STF RHC 90376 / RJ - RIO DE JANEIRO RECURSO EM HABEAS CORPUS
E M E N T A: PROVA PENAL - BANIMENTO CONSTITUCIONAL DAS PROVAS
ILÍCITAS (CF, ART. 5º, LVI) - ILICITUDE (ORIGINÁRIA E POR
DERIVAÇÃO) - INADMISSIBILDADE - BUSCA E APREENSÃO DE MATERIAIS E
EQUIPAMENTOS REALIZADA, SEM MANDADO JUDICIAL, EM QUARTO DE HOTEL
AINDA OCUPADO - IMPOSSIBLIDADE - QUALIFICAÇÃO JURÍDICA DESSE
ESPAÇO PRIVADO (QUARTO DE HOTEL, DESDE QUE OCUPADO) COMO "CASA",
PARA EFEITO DA TUTELA CONSTITUCIONAL DA INVIOLABILIDADE
DOMICILIAR - GARANTIA QUE TRADUZ LIMITAÇÃO CONSTITUCIONAL AO
PODER DO ESTADO EM TEMA DE PERSECUÇÃO PENAL, MESMO EM SUA FASE
PRÉ-PROCESSUAL - CONCEITO DE "CASA" PARA EFEITO DA PROTEÇÃO
CONSTITUCIONAL (CF, ART. 5º, XI E CP, ART. 150, § 4º, II) -
AMPLITUDE DESSA NOÇÃO CONCEITUAL, QUE TAMBÉM COMPREENDE OS
APOSENTOS DE HABITAÇÃO COLETIVA (COMO, POR EXEMPLO, OS QUARTOS DE
HOTEL, PENSÃO, MOTEL E HOSPEDARIA, DESDE QUE OCUPADOS):
NECESSIDADE, EM TAL HIPÓTESE, DE MANDADO JUDICIAL (CF, ART. 5º,
XI). IMPOSSIBILIDADE DE UTILIZAÇÃO, PELO MINISTÉRIO PÚBLICO, DE
PROVA OBTIDA COM TRANSGRESSÃO À GARANTIA DA INVIOLABILIDADE
DOMICILIAR - PROVA ILÍCITA - INIDONEIDADE JURÍDICA - RECURSO
ORDINÁRIO PROVIDO.
BUSCA E APREENSÃO EM APOSENTOS OCUPADOS
DE HABITAÇÃO COLETIVA (COMO QUARTOS DE HOTEL) - SUBSUNÇÃO DESSE
ESPAÇO PRIVADO, DESDE QUE OCUPADO, AO CONCEITO DE "CASA" -
CONSEQÜENTE NECESSIDADE, EM TAL HIPÓTESE, DE MANDADO JUDICIAL,
RESSALVADAS AS EXCEÇÕES PREVISTAS NO PRÓPRIO TEXTO
CONSTITUCIONAL.
- Para os fins da proteção jurídica a que se
refere o art. 5º, XI, da Constituição da República, o conceito
normativo de "casa" revela-se abrangente e, por estender-se a
qualquer aposento de habitação coletiva, desde que ocupado (CP,
art. 150, § 4º, II), compreende, observada essa específica
limitação espacial, os quartos de hotel. Doutrina.
Precedentes.
- Sem que ocorra qualquer das situações
excepcionais taxativamente previstas no texto constitucional
(art. 5º, XI), nenhum agente público poderá, contra a vontade de
quem de direito ("invito domino"), ingressar, durante o dia, sem
mandado judicial, em aposento ocupado de habitação coletiva, sob
pena de a prova resultante dessa diligência de busca e apreensão
reputar-se inadmissível, porque impregnada de ilicitude
originária. Doutrina. Precedentes (STF).
ILICITUDE DA PROVA
- INADMISSIBILIDADE DE SUA PRODUÇÃO EM JUÍZO (OU PERANTE QUALQUER
INSTÂNCIA DE PODER) - INIDONEIDADE JURÍDICA DA PROVA RESULTANTE
DA TRANSGRESSÃO ESTATAL AO REGIME CONSTITUCIONAL DOS DIREITOS E
GARANTIAS INDIVIDUAIS.
- A ação persecutória do Estado,
qualquer que seja a instância de poder perante a qual se instaure,
para revestir-se de legitimidade, não pode apoiar-se em
elementos probatórios ilicitamente obtidos, sob pena de ofensa à
garantia constitucional do "due process of law", que tem, no
dogma da inadmissibilidade das provas ilícitas, uma de suas mais
expressivas projeções concretizadoras no plano do nosso sistema
de direito positivo.
- A Constituição da República, em norma
revestida de conteúdo vedatório (CF, art. 5º, LVI), desautoriza,
por incompatível com os postulados que regem uma sociedade
fundada em bases democráticas (CF, art. 1º), qualquer prova cuja
obtenção, pelo Poder Público, derive de transgressão a cláusulas
de ordem constitucional, repelindo, por isso mesmo, quaisquer
elementos probatórios que resultem de violação do direito
material (ou, até mesmo, do direito processual), não prevalecendo,
em conseqüência, no ordenamento normativo brasileiro, em matéria
de atividade probatória, a fórmula autoritária do "male captum,
bene retentum". Doutrina. Precedentes.
A QUESTÃO DA DOUTRINA
DOS FRUTOS DA ÁRVORE ENVENENADA ("FRUITS OF THE POISONOUS TREE"):
A QUESTÃO DA ILICITUDE POR DERIVAÇÃO.
- Ninguém pode ser
investigado, denunciado ou condenado com base, unicamente, em
provas ilícitas, quer se trate de ilicitude originária, quer se
cuide de ilicitude por derivação. Qualquer novo dado probatório,
ainda que produzido, de modo válido, em momento subseqüente, não
pode apoiar-se, não pode ter fundamento causal nem derivar de
prova comprometida pela mácula da ilicitude originária.
- A
exclusão da prova originariamente ilícita - ou daquela afetada
pelo vício da ilicitude por derivação - representa um dos meios
mais expressivos destinados a conferir efetividade à garantia do
"due process of law" e a tornar mais intensa, pelo banimento da
prova ilicitamente obtida, a tutela constitucional que preserva
os direitos e prerrogativas que assistem a qualquer acusado em
sede processual penal. Doutrina. Precedentes.
- A doutrina da
ilicitude por derivação (teoria dos "frutos da árvore
envenenada") repudia, por constitucionalmente inadmissíveis, os
meios probatórios, que, não obstante produzidos, validamente, em
momento ulterior, acham-se afetados, no entanto, pelo vício
(gravíssimo) da ilicitude originária, que a eles se transmite,
contaminando-os, por efeito de repercussão causal. Hipótese em
que os novos dados probatórios somente foram conhecidos, pelo
Poder Público, em razão de anterior transgressão praticada,
originariamente, pelos agentes da persecução penal, que
desrespeitaram a garantia constitucional da inviolabilidade
domiciliar.
- Revelam-se inadmissíveis, desse modo, em
decorrência da ilicitude por derivação, os elementos probatórios
a que os órgãos da persecução penal somente tiveram acesso em
razão da prova originariamente ilícita, obtida como resultado da
transgressão, por agentes estatais, de direitos e garantias
constitucionais e legais, cuja eficácia condicionante, no plano
do ordenamento positivo brasileiro, traduz significativa
limitação de ordem jurídica ao poder do Estado em face dos
cidadãos.
- Se, no entanto, o órgão da persecução penal
demonstrar que obteve, legitimamente, novos elementos de
informação a partir de uma fonte autônoma de prova - que não
guarde qualquer relação de dependência nem decorra da prova
originariamente ilícita, com esta não mantendo vinculação causal
-, tais dados probatórios revelar-se-ão plenamente admissíveis,
porque não contaminados pela mácula da ilicitude originária.
-
A QUESTÃO DA FONTE AUTÔNOMA DE PROVA ("AN INDEPENDENT SOURCE") E
A SUA DESVINCULAÇÃO CAUSAL DA PROVA ILICITAMENTE OBTIDA -
DOUTRINA - PRECEDENTES DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL -
JURISPRUDÊNCIA COMPARADA (A EXPERIÊNCIA DA SUPREMA CORTE
AMERICANA): CASOS "SILVERTHORNE LUMBER CO. V. UNITED STATES
(1920); SEGURA V. UNITED STATES (1984); NIX V. WILLIAMS (1984);
MURRAY V. UNITED STATES (1988)", v.g..
Ementa
E M E N T A: PROVA PENAL - BANIMENTO CONSTITUCIONAL DAS PROVAS
ILÍCITAS (CF, ART. 5º, LVI) - ILICITUDE (ORIGINÁRIA E POR
DERIVAÇÃO) - INADMISSIBILDADE - BUSCA E APREENSÃO DE MATERIAIS E
EQUIPAMENTOS REALIZADA, SEM MANDADO JUDICIAL, EM QUARTO DE HOTEL
AINDA OCUPADO - IMPOSSIBLIDADE - QUALIFICAÇÃO JURÍDICA DESSE
ESPAÇO PRIVADO (QUARTO DE HOTEL, DESDE QUE OCUPADO) COMO "CASA",
PARA EFEITO DA TUTELA CONSTITUCIONAL DA INVIOLABILIDADE
DOMICILIAR - GARANTIA QUE TRADUZ LIMITAÇÃO CONSTITUCIONAL AO
PODER DO ESTADO EM TEMA DE PERSECUÇÃO PENAL, MESMO EM SUA FASE
PRÉ-PROCESSUAL - CONCEITO DE "CASA" PARA EFEITO DA PROTEÇÃO
CONSTITUCIONAL (CF, ART. 5º, XI E CP, ART. 150, § 4º, II) -
AMPLITUDE DESSA NOÇÃO CONCEITUAL, QUE TAMBÉM COMPREENDE OS
APOSENTOS DE HABITAÇÃO COLETIVA (COMO, POR EXEMPLO, OS QUARTOS DE
HOTEL, PENSÃO, MOTEL E HOSPEDARIA, DESDE QUE OCUPADOS):
NECESSIDADE, EM TAL HIPÓTESE, DE MANDADO JUDICIAL (CF, ART. 5º,
XI). IMPOSSIBILIDADE DE UTILIZAÇÃO, PELO MINISTÉRIO PÚBLICO, DE
PROVA OBTIDA COM TRANSGRESSÃO À GARANTIA DA INVIOLABILIDADE
DOMICILIAR - PROVA ILÍCITA - INIDONEIDADE JURÍDICA - RECURSO
ORDINÁRIO PROVIDO.
BUSCA E APREENSÃO EM APOSENTOS OCUPADOS
DE HABITAÇÃO COLETIVA (COMO QUARTOS DE HOTEL) - SUBSUNÇÃO DESSE
ESPAÇO PRIVADO, DESDE QUE OCUPADO, AO CONCEITO DE "CASA" -
CONSEQÜENTE NECESSIDADE, EM TAL HIPÓTESE, DE MANDADO JUDICIAL,
RESSALVADAS AS EXCEÇÕES PREVISTAS NO PRÓPRIO TEXTO
CONSTITUCIONAL.
- Para os fins da proteção jurídica a que se
refere o art. 5º, XI, da Constituição da República, o conceito
normativo de "casa" revela-se abrangente e, por estender-se a
qualquer aposento de habitação coletiva, desde que ocupado (CP,
art. 150, § 4º, II), compreende, observada essa específica
limitação espacial, os quartos de hotel. Doutrina.
Precedentes.
- Sem que ocorra qualquer das situações
excepcionais taxativamente previstas no texto constitucional
(art. 5º, XI), nenhum agente público poderá, contra a vontade de
quem de direito ("invito domino"), ingressar, durante o dia, sem
mandado judicial, em aposento ocupado de habitação coletiva, sob
pena de a prova resultante dessa diligência de busca e apreensão
reputar-se inadmissível, porque impregnada de ilicitude
originária. Doutrina. Precedentes (STF).
ILICITUDE DA PROVA
- INADMISSIBILIDADE DE SUA PRODUÇÃO EM JUÍZO (OU PERANTE QUALQUER
INSTÂNCIA DE PODER) - INIDONEIDADE JURÍDICA DA PROVA RESULTANTE
DA TRANSGRESSÃO ESTATAL AO REGIME CONSTITUCIONAL DOS DIREITOS E
GARANTIAS INDIVIDUAIS.
- A ação persecutória do Estado,
qualquer que seja a instância de poder perante a qual se instaure,
para revestir-se de legitimidade, não pode apoiar-se em
elementos probatórios ilicitamente obtidos, sob pena de ofensa à
garantia constitucional do "due process of law", que tem, no
dogma da inadmissibilidade das provas ilícitas, uma de suas mais
expressivas projeções concretizadoras no plano do nosso sistema
de direito positivo.
- A Constituição da República, em norma
revestida de conteúdo vedatório (CF, art. 5º, LVI), desautoriza,
por incompatível com os postulados que regem uma sociedade
fundada em bases democráticas (CF, art. 1º), qualquer prova cuja
obtenção, pelo Poder Público, derive de transgressão a cláusulas
de ordem constitucional, repelindo, por isso mesmo, quaisquer
elementos probatórios que resultem de violação do direito
material (ou, até mesmo, do direito processual), não prevalecendo,
em conseqüência, no ordenamento normativo brasileiro, em matéria
de atividade probatória, a fórmula autoritária do "male captum,
bene retentum". Doutrina. Precedentes.
A QUESTÃO DA DOUTRINA
DOS FRUTOS DA ÁRVORE ENVENENADA ("FRUITS OF THE POISONOUS TREE"):
A QUESTÃO DA ILICITUDE POR DERIVAÇÃO.
- Ninguém pode ser
investigado, denunciado ou condenado com base, unicamente, em
provas ilícitas, quer se trate de ilicitude originária, quer se
cuide de ilicitude por derivação. Qualquer novo dado probatório,
ainda que produzido, de modo válido, em momento subseqüente, não
pode apoiar-se, não pode ter fundamento causal nem derivar de
prova comprometida pela mácula da ilicitude originária.
- A
exclusão da prova originariamente ilícita - ou daquela afetada
pelo vício da ilicitude por derivação - representa um dos meios
mais expressivos destinados a conferir efetividade à garantia do
"due process of law" e a tornar mais intensa, pelo banimento da
prova ilicitamente obtida, a tutela constitucional que preserva
os direitos e prerrogativas que assistem a qualquer acusado em
sede processual penal. Doutrina. Precedentes.
- A doutrina da
ilicitude por derivação (teoria dos "frutos da árvore
envenenada") repudia, por constitucionalmente inadmissíveis, os
meios probatórios, que, não obstante produzidos, validamente, em
momento ulterior, acham-se afetados, no entanto, pelo vício
(gravíssimo) da ilicitude originária, que a eles se transmite,
contaminando-os, por efeito de repercussão causal. Hipótese em
que os novos dados probatórios somente foram conhecidos, pelo
Poder Público, em razão de anterior transgressão praticada,
originariamente, pelos agentes da persecução penal, que
desrespeitaram a garantia constitucional da inviolabilidade
domiciliar.
- Revelam-se inadmissíveis, desse modo, em
decorrência da ilicitude por derivação, os elementos probatórios
a que os órgãos da persecução penal somente tiveram acesso em
razão da prova originariamente ilícita, obtida como resultado da
transgressão, por agentes estatais, de direitos e garantias
constitucionais e legais, cuja eficácia condicionante, no plano
do ordenamento positivo brasileiro, traduz significativa
limitação de ordem jurídica ao poder do Estado em face dos
cidadãos.
- Se, no entanto, o órgão da persecução penal
demonstrar que obteve, legitimamente, novos elementos de
informação a partir de uma fonte autônoma de prova - que não
guarde qualquer relação de dependência nem decorra da prova
originariamente ilícita, com esta não mantendo vinculação causal
-, tais dados probatórios revelar-se-ão plenamente admissíveis,
porque não contaminados pela mácula da ilicitude originária.
-
A QUESTÃO DA FONTE AUTÔNOMA DE PROVA ("AN INDEPENDENT SOURCE") E
A SUA DESVINCULAÇÃO CAUSAL DA PROVA ILICITAMENTE OBTIDA -
DOUTRINA - PRECEDENTES DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL -
JURISPRUDÊNCIA COMPARADA (A EXPERIÊNCIA DA SUPREMA CORTE
AMERICANA): CASOS "SILVERTHORNE LUMBER CO. V. UNITED STATES
(1920); SEGURA V. UNITED STATES (1984); NIX V. WILLIAMS (1984);
MURRAY V. UNITED STATES (1988)", v.g..Decisão
A Turma, por votação unânime, deu provimento ao recuso ordinário, nos
termos do voto do Relator, para restabelecer a sentença penal
absolutória proferida nos autos do Processo-crime nº 1998.001.082771-6
(19ª Vara Criminal da Comarca do Rio de Janeiro/RJ). Ausente,
justificadamente, neste julgamento o Senhor Ministro Gilmar Mendes. 2ª
Turma, 03.04.2007.
Data do Julgamento
:
03/04/2007
Data da Publicação
:
DJe-018 DIVULG 17-05-2007 PUBLIC 18-05-2007 DJ 18-05-2007 PP-00113 EMENT VOL-02276-02 PP-00321 RTJ VOL-00202-02 PP-00764 RT v. 96, n. 864, 2007, p. 510-525 RCJ v. 21, n. 136, 2007, p. 145-147
Órgão Julgador
:
Segunda Turma
Relator(a)
:
Min. CELSO DE MELLO
Parte(s)
:
RECTE.(S) : SÉRGIO AUGUSTO COIMBRA VIAL
ADV.(A/S) : FLÁVIO JORGE MARTINS
RECDO.(A/S) : MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
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