STF HC 93883 / SP - SÃO PAULO HABEAS CORPUS
E M E N T A: "HABEAS CORPUS" - PRISÃO PREVENTIVA DECRETADA
COM FUNDAMENTO NA GRAVIDADE OBJETIVA DOS DELITOS E NA SUPOSIÇÃO
DE QUE OS RÉUS PODERIAM CONSTRANGER AS TESTEMUNHAS OU PROCEDER DE
FORMA SEMELHANTE CONTRA OUTRAS VÍTIMAS - CARÁTER EXTRAORDINÁRIO
DA PRIVAÇÃO CAUTELAR DA LIBERDADE INDIVIDUAL - UTILIZAÇÃO, PELO
MAGISTRADO, NA DECRETAÇÃO DA PRISÃO PREVENTIVA, DE CRITÉRIOS
INCOMPATÍVEIS COM A JURISPRUDÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL -
SITUAÇÃO DE INJUSTO CONSTRANGIMENTO CONFIGURADA - PEDIDO DEFERIDO,
COM EXTENSÃO DE SEUS EFEITOS AO CO-RÉU.
A PRISÃO CAUTELAR
CONSTITUI MEDIDA DE NATUREZA EXCEPCIONAL.
- A privação
cautelar da liberdade individual reveste-se de caráter
excepcional, somente devendo ser decretada em situações de
absoluta necessidade.
A prisão preventiva, para legitimar-se
em face de nosso sistema jurídico, impõe - além da satisfação dos
pressupostos a que se refere o art. 312 do CPP (prova da
existência material do crime e presença de indícios suficientes
de autoria) - que se evidenciem, com fundamento em base empírica
idônea, razões justificadoras da imprescindibilidade dessa
extraordinária medida cautelar de privação da liberdade do
indiciado ou do réu.
- A questão da decretabilidade da prisão
cautelar. Possibilidade excepcional, desde que satisfeitos os
requisitos mencionados no art. 312 do CPP. Necessidade da
verificação concreta, em cada caso, da imprescindibilidade da
adoção dessa medida extraordinária. Precedentes.
A PRISÃO
PREVENTIVA - ENQUANTO MEDIDA DE NATUREZA CAUTELAR - NÃO PODE SER
UTILIZADA COMO INSTRUMENTO DE PUNIÇÃO ANTECIPADA DO INDICIADO OU
DO RÉU.
- A prisão preventiva não pode - e não deve - ser
utilizada, pelo Poder Público, como instrumento de punição
antecipada daquele a quem se imputou a prática do delito, pois,
no sistema jurídico brasileiro, fundado em bases democráticas,
prevalece o princípio da liberdade, incompatível com punições sem
processo e inconciliável com condenações sem defesa prévia.
A
prisão preventiva - que não deve ser confundida com a prisão
penal - não objetiva infligir punição àquele que sofre a sua
decretação, mas destina-se, considerada a função cautelar que lhe
é inerente, a atuar em benefício da atividade estatal
desenvolvida no processo penal.
A GRAVIDADE EM ABSTRATO DO
CRIME NÃO CONSTITUI FATOR DE LEGITIMAÇÃO DA PRIVAÇÃO CAUTELAR DA
LIBERDADE.
- A natureza da infração penal não constitui, só
por si, fundamento justificador da decretação da prisão cautelar
daquele que sofre a persecução criminal instaurada pelo Estado.
Precedentes.
A PRISÃO CAUTELAR NÃO PODE APOIAR-SE EM JUÍZOS
MERAMENTE CONJECTURAIS.
- A mera suposição, fundada em simples
conjecturas, não pode autorizar a decretação da prisão cautelar
de qualquer pessoa.
- A decisão que ordena a privação cautelar
da liberdade não se legitima quando desacompanhada de fatos
concretos que lhe justifiquem a necessidade, não podendo
apoiar-se, por isso mesmo, na avaliação puramente subjetiva do
magistrado de que a pessoa investigada ou processada, se em
liberdade, poderá delinqüir, ou interferir na instrução
probatória, ou evadir-se do distrito da culpa, ou, então,
prevalecer-se de sua particular condição social, funcional ou
econômico-financeira.
- Presunções arbitrárias, construídas a
partir de juízos meramente conjecturais, porque formuladas à
margem do sistema jurídico, não podem prevalecer sobre o
princípio da liberdade, cuja precedência constitucional lhe
confere posição eminente no domínio do processo
penal.
AUSÊNCIA DE DEMONSTRAÇÃO, NO CASO, DA NECESSIDADE
CONCRETA DE DECRETAR-SE A PRISÃO PREVENTIVA DO PACIENTE.
- Sem
que se caracterize situação de real necessidade, não se legitima
a privação cautelar da liberdade individual do indiciado ou do
réu. Ausentes razões de necessidade, revela-se incabível, ante a
sua excepcionalidade, a decretação ou a subsistência da prisão
preventiva.
O POSTULADO CONSTITUCIONAL DA PRESUNÇÃO DE
INOCÊNCIA IMPEDE QUE O ESTADO TRATE, COMO SE CULPADO FOSSE,
AQUELE QUE AINDA NÃO SOFREU CONDENAÇÃO PENAL IRRECORRÍVEL.
- A
prerrogativa jurídica da liberdade - que possui extração
constitucional (CF, art. 5º, LXI e LXV) - não pode ser ofendida
por interpretações doutrinárias ou jurisprudenciais, que,
fundadas em preocupante discurso de conteúdo autoritário,
culminam por consagrar, paradoxalmente, em detrimento de direitos
e garantias fundamentais proclamados pela Constituição da
República, a ideologia da lei e da ordem.
Mesmo que se trate
de pessoa acusada da suposta prática de crime hediondo, e até que
sobrevenha sentença penal condenatória irrecorrível, não se
revela possível - por efeito de insuperável vedação
constitucional (CF, art. 5º, LVII) - presumir-lhe a
culpabilidade.
Ninguém pode ser tratado como culpado, qualquer
que seja a natureza do ilícito penal cuja prática lhe tenha sido
atribuída, sem que exista, a esse respeito, decisão judicial
condenatória transitada em julgado.
O princípio
constitucional da presunção de inocência, em nosso sistema
jurídico, consagra, além de outras relevantes conseqüências, uma
regra de tratamento que impede o Poder Público de agir e de se
comportar, em relação ao suspeito, ao indiciado, ao denunciado ou
ao réu, como se estes já houvessem sido condenados,
definitivamente, por sentença do Poder Judiciário.
Precedentes.
Ementa
E M E N T A: "HABEAS CORPUS" - PRISÃO PREVENTIVA DECRETADA
COM FUNDAMENTO NA GRAVIDADE OBJETIVA DOS DELITOS E NA SUPOSIÇÃO
DE QUE OS RÉUS PODERIAM CONSTRANGER AS TESTEMUNHAS OU PROCEDER DE
FORMA SEMELHANTE CONTRA OUTRAS VÍTIMAS - CARÁTER EXTRAORDINÁRIO
DA PRIVAÇÃO CAUTELAR DA LIBERDADE INDIVIDUAL - UTILIZAÇÃO, PELO
MAGISTRADO, NA DECRETAÇÃO DA PRISÃO PREVENTIVA, DE CRITÉRIOS
INCOMPATÍVEIS COM A JURISPRUDÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL -
SITUAÇÃO DE INJUSTO CONSTRANGIMENTO CONFIGURADA - PEDIDO DEFERIDO,
COM EXTENSÃO DE SEUS EFEITOS AO CO-RÉU.
A PRISÃO CAUTELAR
CONSTITUI MEDIDA DE NATUREZA EXCEPCIONAL.
- A privação
cautelar da liberdade individual reveste-se de caráter
excepcional, somente devendo ser decretada em situações de
absoluta necessidade.
A prisão preventiva, para legitimar-se
em face de nosso sistema jurídico, impõe - além da satisfação dos
pressupostos a que se refere o art. 312 do CPP (prova da
existência material do crime e presença de indícios suficientes
de autoria) - que se evidenciem, com fundamento em base empírica
idônea, razões justificadoras da imprescindibilidade dessa
extraordinária medida cautelar de privação da liberdade do
indiciado ou do réu.
- A questão da decretabilidade da prisão
cautelar. Possibilidade excepcional, desde que satisfeitos os
requisitos mencionados no art. 312 do CPP. Necessidade da
verificação concreta, em cada caso, da imprescindibilidade da
adoção dessa medida extraordinária. Precedentes.
A PRISÃO
PREVENTIVA - ENQUANTO MEDIDA DE NATUREZA CAUTELAR - NÃO PODE SER
UTILIZADA COMO INSTRUMENTO DE PUNIÇÃO ANTECIPADA DO INDICIADO OU
DO RÉU.
- A prisão preventiva não pode - e não deve - ser
utilizada, pelo Poder Público, como instrumento de punição
antecipada daquele a quem se imputou a prática do delito, pois,
no sistema jurídico brasileiro, fundado em bases democráticas,
prevalece o princípio da liberdade, incompatível com punições sem
processo e inconciliável com condenações sem defesa prévia.
A
prisão preventiva - que não deve ser confundida com a prisão
penal - não objetiva infligir punição àquele que sofre a sua
decretação, mas destina-se, considerada a função cautelar que lhe
é inerente, a atuar em benefício da atividade estatal
desenvolvida no processo penal.
A GRAVIDADE EM ABSTRATO DO
CRIME NÃO CONSTITUI FATOR DE LEGITIMAÇÃO DA PRIVAÇÃO CAUTELAR DA
LIBERDADE.
- A natureza da infração penal não constitui, só
por si, fundamento justificador da decretação da prisão cautelar
daquele que sofre a persecução criminal instaurada pelo Estado.
Precedentes.
A PRISÃO CAUTELAR NÃO PODE APOIAR-SE EM JUÍZOS
MERAMENTE CONJECTURAIS.
- A mera suposição, fundada em simples
conjecturas, não pode autorizar a decretação da prisão cautelar
de qualquer pessoa.
- A decisão que ordena a privação cautelar
da liberdade não se legitima quando desacompanhada de fatos
concretos que lhe justifiquem a necessidade, não podendo
apoiar-se, por isso mesmo, na avaliação puramente subjetiva do
magistrado de que a pessoa investigada ou processada, se em
liberdade, poderá delinqüir, ou interferir na instrução
probatória, ou evadir-se do distrito da culpa, ou, então,
prevalecer-se de sua particular condição social, funcional ou
econômico-financeira.
- Presunções arbitrárias, construídas a
partir de juízos meramente conjecturais, porque formuladas à
margem do sistema jurídico, não podem prevalecer sobre o
princípio da liberdade, cuja precedência constitucional lhe
confere posição eminente no domínio do processo
penal.
AUSÊNCIA DE DEMONSTRAÇÃO, NO CASO, DA NECESSIDADE
CONCRETA DE DECRETAR-SE A PRISÃO PREVENTIVA DO PACIENTE.
- Sem
que se caracterize situação de real necessidade, não se legitima
a privação cautelar da liberdade individual do indiciado ou do
réu. Ausentes razões de necessidade, revela-se incabível, ante a
sua excepcionalidade, a decretação ou a subsistência da prisão
preventiva.
O POSTULADO CONSTITUCIONAL DA PRESUNÇÃO DE
INOCÊNCIA IMPEDE QUE O ESTADO TRATE, COMO SE CULPADO FOSSE,
AQUELE QUE AINDA NÃO SOFREU CONDENAÇÃO PENAL IRRECORRÍVEL.
- A
prerrogativa jurídica da liberdade - que possui extração
constitucional (CF, art. 5º, LXI e LXV) - não pode ser ofendida
por interpretações doutrinárias ou jurisprudenciais, que,
fundadas em preocupante discurso de conteúdo autoritário,
culminam por consagrar, paradoxalmente, em detrimento de direitos
e garantias fundamentais proclamados pela Constituição da
República, a ideologia da lei e da ordem.
Mesmo que se trate
de pessoa acusada da suposta prática de crime hediondo, e até que
sobrevenha sentença penal condenatória irrecorrível, não se
revela possível - por efeito de insuperável vedação
constitucional (CF, art. 5º, LVII) - presumir-lhe a
culpabilidade.
Ninguém pode ser tratado como culpado, qualquer
que seja a natureza do ilícito penal cuja prática lhe tenha sido
atribuída, sem que exista, a esse respeito, decisão judicial
condenatória transitada em julgado.
O princípio
constitucional da presunção de inocência, em nosso sistema
jurídico, consagra, além de outras relevantes conseqüências, uma
regra de tratamento que impede o Poder Público de agir e de se
comportar, em relação ao suspeito, ao indiciado, ao denunciado ou
ao réu, como se estes já houvessem sido condenados,
definitivamente, por sentença do Poder Judiciário.
Precedentes.Decisão
A Turma, por votação unânime, deferiu o pedido de habeas
corpus, em favor dos pacientes e, também por unanimidade,
estendeu esta ordem ao co-réu Edson Uemura, nos termos do voto do
Relator. Falou, pelo Ministério Público Federal, o Dr. Mário José
Gisi. Ausentes, justificadamente, neste julgamento, os Senhores
Ministros Joaquim Barbosa e Eros Grau. 2ª Turma, 26.08.2008.
Data do Julgamento
:
26/08/2008
Data da Publicação
:
DJe-059 DIVULG 26-03-2009 PUBLIC 27-03-2009 EMENT VOL-02354-03 PP-00529
Órgão Julgador
:
Segunda Turma
Relator(a)
:
Min. CELSO DE MELLO
Parte(s)
:
PACTE.(S): RAFAEL RIBEIRO DE OLIVEIRA
PACTE.(S): RENÉ JOSÉ RENNER SCHNEIDER
IMPTE.(S): DANIEL LEON BIALSKI E OUTRO(A/S)
COATOR(A/S)(ES): SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
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