STF HC 96095 / SP - SÃO PAULO HABEAS CORPUS
E M E N T A: "HABEAS CORPUS" - PRISÃO PREVENTIVA DECRETADA COM
FUNDAMENTO NA GRAVIDADE OBJETIVA DO DELITO, NO CLAMOR PÚBLICO, NA
SUPOSTA OFENSA À CREDIBILIDADE DAS INSTITUIÇÕES E NA CONJECTURA
DE QUE A PRISÃO CAUTELAR SE JUSTIFICA PARA CONVENIÊNCIA DA
INSTRUÇÃO CRIMINAL - CARÁTER EXTRAORDINÁRIO DA PRIVAÇÃO CAUTELAR
DA LIBERDADE INDIVIDUAL - UTILIZAÇÃO, PELO MAGISTRADO, NA
DECRETAÇÃO DA PRISÃO PREVENTIVA, DE CRITÉRIOS INCOMPATÍVEIS COM A
JURISPRUDÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL - SITUAÇÃO DE INJUSTO
CONSTRANGIMENTO CONFIGURADA - AFASTAMENTO, EM CARÁTER EXCEPCIONAL,
NO CASO CONCRETO, DA INCIDÊNCIA DA SÚMULA 691/STF - "HABEAS
CORPUS" CONCEDIDO DE OFÍCIO.
A PRISÃO CAUTELAR CONSTITUI
MEDIDA CAUTELAR DE NATUREZA EXCEPCIONAL.
- A privação cautelar
da liberdade individual reveste-se de caráter excepcional,
somente devendo ser decretada em situações de absoluta
necessidade.
A prisão preventiva, para legitimar-se em face de
nosso sistema jurídico, impõe - além da satisfação dos
pressupostos a que se refere o art. 312 do CPP (prova da
existência material do crime e presença de indícios suficientes
de autoria) - que se evidenciem, com fundamento em base empírica
idônea, razões justificadoras da imprescindibilidade dessa
extraordinária medida cautelar de privação da liberdade do
indiciado ou do réu.
- A questão da decretabilidade da prisão
cautelar. Possibilidade excepcional, desde que satisfeitos os
requisitos mencionados no art. 312 do CPP. Necessidade da
verificação concreta, em cada caso, da imprescindibilidade da
adoção dessa medida extraordinária. Precedentes.
A PRISÃO
PREVENTIVA - ENQUANTO MEDIDA DE NATUREZA CAUTELAR - NÃO PODE SER
UTILIZADA COMO INSTRUMENTO DE PUNIÇÃO ANTECIPADA DO INDICIADO OU
DO RÉU.
- A prisão preventiva não pode - e não deve - ser
utilizada, pelo Poder Público, como instrumento de punição
antecipada daquele a quem se imputou a prática do delito, pois,
no sistema jurídico brasileiro, fundado em bases democráticas,
prevalece o princípio da liberdade, incompatível com punições sem
processo e inconciliável com condenações sem defesa prévia.
A
prisão preventiva - que não deve ser confundida com a prisão
penal - não objetiva infligir punição àquele que sofre a sua
decretação, mas destina-se, considerada a função cautelar que lhe
é inerente, a atuar em benefício da atividade estatal
desenvolvida no processo penal.
A GRAVIDADE EM ABSTRATO DO
CRIME NÃO CONSTITUI FATOR DE LEGITIMAÇÃO DA PRIVAÇÃO CAUTELAR DA
LIBERDADE.
- A natureza da infração penal não constitui, só
por si, fundamento justificador da decretação da prisão cautelar
daquele que sofre a persecução criminal instaurada pelo Estado.
Precedentes.
O CLAMOR PÚBLICO NÃO BASTA PARA JUSTIFICAR A
DECRETAÇÃO DA PRISÃO CAUTELAR.
- O estado de comoção social e
de eventual indignação popular, motivado pela repercussão da
prática da infração penal, não pode justificar, só por si, a
decretação da prisão cautelar do suposto autor do comportamento
delituoso, sob pena de completa e grave aniquilação do postulado
fundamental da liberdade.
- O clamor público - precisamente
por não constituir causa legal de justificação da prisão
processual (CPP, art. 312) - não se qualifica como fator de
legitimação da privação cautelar da liberdade do indiciado ou do
réu. Precedentes.
A PRESERVAÇÃO DA CREDIBILIDADE DAS
INSTITUIÇÕES NÃO SE QUALIFICA, SÓ POR SI, COMO FUNDAMENTO
AUTORIZADOR DA PRISÃO CAUTELAR.
- Não se reveste de idoneidade
jurídica, para efeito de justificação do ato excepcional da
prisão cautelar, a alegação de que a prisão é necessária para
resguardar a "credibilidade da Justiça".
AUSÊNCIA DE
DEMONSTRAÇÃO, NO CASO, DA NECESSIDADE CONCRETA DE DECRETAR-SE A
PRISÃO PREVENTIVA DO PACIENTE.
- Sem que se caracterize
situação de real necessidade, não se legitima a privação cautelar
da liberdade individual do indiciado ou do réu. Ausentes razões
de necessidade, revela-se incabível, ante a sua excepcionalidade,
a decretação ou a subsistência da prisão preventiva.
O
POSTULADO CONSTITUCIONAL DA PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA IMPEDE QUE O
ESTADO TRATE, COMO SE CULPADO FOSSE, AQUELE QUE AINDA NÃO SOFREU
CONDENAÇÃO PENAL IRRECORRÍVEL.
- A prerrogativa jurídica da
liberdade - que possui extração constitucional (CF, art. 5º, LXI
e LXV) - não pode ser ofendida por interpretações doutrinárias ou
jurisprudenciais, que, fundadas em preocupante discurso de
conteúdo autoritário, culminam por consagrar, paradoxalmente, em
detrimento de direitos e garantias fundamentais proclamados pela
Constituição da República, a ideologia da lei e da
ordem.
Mesmo que se trate de pessoa acusada da suposta prática
de crime hediondo, e até que sobrevenha sentença penal
condenatória irrecorrível, não se revela possível - por efeito de
insuperável vedação constitucional (CF, art. 5º, LVII) -
presumir-lhe a culpabilidade.
Ninguém pode ser tratado como
culpado, qualquer que seja a natureza do ilícito penal cuja
prática lhe tenha sido atribuída, sem que exista, a esse respeito,
decisão judicial condenatória transitada em julgado.
O
princípio constitucional da presunção de inocência, em nosso
sistema jurídico, consagra, além de outras relevantes
conseqüências, uma regra de tratamento que impede o Poder Público
de agir e de se comportar, em relação ao suspeito, ao indiciado,
ao denunciado ou ao réu, como se estes já houvessem sido
condenados, definitivamente, por sentença do Poder Judiciário.
Precedentes.
Ementa
E M E N T A: "HABEAS CORPUS" - PRISÃO PREVENTIVA DECRETADA COM
FUNDAMENTO NA GRAVIDADE OBJETIVA DO DELITO, NO CLAMOR PÚBLICO, NA
SUPOSTA OFENSA À CREDIBILIDADE DAS INSTITUIÇÕES E NA CONJECTURA
DE QUE A PRISÃO CAUTELAR SE JUSTIFICA PARA CONVENIÊNCIA DA
INSTRUÇÃO CRIMINAL - CARÁTER EXTRAORDINÁRIO DA PRIVAÇÃO CAUTELAR
DA LIBERDADE INDIVIDUAL - UTILIZAÇÃO, PELO MAGISTRADO, NA
DECRETAÇÃO DA PRISÃO PREVENTIVA, DE CRITÉRIOS INCOMPATÍVEIS COM A
JURISPRUDÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL - SITUAÇÃO DE INJUSTO
CONSTRANGIMENTO CONFIGURADA - AFASTAMENTO, EM CARÁTER EXCEPCIONAL,
NO CASO CONCRETO, DA INCIDÊNCIA DA SÚMULA 691/STF - "HABEAS
CORPUS" CONCEDIDO DE OFÍCIO.
A PRISÃO CAUTELAR CONSTITUI
MEDIDA CAUTELAR DE NATUREZA EXCEPCIONAL.
- A privação cautelar
da liberdade individual reveste-se de caráter excepcional,
somente devendo ser decretada em situações de absoluta
necessidade.
A prisão preventiva, para legitimar-se em face de
nosso sistema jurídico, impõe - além da satisfação dos
pressupostos a que se refere o art. 312 do CPP (prova da
existência material do crime e presença de indícios suficientes
de autoria) - que se evidenciem, com fundamento em base empírica
idônea, razões justificadoras da imprescindibilidade dessa
extraordinária medida cautelar de privação da liberdade do
indiciado ou do réu.
- A questão da decretabilidade da prisão
cautelar. Possibilidade excepcional, desde que satisfeitos os
requisitos mencionados no art. 312 do CPP. Necessidade da
verificação concreta, em cada caso, da imprescindibilidade da
adoção dessa medida extraordinária. Precedentes.
A PRISÃO
PREVENTIVA - ENQUANTO MEDIDA DE NATUREZA CAUTELAR - NÃO PODE SER
UTILIZADA COMO INSTRUMENTO DE PUNIÇÃO ANTECIPADA DO INDICIADO OU
DO RÉU.
- A prisão preventiva não pode - e não deve - ser
utilizada, pelo Poder Público, como instrumento de punição
antecipada daquele a quem se imputou a prática do delito, pois,
no sistema jurídico brasileiro, fundado em bases democráticas,
prevalece o princípio da liberdade, incompatível com punições sem
processo e inconciliável com condenações sem defesa prévia.
A
prisão preventiva - que não deve ser confundida com a prisão
penal - não objetiva infligir punição àquele que sofre a sua
decretação, mas destina-se, considerada a função cautelar que lhe
é inerente, a atuar em benefício da atividade estatal
desenvolvida no processo penal.
A GRAVIDADE EM ABSTRATO DO
CRIME NÃO CONSTITUI FATOR DE LEGITIMAÇÃO DA PRIVAÇÃO CAUTELAR DA
LIBERDADE.
- A natureza da infração penal não constitui, só
por si, fundamento justificador da decretação da prisão cautelar
daquele que sofre a persecução criminal instaurada pelo Estado.
Precedentes.
O CLAMOR PÚBLICO NÃO BASTA PARA JUSTIFICAR A
DECRETAÇÃO DA PRISÃO CAUTELAR.
- O estado de comoção social e
de eventual indignação popular, motivado pela repercussão da
prática da infração penal, não pode justificar, só por si, a
decretação da prisão cautelar do suposto autor do comportamento
delituoso, sob pena de completa e grave aniquilação do postulado
fundamental da liberdade.
- O clamor público - precisamente
por não constituir causa legal de justificação da prisão
processual (CPP, art. 312) - não se qualifica como fator de
legitimação da privação cautelar da liberdade do indiciado ou do
réu. Precedentes.
A PRESERVAÇÃO DA CREDIBILIDADE DAS
INSTITUIÇÕES NÃO SE QUALIFICA, SÓ POR SI, COMO FUNDAMENTO
AUTORIZADOR DA PRISÃO CAUTELAR.
- Não se reveste de idoneidade
jurídica, para efeito de justificação do ato excepcional da
prisão cautelar, a alegação de que a prisão é necessária para
resguardar a "credibilidade da Justiça".
AUSÊNCIA DE
DEMONSTRAÇÃO, NO CASO, DA NECESSIDADE CONCRETA DE DECRETAR-SE A
PRISÃO PREVENTIVA DO PACIENTE.
- Sem que se caracterize
situação de real necessidade, não se legitima a privação cautelar
da liberdade individual do indiciado ou do réu. Ausentes razões
de necessidade, revela-se incabível, ante a sua excepcionalidade,
a decretação ou a subsistência da prisão preventiva.
O
POSTULADO CONSTITUCIONAL DA PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA IMPEDE QUE O
ESTADO TRATE, COMO SE CULPADO FOSSE, AQUELE QUE AINDA NÃO SOFREU
CONDENAÇÃO PENAL IRRECORRÍVEL.
- A prerrogativa jurídica da
liberdade - que possui extração constitucional (CF, art. 5º, LXI
e LXV) - não pode ser ofendida por interpretações doutrinárias ou
jurisprudenciais, que, fundadas em preocupante discurso de
conteúdo autoritário, culminam por consagrar, paradoxalmente, em
detrimento de direitos e garantias fundamentais proclamados pela
Constituição da República, a ideologia da lei e da
ordem.
Mesmo que se trate de pessoa acusada da suposta prática
de crime hediondo, e até que sobrevenha sentença penal
condenatória irrecorrível, não se revela possível - por efeito de
insuperável vedação constitucional (CF, art. 5º, LVII) -
presumir-lhe a culpabilidade.
Ninguém pode ser tratado como
culpado, qualquer que seja a natureza do ilícito penal cuja
prática lhe tenha sido atribuída, sem que exista, a esse respeito,
decisão judicial condenatória transitada em julgado.
O
princípio constitucional da presunção de inocência, em nosso
sistema jurídico, consagra, além de outras relevantes
conseqüências, uma regra de tratamento que impede o Poder Público
de agir e de se comportar, em relação ao suspeito, ao indiciado,
ao denunciado ou ao réu, como se estes já houvessem sido
condenados, definitivamente, por sentença do Poder Judiciário.
Precedentes.Decisão
A Turma, por maioria, superando a Súmula 691/STF, concedeu,
de ofício, a ordem de habeas corpus, nos termos do voto do
Relator, vencida a Senhora Ministra Ellen Gracie. 2ª Turma,
03.02.2009.
Data do Julgamento
:
03/02/2009
Data da Publicação
:
DJe-048 DIVULG 12-03-2009 PUBLIC 13-03-2009 EMENT VOL-02352-04 PP-00623 RF v. 105, n. 401, 2009, p. 563-572
Órgão Julgador
:
Segunda Turma
Relator(a)
:
Min. CELSO DE MELLO
Parte(s)
:
PACTE.(S): JEREMIAS VENÂNCIO DOMINGUES
IMPTE.(S): ALAN DE AUGUSTINIS
COATOR(A/S)(ES): RELATORA DO HC Nº 113155 DO SUPERIOR TRIBUNAL DE
JUSTIÇA
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