STF HC 94016 / SP - SÃO PAULO HABEAS CORPUS
E M E N T A: "HABEAS CORPUS" - SÚMULA 691/STF - INAPLICABILIDADE
AO CASO - OCORRÊNCIA DE SITUAÇÃO EXCEPCIONAL QUE AFASTA A
RESTRIÇÃO SUMULAR - ESTRANGEIRO NÃO DOMICILIADO NO BRASIL -
IRRELEVÂNCIA - CONDIÇÃO JURÍDICA QUE NÃO O DESQUALIFICA COMO
SUJEITO DE DIREITOS E TITULAR DE GARANTIAS CONSTITUCIONAIS E
LEGAIS - PLENITUDE DE ACESSO, EM CONSEQÜÊNCIA, AOS INSTRUMENTOS
PROCESSUAIS DE TUTELA DA LIBERDADE - NECESSIDADE DE RESPEITO,
PELO PODER PÚBLICO, ÀS PRERROGATIVAS JURÍDICAS QUE COMPÕEM O
PRÓPRIO ESTATUTO CONSTITUCIONAL DO DIREITO DE DEFESA - A GARANTIA
CONSTITUCIONAL DO "DUE PROCESS OF LAW" COMO EXPRESSIVA LIMITAÇÃO
À ATIVIDADE PERSECUTÓRIA DO ESTADO (INVESTIGAÇÃO PENAL E PROCESSO
PENAL) - O CONTEÚDO MATERIAL DA CLÁUSULA DE GARANTIA DO "DUE
PROCESS" - INTERROGATÓRIO JUDICIAL - NATUREZA JURÍDICA - MEIO DE
DEFESA DO ACUSADO - POSSIBILIDADE DE QUALQUER DOS LITISCONSORTES
PENAIS PASSIVOS FORMULAR REPERGUNTAS AOS DEMAIS CO-RÉUS,
NOTADAMENTE SE AS DEFESAS DE TAIS ACUSADOS SE MOSTRAREM
COLIDENTES - PRERROGATIVA JURÍDICA CUJA LEGITIMAÇÃO DECORRE DO
POSTULADO CONSTITUCIONAL DA AMPLA DEFESA - PRECEDENTE DO SUPREMO
TRIBUNAL FEDERAL (PLENO) - MAGISTÉRIO DA DOUTRINA -
CONSTRANGIMENTO ILEGAL CARACTERIZADO - "HABEAS CORPUS" CONCEDIDO
"EX OFFICIO", COM EXTENSÃO DE SEUS EFEITOS AOS
CO-RÉUS.
DENEGAÇÃO DE MEDIDA LIMINAR - SÚMULA 691/STF -
SITUAÇÕES EXCEPCIONAIS QUE AFASTAM A RESTRIÇÃO SUMULAR.
- A
jurisprudência do Supremo Tribunal Federal tem admitido o
afastamento, "hic et nunc", da Súmula 691/STF, em hipóteses nas
quais a decisão questionada divirja da jurisprudência
predominante nesta Corte ou, então, veicule situações
configuradoras de abuso de poder ou de manifesta ilegalidade.
Precedentes. Hipótese ocorrente na espécie.
O SÚDITO
ESTRANGEIRO, MESMO AQUELE SEM DOMICÍLIO NO BRASIL, TEM DIREITO A
TODAS AS PRERROGATIVAS BÁSICAS QUE LHE ASSEGUREM A PRESERVAÇÃO DO
"STATUS LIBERTATIS" E A OBSERVÂNCIA, PELO PODER PÚBLICO, DA
CLÁUSULA CONSTITUCIONAL DO "DUE PROCESS".
- O súdito
estrangeiro, mesmo o não domiciliado no Brasil, tem plena
legitimidade para impetrar o remédio constitucional do "habeas
corpus", em ordem a tornar efetivo, nas hipóteses de persecução
penal, o direito subjetivo, de que também é titular, à
observância e ao integral respeito, por parte do Estado, das
prerrogativas que compõem e dão significado à cláusula do devido
processo legal.
- A condição jurídica de não-nacional do
Brasil e a circunstância de o réu estrangeiro não possuir
domicílio em nosso país não legitimam a adoção, contra tal
acusado, de qualquer tratamento arbitrário ou discriminatório.
Precedentes.
- Impõe-se, ao Judiciário, o dever de assegurar,
mesmo ao réu estrangeiro sem domicílio no Brasil, os direitos
básicos que resultam do postulado do devido processo legal,
notadamente as prerrogativas inerentes à garantia da ampla defesa,
à garantia do contraditório, à igualdade entre as partes perante
o juiz natural e à garantia de imparcialidade do magistrado
processante.
A ESSENCIALIDADE DO POSTULADO DO DEVIDO
PROCESSO LEGAL, QUE SE QUALIFICA COMO REQUISITO LEGITIMADOR DA
PRÓPRIA "PERSECUTIO CRIMINIS".
- O exame da cláusula referente
ao "due process of law" permite nela identificar alguns elementos
essenciais à sua configuração como expressiva garantia de ordem
constitucional, destacando-se, dentre eles, por sua
inquestionável importância, as seguintes prerrogativas: (a)
direito ao processo (garantia de acesso ao Poder Judiciário); (b)
direito à citação e ao conhecimento prévio do teor da acusação;
(c) direito a um julgamento público e célere, sem dilações
indevidas; (d) direito ao contraditório e à plenitude de defesa
(direito à autodefesa e à defesa técnica); (e) direito de não ser
processado e julgado com base em leis "ex post facto"; (f)
direito à igualdade entre as partes; (g) direito de não ser
processado com fundamento em provas revestidas de ilicitude; (h)
direito ao benefício da gratuidade; (i) direito à observância do
princípio do juiz natural; (j) direito ao silêncio (privilégio
contra a auto-incriminação); (l) direito à prova; e (m) direito
de presença e de "participação ativa" nos atos de interrogatório
judicial dos demais litisconsortes penais passivos, quando
existentes.
- O direito do réu à observância, pelo Estado, da
garantia pertinente ao "due process of law", além de traduzir
expressão concreta do direito de defesa, também encontra suporte
legitimador em convenções internacionais que proclamam a
essencialidade dessa franquia processual, que compõe o próprio
estatuto constitucional do direito de defesa, enquanto complexo
de princípios e de normas que amparam qualquer acusado em sede de
persecução criminal, mesmo que se trate de réu estrangeiro, sem
domicílio em território brasileiro, aqui processado por suposta
prática de delitos a ele atribuídos.
O INTERROGATÓRIO
JUDICIAL COMO MEIO DE DEFESA DO RÉU.
- Em sede de persecução
penal, o interrogatório judicial - notadamente após o advento da
Lei nº 10.792/2003 - qualifica-se como ato de defesa do réu, que,
além de não ser obrigado a responder a qualquer indagação feita
pelo magistrado processante, também não pode sofrer qualquer
restrição em sua esfera jurídica em virtude do exercício, sempre
legítimo, dessa especial prerrogativa. Doutrina.
Precedentes.
POSSIBILIDADE JURÍDICA DE UM DOS LITISCONSORTES
PENAIS PASSIVOS, INVOCANDO A GARANTIA DO "DUE PROCESS OF LAW",
VER ASSEGURADO O SEU DIREITO DE FORMULAR REPERGUNTAS AOS CO-RÉUS,
QUANDO DO RESPECTIVO INTERROGATÓRIO JUDICIAL.
- Assiste, a
cada um dos litisconsortes penais passivos, o direito - fundado
em cláusulas constitucionais (CF, art. 5º, incisos LIV e LV) -
de formular reperguntas aos demais co-réus, que, no entanto, não
estão obrigados a respondê-las, em face da prerrogativa contra a
auto-incriminação, de que também são titulares. O desrespeito a
essa franquia individual do réu, resultante da arbitrária recusa
em lhe permitir a formulação de reperguntas, qualifica-se como
causa geradora de nulidade processual absoluta, por implicar
grave transgressão ao estatuto constitucional do direito de
defesa. Doutrina. Precedente do STF.
Ementa
E M E N T A: "HABEAS CORPUS" - SÚMULA 691/STF - INAPLICABILIDADE
AO CASO - OCORRÊNCIA DE SITUAÇÃO EXCEPCIONAL QUE AFASTA A
RESTRIÇÃO SUMULAR - ESTRANGEIRO NÃO DOMICILIADO NO BRASIL -
IRRELEVÂNCIA - CONDIÇÃO JURÍDICA QUE NÃO O DESQUALIFICA COMO
SUJEITO DE DIREITOS E TITULAR DE GARANTIAS CONSTITUCIONAIS E
LEGAIS - PLENITUDE DE ACESSO, EM CONSEQÜÊNCIA, AOS INSTRUMENTOS
PROCESSUAIS DE TUTELA DA LIBERDADE - NECESSIDADE DE RESPEITO,
PELO PODER PÚBLICO, ÀS PRERROGATIVAS JURÍDICAS QUE COMPÕEM O
PRÓPRIO ESTATUTO CONSTITUCIONAL DO DIREITO DE DEFESA - A GARANTIA
CONSTITUCIONAL DO "DUE PROCESS OF LAW" COMO EXPRESSIVA LIMITAÇÃO
À ATIVIDADE PERSECUTÓRIA DO ESTADO (INVESTIGAÇÃO PENAL E PROCESSO
PENAL) - O CONTEÚDO MATERIAL DA CLÁUSULA DE GARANTIA DO "DUE
PROCESS" - INTERROGATÓRIO JUDICIAL - NATUREZA JURÍDICA - MEIO DE
DEFESA DO ACUSADO - POSSIBILIDADE DE QUALQUER DOS LITISCONSORTES
PENAIS PASSIVOS FORMULAR REPERGUNTAS AOS DEMAIS CO-RÉUS,
NOTADAMENTE SE AS DEFESAS DE TAIS ACUSADOS SE MOSTRAREM
COLIDENTES - PRERROGATIVA JURÍDICA CUJA LEGITIMAÇÃO DECORRE DO
POSTULADO CONSTITUCIONAL DA AMPLA DEFESA - PRECEDENTE DO SUPREMO
TRIBUNAL FEDERAL (PLENO) - MAGISTÉRIO DA DOUTRINA -
CONSTRANGIMENTO ILEGAL CARACTERIZADO - "HABEAS CORPUS" CONCEDIDO
"EX OFFICIO", COM EXTENSÃO DE SEUS EFEITOS AOS
CO-RÉUS.
DENEGAÇÃO DE MEDIDA LIMINAR - SÚMULA 691/STF -
SITUAÇÕES EXCEPCIONAIS QUE AFASTAM A RESTRIÇÃO SUMULAR.
- A
jurisprudência do Supremo Tribunal Federal tem admitido o
afastamento, "hic et nunc", da Súmula 691/STF, em hipóteses nas
quais a decisão questionada divirja da jurisprudência
predominante nesta Corte ou, então, veicule situações
configuradoras de abuso de poder ou de manifesta ilegalidade.
Precedentes. Hipótese ocorrente na espécie.
O SÚDITO
ESTRANGEIRO, MESMO AQUELE SEM DOMICÍLIO NO BRASIL, TEM DIREITO A
TODAS AS PRERROGATIVAS BÁSICAS QUE LHE ASSEGUREM A PRESERVAÇÃO DO
"STATUS LIBERTATIS" E A OBSERVÂNCIA, PELO PODER PÚBLICO, DA
CLÁUSULA CONSTITUCIONAL DO "DUE PROCESS".
- O súdito
estrangeiro, mesmo o não domiciliado no Brasil, tem plena
legitimidade para impetrar o remédio constitucional do "habeas
corpus", em ordem a tornar efetivo, nas hipóteses de persecução
penal, o direito subjetivo, de que também é titular, à
observância e ao integral respeito, por parte do Estado, das
prerrogativas que compõem e dão significado à cláusula do devido
processo legal.
- A condição jurídica de não-nacional do
Brasil e a circunstância de o réu estrangeiro não possuir
domicílio em nosso país não legitimam a adoção, contra tal
acusado, de qualquer tratamento arbitrário ou discriminatório.
Precedentes.
- Impõe-se, ao Judiciário, o dever de assegurar,
mesmo ao réu estrangeiro sem domicílio no Brasil, os direitos
básicos que resultam do postulado do devido processo legal,
notadamente as prerrogativas inerentes à garantia da ampla defesa,
à garantia do contraditório, à igualdade entre as partes perante
o juiz natural e à garantia de imparcialidade do magistrado
processante.
A ESSENCIALIDADE DO POSTULADO DO DEVIDO
PROCESSO LEGAL, QUE SE QUALIFICA COMO REQUISITO LEGITIMADOR DA
PRÓPRIA "PERSECUTIO CRIMINIS".
- O exame da cláusula referente
ao "due process of law" permite nela identificar alguns elementos
essenciais à sua configuração como expressiva garantia de ordem
constitucional, destacando-se, dentre eles, por sua
inquestionável importância, as seguintes prerrogativas: (a)
direito ao processo (garantia de acesso ao Poder Judiciário); (b)
direito à citação e ao conhecimento prévio do teor da acusação;
(c) direito a um julgamento público e célere, sem dilações
indevidas; (d) direito ao contraditório e à plenitude de defesa
(direito à autodefesa e à defesa técnica); (e) direito de não ser
processado e julgado com base em leis "ex post facto"; (f)
direito à igualdade entre as partes; (g) direito de não ser
processado com fundamento em provas revestidas de ilicitude; (h)
direito ao benefício da gratuidade; (i) direito à observância do
princípio do juiz natural; (j) direito ao silêncio (privilégio
contra a auto-incriminação); (l) direito à prova; e (m) direito
de presença e de "participação ativa" nos atos de interrogatório
judicial dos demais litisconsortes penais passivos, quando
existentes.
- O direito do réu à observância, pelo Estado, da
garantia pertinente ao "due process of law", além de traduzir
expressão concreta do direito de defesa, também encontra suporte
legitimador em convenções internacionais que proclamam a
essencialidade dessa franquia processual, que compõe o próprio
estatuto constitucional do direito de defesa, enquanto complexo
de princípios e de normas que amparam qualquer acusado em sede de
persecução criminal, mesmo que se trate de réu estrangeiro, sem
domicílio em território brasileiro, aqui processado por suposta
prática de delitos a ele atribuídos.
O INTERROGATÓRIO
JUDICIAL COMO MEIO DE DEFESA DO RÉU.
- Em sede de persecução
penal, o interrogatório judicial - notadamente após o advento da
Lei nº 10.792/2003 - qualifica-se como ato de defesa do réu, que,
além de não ser obrigado a responder a qualquer indagação feita
pelo magistrado processante, também não pode sofrer qualquer
restrição em sua esfera jurídica em virtude do exercício, sempre
legítimo, dessa especial prerrogativa. Doutrina.
Precedentes.
POSSIBILIDADE JURÍDICA DE UM DOS LITISCONSORTES
PENAIS PASSIVOS, INVOCANDO A GARANTIA DO "DUE PROCESS OF LAW",
VER ASSEGURADO O SEU DIREITO DE FORMULAR REPERGUNTAS AOS CO-RÉUS,
QUANDO DO RESPECTIVO INTERROGATÓRIO JUDICIAL.
- Assiste, a
cada um dos litisconsortes penais passivos, o direito - fundado
em cláusulas constitucionais (CF, art. 5º, incisos LIV e LV) -
de formular reperguntas aos demais co-réus, que, no entanto, não
estão obrigados a respondê-las, em face da prerrogativa contra a
auto-incriminação, de que também são titulares. O desrespeito a
essa franquia individual do réu, resultante da arbitrária recusa
em lhe permitir a formulação de reperguntas, qualifica-se como
causa geradora de nulidade processual absoluta, por implicar
grave transgressão ao estatuto constitucional do direito de
defesa. Doutrina. Precedente do STF.Decisão
A Turma, por votação unânime, superando, preliminarmente,
a restrição fundada na Súmula 691/STF, concedeu, de ofício, a
ordem de habeas corpus, em favor do paciente, nos termos do voto
do Relator. E estendeu, de ofício, também por unanimidade, essa
mesma ordem de habeas corpus em favor dos demais co-réus,
igualmente nos termos do voto do Relator. Falou, pelo paciente, o
Dr. Alberto Zacharias Toron e, pelo Ministério Público Federal, o
Dr. Wagner Gonçalves. Ausente, justificadamente, neste julgamento,
a Senhora Ministra Ellen Gracie. 2ª Turma, 16.09.2008.
Data do Julgamento
:
16/09/2008
Data da Publicação
:
DJe-038 DIVULG 26-02-2009 PUBLIC 27-02-2009 EMENT VOL-02350-02 PP-00266 RTJ VOL-00209-02 PP-00702
Órgão Julgador
:
Segunda Turma
Relator(a)
:
Min. CELSO DE MELLO
Parte(s)
:
PACTE.(S): BORIS ABRAMOVICH BEREZOVSKY OU PLATON ELENIN
IMPTE.(S): ALBERTO ZACHARIAS TORON E OUTRO(A/S)
COATOR(A/S)(ES): RELATOR DO HC Nº 100.204 DO SUPERIOR TRIBUNAL DE
JUSTIÇA
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