STF HC 92304 / SP - SÃO PAULO HABEAS CORPUS
DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. CRIME DE
COMPETÊNCIA DO TRIBUNAL DO JÚRI. RECUSA REITERADA E INJUSTIFICADA
DE ATENDIMENTO MÉDICO À PESSOA GRAVEMENTE ENFERMA. DOLO EVENTUAL.
TRIBUNAL DO JÚRI. REAPRECIAÇÃO DE MATERIAL PROBATÓRIO. DENEGAÇÃO.
1. O presente habeas corpus reproduz, substancialmente, as
teses argüidas perante o Superior Tribunal de Justiça
relacionadas à alegação de inépcia da denúncia e do aditamento e
da ausência de justa causa para a deflagração da ação penal
envolvendo o paciente.
2. Para configuração do dolo eventual
não é necessário o consentimento explícito do agente, nem sua
consciência reflexiva em relação às circunstâncias do evento.
Faz-se imprescindível que o dolo eventual se extraia das
circunstâncias do evento, e não da mente do autor, eis que não se
exige uma declaração expressa do agente. Na realidade, o dolo
eventual não poderia ser descartado ou julgado inadmissível na
fase do iudicium accusationis.
3. A tese da inépcia da
denúncia e do aditamento, à evidência, não se sustenta, eis que
foram preenchidos os requisitos do art. 41, do Código de Processo
Penal, inclusive em razão da observância dos atos previstos no
art. 384, parágrafo único, do CPP, por força do aditamento à
denúncia.
4. No primeiro momento (o do oferecimento da
denúncia), ao paciente foi imputada a conduta de ter agido
negligentemente e de modo imperito, ao não empregar os meios
necessários para ministrar tratamento na pequena vítima, sendo
que no curso da instrução, sobrevieram novos elementos de prova
que apontaram para a ocorrência de possível dolo eventual na
conduta do paciente. Assim, no segundo momento (o do aditamento à
denúncia), descreveu-se a conduta de o paciente haver se recusado,
por duas vezes, em dias consecutivos, a atender à vítima que já
apresentava sérios problemas de saúde, limitando-se a dizer para
a avó da vítima que a levasse de volta para casa, e somente
retornasse quando o médico pediatra tivesse retornado de
viagem.
5. Em tese, o único médico plantonista, procurado mais
de uma vez durante o exercício de sua atividade profissional na
unidade de saúde, cientificado da gravidade da doença apresentada
pelo paciente que lhe é apresentado (com risco de vida), ao se
recusar a atendê-lo, determinando o retorno para casa, sem ao
menos ministrar qualquer atendimento ou tratamento, pode haver
deixado de impedir a ocorrência da morte da vítima, sendo tal
conduta omissiva penalmente relevante devido à sua condição de
garante.
6. Somente é possível o trancamento da ação penal
quando for evidente o constrangimento ilegal sofrido pelo
paciente, não havendo qualquer dúvida acerca da atipicidade
material ou formal da conduta, ou a respeito da ausência de justa
causa para deflagração da ação penal. Não é a hipótese,
competindo ao juiz natural que é o tribunal do júri a avaliação
da existência de elementos suficientes para o reconhecimento da
prática delitiva pelo paciente na modalidade de homicídio sob a
modalidade do dolo eventual.
7. Habeas corpus denegado.
Ementa
DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. CRIME DE
COMPETÊNCIA DO TRIBUNAL DO JÚRI. RECUSA REITERADA E INJUSTIFICADA
DE ATENDIMENTO MÉDICO À PESSOA GRAVEMENTE ENFERMA. DOLO EVENTUAL.
TRIBUNAL DO JÚRI. REAPRECIAÇÃO DE MATERIAL PROBATÓRIO. DENEGAÇÃO.
1. O presente habeas corpus reproduz, substancialmente, as
teses argüidas perante o Superior Tribunal de Justiça
relacionadas à alegação de inépcia da denúncia e do aditamento e
da ausência de justa causa para a deflagração da ação penal
envolvendo o paciente.
2. Para configuração do dolo eventual
não é necessário o consentimento explícito do agente, nem sua
consciência reflexiva em relação às circunstâncias do evento.
Faz-se imprescindível que o dolo eventual se extraia das
circunstâncias do evento, e não da mente do autor, eis que não se
exige uma declaração expressa do agente. Na realidade, o dolo
eventual não poderia ser descartado ou julgado inadmissível na
fase do iudicium accusationis.
3. A tese da inépcia da
denúncia e do aditamento, à evidência, não se sustenta, eis que
foram preenchidos os requisitos do art. 41, do Código de Processo
Penal, inclusive em razão da observância dos atos previstos no
art. 384, parágrafo único, do CPP, por força do aditamento à
denúncia.
4. No primeiro momento (o do oferecimento da
denúncia), ao paciente foi imputada a conduta de ter agido
negligentemente e de modo imperito, ao não empregar os meios
necessários para ministrar tratamento na pequena vítima, sendo
que no curso da instrução, sobrevieram novos elementos de prova
que apontaram para a ocorrência de possível dolo eventual na
conduta do paciente. Assim, no segundo momento (o do aditamento à
denúncia), descreveu-se a conduta de o paciente haver se recusado,
por duas vezes, em dias consecutivos, a atender à vítima que já
apresentava sérios problemas de saúde, limitando-se a dizer para
a avó da vítima que a levasse de volta para casa, e somente
retornasse quando o médico pediatra tivesse retornado de
viagem.
5. Em tese, o único médico plantonista, procurado mais
de uma vez durante o exercício de sua atividade profissional na
unidade de saúde, cientificado da gravidade da doença apresentada
pelo paciente que lhe é apresentado (com risco de vida), ao se
recusar a atendê-lo, determinando o retorno para casa, sem ao
menos ministrar qualquer atendimento ou tratamento, pode haver
deixado de impedir a ocorrência da morte da vítima, sendo tal
conduta omissiva penalmente relevante devido à sua condição de
garante.
6. Somente é possível o trancamento da ação penal
quando for evidente o constrangimento ilegal sofrido pelo
paciente, não havendo qualquer dúvida acerca da atipicidade
material ou formal da conduta, ou a respeito da ausência de justa
causa para deflagração da ação penal. Não é a hipótese,
competindo ao juiz natural que é o tribunal do júri a avaliação
da existência de elementos suficientes para o reconhecimento da
prática delitiva pelo paciente na modalidade de homicídio sob a
modalidade do dolo eventual.
7. Habeas corpus denegado.Decisão
A Turma, a unanimidade, denegou a ordem de habeas corpus,
nos termos do voto da Relatora. Ausentes, justificadamente, neste
julgamento, os Senhores Ministros Celso de Mello e Eros Grau.
Presidiu, este julgamento, a Senhora Ministra Ellen Gracie. 2ª
Turma, 05.08.2008.
Data do Julgamento
:
05/08/2008
Data da Publicação
:
DJe-157 DIVULG 21-08-2008 PUBLIC 22-08-2008 EMENT VOL-02329-03 PP-00431 RTJ VOL-00205-03 PP-01339
Órgão Julgador
:
Segunda Turma
Relator(a)
:
Min. ELLEN GRACIE
Parte(s)
:
PACTE.(S): ADRIANO MOYSÉS CRISTIANO
IMPTE.(S): LUIZ CARLOS BENTO E OUTRO(A/S)
COATOR(A/S)(ES): SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
Mostrar discussão