STF MI 712 / PA - PARÁ MANDADO DE INJUNÇÃO
EMENTA: MANDADO DE INJUNÇÃO. ART. 5º, LXXI DA CONSTITUIÇÃO DO
BRASIL. CONCESSÃO DE EFETIVIDADE À NORMA VEICULADA PELO ARTIGO 37,
INCISO VII, DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL. LEGITIMIDADE ATIVA DE
ENTIDADE SINDICAL. GREVE DOS TRABALHADORES EM GERAL [ART. 9º DA
CONSTITUIÇÃO DO BRASIL]. APLICAÇÃO DA LEI FEDERAL N. 7.783/89 À
GREVE NO SERVIÇO PÚBLICO ATÉ QUE SOBREVENHA LEI REGULAMENTADORA.
PARÂMETROS CONCERNENTES AO EXERCÍCIO DO DIREITO DE GREVE PELOS
SERVIDORES PÚBLICOS DEFINIDOS POR ESTA CORTE. CONTINUIDADE DO
SERVIÇO PÚBLICO. GREVE NO SERVIÇO PÚBLICO. ALTERAÇÃO DE
ENTENDIMENTO ANTERIOR QUANTO À SUBSTÂNCIA DO MANDADO DE INJUNÇÃO.
PREVALÊNCIA DO INTERESSE SOCIAL. INSUBSSISTÊNCIA DO ARGUMENTO
SEGUNDO O QUAL DAR-SE-IA OFENSA À INDEPENDÊNCIA E HARMONIA ENTRE
OS PODERES [ART. 2O DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL] E À SEPARAÇÃO DOS
PODERES [art. 60, § 4o, III, DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL]. INCUMBE
AO PODER JUDICIÁRIO PRODUZIR A NORMA SUFICIENTE PARA TORNAR
VIÁVEL O EXERCÍCIO DO DIREITO DE GREVE DOS SERVIDORES PÚBLICOS,
CONSAGRADO NO ARTIGO 37, VII, DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL.
1. O
acesso de entidades de classe à via do mandado de injunção
coletivo é processualmente admissível, desde que legalmente
constituídas e em funcionamento há pelo menos um ano.
2. A
Constituição do Brasil reconhece expressamente possam os
servidores públicos civis exercer o direito de greve --- artigo
37, inciso VII. A Lei n. 7.783/89 dispõe sobre o exercício do
direito de greve dos trabalhadores em geral, afirmado pelo artigo
9º da Constituição do Brasil. Ato normativo de início inaplicável
aos servidores públicos civis.
3. O preceito veiculado pelo
artigo 37, inciso VII, da CB/88 exige a edição de ato normativo
que integre sua eficácia. Reclama-se, para fins de plena
incidência do preceito, atuação legislativa que dê concreção ao
comando positivado no texto da Constituição.
4. Reconhecimento,
por esta Corte, em diversas oportunidades, de omissão do
Congresso Nacional no que respeita ao dever, que lhe incumbe, de
dar concreção ao preceito constitucional. Precedentes.
5. Diante de mora legislativa, cumpre ao Supremo Tribunal
Federal decidir no sentido de suprir omissão dessa ordem. Esta
Corte não se presta, quando se trate da apreciação de mandados de
injunção, a emitir decisões desnutridas de eficácia.
6. A greve,
poder de fato, é a arma mais eficaz de que dispõem os
trabalhadores visando à conquista de melhores condições de vida.
Sua auto-aplicabilidade é inquestionável; trata-se de direito
fundamental de caráter instrumental.
7. A Constituição, ao
dispor sobre os trabalhadores em geral, não prevê limitação do
direito de greve: a eles compete decidir sobre a oportunidade de
exercê-lo e sobre os interesses que devam por meio dela defender.
Por isso a lei não pode restringi-lo, senão protegê-lo, sendo
constitucionalmente admissíveis todos os tipos de greve.
8. Na
relação estatutária do emprego público não se manifesta tensão
entre trabalho e capital, tal como se realiza no campo da
exploração da atividade econômica pelos particulares. Neste, o
exercício do poder de fato, a greve, coloca em risco os
interesses egoísticos do sujeito detentor de capital ---
indivíduo ou empresa --- que, em face dela, suporta, em tese,
potencial ou efetivamente redução de sua capacidade de acumulação
de capital. Verifica-se, então, oposição direta entre os
interesses dos trabalhadores e os interesses dos capitalistas.
Como a greve pode conduzir à diminuição de ganhos do titular de
capital, os trabalhadores podem em tese vir a obter, efetiva ou
potencialmente, algumas vantagens mercê do seu exercício. O mesmo
não se dá na relação estatutária, no âmbito da qual, em tese, aos
interesses dos trabalhadores não correspondem, antagonicamente,
interesses individuais, senão o interesse social. A greve no
serviço público não compromete, diretamente, interesses
egoísticos do detentor de capital, mas sim os interesses dos
cidadãos que necessitam da prestação do serviço público.
9. A
norma veiculada pelo artigo 37, VII, da Constituição do Brasil
reclama regulamentação, a fim de que seja adequadamente
assegurada a coesão social.
10. A regulamentação do exercício
do direito de greve pelos servidores públicos há de ser peculiar,
mesmo porque "serviços ou atividades essenciais" e "necessidades
inadiáveis da coletividade" não se superpõem a "serviços
públicos"; e vice-versa.
11. Daí porque não deve ser aplicado
ao exercício do direito de greve no âmbito da Administração
tão-somente o disposto na Lei n. 7.783/89. A esta Corte impõe-se
traçar os parâmetros atinentes a esse exercício.
12. O que deve
ser regulado, na hipótese dos autos, é a coerência entre o
exercício do direito de greve pelo servidor público e as
condições necessárias à coesão e interdependência social, que a
prestação continuada dos serviços públicos assegura.
13. O
argumento de que a Corte estaria então a legislar --- o que se
afiguraria inconcebível, por ferir a independência e harmonia
entre os poderes [art. 2o da Constituição do Brasil] e a
separação dos poderes [art. 60, § 4o, III] --- é
insubsistente.
14. O Poder Judiciário está vinculado pelo
dever-poder de, no mandado de injunção, formular supletivamente a
norma regulamentadora de que carece o ordenamento
jurídico.
15. No mandado de injunção o Poder Judiciário não
define norma de decisão, mas enuncia o texto normativo que
faltava para, no caso, tornar viável o exercício do direito de
greve dos servidores públicos.
16. Mandado de injunção julgado
procedente, para remover o obstáculo decorrente da omissão
legislativa e, supletivamente, tornar viável o exercício do
direito consagrado no artigo 37, VII, da Constituição do Brasil.
Ementa
MANDADO DE INJUNÇÃO. ART. 5º, LXXI DA CONSTITUIÇÃO DO
BRASIL. CONCESSÃO DE EFETIVIDADE À NORMA VEICULADA PELO ARTIGO 37,
INCISO VII, DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL. LEGITIMIDADE ATIVA DE
ENTIDADE SINDICAL. GREVE DOS TRABALHADORES EM GERAL [ART. 9º DA
CONSTITUIÇÃO DO BRASIL]. APLICAÇÃO DA LEI FEDERAL N. 7.783/89 À
GREVE NO SERVIÇO PÚBLICO ATÉ QUE SOBREVENHA LEI REGULAMENTADORA.
PARÂMETROS CONCERNENTES AO EXERCÍCIO DO DIREITO DE GREVE PELOS
SERVIDORES PÚBLICOS DEFINIDOS POR ESTA CORTE. CONTINUIDADE DO
SERVIÇO PÚBLICO. GREVE NO SERVIÇO PÚBLICO. ALTERAÇÃO DE
ENTENDIMENTO ANTERIOR QUANTO À SUBSTÂNCIA DO MANDADO DE INJUNÇÃO.
PREVALÊNCIA DO INTERESSE SOCIAL. INSUBSSISTÊNCIA DO ARGUMENTO
SEGUNDO O QUAL DAR-SE-IA OFENSA À INDEPENDÊNCIA E HARMONIA ENTRE
OS PODERES [ART. 2O DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL] E À SEPARAÇÃO DOS
PODERES [art. 60, § 4o, III, DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL]. INCUMBE
AO PODER JUDICIÁRIO PRODUZIR A NORMA SUFICIENTE PARA TORNAR
VIÁVEL O EXERCÍCIO DO DIREITO DE GREVE DOS SERVIDORES PÚBLICOS,
CONSAGRADO NO ARTIGO 37, VII, DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL.
1. O
acesso de entidades de classe à via do mandado de injunção
coletivo é processualmente admissível, desde que legalmente
constituídas e em funcionamento há pelo menos um ano.
2. A
Constituição do Brasil reconhece expressamente possam os
servidores públicos civis exercer o direito de greve --- artigo
37, inciso VII. A Lei n. 7.783/89 dispõe sobre o exercício do
direito de greve dos trabalhadores em geral, afirmado pelo artigo
9º da Constituição do Brasil. Ato normativo de início inaplicável
aos servidores públicos civis.
3. O preceito veiculado pelo
artigo 37, inciso VII, da CB/88 exige a edição de ato normativo
que integre sua eficácia. Reclama-se, para fins de plena
incidência do preceito, atuação legislativa que dê concreção ao
comando positivado no texto da Constituição.
4. Reconhecimento,
por esta Corte, em diversas oportunidades, de omissão do
Congresso Nacional no que respeita ao dever, que lhe incumbe, de
dar concreção ao preceito constitucional. Precedentes.
5. Diante de mora legislativa, cumpre ao Supremo Tribunal
Federal decidir no sentido de suprir omissão dessa ordem. Esta
Corte não se presta, quando se trate da apreciação de mandados de
injunção, a emitir decisões desnutridas de eficácia.
6. A greve,
poder de fato, é a arma mais eficaz de que dispõem os
trabalhadores visando à conquista de melhores condições de vida.
Sua auto-aplicabilidade é inquestionável; trata-se de direito
fundamental de caráter instrumental.
7. A Constituição, ao
dispor sobre os trabalhadores em geral, não prevê limitação do
direito de greve: a eles compete decidir sobre a oportunidade de
exercê-lo e sobre os interesses que devam por meio dela defender.
Por isso a lei não pode restringi-lo, senão protegê-lo, sendo
constitucionalmente admissíveis todos os tipos de greve.
8. Na
relação estatutária do emprego público não se manifesta tensão
entre trabalho e capital, tal como se realiza no campo da
exploração da atividade econômica pelos particulares. Neste, o
exercício do poder de fato, a greve, coloca em risco os
interesses egoísticos do sujeito detentor de capital ---
indivíduo ou empresa --- que, em face dela, suporta, em tese,
potencial ou efetivamente redução de sua capacidade de acumulação
de capital. Verifica-se, então, oposição direta entre os
interesses dos trabalhadores e os interesses dos capitalistas.
Como a greve pode conduzir à diminuição de ganhos do titular de
capital, os trabalhadores podem em tese vir a obter, efetiva ou
potencialmente, algumas vantagens mercê do seu exercício. O mesmo
não se dá na relação estatutária, no âmbito da qual, em tese, aos
interesses dos trabalhadores não correspondem, antagonicamente,
interesses individuais, senão o interesse social. A greve no
serviço público não compromete, diretamente, interesses
egoísticos do detentor de capital, mas sim os interesses dos
cidadãos que necessitam da prestação do serviço público.
9. A
norma veiculada pelo artigo 37, VII, da Constituição do Brasil
reclama regulamentação, a fim de que seja adequadamente
assegurada a coesão social.
10. A regulamentação do exercício
do direito de greve pelos servidores públicos há de ser peculiar,
mesmo porque "serviços ou atividades essenciais" e "necessidades
inadiáveis da coletividade" não se superpõem a "serviços
públicos"; e vice-versa.
11. Daí porque não deve ser aplicado
ao exercício do direito de greve no âmbito da Administração
tão-somente o disposto na Lei n. 7.783/89. A esta Corte impõe-se
traçar os parâmetros atinentes a esse exercício.
12. O que deve
ser regulado, na hipótese dos autos, é a coerência entre o
exercício do direito de greve pelo servidor público e as
condições necessárias à coesão e interdependência social, que a
prestação continuada dos serviços públicos assegura.
13. O
argumento de que a Corte estaria então a legislar --- o que se
afiguraria inconcebível, por ferir a independência e harmonia
entre os poderes [art. 2o da Constituição do Brasil] e a
separação dos poderes [art. 60, § 4o, III] --- é
insubsistente.
14. O Poder Judiciário está vinculado pelo
dever-poder de, no mandado de injunção, formular supletivamente a
norma regulamentadora de que carece o ordenamento
jurídico.
15. No mandado de injunção o Poder Judiciário não
define norma de decisão, mas enuncia o texto normativo que
faltava para, no caso, tornar viável o exercício do direito de
greve dos servidores públicos.
16. Mandado de injunção julgado
procedente, para remover o obstáculo decorrente da omissão
legislativa e, supletivamente, tornar viável o exercício do
direito consagrado no artigo 37, VII, da Constituição do Brasil.Decisão
Após o voto do Senhor Ministro Eros Grau (Relator), que
conhecia do mandado de injunção e dava solução à omissão
legislativa, nos termos de seu voto, no que foi acompanhado pelo
Senhor Ministro Gilmar Mendes, pediu vista dos autos o Senhor
Ministro Ricardo Lewandowski. Presidência da Senhora Ministra
Ellen Gracie. Plenário, 07.06.2006.
Decisão: Após os votos
dos Senhores Ministros Eros Grau (Relator), Gilmar Mendes, Celso
de Mello, Sepúlveda Pertence, Carlos Britto, Cármen Lúcia e Cezar
Peluso, que conheciam e julgavam procedente o mandado de injunção
para determinar a aplicação da Lei nº 7.783, de 28 de junho de
1989, e do voto do Senhor Ministro Ricardo Lewandowski,
julgando-a procedente em parte, nos termos do voto proferido,
pediu vista dos autos o Senhor Ministro Joaquim Barbosa. Em
seguida, o Tribunal, por maioria, apreciando questão de ordem
suscitada, indeferiu o pedido de tutela antecipada, vencidos os
Senhores Ministros Relator, que a suscitara, Cezar Peluso, Celso
de Mello e Gilmar Mendes. Ausentes, ocasionalmente, neste ponto,
o Senhor Ministro Sepúlveda Pertence, e, na segunda parte da
sessão, a Senhora Ministra Ellen Gracie (Presidente). Presidência
do Senhor Ministro Gilmar Mendes (Vice-Presidente). Plenário,
12.04.2007.
Decisão: O Tribunal, por maioria, nos termos do
voto do Relator, conheceu do mandado de injunção e propôs a
solução para a omissão legislativa com a aplicação da Lei nº
7.783, de 28 de junho de 1989, no que couber, vencidos,
parcialmente, os Senhores Ministros Ricardo Lewandowski, Joaquim
Barbosa e Marco Aurélio, que limitavam a decisão à categoria
representada pelo sindicato e estabeleciam condições específicas
para o exercício das paralisações. Votou a Presidente, Ministra
Ellen Gracie. Não votou o Senhor Ministro Menezes Direito por
suceder ao Senhor Ministro Sepúlveda Pertence, que proferiu voto
anteriormente. Ausente, justificadamente, a Senhora Ministra
Cármen Lúcia, com voto proferido em assentada anterior. Plenário,
25.10.2007.
Data do Julgamento
:
25/10/2007
Data da Publicação
:
DJe-206 DIVULG 30-10-2008 PUBLIC 31-10-2008 EMENT VOL-02339-03 PP-00384
Órgão Julgador
:
Tribunal Pleno
Relator(a)
:
Min. EROS GRAU
Parte(s)
:
IMPTE.(S): SINDICATO DOS TRABALHADORES DO PODER JUDICIÁRIO DO
ESTADO DO PARÁ - SINJEP
ADV.(A/S): EDUARDO SUZUKI SIZO E OUTRO(A/S)
IMPDO.(A/S): CONGRESSO NACIONAL
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