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Jurisprudência


STF Ext 1082 / URU - REPÚBLICA ORIENTAL DO URUGUAI EXTRADIÇÃO

Ementa
E M E N T A: EXTRADIÇÃO PASSIVA - ACORDO DE EXTRADIÇÃO (MERCOSUL) - NACIONAL URUGUAIO - TRÁFICO ILÍCITO DE ENTORPECENTES - INVESTIGAÇÃO PENAL AINDA EM CURSO - POSSIBILIDADE - ALEGAÇÃO DE VÍCIOS FORMAIS NA FORMULAÇÃO DO PEDIDO EXTRADICIONAL - INOCORRÊNCIA - PRETENDIDO REEXAME DOS FATOS SUBJACENTES À INVESTIGAÇÃO PENAL - NEGATIVA DE AUTORIA - INADMISSIBILIDADE - SISTEMA DE CONTENCIOSIDADE LIMITADA - MODELO QUE SÓ NÃO SE APLICA AO BRASILEIRO NATURALIZADO (CF, ART. 5º, LI) - SATISFAÇÃO DOS PRESSUPOSTOS E ATENDIMENTO DAS CONDIÇÕES REFERENTES AO PEDIDO EXTRADICIONAL - EXIGÊNCIA DE DETRAÇÃO PENAL - EXTRADIÇÃO DEFERIDA. PROCESSO EXTRADICIONAL E SISTEMA DE CONTENCIOSIDADE LIMITADA: INADMISSIBILIDADE DE DISCUSSÃO SOBRE A PROVA PENAL PRODUZIDA PERANTE O ESTADO REQUERENTE. - A ação de extradição passiva não confere, ordinariamente, ao Supremo Tribunal Federal, qualquer poder de indagação sobre o mérito da pretensão deduzida pelo Estado requerente ou sobre o contexto probatório em que a postulação extradicional se apóia, não cabendo, ainda, a esta Corte Suprema, o exame da negativa de autoria invocada pelo extraditando em sua defesa. Precedentes. Doutrina. - O sistema de contenciosidade limitada, que caracteriza o regime jurídico da extradição passiva no direito positivo brasileiro, não permite qualquer indagação probatória pertinente ao ilícito criminal cuja persecução, no exterior, justificou o ajuizamento da demanda extradicional perante o Supremo Tribunal Federal. - Revelar-se-á excepcionalmente possível, no entanto, a análise, pelo Supremo Tribunal Federal, de aspectos materiais concernentes à própria substância da imputação penal, sempre que tal exame se mostrar indispensável à solução de controvérsia pertinente (a) à ocorrência de prescrição penal, (b) à observância do princípio da dupla tipicidade ou (c) à configuração eventualmente política tanto do delito atribuído ao extraditando quanto das razões que levaram o Estado estrangeiro a requerer a extradição de determinada pessoa ao Governo brasileiro. Inocorrência, na espécie, de qualquer dessas hipóteses. VALIDADE CONSTITUCIONAL DO ART. 85, § 1º, DA LEI Nº 6.815/80. - As restrições de ordem temática, estabelecidas no Estatuto do Estrangeiro (art. 85, § 1º) - cuja incidência delimita, nas ações de extradição passiva, o âmbito material do exercício do direito de defesa -, não são inconstitucionais, nem ofendem a garantia da plenitude de defesa, em face da natureza mesma de que se reveste o processo extradicional no direito brasileiro e, ainda, em decorrência do próprio modelo de contenciosidade limitada adotado pelo ordenamento positivo nacional. Precedentes. EXTRADIÇÃO PASSIVA E BRASILEIRO NATURALIZADO - POSSIBILIDADE EXCEPCIONAL - TRÁFICO ILÍCITO DE ENTORPECENTES - NECESSIDADES, EM TAL HIPÓTESE, DE QUE SE DEMONSTRE "COMPROVADO ENVOLVIMENTO" DO BRASILEIRO NATURALIZADO (CF, ART. 5º, LI) - EXCEÇÃO CONSTITUCIONAL AO MODELO DE CONTENCIOSIDADE LIMITADA - INAPLICABILIDADE DESSA REGRA DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA AO SÚDITO ESTRANGEIRO, EMBORA O CO-AUTOR DO MESMO FATO DELITUOSO OSTENTE A CONDIÇÃO DE BRASILEIRO NATURALIZADO. - O brasileiro naturalizado, em tema de extradição passiva, dispõe de proteção constitucional mais intensa que aquela outorgada aos súditos estrangeiros em geral, pois somente pode ser extraditado pelo Governo do Brasil em duas hipóteses excepcionais: (a) crimes comuns cometidos antes da naturalização e (b) tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins praticado em qualquer momento, antes ou depois de obtida a naturalização (CF, art. 5º, LI). - Tratando-se de extradição requerida contra brasileiro naturalizado, fundada em suposta prática de tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, impõe-se, ao Estado requerente, a comprovação do envolvimento da pessoa reclamada no cometimento de referido evento delituoso. - A inovação jurídica introduzida pela norma inscrita no art. 5º, LI, "in fine", da Constituição - além de representar, em favor do brasileiro naturalizado, clara derrogação do sistema de contenciosidade limitada - instituiu procedimento, a ser disciplinado em lei, destinado a ensejar cognição judicial mais abrangente do conteúdo da acusação (ou da condenação) penal estrangeira, em ordem a permitir, embora excepcionalmente, ao Supremo Tribunal Federal, na ação de extradição passiva, o exame do próprio mérito da "persecutio criminis" instaurada perante autoridades do Estado requerente. Precedentes: Ext 688/República Italiana, Rel. Min. CELSO DE MELLO - Ext 934/República Oriental do Uruguai, Rel. Min. EROS GRAU - Ext 1.074/República Federal da Alemanha, Rel. Min. CELSO DE MELLO, v.g.. - Não se aplica, contudo, ao súdito estrangeiro, em sede extradicional, essa mesma regra constitucional de tratamento mais favorável (CF, art. 5º, LI), não obstante o co-autor do fato delituoso ostente a condição de brasileiro naturalizado. EXTRADIÇÃO - DUPLA TIPICIDADE E DUPLA PUNIBILIDADE. - O postulado da dupla tipicidade - por constituir requisito essencial ao atendimento do pedido de extradição - impõe que o ilícito penal atribuído ao extraditando seja juridicamente qualificado como crime tanto no Brasil quanto no Estado requerente. Delito imputado ao súdito estrangeiro - tráfico ilícito de entorpecentes ("transporte") - que encontra, na espécie em exame, plena correspondência típica na legislação penal brasileira. - Não se concederá a extradição, quando se achar extinta, em decorrência de qualquer causa legal, a punibilidade do extraditando, notadamente se se verificar a consumação da prescrição penal, seja nos termos da lei brasileira, seja segundo o ordenamento positivo do Estado requerente. A satisfação da exigência concernente à dupla punibilidade constitui requisito essencial ao deferimento do pedido extradicional. - Observância, na espécie, do postulado da dupla punibilidade, eis que atendida, no caso, a exigência fundada no Acordo de Extradição (MERCOSUL), que impõe, tão-somente, ao Estado requerente, que instrua o pedido com declaração formal "de que a ação e a pena não estejam prescritas de acordo com sua legislação" (Artigo 18, n. 4, III). Desnecessidade, em tal caso, de oferecimento de cópia dos respectivos textos legais, exceto se o Supremo Tribunal Federal reputar indispensável essa produção documental. Inexistência, na espécie, de qualquer dúvida objetiva sobre a subsistência da pretensão punitiva do Estado requerente. NOTA DIPLOMÁTICA E PRESUNÇÃO DE VERACIDADE. - A Nota Diplomática, que vale pelo que nela se contém, goza da presunção "juris tantum" de autenticidade e de veracidade (RTJ 177/485-488). Trata-se de documento formal cuja eficácia jurídica deriva das condições e peculiaridades de seu trânsito por via diplomática. Presume-se, desse modo, a sinceridade da declaração encaminhada por via diplomática, no sentido de que a pretensão punitiva ou executória do Estado requerente mantém-se íntegra, nos termos de sua própria legislação. Essa presunção de veracidade - sempre ressalvada a possibilidade de demonstração em contrário - decorre do princípio da boa-fé, que rege, no plano internacional, as relações político-jurídicas entre os Estados soberanos. A Convenção de Viena sobre Relações Diplomáticas - Artigo 3º, n. 1, "a" - outorga, à Missão Diplomática, o poder de representar o Estado acreditante ("État d'envoi") perante o Estado acreditado ou Estado receptor (o Brasil, no caso), derivando, dessa eminente função política, um complexo de atribuições e de poderes reconhecidos ao agente diplomático que exerce a atividade de representação institucional de seu País, aí incluída a prerrogativa de fazer declarações, como aquela a que se refere o Acordo de Extradição/MERCOSUL (Artigo 18, n. 4, III). DETRAÇÃO PENAL E PRISÃO CAUTELAR PARA EFEITOS EXTRADICIONAIS. - O período de duração da prisão cautelar do súdito estrangeiro, no Brasil, decretada para fins extradicionais, ainda que em processo de extradição julgado extinto por instrução documental deficiente, deve ser integralmente computado na pena a ser cumprida no Estado requerente. - Essa exigência - originariamente estabelecida no Código Bustamante (art. 379), hoje fundada no Estatuto do Estrangeiro ou, quando houver, em tratado de extradição específico (como o Acordo de Extradição/MERCOSUL) - objetiva impedir que a prisão cautelar, no Brasil, quando decretada para fins extradicionais, culmine por prorrogar, indevidamente, o lapso temporal da pena de prisão a que estará eventualmente sujeito, no Estado requerente, o súdito estrangeiro cuja entrega foi reclamada ao Governo brasileiro.
Decisão
O Tribunal, por unanimidade e nos termos do voto do relator, deferiu o pedido de extradição. Ausente, justificadamente, o Senhor Ministro Menezes Direito. Falou pelo extraditando o Dr. Renato Nakahara. Presidiu o julgamento o Senhor Ministro Gilmar Mendes. Plenário, 19.06.2008.

Data do Julgamento : 19/06/2008
Data da Publicação : DJe-147 DIVULG 07-08-2008 PUBLIC 08-08-2008 EMENT VOL-02327-01 PP-00009 RTJ VOL-00206-02 PP-00505
Órgão Julgador : Tribunal Pleno
Relator(a) : Min. CELSO DE MELLO
Parte(s) : REQTE.(S): GOVERNO DO URUGUAI EXTDO.(A/S): CARLOS ALBERTO FRASCOLLA PERDIGÓN ADV.(A/S): RENATO YASUO MATSUMURA NAKAHARA
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