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Jurisprudência


STF AO 506 QO / AC - ACRE QUESTÃO DE ORDEM NA AÇÃO ORIGINÁRIA

Ementa
- DIREITO CONSTITUCIONAL, ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO POPULAR CONTRA TODOS OS MAGISTRADOS DO ESTADO DO ACRE. COMPETÊNCIA ORIGINÁRIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL(ART. 102, I, "N", DA C.F.). CABIMENTO DA AÇÃO. MEDIDA LIMINAR. GRATIFICAÇÃO DE NÍVEL UNIVERSITÁRIO AOS MAGISTRADOS DO ESTADO DO ACRE: ATO Nº 143/89, DE 20.07.1989, BAIXADO PELO PRESIDENTE DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA. ART. 326 DO CÓDIGO DE ORGANIZAÇÃO JUDICIÁRIA DO ESTADO (L.C. N 47, DE 22.11.1995). QUESTÕES DE ORDEM. 1. A competência originária do Supremo Tribunal Federal é de ser reconhecida, em face do disposto no art. 102, I, "n", da Constituição Federal, pois a Ação é proposta contra todos os Juízes do Estado do Acre, inclusive os Desembargadores do Tribunal de Justiça. 2. A Ação Popular é cabível, já que objetiva a suspensão definitiva do pagamento da Gratificação de Nível Superior e a conseqüente condenação dos beneficiários à devolução de todas as quantias recebidas, devidamente corrigidas. Com efeito, a Ação Popular, como regulada pela Lei nº 4.717, de 29.06.1965, visa à declaração de nulidade ou à anulação de atos administrativos, quando lesivos ao patrimônio público, como dispõem seus artigos 1º, 2º e 4º. Mas não é preciso esperar que os atos lesivos ocorram e produzam todos os seus efeitos, para que, só então, ela seja proposta. 3. No caso presente, a Ação Popular, como proposta, tem índole preventiva e repressiva ou corretiva, ao mesmo tempo. Com ela se pretende a sustação dos pagamentos futuros (caráter preventivo) e a restituição das quantias que tiverem sido pagas, nos últimos cinco anos, em face do prazo prescricional previsto no art. 21 da Lei da Ação Popular (caráter repressivo). 4. Cabível, pois, a Ação, como proposta. 5. Examina-se, em seguida, o requerimento de medida liminar, como prevista no § 4º do art. 5º da L.A.P. 6. A base normativa atual para o pagamento da Gratificação de Nível Universitário aos Magistrados do Estado do Acre é o Ato nº 143/89, de 20 de julho de 1989, baixado pelo então Presidente do Tribunal de Justiça. 7. O caráter normativo desse Ato é indiscutível, pois reinstitui a antiga e já extinta Gratificação de Nível Universitário para todos os Magistrados do Acre, não se tratando, aí, de ato puramente administrativo, praticado na apreciação de requerimento de qualquer interessado. Tendo caráter normativo, não poderia ele ser impugnado em Ação Popular, mas, sim, em Ação Direta de Inconstitucionalidade, ou, incidentalmente, na propositura da Ação Popular, como um dos fundamentos desta. E é o que ocorre, no caso, pois o autor não objetiva a declaração de nulidade ou de inconstitucionalidade do Ato nº 143/89, de 20.07.1989, da Presidência do Tribunal de Justiça do Estado, mas, sim, a suspensão dos atos administrativos consistentes nos pagamentos dos valores correspondentes à vantagem reinstituída pelo ato normativo. E isso por considerar inconstitucional e ilegal a reinstituição da gratificação, pelo ato normativo referido. 8. Parece evidente, ao menos a um primeiro exame, que o Presidente do Tribunal de Justiça não tinha e não tem competência para elaborar ato normativo, instituindo ou reinstituindo vantagem pecuniária em favor de toda a Magistratura do Estado, como ocorreu no caso, pois, para isso, seria imprescindível o envio de projeto de lei, pelo Tribunal de Justiça, ao Poder Legislativo estadual, nos termos do art. 96, II, "b", da Constituição Federal. Projeto, ademais, que haveria de estar em conformidade com o Estatuto da Magistratura Nacional, que não prevê Gratificação de Nível Universitário aos Magistrados, e até exclui a possibilidade de lhes ser outorgada (art. 65, seus incisos, e parágrafo 2º, da Lei Complementar nº 35, de 14.03.1979). Estatuto, aliás, que, segundo pacífica jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, ainda se encontra em vigor, ao menos nos pontos em que não se mostra incompatível com a Constituição Federal de 05.10.1988, que lhe é posterior. E, a esse respeito, não há incompatibilidade entre o Estatuto e a Constituição, pois, tanto um, quanto outra, deixam claro que os vencimentos dos Magistrados, neles incluídas as vantagens pecuniárias, como as gratificações, são fixados em lei (art. 61 da LOMAN e art. 96, II, "b", da Constituição). 9. De resto, o Projeto de Lei do novo Estatuto da Magistratura Nacional, já foi enviado, pelo Supremo Tribunal Federal, ao Congresso Nacional, conforme estabelece o art. 93 da Constituição Federal, e também ele, no art. 28, exige lei formal para a instituição de qualquer vantagem pecuniária para os Magistrados. 10. Esse, pois, o entendimento do Tribunal, a respeito da matéria, manifestado com o envio do Projeto e que é encontradiço, também, em sua jurisprudência. 11. De salientar, mesmo de passagem, que, entre os "consideranda" do ato normativo, em questão, há também a referência no sentido de que "os membros do Ministério Público do Estado, que têm vencimentos e vantagens iguais aos magistrados do Estado, por força do art. 82 da Lei Complementar nº 08, de 18 de julho de 1983, continuam percebendo as vantagens denominadas nível universitário e sexta parte". E por isso o ato normativo estendeu aos Magistrados a Gratificação de Nível Universitário, assim como a sexta parte. Sucede que vinculação e equiparação de vencimentos já eram proibidas pelo art. 98, parágrafo único, da E.C. nº 1/69, e continuam sendo pelo inciso XIII do art. 39 da Constituição Federal de 1988. 12. É certo, também, que a Lei Complementar estadual nº 47, de 22 de novembro de 1995, que instituiu o Código de Organização e Divisão Judiciárias do Estado do Acre, no art. 326, estabeleceu: "Art. 326. A Gratificação de Nível Superior devida aos servidores ocupantes de cargos de nível superior, corresponderá a 40% (quarenta por cento) do vencimento do cargo que estiverem exercendo." Essa Gratificação vem sendo paga aos Magistrados do Acre, não com base nesse texto, que somente se refere aos servidores públicos ocupantes de cargos de nível superior, mas com base num texto que assim restou expresso pelo Tribunal de Justiça, no "Código de Organização e Divisão Judiciárias do Estado do Acre", que fez imprimir: "Art. 326 - A Gratificação de Nível Superior, devida aos servidores ocupantes de cargos de nível superior, inclusive aos Magistrados, corresponderá a 40% (quarenta por cento) do vencimento do cargo que estiverem exercendo". As expressões "inclusive aos Magistrados" não constaram da Lei, como aprovada pelo Poder Legislativo, mas, sim, apenas e tão-somente, do impresso realizado pelo Tribunal de Justiça. Trata-se, pois, de expressões juridicamente inexistentes na Lei e que não podem ser invocadas para o pagamento. Aliás, nas informações presidenciais, ficou expressamente reconhecido que não constam elas da Lei, de sorte que, a esta altura, o único ato normativo, que outorga tal vantagem aos Magistrados do Acre é o baixado, pelo então Presidente, a 20 de julho de 1989 (Ato nº 143/89), sem qualquer apoio na Constituição Federal e no Estatuto da Magistratura Nacional. 13. De resto, a Gratificação de Nível Universitário vinha sendo paga, aos Magistrados do Acre, antes da E.C. nº 1/69 e do Estatuto da Magistratura Nacional (L.C. nº 35/79), com base no art. 374 da Lei de Organização Judiciária do Estado (Lei nº 11, de 20 de março de 1964). Essa vantagem restou extinta, como reconhecido nos próprios "consideranda" do Ato Normativo nº 143/89, de 20 de julho de 1989. Assim, o Ato normativo nº 143/89, baixado pelo então Presidente, sem apoio constitucional ou legal, reinstituiu a vantagem extinta. Mas a que vem sendo paga, também não é a correspondente aos 25% dos vencimentos do cargo, mas, sim, a 40%. E isso como decorrência de inclusão, no texto impresso pelo Tribunal, de expressões não contidas na L.C. nº 47/95. 14. Diante de todas essas circunstâncias, não se pode negar a plausibilidade jurídica da Ação Popular, que visa, em primeiro lugar, à sustação do pagamento da Gratificação de Nível Superior aos Magistrados ativos e inativos do Estado do Acre e, em seguida, à restituição do que tiverem recebido a esse título, nos últimos cinco anos. 15. Está presente, também, o requisito do "periculum in mora", pois é previsível a demora no andamento do processo, talvez de alguns anos, com tantos demandados a serem citados e que poderão apresentar defesas as mais diversas, seguindo-se a instrução que vier a ser necessária, a manifestação final das partes, do Ministério Público e, enfim, o julgamento do mérito. 16. Se é certo que o Estado do Acre não se insurgiu contra o pagamento da vantagem em questão, certo também é, por outro lado, que qualquer cidadão pode fazê-lo, mediante a Ação Popular. E o autor pediu a citação do Estado para os termos do processo, o que, aliás, tem apoio no § 3º do art. 6º da Lei da Ação Popular, segundo o qual "a pessoa jurídica de direito público ou de direito privado, cujo ato seja objeto de impugnação, poderá abster- se de contestar o pedido, ou poderá atuar ao lado do autor, desde que isso se afigure útil, ao interesse público, a juízo do respectivo representante legal ou dirigente". 17. Há, nas informações do Presidente do Tribunal de Justiça, a notícia de que "alguns juízes, quando o Estado do Acre quis retirar o adicional proveniente do nível superior da Magistratura, ingressaram na Justiça e ganharam a causa, inclusive no Tribunal de Justiça, que confirmou a sentença de primeiro grau". Quanto a esse ponto, não há elementos nos autos, que possibilitem qualquer ressalva. 18. Enfim, resolvendo as questões de ordem, suscitadas pelo Relator, o Supremo Tribunal Federal, considera-se competente, para o processo e julgamento da ação (art. 102, I, "n", da Constituição Federal), admite a Ação Popular, como proposta, e defere a medida liminar, com base no § 4º do art. 5º da L.A.P., para suspender a Gratificação de Nível Superior ou Universitário, que estiver sendo paga aos Magistrados ativos e inativos do Estado do Acre. 19. Oportunamente serão apreciados, pelo Relator, os requerimentos de citação para os termos do processo. 3
Decisão
- O Tribunal, por votação unânime, resolvendo questão de ordem suscitada pelo Relator, (a) reconheceu, com fundamento no art. 102, inciso I, alínea n, da Constituição, a sua competência originária para apreciar esta causa, conhecendo, em conseqüência, da ação popular promovida contra todos os magistrados, ativos e inativos, do Estado do Acre; (b) entendeu processualmente cabível, nos termos e para os efeitos com que ajuizada, a ação popular ora promovida pelo autor; (c) deferiu o pedido de medida cautelar nela formulado, para suspender a gratificação de nível superior ou universitário que estiver sendo paga aos magistrados, ativos e inativos, do Estado do Acre. Votou o Presidente. Ausentes, justificadamente, o Ministro Nelson Jobim, e, neste julgamento, o Ministro Ilmar Galvão. Plenário, 06.5.98.

Data do Julgamento : 06/05/1998
Data da Publicação : DJ 04-12-1998 PP-00010 EMENT VOL-01934-01 PP-00022
Órgão Julgador : Tribunal Pleno
Relator(a) : Min. SYDNEY SANCHES
Parte(s) : AUTOR : HILDEBRANDO PASCOAL NOGUEIRA NETO ADVDA. : VERA ELIZA MÜLLER RÉU : ESTADO DO ACRE RÉU : TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO ACRE LIT.PASS. : GERCINO JOSÉ DA SILVA FILHO E OUTROS
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