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Jurisprudência


STF RHC 79785 / RJ - RIO DE JANEIRO RECURSO EM HABEAS CORPUS

Ementa
I. Duplo grau de jurisdição no Direito brasileiro, à luz da Constituição e da Convenção Americana de Direitos Humanos. 1. Para corresponder à eficácia instrumental que lhe costuma ser atribuída, o duplo grau de jurisdição há de ser concebido, à moda clássica, com seus dois caracteres específicos: a possibilidade de um reexame integral da sentença de primeiro grau e que esse reexame seja confiado à órgão diverso do que a proferiu e de hierarquia superior na ordem judiciária. 2. Com esse sentido próprio - sem concessões que o desnaturem - não é possível, sob as sucessivas Constituições da República, erigir o duplo grau em princípio e garantia constitucional, tantas são as previsões, na própria Lei Fundamental, do julgamento de única instância ordinária, já na área cível, já, particularmente, na área penal. 3. A situação não se alterou, com a incorporação ao Direito brasileiro da Convenção Americana de Direitos Humanos (Pacto de São José), na qual, efetivamente, o art. 8º, 2, h, consagrou, como garantia, ao menos na esfera processual penal, o duplo grau de jurisdição, em sua acepção mais própria: o direito de "toda pessoa acusada de delito", durante o processo, "de recorrer da sentença para juiz ou tribunal superior". 4. Prevalência da Constituição, no Direito brasileiro, sobre quaisquer convenções internacionais, incluídas as de proteção aos direitos humanos, que impede, no caso, a pretendida aplicação da norma do Pacto de São José: motivação. II. A Constituição do Brasil e as convenções internacionais de proteção aos direitos humanos: prevalência da Constituição que afasta a aplicabilidade das cláusulas convencionais antinômicas. 1. Quando a questão - no estágio ainda primitivo de centralização e efetividade da ordem jurídica internacional - é de ser resolvida sob a perspectiva do juiz nacional - que, órgão do Estado, deriva da Constituição sua própria autoridade jurisdicional - não pode ele buscar, senão nessa Constituição mesma, o critério da solução de eventuais antinomias entre normas internas e normas internacionais; o que é bastante a firmar a supremacia sobre as últimas da Constituição, ainda quando esta eventualmente atribua aos tratados a prevalência no conflito: mesmo nessa hipótese, a primazia derivará da Constituição e não de uma apriorística força intrínseca da convenção internacional. 2. Assim como não o afirma em relação às leis, a Constituição não precisou dizer-se sobreposta aos tratados: a hierarquia está ínsita em preceitos inequívocos seus, como os que submetem a aprovação e a promulgação das convenções ao processo legislativo ditado pela Constituição e menos exigente que o das emendas a ela e aquele que, em conseqüência, explicitamente admite o controle da constitucionalidade dos tratados (CF, art. 102, III, b). 3. Alinhar-se ao consenso em torno da estatura infraconstitucional, na ordem positiva brasileira, dos tratados a ela incorporados, não implica assumir compromisso de logo com o entendimento - majoritário em recente decisão do STF (ADInMC 1.480) - que, mesmo em relação às convenções internacionais de proteção de direitos fundamentais, preserva a jurisprudência que a todos equipara hierarquicamente às leis ordinárias. 4. Em relação ao ordenamento pátrio, de qualquer sorte, para dar a eficácia pretendida à cláusula do Pacto de São José, de garantia do duplo grau de jurisdição, não bastaria sequer lhe conceder o poder de aditar a Constituição, acrescentando-lhe limitação oponível à lei como é a tendência do relator: mais que isso, seria necessário emprestar à norma convencional força ab-rogante da Constituição mesma, quando não dinamitadoras do seu sistema, o que não é de admitir. III. Competência originária dos Tribunais e duplo grau de jurisdição. 1. Toda vez que a Constituição prescreveu para determinada causa a competência originária de um Tribunal, de duas uma: ou também previu recurso ordinário de sua decisão (CF, arts. 102, II, a; 105, II, a e b; 121, § 4º, III, IV e V) ou, não o tendo estabelecido, é que o proibiu. 2. Em tais hipóteses, o recurso ordinário contra decisões de Tribunal, que ela mesma não criou, a Constituição não admite que o institua o direito infraconstitucional, seja lei ordinária seja convenção internacional: é que, afora os casos da Justiça do Trabalho - que não estão em causa - e da Justiça Militar - na qual o STM não se superpõe a outros Tribunais -, assim como as do Supremo Tribunal, com relação a todos os demais Tribunais e Juízos do País, também as competências recursais dos outros Tribunais Superiores - o STJ e o TSE - estão enumeradas taxativamente na Constituição, e só a emenda constitucional poderia ampliar. 3 .À falta de órgãos jurisdicionais ad qua, no sistema constitucional, indispensáveis a viabilizar a aplicação do princípio do duplo grau de jurisdição aos processos de competência originária dos Tribunais, segue-se a incompatibilidade com a Constituição da aplicação no caso da norma internacional de outorga da garantia invocada.
Decisão
Indexação - DESCONSIDERAÇÃO, DUPLO GRAU DE JURISDIÇÃO, PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL, GARANTIA FUNDAMENTAL. EXISTÊNCIA, PREVISÃO, CONSTITUIÇÃO FEDERAL, JULGAMENTO, ÚNICA INSTÂNCIA. POSSIBILIDADE, LEI ORDINÁRIA, ESTIPULAÇÃO, EXCEÇÃO, DUPLO GRAU. RAZOABILIDADE, EXCLUSÃO LEGAL, RECURSO ORDINÁRIO. CONSIDERAÇÃO, PRINCÍPIO GERAL DO PROCESSO. EXISTÊNCIA, DUPLO GRAU DE JURISDIÇÃO, EXCLUSIVIDADE, CARTA POLÍTICA DO IMPÉRIO. VALIDADE, PERDA, REEXAME, CONDENAÇÃO, IMPETRANTE, DECORRÊNCIA, PRIVILÉGIO DE FORO, DIVERSIDADE, ACUSADO. - IMPOSSIBILIDADE, CONVENÇÃO INTERNACIONAL, PREVALÊNCIA, CONSTITUIÇÃO FEDERAL. NECESSIDADE, OBSERVÂNCIA, CARTA MAGNA, LIMITE, CONFLITO, NORMA INTERNA, NORMA INTERNACIONAL. CARACTERIZAÇÃO, NATUREZA INFRACONSTITUCIONAL, NORMA DERIVADA. EXISTÊNCIA, HIERARQUIA IMPLÍCITA, RIGIDEZ CONSTITUCIONAL, PROCESSO LEGISLATIVO, CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE, TRATADOS. OUTORGA, FORÇA SUPRA-LEGAL, CONVENÇÃO, DIREITOS HUMANOS. APLICAÇÃO DIRETA, NORMA. POSSIBILIDADE, OFENSA, LEI ORDINÁRIA. IMPOSSIBILIDADE, LEI INFRACONSTITUCIONAL, INSTITUIÇÃO, RECURSO, COMPETÊNCIA ORIGINÁRIA, TRIBUNAL, AUSÊNCIA, PREVISÃO CONSTITUCIONAL. ENUMERAÇÃO TAXATIVA, COMPETÊNCIA RECURSAL, TRIBUNAL, JURISDIÇÃO, ESTADO. NECESSIDADE, OBSERVÂNCIA, EXCEÇÃO CONSTITUCIONAL, INDEPENDÊNCIA, INSERÇÃO, DUPLO GRAU, CONSTITUIÇÃO. - (ENTENDIMENTO DIVERGENTE), INEXISTÊNCIA, HIERARQUIA, LEI, TRATADO INTERNACIONAL. CONSTITUCIONALIZAÇÃO, TRATO INTERNACIONAL, ANTERIORIDADE, PROMULGAÇÃO, CARTA POLÍTICA. IMPOSSIBILIDADE, EQUIPARAÇÃO, EMENDA CONSTITUCIONAL (MIN. MOREIRA ALVES). - VOTO VENCIDO, MIN. MARCO AURÉLIO: CABIMENTO, RECURSO INOMINADO, SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA (STJ), ATUAÇÃO ORIGINÁRIA, TRIBUNAL DE JUSTIÇA, AÇÃO PENAL . RATIFICAÇÃO, CONVENÇÃO, IDENTIDADE, PATAMAR, CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. ADMISSÃO, LEI PROCESSUAL PENAL, INTERPRETAÇÃO EXTENSIVA, APLICAÇÃO ANALÓGICA. NECESSIDADE, ABERTURA, VIA RECURSAL ORDINÁRIA, ACUSADO. VIOLAÇÃO, PRINCÍPIO DA ISONOMIA, DECORRÊNCIA, CONDENAÇÃO IRRECORRÍVEL. PREVISÃO, RECORRIBILIDADE, DECISÃO, PLENÁRIO, SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. - VOTO VENCIDO, MIN. CARLOS VELLOSO: CONSAGRAÇÃO, DUPLO GRAU DE JURISDIÇÃO, DIREITO FUNDAMENTAL, DECORRÊNCIA, INTRODUÇÃO, ORDEM JURÍDICO-CONSTITUCIONAL . AUSÊNCIA, IMPEDIMENTO, UTILIZAÇÃO, RECURSO, OBSERVÂNCIA, CONSTITUIÇÃO FEDERAL. Legislação LEG-FED CF ANO-1988 ART-00005 PAR-00002 INC-00035 INC-00054 INC-00055 INC-00067 ART-00059 ART-00102 INC-00002 INC-00003 ART-00105 INC-00002 LET-A LET-B ART-00108 INC-00002 ART-00121 PAR-00004 INC-00003 INC-00004 INC-00005 CF-1988 CONSTITUIÇÃO FEDERAL LEG-FED DEC-000678 ANO-1992 LEG-FED DEL-003689 ANO-1941 ART-00003 CPP-1941 CÓDIGO DE PROCESSO PENAL Observação Votação: por maioria, vencidos os Mins Marco Aurélio e o Carlos Velloso. Resultado: desprovido. Acórdãos citados: ADI-675-MC, ADI-1480-MC, HC-68846 (RTJ-58/593), HC-71124, HC-72131, Pet-760 (RTJ-155/722), Ext-347 (RTJ-86/1), RE-86709 (RTJ-90/950). Obs.: - O RHC- 79785 foi objeto dos RHC-ED desprovidos em 10/04/2003. Número de páginas: (45). Análise:(FLO). Revisão:(AAF). Inclusão: 26/03/03, (MLR). Alteração: 23/01/04, (SVF). Doutrina OBRA: COMENTÁRIOS AO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL AUTOR: BARBOSA MOREIRA EDITORA: FORENSE VOLUME: 05 EDIÇÃO: 8ª PÁGINA: 238 OBRA: TEORIA DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS - O § 2º DO ART. 5º DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL AUTOR: CELSO DE ALBUQUERQUE MELLO CITADO POR RICARDO LOBO TORRES EDITORA: RENOVAR ANO: 1999 VOLUME: 1º PÁGINA: 25 OBRA: DIREITO INTERNACIONAL PÚBLICO AUTOR: FRANCISCO REZEK EDITORA: SARAIVA ANO: 1989 PÁGINA: 103

Data do Julgamento : 29/03/2000
Data da Publicação : DJ 22-11-2002 PP-00057 EMENT VOL-02092-02 PP-00280 RTJ VOL-00183-03 PP-01010
Órgão Julgador : Tribunal Pleno
Relator(a) : Min. SEPÚLVEDA PERTENCE
Parte(s) : RECTE. : JORGINA MARIA DE FREITAS FERNANDES ADVDO. : LUIZ CARLOS DE ANDRADE ADVDO.(A/S) : ANA NERY DE FREITAS ADVDO.(A/S) : FRANCISCO ANTÔNIO DE FREITAS NETO RECDO. : MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
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