STF Ext 542 / ESTADOS UNIDOS DA AMÉRICA EXTRADIÇÃO
- EXTRADIÇÃO - NATUREZA DO PROCESSO EXTRADICIONAL - EXTENSÃO DOS PODERES DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL - JUÍZO DE DELIBAÇÃO - INADMISSIBILIDADE DO JUÍZO DE REVISÃO - LIMITAÇÃO MATERIAL DA DEFESA DO EXTRADITANDO - "BILL OF INDICTMENT" E SUA
NATUREZA
JURÍDICA - IMPOSSIBILIDADE DE IMPOR AO ESTADO REQUERENTE A ADOÇÃO DA FIGURA DO CRIME CONTINUADO - EXTRADIÇÃO DEFERIDA.
- A ação de extradição passiva, instaurada, no âmbito do Estado brasileiro, perante o Supremo Tribunal Federal, não confere a esta Corte qualquer poder de indagação sobre o mérito da pretensão deduzida pelo Estado requerente ou sobre o contexto
probatório em que a postulação extradicional se apóia.
- O controle de legalidade do pedido extradicional não permite ao Supremo Tribunal Federal sequer reexaminar a existência de eventuais defeitos formais que hajam inquinado de nulidade a "persecutio criminis" instaurada no âmbito do Estado requerente.
- O processo de extradição passiva - que ostenta, em nosso sistema jurídico, o caráter de processo documental - não admite que se instaure em seu âmbito, e entre as partes que nele figuram, qualquer contraditório que tenha por objeto os elementos
probatórios produzidos na causa penal que motivou a postulação extradicional deduzida por Governo estrangeiro perante o Estado brasileiro.
- O juízo de delibação, subjacente ao pronunciamento do Supremo Tribunal Federal na apreciação da ação de extradição passiva, não confere poder algum a esta Corte Suprema para rever ou reexaminar os procedimentos judiciais instaurados perante o Estado
estrangeiro, incluindo-se nessa vedação até mesmo a própria sentença penal condenatória deles resultante. Inexiste, portanto, no processo extradicional regido pelo ordenamento positivo brasileiro, a possibilidade de o Supremo Tribunal Federal emitir
qualquer juízo de revisão.
- A natureza especial do processo de extradição impõe limitações materiais ao exercício do direito de defesa pelo extraditando, que, nele, somente poderá suscitar questões temáticas associadas (a) à identidade da pessoa reclamada, (b) ao defeito de
forma dos documentos apresentados e/ou (c) à ilegalidade da extradição.
- O "indictment" - que o Supremo Tribunal Federal já equiparou ao instituto processual da pronúncia (Ext 280-EUA, RTJ-50/299) - constitui título jurídico hábil que legitima, nos pedidos extradicionais instrutórios, o ajuizamento da ação de extradição
passiva.
- A questão do reconhecimento, ou não, da ficção jurídica do crime continuado, traduz - enquanto expressão da benignidade estatal no tratamento jurídico-penal das infrações múltiplas cometidas pelo mesmo agente - opção legislativa peculiar ao
ordenamento jurídico de cada Estado. Nesse contexto, não se pode impor, no plano das relações extradicionais entre Estados soberanos, a compulsória submissão da parte requerente ao modelo jurídico de aplicação das penas vigente no âmbito do sistema
normativo do Estado a quem a extradição é solicitada.
O Brasil, conseqüentemente, não pode, a pretexto de deferir o pedido extradicional, impor, à observância necessária dos demais países, o seu modelo legal que, consagrando o instituto da unidade fictícia do crime continuado, estipula regras concernentes
à aplicação da pena.
A imposssibilidade de o Estado brasileiro impor, mediante ressalva, ao Estado requerente, a aceitação de institutos peculiares ao direito penal positivo do Brasil - tal como se dá em relação ao fenômeno jurídico da continuidade delitiva - deriva da
circunstância de que, em assim agindo, estaria a afetar a própria integridade da soberania estatal da parte requerente. A força da importação de critérios ou de institutos penais não se legitima em face do Direito das Gentes e nem à luz de nosso
próprio
sistema jurídico.
Cabe, assim, à Justiça do Estado requerente, reconhecer soberanamente - desde que o permita a sua própria legislação penal - a ocorrência, ou não, da continuidade delitiva, não competindo ao Brasil, em obséquio ao princípio fundamental da soberania dos
Estados, que rege as relações internacionais, constranger o Governo requerente a aceitar um instituto que até mesmo o seu próprio ordenamento positivo possa rejeitar.
Ementa
- EXTRADIÇÃO - NATUREZA DO PROCESSO EXTRADICIONAL - EXTENSÃO DOS PODERES DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL - JUÍZO DE DELIBAÇÃO - INADMISSIBILIDADE DO JUÍZO DE REVISÃO - LIMITAÇÃO MATERIAL DA DEFESA DO EXTRADITANDO - "BILL OF INDICTMENT" E SUA
NATUREZA
JURÍDICA - IMPOSSIBILIDADE DE IMPOR AO ESTADO REQUERENTE A ADOÇÃO DA FIGURA DO CRIME CONTINUADO - EXTRADIÇÃO DEFERIDA.
- A ação de extradição passiva, instaurada, no âmbito do Estado brasileiro, perante o Supremo Tribunal Federal, não confere a esta Corte qualquer poder de indagação sobre o mérito da pretensão deduzida pelo Estado requerente ou sobre o contexto
probatório em que a postulação extradicional se apóia.
- O controle de legalidade do pedido extradicional não permite ao Supremo Tribunal Federal sequer reexaminar a existência de eventuais defeitos formais que hajam inquinado de nulidade a "persecutio criminis" instaurada no âmbito do Estado requerente.
- O processo de extradição passiva - que ostenta, em nosso sistema jurídico, o caráter de processo documental - não admite que se instaure em seu âmbito, e entre as partes que nele figuram, qualquer contraditório que tenha por objeto os elementos
probatórios produzidos na causa penal que motivou a postulação extradicional deduzida por Governo estrangeiro perante o Estado brasileiro.
- O juízo de delibação, subjacente ao pronunciamento do Supremo Tribunal Federal na apreciação da ação de extradição passiva, não confere poder algum a esta Corte Suprema para rever ou reexaminar os procedimentos judiciais instaurados perante o Estado
estrangeiro, incluindo-se nessa vedação até mesmo a própria sentença penal condenatória deles resultante. Inexiste, portanto, no processo extradicional regido pelo ordenamento positivo brasileiro, a possibilidade de o Supremo Tribunal Federal emitir
qualquer juízo de revisão.
- A natureza especial do processo de extradição impõe limitações materiais ao exercício do direito de defesa pelo extraditando, que, nele, somente poderá suscitar questões temáticas associadas (a) à identidade da pessoa reclamada, (b) ao defeito de
forma dos documentos apresentados e/ou (c) à ilegalidade da extradição.
- O "indictment" - que o Supremo Tribunal Federal já equiparou ao instituto processual da pronúncia (Ext 280-EUA, RTJ-50/299) - constitui título jurídico hábil que legitima, nos pedidos extradicionais instrutórios, o ajuizamento da ação de extradição
passiva.
- A questão do reconhecimento, ou não, da ficção jurídica do crime continuado, traduz - enquanto expressão da benignidade estatal no tratamento jurídico-penal das infrações múltiplas cometidas pelo mesmo agente - opção legislativa peculiar ao
ordenamento jurídico de cada Estado. Nesse contexto, não se pode impor, no plano das relações extradicionais entre Estados soberanos, a compulsória submissão da parte requerente ao modelo jurídico de aplicação das penas vigente no âmbito do sistema
normativo do Estado a quem a extradição é solicitada.
O Brasil, conseqüentemente, não pode, a pretexto de deferir o pedido extradicional, impor, à observância necessária dos demais países, o seu modelo legal que, consagrando o instituto da unidade fictícia do crime continuado, estipula regras concernentes
à aplicação da pena.
A imposssibilidade de o Estado brasileiro impor, mediante ressalva, ao Estado requerente, a aceitação de institutos peculiares ao direito penal positivo do Brasil - tal como se dá em relação ao fenômeno jurídico da continuidade delitiva - deriva da
circunstância de que, em assim agindo, estaria a afetar a própria integridade da soberania estatal da parte requerente. A força da importação de critérios ou de institutos penais não se legitima em face do Direito das Gentes e nem à luz de nosso
próprio
sistema jurídico.
Cabe, assim, à Justiça do Estado requerente, reconhecer soberanamente - desde que o permita a sua própria legislação penal - a ocorrência, ou não, da continuidade delitiva, não competindo ao Brasil, em obséquio ao princípio fundamental da soberania dos
Estados, que rege as relações internacionais, constranger o Governo requerente a aceitar um instituto que até mesmo o seu próprio ordenamento positivo possa rejeitar.Decisão
Por votação unânime, o Tribunal deferiu o pedido de extradição.
Falaram, pelo requerente, o Dr. Paulo Roberto Chaves Rolo e, pelo
extraditando, o Dr. Raimundo Evaldo Ponte. Plenário, 13.02.92.
Data do Julgamento
:
13/02/1992
Data da Publicação
:
DJ 20-03-1992 PP-03320 EMENT VOL-01654-01 PP-00103 RTJ VOL-00140-02 PP-00436
Órgão Julgador
:
Tribunal Pleno
Relator(a)
:
Min. CELSO DE MELLO
Parte(s)
:
REQTE. : GOVERNO DOS ESTADOS UNIDOS DA AMÉRICA
ADVDO. : PAULO ROBERTO CHAVES ROLO
EXTNDO. : MORRIS CLINTON HENSON, TAMBÉM CONHECIDO COMO MAURÍCIO
ADVDOS. : MARCELO FRAGOSO PONTE E OUTRO
Mostrar discussão