STF Ext 855 / CL - CHILE EXTRADIÇÃO
E M E N T A: EXTRADIÇÃO - ATOS DELITUOSOS DE NATUREZA TERRORISTA -
DESCARACTERIZAÇÃO DO TERRORISMO COMO PRÁTICA DE CRIMINALIDADE
POLÍTICA - CONDENAÇÃO DO EXTRADITANDO A DUAS (2) PENAS DE PRISÃO
PERPÉTUA - INADMISSIBILIDADE DESSA PUNIÇÃO NO SISTEMA CONSTITUCIONAL
BRASILEIRO (CF, ART. 5º, XLVII, "B") - EFETIVAÇÃO EXTRADICIONAL
DEPENDENTE DE PRÉVIO COMPROMISSO DIPLOMÁTICO CONSISTENTE NA
COMUTAÇÃO, EM PENAS TEMPORÁRIAS NÃO SUPERIORES A 30 ANOS, DA PENA DE
PRISÃO PERPÉTUA - PRETENDIDA EXECUÇÃO IMEDIATA DA ORDEM
EXTRADICIONAL, POR DETERMINAÇÃO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL -
IMPOSSIBILIDADE - PRERROGATIVA QUE ASSISTE, UNICAMENTE, AO
PRESIDENTE DA REPÚBLICA, ENQUANTO CHEFE DE ESTADO - PEDIDO DEFERIDO,
COM RESTRIÇÃO.
O REPÚDIO AO TERRORISMO: UM COMPROMISSO
ÉTICO-JURÍDICO ASSUMIDO PELO BRASIL, QUER EM FACE DE SUA PRÓPRIA
CONSTITUIÇÃO, QUER PERANTE A COMUNIDADE INTERNACIONAL.
- Os atos
delituosos de natureza terrorista, considerados os parâmetros
consagrados pela vigente Constituição da República, não se subsumem
à noção de criminalidade política, pois a Lei Fundamental proclamou
o repúdio ao terrorismo como um dos princípios essenciais que devem
reger o Estado brasileiro em suas relações internacionais (CF, art.
4º, VIII), além de haver qualificado o terrorismo, para efeito de
repressão interna, como crime equiparável aos delitos hediondos, o
que o expõe, sob tal perspectiva, a tratamento jurídico impregnado
de máximo rigor, tornando-o inafiançável e insuscetível da clemência
soberana do Estado e reduzindo-o, ainda, à dimensão ordinária dos
crimes meramente comuns (CF, art. 5º, XLIII).
- A Constituição da
República, presentes tais vetores interpretativos (CF, art. 4º,
VIII, e art. 5º, XLIII), não autoriza que se outorgue, às práticas
delituosas de caráter terrorista, o mesmo tratamento benigno
dispensado ao autor de crimes políticos ou de opinião, impedindo,
desse modo, que se venha a estabelecer, em torno do terrorista, um
inadmissível círculo de proteção que o faça imune ao poder
extradicional do Estado brasileiro, notadamente se se tiver em
consideração a relevantíssima circunstância de que a Assembléia
Nacional Constituinte formulou um claro e inequívoco juízo de
desvalor em relação a quaisquer atos delituosos revestidos de
índole terrorista, a estes não reconhecendo a dignidade de que
muitas vezes se acha impregnada a prática da criminalidade política.
EXTRADITABILIDADE DO TERRORISTA: NECESSIDADE DE PRESERVAÇÃO
DO PRINCÍPIO DEMOCRÁTICO E ESSENCIALIDADE DA COOPERAÇÃO
INTERNACIONAL NA REPRESSÃO AO TERRORISMO.
- O estatuto da
criminalidade política não se revela aplicável nem se mostra
extensível, em sua projeção jurídico-constitucional, aos atos
delituosos que traduzam práticas terroristas, sejam aquelas
cometidas por particulares, sejam aquelas perpetradas com o apoio
oficial do próprio aparato governamental, à semelhança do que se
registrou, no Cone Sul, com a adoção, pelos regimes militares
sul-americanos, do modelo desprezível do terrorismo de Estado.
-
O terrorismo - que traduz expressão de uma macrodelinqüência capaz
de afetar a segurança, a integridade e a paz dos cidadãos e das
sociedades organizadas - constitui fenômeno criminoso da mais alta
gravidade, a que a comunidade internacional não pode permanecer
indiferente, eis que o ato terrorista atenta contra as próprias
bases em que se apóia o Estado democrático de direito, além de
representar ameaça inaceitável às instituições políticas e às
liberdades públicas, o que autoriza excluí-lo da benignidade de
tratamento que a Constituição do Brasil (art. 5º, LII) reservou aos
atos configuradores de criminalidade política.
- A cláusula de
proteção constante do art. 5º, LII da Constituição da República -
que veda a extradição de estrangeiros por crime político ou de
opinião - não se estende, por tal razão, ao autor de atos delituosos
de natureza terrorista, considerado o frontal repúdio que a ordem
constitucional brasileira dispensa ao terrorismo e ao
terrorista.
- A extradição - enquanto meio legítimo de cooperação
internacional na repressão às práticas de criminalidade comum -
representa instrumento de significativa importância no combate
eficaz ao terrorismo, que constitui "uma grave ameaça para os
valores democráticos e para a paz e a segurança internacionais
(...)" (Convenção Interamericana Contra o Terrorismo, Art. 11),
justificando-se, por isso mesmo, para efeitos extradicionais, a sua
descaracterização como delito de natureza política.
Doutrina.
EXTRADIÇÃO E PRISÃO PERPÉTUA: NECESSIDADE DE PRÉVIA
COMUTAÇÃO, EM PENA TEMPORÁRIA (MÁXIMO DE 30 ANOS), DA PENA DE PRISÃO
PERPÉTUA - REVISÃO DA JURISPRUDÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL,
EM OBEDIÊNCIA À DECLARAÇÃO CONSTITUCIONAL DE DIREITOS (CF, ART. 5º,
XLVII, "b").
- A extradição somente será deferida pelo Supremo
Tribunal Federal, tratando-se de fatos delituosos puníveis com
prisão perpétua, se o Estado requerente assumir, formalmente, quanto
a ela, perante o Governo brasileiro, o compromisso de comutá-la em
pena não superior à duração máxima admitida na lei penal do Brasil
(CP, art. 75), eis que os pedidos extradicionais - considerado o que
dispõe o art. 5º, XLVII, "b" da Constituição da República, que veda
as sanções penais de caráter perpétuo - estão necessariamente
sujeitos à autoridade hierárquico-normativa da Lei Fundamental
brasileira. Doutrina. Novo entendimento derivado da revisão, pelo
Supremo Tribunal Federal, de sua jurisprudência em tema de
extradição passiva.
A QUESTÃO DA IMEDIATA EFETIVAÇÃO DA ENTREGA
EXTRADICIONAL - INTELIGÊNCIA DO ART. 89 DO ESTATUTO DO ESTRANGEIRO
- PRERROGATIVA EXCLUSIVA DO PRESIDENTE DA REPÚBLICA, ENQUANTO CHEFE
DE ESTADO.
- A entrega do extraditando - que esteja sendo
processado criminalmente no Brasil, ou que haja sofrido condenação
penal imposta pela Justiça brasileira - depende, em princípio, da
conclusão do processo penal brasileiro ou do cumprimento da pena
privativa de liberdade decretada pelo Poder Judiciário do Brasil,
exceto se o Presidente da República, com apoio em juízo
discricionário, de caráter eminentemente político, fundado em razões
de oportunidade, de conveniência e/ou de utilidade, exercer, na
condição de Chefe de Estado, a prerrogativa excepcional que lhe
permite determinar a imediata efetivação da ordem extradicional
(Estatuto do Estrangeiro, art. 89, "caput", "in fine"). Doutrina.
Precedentes.
Ementa
E M E N T A: EXTRADIÇÃO - ATOS DELITUOSOS DE NATUREZA TERRORISTA -
DESCARACTERIZAÇÃO DO TERRORISMO COMO PRÁTICA DE CRIMINALIDADE
POLÍTICA - CONDENAÇÃO DO EXTRADITANDO A DUAS (2) PENAS DE PRISÃO
PERPÉTUA - INADMISSIBILIDADE DESSA PUNIÇÃO NO SISTEMA CONSTITUCIONAL
BRASILEIRO (CF, ART. 5º, XLVII, "B") - EFETIVAÇÃO EXTRADICIONAL
DEPENDENTE DE PRÉVIO COMPROMISSO DIPLOMÁTICO CONSISTENTE NA
COMUTAÇÃO, EM PENAS TEMPORÁRIAS NÃO SUPERIORES A 30 ANOS, DA PENA DE
PRISÃO PERPÉTUA - PRETENDIDA EXECUÇÃO IMEDIATA DA ORDEM
EXTRADICIONAL, POR DETERMINAÇÃO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL -
IMPOSSIBILIDADE - PRERROGATIVA QUE ASSISTE, UNICAMENTE, AO
PRESIDENTE DA REPÚBLICA, ENQUANTO CHEFE DE ESTADO - PEDIDO DEFERIDO,
COM RESTRIÇÃO.
O REPÚDIO AO TERRORISMO: UM COMPROMISSO
ÉTICO-JURÍDICO ASSUMIDO PELO BRASIL, QUER EM FACE DE SUA PRÓPRIA
CONSTITUIÇÃO, QUER PERANTE A COMUNIDADE INTERNACIONAL.
- Os atos
delituosos de natureza terrorista, considerados os parâmetros
consagrados pela vigente Constituição da República, não se subsumem
à noção de criminalidade política, pois a Lei Fundamental proclamou
o repúdio ao terrorismo como um dos princípios essenciais que devem
reger o Estado brasileiro em suas relações internacionais (CF, art.
4º, VIII), além de haver qualificado o terrorismo, para efeito de
repressão interna, como crime equiparável aos delitos hediondos, o
que o expõe, sob tal perspectiva, a tratamento jurídico impregnado
de máximo rigor, tornando-o inafiançável e insuscetível da clemência
soberana do Estado e reduzindo-o, ainda, à dimensão ordinária dos
crimes meramente comuns (CF, art. 5º, XLIII).
- A Constituição da
República, presentes tais vetores interpretativos (CF, art. 4º,
VIII, e art. 5º, XLIII), não autoriza que se outorgue, às práticas
delituosas de caráter terrorista, o mesmo tratamento benigno
dispensado ao autor de crimes políticos ou de opinião, impedindo,
desse modo, que se venha a estabelecer, em torno do terrorista, um
inadmissível círculo de proteção que o faça imune ao poder
extradicional do Estado brasileiro, notadamente se se tiver em
consideração a relevantíssima circunstância de que a Assembléia
Nacional Constituinte formulou um claro e inequívoco juízo de
desvalor em relação a quaisquer atos delituosos revestidos de
índole terrorista, a estes não reconhecendo a dignidade de que
muitas vezes se acha impregnada a prática da criminalidade política.
EXTRADITABILIDADE DO TERRORISTA: NECESSIDADE DE PRESERVAÇÃO
DO PRINCÍPIO DEMOCRÁTICO E ESSENCIALIDADE DA COOPERAÇÃO
INTERNACIONAL NA REPRESSÃO AO TERRORISMO.
- O estatuto da
criminalidade política não se revela aplicável nem se mostra
extensível, em sua projeção jurídico-constitucional, aos atos
delituosos que traduzam práticas terroristas, sejam aquelas
cometidas por particulares, sejam aquelas perpetradas com o apoio
oficial do próprio aparato governamental, à semelhança do que se
registrou, no Cone Sul, com a adoção, pelos regimes militares
sul-americanos, do modelo desprezível do terrorismo de Estado.
-
O terrorismo - que traduz expressão de uma macrodelinqüência capaz
de afetar a segurança, a integridade e a paz dos cidadãos e das
sociedades organizadas - constitui fenômeno criminoso da mais alta
gravidade, a que a comunidade internacional não pode permanecer
indiferente, eis que o ato terrorista atenta contra as próprias
bases em que se apóia o Estado democrático de direito, além de
representar ameaça inaceitável às instituições políticas e às
liberdades públicas, o que autoriza excluí-lo da benignidade de
tratamento que a Constituição do Brasil (art. 5º, LII) reservou aos
atos configuradores de criminalidade política.
- A cláusula de
proteção constante do art. 5º, LII da Constituição da República -
que veda a extradição de estrangeiros por crime político ou de
opinião - não se estende, por tal razão, ao autor de atos delituosos
de natureza terrorista, considerado o frontal repúdio que a ordem
constitucional brasileira dispensa ao terrorismo e ao
terrorista.
- A extradição - enquanto meio legítimo de cooperação
internacional na repressão às práticas de criminalidade comum -
representa instrumento de significativa importância no combate
eficaz ao terrorismo, que constitui "uma grave ameaça para os
valores democráticos e para a paz e a segurança internacionais
(...)" (Convenção Interamericana Contra o Terrorismo, Art. 11),
justificando-se, por isso mesmo, para efeitos extradicionais, a sua
descaracterização como delito de natureza política.
Doutrina.
EXTRADIÇÃO E PRISÃO PERPÉTUA: NECESSIDADE DE PRÉVIA
COMUTAÇÃO, EM PENA TEMPORÁRIA (MÁXIMO DE 30 ANOS), DA PENA DE PRISÃO
PERPÉTUA - REVISÃO DA JURISPRUDÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL,
EM OBEDIÊNCIA À DECLARAÇÃO CONSTITUCIONAL DE DIREITOS (CF, ART. 5º,
XLVII, "b").
- A extradição somente será deferida pelo Supremo
Tribunal Federal, tratando-se de fatos delituosos puníveis com
prisão perpétua, se o Estado requerente assumir, formalmente, quanto
a ela, perante o Governo brasileiro, o compromisso de comutá-la em
pena não superior à duração máxima admitida na lei penal do Brasil
(CP, art. 75), eis que os pedidos extradicionais - considerado o que
dispõe o art. 5º, XLVII, "b" da Constituição da República, que veda
as sanções penais de caráter perpétuo - estão necessariamente
sujeitos à autoridade hierárquico-normativa da Lei Fundamental
brasileira. Doutrina. Novo entendimento derivado da revisão, pelo
Supremo Tribunal Federal, de sua jurisprudência em tema de
extradição passiva.
A QUESTÃO DA IMEDIATA EFETIVAÇÃO DA ENTREGA
EXTRADICIONAL - INTELIGÊNCIA DO ART. 89 DO ESTATUTO DO ESTRANGEIRO
- PRERROGATIVA EXCLUSIVA DO PRESIDENTE DA REPÚBLICA, ENQUANTO CHEFE
DE ESTADO.
- A entrega do extraditando - que esteja sendo
processado criminalmente no Brasil, ou que haja sofrido condenação
penal imposta pela Justiça brasileira - depende, em princípio, da
conclusão do processo penal brasileiro ou do cumprimento da pena
privativa de liberdade decretada pelo Poder Judiciário do Brasil,
exceto se o Presidente da República, com apoio em juízo
discricionário, de caráter eminentemente político, fundado em razões
de oportunidade, de conveniência e/ou de utilidade, exercer, na
condição de Chefe de Estado, a prerrogativa excepcional que lhe
permite determinar a imediata efetivação da ordem extradicional
(Estatuto do Estrangeiro, art. 89, "caput", "in fine"). Doutrina.
Precedentes.Decisão
O Tribunal, por unanimidade, deferiu a extradição e, por maioria,
vencidos os Senhores Ministros Carlos Velloso e o Presidente, Ministro
Nelson Jobim, condicionou a entrega do extraditando a comutação das
penas de prisão perpétua em penas de prisão temporária de no máximo 30
anos, observados, desde que assim o entenda o Senhor Presidente da
República, os artigos 89 e 67 da Lei nº 6815, de 19 de agosto de 1980.
Ausente, justificadamente, a Senhora Ministra Ellen Gracie. Falaram,
pelo requerente, o Dr. Luiz César Aschermann Corrêa, pelo extraditando,
o Dr. Jaime Alejandro Motta Salazar e, pelo Ministério Público Federal,
o Dr. Cláudio Lemos Fonteles, Procurador-Geral da República. Plenário,
26.08.2004.
Data do Julgamento
:
26/08/2004
Data da Publicação
:
DJ 01-07-2005 PP-00005 EMENT VOL-02198-1 PP-00029 RB v. 17, n. 501, 2005, p. 21-22
Órgão Julgador
:
Tribunal Pleno
Relator(a)
:
Min. CELSO DE MELLO
Parte(s)
:
REQTE. : GOVERNO DO CHILE
ADV.(A/S) : MANOEL FRANCISCO CLAVERY GUIDO E OUTROS
EXTDO. : MAURICIO FERNANDEZ NORAMBUENA OU MAURICIO
FERNÁNDEZ NORAMBUENA OU MAURICIO HERNÁNDEZ NORAMBUENA
OU MAURICIO HERNANDEZ NORAMBUENA
ADV.(A/S) : JAIME ALEJANDRO MOTTA SALAZAR
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