RMS 49902 / PRRECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA2015/0310054-8
PROCESSO PENAL. RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA.
DEFENSORIA PÚBLICA. FUNÇÃO ESSENCIAL AO ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO. ACESSO À JUSTIÇA. DEFESA PRÉVIA: INOVAÇÕES DA LEI 11.719/2008. OBRIGATORIEDADE E EFETIVIDADE DA RESPOSTA. AMPLA DEFESA E CONTRADITÓRIO. SUBSTITUIÇÃO PONTUAL DE DEFENSOR PÚBLICO POR DEFENSOR DATIVO: POSSIBILIDADE. INEXISTÊNCIA DE INTERFERÊNCIA NA INDEPENDÊNCIA FUNCIONAL DA DEFENSORIA. CONTROLE JUDICIAL PARA EVITAR NULIDADES. SANEAMENTO PROCESSUAL PERMANENTE. AUSÊNCIA DE DEMONSTRAÇÃO DE PREJUÍZO. PRECEDENTES DO STF E DO STJ.
1. A instituição da Defensoria Pública é reconhecida pelo art. 134 da CF/88 como essencial à função jurisdicional do Estado, dado o seu relevante papel na garantia de efetivo acesso à justiça a um sem número de necessitados. Como expressão e instrumento do regime democrático, essa grande Instituição deve promover, fundamentalmente, a orientação jurídica, os direitos humanos e a defesa, em todos os graus, judicial e extrajudicial, dos direitos individuais e coletivos, de forma integral e gratuita, aos necessitados, na forma do inciso LXXIV do art. 5º da Constituição Federal. 2. Nessa linha de raciocínio, é admissível a designação de advogado ad hoc para atuar no feito quando não há órgão de assistência judiciária na comarca ou subseção judiciária, ou se a Defensoria não está devidamente organizada na localidade, havendo desproporção entre os assistidos e os respectivos defensores (RHC n.
106.394/MG, Primeira Turma, Rel. Min. Rosa Weber, DJe de 08/02/2013 e HC n. 337.754/SC, Quinta Turma, Rel. Min. Jorge Mussi, DJe de 26/11/2015).
3. A Defensoria Pública da União ainda não está aparelhada ao ponto de dispensar-se, no âmbito da Justiça Federal, a atuação dos advogados voluntários e dos núcleos de prática jurídica das universidades até mesmo nas grandes capitais. A desproporção entre os assistidos e os respectivos defensores é evidente! 4. Diante das inovações contidas nos arts. 396, 396-A e 397 da Lei Adjetiva Penal, o caráter obrigatório e a necessidade da efetiva defesa prévia do acusado, que poderá, inclusive, provocar a absolvição sumária nessa fase inicial, não constituem interferência na independência funcional da Defensoria Pública: a) a verificação de que a petição apresentada não traz argumentos mínimos suficientes para a configuração de uma defesa técnica efetiva e eficiente; b) a determinação de que seja ela complementada, tanto mais que o julgador não indica os argumentos a serem desenvolvidos para o bom exercício da defesa do réu.
5. Constitui dever do magistrado zelar pela regularidade do andamento do processo, a fim de evitar nulidade processual. Tal dever, principalmente quando voltado para a verificação da efetiva obediência à garantia constitucional do direito ao contraditório e à ampla defesa, não pode ser mitigado, tanto mais diante do entendimento expresso no verbete n. 523 da Súmula da Corte Suprema, que considera nulidade absoluta a falta de defesa, ao que pode se equiparar a resposta insuficiente que, ao fim e ao cabo, implique em ausência de defesa. Precedentes.
6. Por mais que o Supremo Tribunal Federal tenha reconhecido preferência de nomeação da Defensoria Pública para representação do réu incapaz de custear seu próprio patrono (se a Defensoria está devidamente estruturada no local), tal interpretação é passível de uma série de exceções e mitigações e não impede a substituição pontual do Defensor Público por defensor dativo.
7. Com efeito, o art. 4º-A da Lei Complementar 80/1994 estabelece que são direitos dos assistidos pela Defensoria Pública "o patrocínio de seus direitos e interesses pelo defensor natural" (designação por critérios legais), o que não se confunde com exclusividade do órgão para atuar nas causas em que figure pessoa carente, sobretudo se considerada a atual realidade institucional (HC 123.494, Relator(a): Min. TEORI ZAVASCKI, Segunda Turma, julgado em 16/02/2016, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-039 DIVULG 01-03-2016 PUBLIC 02-03-2016).
8. A defesa, no âmbito do processo penal, deve ser a mais completa possível, garantindo-se que, em todas as fases, o acusado, ainda que revel, esteja devidamente representado por defensor que zele pela regularidade dos procedimentos, requerendo o que for de direito a seu favor. E, com a reforma do Código de Processo Penal, por meio da Lei 11.719/2008, a defesa prévia, cuja apresentação anteriormente nem mesmo era obrigatória, passa a ser peça de grande importância, até porque as alegações ali postas podem levar à absolvição sumária do acusado, nos termos do art. 397 do CPP. 9. Não há como se reconhecer teratologia na decisão judicial que, após negativa de complementação de defesa prévia apresentada em três linhas de conteúdo genérico, designa pontualmente defensor dativo ao acusado.
10. Inviável, ademais, o reconhecimento de nulidade sem demonstração de prejuízo (art. 563 da Lei Adjetiva Penal), máxime quando o recorrente não dedicou uma linha sequer das razões de seu recurso para alegar tal prejuízo. Assim, em momento algum, a Defensoria Pública logrou comprovar em que medida o paciente teria sido prejudicado com atuação do advogado dativo, circunstância que reforça a impossibilidade de reconhecimento da eiva suscitada, nos termos do artigo 563 do Código de Processo Penal. (RHC 74.841/AC, Rel. Ministro JORGE MUSSI, QUINTA TURMA, julgado em 06/10/2016, DJe 14/10/2016).
11. Eventuais discordâncias pessoais entre os operadores do direito deverão ser resolvidas no âmbito de suas respectivas corregedorias.
12. Recurso a que se nega provimento.
(RMS 49.902/PR, Rel. Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, QUINTA TURMA, julgado em 18/05/2017, DJe 26/05/2017)
Ementa
PROCESSO PENAL. RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA.
DEFENSORIA PÚBLICA. FUNÇÃO ESSENCIAL AO ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO. ACESSO À JUSTIÇA. DEFESA PRÉVIA: INOVAÇÕES DA LEI 11.719/2008. OBRIGATORIEDADE E EFETIVIDADE DA RESPOSTA. AMPLA DEFESA E CONTRADITÓRIO. SUBSTITUIÇÃO PONTUAL DE DEFENSOR PÚBLICO POR DEFENSOR DATIVO: POSSIBILIDADE. INEXISTÊNCIA DE INTERFERÊNCIA NA INDEPENDÊNCIA FUNCIONAL DA DEFENSORIA. CONTROLE JUDICIAL PARA EVITAR NULIDADES. SANEAMENTO PROCESSUAL PERMANENTE. AUSÊNCIA DE DEMONSTRAÇÃO DE PREJUÍZO. PRECEDENTES DO STF E DO STJ.
1. A instituição da Defensoria Pública é reconhecida pelo art. 134 da CF/88 como essencial à função jurisdicional do Estado, dado o seu relevante papel na garantia de efetivo acesso à justiça a um sem número de necessitados. Como expressão e instrumento do regime democrático, essa grande Instituição deve promover, fundamentalmente, a orientação jurídica, os direitos humanos e a defesa, em todos os graus, judicial e extrajudicial, dos direitos individuais e coletivos, de forma integral e gratuita, aos necessitados, na forma do inciso LXXIV do art. 5º da Constituição Federal. 2. Nessa linha de raciocínio, é admissível a designação de advogado ad hoc para atuar no feito quando não há órgão de assistência judiciária na comarca ou subseção judiciária, ou se a Defensoria não está devidamente organizada na localidade, havendo desproporção entre os assistidos e os respectivos defensores (RHC n.
106.394/MG, Primeira Turma, Rel. Min. Rosa Weber, DJe de 08/02/2013 e HC n. 337.754/SC, Quinta Turma, Rel. Min. Jorge Mussi, DJe de 26/11/2015).
3. A Defensoria Pública da União ainda não está aparelhada ao ponto de dispensar-se, no âmbito da Justiça Federal, a atuação dos advogados voluntários e dos núcleos de prática jurídica das universidades até mesmo nas grandes capitais. A desproporção entre os assistidos e os respectivos defensores é evidente! 4. Diante das inovações contidas nos arts. 396, 396-A e 397 da Lei Adjetiva Penal, o caráter obrigatório e a necessidade da efetiva defesa prévia do acusado, que poderá, inclusive, provocar a absolvição sumária nessa fase inicial, não constituem interferência na independência funcional da Defensoria Pública: a) a verificação de que a petição apresentada não traz argumentos mínimos suficientes para a configuração de uma defesa técnica efetiva e eficiente; b) a determinação de que seja ela complementada, tanto mais que o julgador não indica os argumentos a serem desenvolvidos para o bom exercício da defesa do réu.
5. Constitui dever do magistrado zelar pela regularidade do andamento do processo, a fim de evitar nulidade processual. Tal dever, principalmente quando voltado para a verificação da efetiva obediência à garantia constitucional do direito ao contraditório e à ampla defesa, não pode ser mitigado, tanto mais diante do entendimento expresso no verbete n. 523 da Súmula da Corte Suprema, que considera nulidade absoluta a falta de defesa, ao que pode se equiparar a resposta insuficiente que, ao fim e ao cabo, implique em ausência de defesa. Precedentes.
6. Por mais que o Supremo Tribunal Federal tenha reconhecido preferência de nomeação da Defensoria Pública para representação do réu incapaz de custear seu próprio patrono (se a Defensoria está devidamente estruturada no local), tal interpretação é passível de uma série de exceções e mitigações e não impede a substituição pontual do Defensor Público por defensor dativo.
7. Com efeito, o art. 4º-A da Lei Complementar 80/1994 estabelece que são direitos dos assistidos pela Defensoria Pública "o patrocínio de seus direitos e interesses pelo defensor natural" (designação por critérios legais), o que não se confunde com exclusividade do órgão para atuar nas causas em que figure pessoa carente, sobretudo se considerada a atual realidade institucional (HC 123.494, Relator(a): Min. TEORI ZAVASCKI, Segunda Turma, julgado em 16/02/2016, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-039 DIVULG 01-03-2016 PUBLIC 02-03-2016).
8. A defesa, no âmbito do processo penal, deve ser a mais completa possível, garantindo-se que, em todas as fases, o acusado, ainda que revel, esteja devidamente representado por defensor que zele pela regularidade dos procedimentos, requerendo o que for de direito a seu favor. E, com a reforma do Código de Processo Penal, por meio da Lei 11.719/2008, a defesa prévia, cuja apresentação anteriormente nem mesmo era obrigatória, passa a ser peça de grande importância, até porque as alegações ali postas podem levar à absolvição sumária do acusado, nos termos do art. 397 do CPP. 9. Não há como se reconhecer teratologia na decisão judicial que, após negativa de complementação de defesa prévia apresentada em três linhas de conteúdo genérico, designa pontualmente defensor dativo ao acusado.
10. Inviável, ademais, o reconhecimento de nulidade sem demonstração de prejuízo (art. 563 da Lei Adjetiva Penal), máxime quando o recorrente não dedicou uma linha sequer das razões de seu recurso para alegar tal prejuízo. Assim, em momento algum, a Defensoria Pública logrou comprovar em que medida o paciente teria sido prejudicado com atuação do advogado dativo, circunstância que reforça a impossibilidade de reconhecimento da eiva suscitada, nos termos do artigo 563 do Código de Processo Penal. (RHC 74.841/AC, Rel. Ministro JORGE MUSSI, QUINTA TURMA, julgado em 06/10/2016, DJe 14/10/2016).
11. Eventuais discordâncias pessoais entre os operadores do direito deverão ser resolvidas no âmbito de suas respectivas corregedorias.
12. Recurso a que se nega provimento.
(RMS 49.902/PR, Rel. Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, QUINTA TURMA, julgado em 18/05/2017, DJe 26/05/2017)Acórdão
Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima
indicadas, acordam os Ministros da Quinta Turma do Superior Tribunal
de Justiça, por unanimidade, negar provimento ao recurso. Os Srs.
Ministros Ribeiro Dantas, Joel Ilan Paciornik, Felix Fischer e Jorge
Mussi votaram com o Sr. Ministro Relator.
Data do Julgamento
:
18/05/2017
Data da Publicação
:
DJe 26/05/2017
Órgão Julgador
:
T5 - QUINTA TURMA
Relator(a)
:
Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA (1170)
Referência legislativa
:
LEG:FED CFB:****** ANO:1988***** CF-1988 CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988 ART:00005 INC:00074 ART:00134LEG:FED DEL:003689 ANO:1941***** CPP-41 CÓDIGO DE PROCESSO PENAL ART:00396 ART:0396A ART:00397 ART:00563LEG:FED SUM:****** ANO:********* SUM(STF) SÚMULA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL SUM:000523LEG:FED LCP:000080 ANO:1994 ART:0004ALEG:FED LEI:011719 ANO:2008
Veja
:
(DESIGNAÇÃO ADVOGADO DATIVO - POSSIBILIDADE) STF - RHC 106394-MG STJ - HC 337754-SC(DEFENSORIA PÚBLICA - INEXISTÊNCIA EXCLUSIVIDADE) STF - HC 123494 STJ - RHC 35119-RS, RHC 74841-AC(NULIDADE - NÃO COMPROVAÇÃO DO PREJUÍZO) STJ - RHC 74841-AC, AgRg no Ag 1130380-MG, HC 344693-SP, RHC 11081-SP
Mostrar discussão