nesse contexto, em conformidade com o art. 3º, III, da Portaria IBAMA 4, de 19/03/2009, permite-se a realização da pesca amadora subaquática, com ou sem auxílio de embarcações, com utilização de espingarda de mergulho ou arbalete, sendo vedado o emprego de aparelhos de respiração artificial, respeitada a limitação de captura e transporte por pescador amador, constante do art. 6º da mesma Portaria.
VII. De qualquer sorte, deve ser obedecida a limitação constante do art. 9º do Decreto estadual 20.172, de 01/07/1994 - que proíbe a exploração da pesca em locais favoráveis à desova, de desenvolvimento de larvas ou pós-larvas, de alimentação de espécies cujos estoques estejam abaixo do necessário à sua manutenção, e os considerados como refúgio para espécies -, por se cuidar de norma estadual mais restritiva, cuja observância é imposta pelo art. 16 da Portaria IBAMA 4, de 19/03/2009.
VIII. Da interpretação teleológica dos mencionados institutos normativos, infere-se que a utilização de arbalete, sem auxílio de respirador, para realização da pesca amadora subaquática, conforme previsto nas normas regulamentadoras da matéria (Portaria IBAMA 30, de 23/05/2003, posteriormente revogada pela Portaria IBAMA 4, de 19/03/2009), não desvirtua o espírito da Portaria N-35, da SUDEPE, de 22 de dezembro de 1988, consubstanciado na proteção das áreas de reprodução e crescimento de peixes, crustáceos e moluscos e com o fito de evitar a pesca comercial, com efeitos predatórios, nos locais que o ato normativo da extinta SUDEPE menciona.
IX. Por outro lado, a Portaria IBAMA 4, de 19/03/2009, em seu art.
6º, estabelece limite de captura e transporte de peixes por pescador amador também como mecanismo de proteção ao meio ambiente, evidenciando-se a inadequação da restrição da pesca amadora subaquática em apneia, com utilização de arbalete, sem auxílio de respirador, sob pena de afronta ao princípio da proporcionalidade, postulado também orientador do Direito Administrativo, para que não haja a adoção de medidas restritivas desnecessárias para o alcance do interesse público.
X. Apreciando caso análogo, entendeu o STJ existente direito líquido e certo do recorrente, pescador amador, detentor de licença do órgão federal competente, à pesca amadora subaquática em apneia, com arbalete, nos locais mencionados no art. 1º da Portaria N-35/1988 - SUDEPE, destacando que "a Portaria Sudepe é de 1988. (...) o fato de a Portaria Sudepe N-35, ao livrar da proibição de pesca comercial os pescadores artesanais e amadores, não ter feito menção a este artefato (o arbalete) diz respeito unicamente a sua inexistência à época em que editada esta portaria (1988), e não à real vontade regulamentadora de vedar a pesca subaquática amadora com o uso do arbalete. Não há, pois, caráter restritivo, mas apenas lacuna relativa a desenvolvimento técnico. (...) o conceito de 'pesca artesanal' não vem definido pela Portaria Sudepe, mas sim pela Portaria do Ibama retro transcrita e, neste conjunto de normas, a pesca amadora é simplesmente aquela que não possui finalidade comercial. (...) o art. 1º da Portaria Sudepe permite a pesca com anzóis, tipo de pesca amadora que, na Portaria do Ibama pode ser classificada como pesca amadora desembarcada ou embarcada - conforme se utilize ou não de embarcações. Quer dizer: até o uso de embarcações não é suficiente para afastar o amadorismo, de modo que o mero uso de arbalete, sob a perspectiva da razoabilidade na proteção do meio ambiente aquático (especialmente sob o aspecto da necessidade e da proporcionalidade em sentido estrito), também não o pode ser" (STJ, RMS 33.562/RJ, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, DJe de 24/08/2011).
XI. Recurso Ordinário provido.
(RMS 36.943/RJ, Rel. Ministra ASSUSETE MAGALHÃES, SEGUNDA TURMA, julgado em 09/08/2016, DJe 10/10/2016)Acórdão
Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima
indicadas, acordam os Ministros da Segunda Turma do Superior
Tribunal de Justiça "Prosseguindo-se no julgamento, após o
voto-vista do Sr. Ministro Herman Benjamin, dando provimento ao
recurso ordinário, com ressalva de seu ponto de vista, a Turma, por
unanimidade, deu provimento ao recurso ordinário, nos termos do voto
da Sra. Ministra-Relatora. A Sra. Ministra Diva Malerbi
(Desembargadora Convocada do TRF/3ª Região) (voto-vista), os Srs.
Ministros Humberto Martins, Herman Benjamin e Mauro Campbell Marques
votaram com a Sra. Ministra Relatora.
Data do Julgamento
:
09/08/2016
Data da Publicação
:
DJe 10/10/2016RSTJ vol. 243 p. 195
Órgão Julgador
:
T2 - SEGUNDA TURMA
Relator(a)
:
Ministra ASSUSETE MAGALHÃES (1151)
Referência legislativa
:
LEG:FED PRT:000035 ANO:1988 ART:00001 INC:00001 INC:00002 PAR:00001(SUPERINTENDÊNCIA DO DESENVOLVIMENTO DA PESCA - SUDEPE)LEG:FED PRT:000030 ANO:2003 ART:00002 INC:00001 ART:00003 INC:00003 ART:00004 ART:00006 PAR:00001(INSTITUTO BRASILEIRO DO MEIO AMBIENTE E DOS RECURSOS NATURAISRENOVÁVEIS IBAMA)LEG:FED PRT:000004 ANO:2009 ART:00002 INC:00001 ART:00003 INC:00003 ART:00004 ART:00005 ART:00006 ART:00016LEG:EST DEC:020172 ANO:1994 UF:RJ ART:00009 INC:00001 LET:E
Veja
:
(PESCA SUBAQUÁTICA - PROIBIÇÃO - CARÁTER AMADOR) STJ - RMS 33562-RJ
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