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Jurisprudência


TJAC 0000005-52.1999.8.01.0002

Ementa
Apelação Cível. Agente político. Ação Civil Pública. Via. Inadequação. Contrato. Obras e serviços. Irregularidades. Existência. Má-fé. Ausência. - Os atos praticado por agentes políticos, contra a administração pública, constituem crime de responsabilidade, posto que regidos por Lei específica. - Impõe-se a extinção do feito sem resolução de mérito, em relação aos agentes políticos, à falta de uma das condições da ação. - Constatada a ausência de má-fé pelos executores do contrato, mantém-se a Sentença que deixou de condená-los por ato ilícito em face da administração pública. Vistos, relatados e discutidos estes autos da Apelação Cível nº 0000005-52.1999.8.01.0002, acordam, por maioria, os Membros que compõem a Segunda Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Acre, em acolher a preliminar de carência da ação, por inadequação da via eleita, extinguindo-se o processo em relação ao Espólio de Orleir Messias Cameli e Raimundo Nonato de Queiroz e, à unanimidade, negar provimento ao Recurso do Estado do Acre, nos termos do Voto do Relator, que faz parte deste Acórdão. Relatório – O Estado do Acre propôs a Ação Civil Pública por ato de improbidade administrativa nº 0000005-52.1999.8.01.0002 contra Orleir Messias Cameli, Luiz Carlos Nalin Reis, Raimundo Nonato de Queiroz, Empresa de Consultoria e Construções Elétricas Ltda, Cláudio Gastão Kipper e Marco Antônio Brazauskas, buscando a nulidade do Contrato nº 008/98, cujo objeto era a construção de cem casas populares no Município de Cruzeiro do Sul e a condenação dos mesmos na previsão contida no artigo 12, incisos II e III, da Lei nº 8.429/92. No dispositivo da Sentença a Juíza de Direito da 1ª Vara Cível da Comarca de Cruzeiro do Sul, consignou: "Posto isso, julgo parcialmente procedente o pedido, para: 1 - declarar nulo o Contrato n. 008/98, tornando definitiva a antecipação da tutela; 2 - reconhecer a prática de ato de improbidade administrativa pelo réu ORLEIR MESSIAS CAMELI, previsto no art. 10, I, IX, XI, XII, e art. 11, I da Lei 8.429/92, condenando-o, solidariamente, conforme fundamentado, nos termos do art. 12, II, da Lei n. 8.429/92, nas penas de ressarcimento integral do dano no valor de R$ 221.056,26 (duzentos e vinte e um mil, cinquenta e seis reais e vinte e seis centavos), corrigido monetariamente a partir de 15 de outubro de 1998 (fl. 230), e com juros legais desde a citação, perda da função pública, se exercê-la, suspensão dos direitos políticos pelo período de 8 (oito) anos, multa civil no valor correspondente a duas vezes o valor do dano, proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de 5 (cinco) anos; 3 - reconhecer a prática de ato de improbidade administrativa pelo réu LUIZ CARLOS NALIN REIS, previsto no art. 10, I, VIII, IX, XI, XII, e art. 11, I, da Lei 8.429/92, condenando-o, solidariamente, conforme fundamentado, nos termos do art. 12, II, da Lei n. 8.429/92, nas penas de ressarcimento integral do dano no valor de R$ 221.056,26 (duzentos e vinte e um mil, cinquenta e seis reais e vinte e seis centavos), corrigido monetariamente a partir de 15 de outubro de 1998 (fl. 230), e com juros legais desde a citação, perda da função pública, se exercê-la, suspensão dos direitos políticos pelo período de 8 (oito) anos, multa civil no valor correspondente a duas vezes o valor do dano, proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de 5 (cinco) anos; 4 - reconhecer a prática de ato de improbidade administrativa pelo réu RAIMUNDO NONATO DE QUEIROZ, previsto no art. 10, I, IX, XI, XII, e art. 11, I, da Lei 8.429/92, condenando-o, solidariamente, conforme fundamentado, nos termos do art. 12, II, da Lei n. 8.429/92, nas penas de ressarcimento integral do dano no valor de R$221.056,26 (duzentos e vinte e um mil, cinqüenta e seis reais e vinte e seis centavos), corrigido monetariamente a partir de 15 de outubro de 1998 (fl. 230), e com juros legais desde a citação, perda da função pública, se exercê-la, suspensão dos direitos políticos pelo período de 6 (seis) anos, multa civil no valor correspondente a uma vez o valor do dano, proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de 5 (cinco) anos; 5 - reconhecer a prática de ato de improbidade administrativa pela ré CONSILUX EMPRESA DE CONSULTORIA E CONSTRUÇÕES ELÉTRICAS LTDA, previsto no art. 10, caput, da Lei 8.429/92, condenando-a, solidariamente, conforme fundamentado, nos termos do art. 12, II, da Lei n. 8.429/92, nas penas de ressarcimento integral do dano no valor de R$ 221.056,26 (duzentos e vinte e um mil, cinqüenta e seis reais e vinte e seis centavos), corrigido monetariamente a partir de 15 de outubro de 1998 (fl. 230), e com juros legais desde a citação, multa civil no valor correspondente a duas vezes o valor do dano, proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de 5 (cinco) anos; 6 - rejeitar o pedido com relação aos réus Cláudio Gastão Kipper e Marco Antônio Brazauskas, o pedido de declaração de nulidade do Contrato de Prestação de Serviço entre a SEPLAN e Cláudio Gastão Kipper, bem como o pedido de desconsideração da personalidade jurídica da empresa ré CONSILUX, DECRETANTO A RESOLUÇÃO DO MÉRITO, com espeque no art. 269, I, do CPC. Condeno os réus Orleir Messias Cameli, Luiz Carlos Nalin Reis, Raimundo Nonato de Queiroz e CONSILUX Empresa de Consultoria e Construções Elétricas Ltda ao pagamento das despesas processuais. Após o trânsito em julgado, expeçam-se os expedientes necessários para o cumprimento desta decisão". O Estado do Acre opôs Embargos de Declaração, alegando a existência de omissão na Sentença quanto aos honorários de advogado. A Juíza singular acolheu os Embargos, fixando os honorários de advogado em quinze por cento sobre o valor da condenação. Contra a Sentença foi interposto Recurso de Apelação por Orleir Messias Cameli, pretendendo em sede de preliminar, a extinção do processo por inadequação da via eleita. Afirma que: "à época dos fatos, o apelante exercia funções de agente político, sendo que os supostos atos de improbidade administrativa se sucederam no exercício do referido cargo, pelo que deve ser julgado à luz da Lei nº 1.079/50, por assim definirem o art. 74 c/c 4º-V, no rito definido na Constituição Estadual e nos arts. 75 a 79 daquela lei, não podendo assim serem enquadrados, simultaneamente, na penas da Lei nº 1.079/50, norma especial que tipifica os crimes de responsabilidade e regula o respectivo processo e na Lei nº 8.429/92 que define os atos de improbidade administrativa". Invoca em auxílio à sua argumentação, precedente do Supremo Tribunal Federal e da atual Primeira Câmara Cível deste Tribunal de Justiça, para dizer que os agentes políticos não se submetem à Lei nº 8.429/92, mas apenas ao contido na Lei nº 1.079/50, que trata do crime de responsabilidade. No mérito, sustenta que a conduta ímproba atribuída a si na Sentença, restringe-se à edição de um Decreto aprovando "o Plano de aplicação parcial do Fundo de Desenvolvimento Estadual", visando garantir verbas para a construção de casas populares, bem como a assinatura do contrato público que não tem conotação de improbidade, "mas do contrário, visou à edificação de moradias para suprir o déficit habitacional da cidade de Cruzeiro do Sul". Assenta que "destinar ao apelante a responsabilidade pela inexecução do contrato público, quando não detinha a responsabilidade específica pela fiscalização da empreitada, destinada a agente diverso, é impor obrigação a qual não faz jus, pois a simples edição de um decreto e a assinatura de um contrato público, lícitos e escorreitos em sua forma e conteúdo, não são fatos motivadores para o decreto condenatório". Assegura que não ficou demonstrado o nexo causal entre a sua conduta e prejuízo ao Erário, pois não existe improbidade onde não há dolo e má-fé do gestor público. Ao final, "pugna pela reforma da sentença, para o fim de que todos os pedidos da inicial sejam rejeitados, exonerando o apelante de qualquer penalidade prevista na Lei de Improbidade Administrativa". O apelante Raimundo Nonato de Queiroz suscita as preliminares de prescrição da pretensão punitiva e ilegitimidade ativa ad processum. Alude a "imensuração do dano causado ao erário público; da não identificação individualizada de quem causou ou de quem se locupletou e da desproporcionalidade da condenação". Afirma que não é responsável pelo descumprimento de cláusulas relativas à Lei nº 8.666/93, uma vez que apenas assinou um Decreto de suplementação orçamentária, não tendo sido comprovado nos autos conduta ímproba ou má-fé sua. Assegura que "não teve seu patrimônio alargado por conta da malversação de verbas públicas e o Estado do Acre nem sequer cogita esta hipótese. Com relação à segunda modalidade acima citada pode-se afirmar que o prejuízo do Estado do Acre, pelo que consta na própria sentença monocrática, se existiu, foi causado somente por atos da Seplan e da Consilux". Por fim, postula seja provido o Recurso para o fim de reconhecer a ausência da prática de ato de improbidade administrativa a si imputada. Por meio de emenda que fez ao Recurso, o apelante se insurge contra os honorários de advogado. Afirma que os Procuradores do Estado não têm direito aos honorários de sucumbência, porque já são remunerados para tal, além disso é pobre nos termos da lei, não possuindo recursos para arcar com tais gastos. Há Recurso do Estado do Acre, buscando a procedência da Ação Civil Pública em relação aos apelados Marco Antônio Brazauskas e Cláudio Gastão Kipper. Afirma que "os valores foram sendo liberados consoante as medições apresentadas pela Consilux, subscritas pelo Engenheiro Marcos Antônio Brazauskas e atestadas pelo fiscal da obra, Arquiteto Cláudio Gastão Kipper". Prossegue dizendo que "houve pagamento a maior do que o serviço que realmente foi executado, apesar de as medições terem sido aprovados pela fiscalização da obra, o que foi conditio sine qua non para a efetivação dos pagamentos, demonstrando o envolvimento direto de ambos os réus na prática de atos de improbidade, pois emitiram declarações falsas que permitiram a realização do pagamento". Ressalta que os atos de improbidade administrativa praticados pelos apelados, residem no fato de terem permitido o recebimento a maior de recursos e no recebimento de obras não realizadas, com falhas na estrutura, estabilidade e segurança. Enfim, defende o provimento do Recurso. Nas contrarrazões o Ministério Público se manifesta pela rejeição das preliminares. No mérito, postula o improvimento dos Recursos interpostos por Orleir Messias Cameli e Raimundo Nonato de Queiroz e o provimento da Apelação interposta pelo Estado do Acre. Por meio de curador especial, o apelado Marcos Antônio Brazauskas apresentou as contrarrazões rebatendo os argumentos expostos pelo apelante Estado do Acre e afirmando que não teve qualquer participação na suposta prática de ato de improbidade administrativa. Requer o improvimento do Recurso. Não há contrarrazões do apelado Cláudio Gastão Kipper. O curador especial do apelado Luiz Carlos Nalin Reis foi intimado pessoalmente à fl. 2262, para proceder a devolução dos autos, mas nada requereu. Há Certidão nos autos passada pela Secretaria da Unidade Jurisdicional de orígem, dando conta que a Sentença transitou em julgado para a Empresa de Consultoria e Construções Elétricas Ltda – Consilux e para Luiz Carlos Nalin dos Reis. O apelado Estado do Acre apresentou as contrarrazões rebatendo os argumentos apresentados pelos apelantes Orleir Messias Cameli e Raimundo Nonato de Queiroz. Pretende que os Recursos por eles interpostos tenham somente efeito devolutivo. Aponta violação ao artigo 520, inciso VII, do Código de Processo Civil. No mérito, postula o improvimento dos citados Recursos. Os autos foram distribuídos à Desembargadora Cezarinete Angelim, que determinou a remessa dos mesmos ao Ministério Público. O Procurador de Justiça Flávio Augusto Siqueira de Oliveira subscreveu Parecer opinando pela rejeição das preliminares e no mérito, pelo improvimento dos Recursos interpostos por Orleir Messias Cameli e Raimundo Nonato de Queiroz. Opinou pelo provimento do Recurso interposto pelo Estado do Acre. A Desembargadora Cezarinete Angelim se declarou impedida e os autos vieram a mim por redistribuição. Despachei nos autos no dia 23 de maio de 2013, determinando a suspensão do processo pelo prazo de sessenta dias, possibilitando a substituição do apelante falecido Orleir Messias Cameli, conforme previsão do artigo 43, do Código de Processo Civil. A diligência foi atendida pelo Estado do Acre, que trouxe aos autos cópia do Inventário nº 0701293-03.2013.8.01.0002. Nele consta Despacho da Juíza singular, nomeando inventariante Linker Barroso Cameli. É o Relatório que tive a honra de submeter à Douta Revisão, com as minhas homenagens. Voto - o Desembargador Samoel Evangelista (Relator) De início, reputo importante tecer rápida digressão fática para melhor entendimento da matéria. O Estado do Acre propôs Ação Civil Pública contra Orleir Messias Cameli, Luiz Carlos Nalin Reis, Raimundo Nonato de Queiroz, Empresa de Consultoria e Construções Elétricas Ltda - Consilux, Cláudio Gastão Kipper e Marco Antônio Brazauskas, alegando que o segundo, no exercício do Cargo de Secretário de Estado de Planejamento elaborou o Programa de Infra-Estrutura Urbana e Habitação Popular, para construção de cem casas populares no Município de Cruzeiro do Sul, do qual se extrai irregularidades, tais como: a) incompetência do órgão para elaboração do referido programa; b) falta de previsão orçamentária; c) ilicitude do Decreto nº 462-A; d) inobservância de formalidade necessária para a celebração do contrato; e) pagamento indevido na ordem de duzentos e vinte e um mil, vinte e seis reais e cinquenta e seis centavos. Ressalta que realizado o Certame licitatório objeto do Edital de Tomada de Preço nº 43/98, para execução do mencionado Programa, em regime de empreitada por preço global, pelo critério menor preço, sagrou-se vencedora a empresa Consilux, tendo esta celebrado o Contrato nº 08/98 com a Secretaria de Estado de Planejamento, no valor de um milhão, cento e vinte e dois mil, seiscentos e oito reais, dividido em quatro parcelas mensais e sucessivas de duzentos e oitenta mil, seiscentos e cinquenta e dois reais, para execução das obras e serviços no prazo de cento e vinte dias. Pontuou que o então Secretário de Estado de Planejamento, quando da celebração do mencionado Contrato, não observou a disposição contida no item 20.1, do Edital de Tomada de Preço, uma vez que não exigiu a prestação de caução e garantia da execução do contrato pela Empresa de Consultoria e Construções Elétricas Ltda - Consilux, ficando o Estado do Acre sem qualquer instrumento de garantia para eliminar os riscos de eventual descumprimento da obrigação pela contratada. Refere-se a dois Aditivos firmados com a contratada, sendo o objeto do primeiro o adiantamento de cinquenta mil reais, para fazer frente às despesas com mobilização de pessoal técnico, máquinas e equipamentos. O segundo alterou o item 4.1 do Contrato nº 08/98, cujo valor global passou para um milhão, duzentos e noventa e oito mil, cento e quarenta e três reais e vinte e sete centavos, sob a justificativa da necessidade da Empresa de Consultoria e Construções Elétricas Ltda - Consilux ter que executar os serviços de aterro compactado, baldrames e brocas de concreto armado, reboco de baldrames, beiral e oitão em lambri, fossas sanitárias e varandas. Sustenta que "além de não cumprir o cronograma previsto, a empresa Consilux efetuou as obras das casas de forma parcial, posto que as mesmas se encontram inacabadas. Com relação ao projeto de esgotamento sanitário, o mesmo foi substituído por um sistema de fossas, também, não concluídas, resultando em pagamento indevido àquela empresa, conforme relatório de levantamento atual efetuado (doc. 21)". Menciona a Cláusula sétima, item 7.1, do Contrato nº 8/98, para dizer que a fiscalização dos serviços, para fins de se efetuar os pagamentos, seria exercida por técnicos designados pela Secretaria de Planejamento. Diz que "ainda assim, o ex-Secretário Luiz Carlos Nalin Reis contratou o arquiteto Cláudio Gastão Kipper para os serviços de assessoramento técnico, acompanhamento e fiscalização daquelas obras, conforme Contrato de Prestação de Serviço nº 001/98, de 10 de junho de 1998 (doc. 12)". Alude à Declaração firmada pelo Engenheiro Civil Edmilson Ferraz da Cunha, noticiando que "o ex-Secretário de Estado de Planejamento e então Diretor-Presidente da COHAB/AC, Luiz Carlos Nalin Reis, lhe solicitou que atestasse uma planilha de medições das obras referentes aos Contratos n.s 006 e 008, relativas à execução da construção de casas em Rio Branco e Cruzeiro do Sul, o que, no entanto, não acatou, sob o argumento de que aquelas medições não teriam sido realizadas pelo mesmo, contudo, se prontificou para efetuar tais medições, no que não foi atendido (doc. 14)". No mesmo sentido foram as declarações por ele prestadas nos autos da Investigação Preliminar nº 215/99, instaurada pelo Ministério Público do Estado do Acre. Diz que existe um Termo de Acordo de Cooperação Técnica celebrado entre a Secretaria de Estado de Planejamento e Coordenação - Seplan e a Companhia de Habitação do Estado do Acre - Cohab, onde ficou estipulado competir a esta última a fiscalização de obras, promoção da inscrição e seleção de mutuários, comercialização dos imóveis e cobrança das prestações. Arremata que "a partir de janeiro de 1999, sob a atual Administração, a Secretaria de Estado de Planejamento e Coordenação – Seplan – e a Companhia de Habitação do Estado do Acre – Cohab/AC, realizaram levantamento detalhado da documentação e das instalações físicas existentes, cuja constatação concluiu a ocorrência de pagamento a maior e de obras executadas sem qualidade e fora das especificações e normas técnicas (processo administrativo nº 065-99) - (doc. 17)". Com exceção dos apelados Cláudio Gastão Kipper e Marcos Antônio Brazauskas, os demais foram condenados solidariamente ao ressarcimento integral do dano. Como já relatado, a Ação transitou em julgado para os réus Luiz Carlos Nalin Reis e Empresa de Consultoria e Construções Elétricas Ltda – Consilux. Assim, independentemente da solução dada aos Recursos ora em julgamento, o Erário não sofrerá nenhum prejuízo. Registro que tramitou na 1ª Vara da Fazenda Pública da Comarca de Rio Branco, a Ação Civil Pública nº 001.99.004152-3, na qual figuravam como partes as mesmas da Ação proposta na 1ª Vara Cível da Comarca de Cruzeiro do Sul e na qual foram interpostos os Recursos ora examinados. A diferença entre as duas Ações diz respeito somente ao pedido. Nesta se busca a nulidade do Contrato nº 008/98, cujo objeto foi a construção de cem casas populares no Município de Cruzeiro do Sul e naquela a nulidade do Contrato nº 006/98, que objetiva a construção de duas mil casas populares no Município de Rio Branco. Os dois Juízos deram idêntica solução para a demanda, absolvendo os réus Cláudio Gastão Kipper e Marcos Antônio Brazauskas e condenando os demais. No julgamento da Apelação nº 2006.000506-0, relatada pela Desembargadora Miracele Lopes, a Câmara Cível no dia 21 de julho de 2009, por maioria, deu provimento ao Recurso interposto por Orleir Messias Cameli, Raimundo Nonato de Queiroz e Luiz Carlos Nalin Réis, para "declarar extinto o Processo, sem resolução do mérito, quanto a eles a Ação Civil Pública por ato de improbidade", bem como, também por maioria, negou provimento ao Recurso da Empresa de Consultoria e Construções Elétricas Ltda – Consilux. Os autos estão no âmbito do Superior Tribunal de Justiça em sede de Recurso Especial. Examino os Recursos. 1. Espólio de Orleir Messias Cameli: O apelante suscita a preliminar de inadequação da via eleita - Ação Civil Pública -, requerendo a extinção do processo sem resolução de mérito. Argumenta que: "à época dos fatos, o apelante exercia funções de agente político, sendo que os supostos atos de improbidade administrativa se sucederam no exercício do referido cargo, pelo que deve ser julgado à luz da Lei nº 1.079/50, por assim definirem o art. 74 c/c 4º-V, no rito definido na Constituição Estadual e nos arts. 75 a 79 daquela lei, não podendo assim serem enquadrados, simultaneamente, na penas da Lei nº 1.079/50, norma especial que tipifica os crimes de responsabilidade e regula o respectivo processo e na Lei nº 8.429/92 que define os atos de improbidade administrativa". A respeito do tema abordado, retiro do Voto da Desembargadora Miracele Lopes, no Recurso de Apelação já citado, o seguinte lanço: "Entretanto, como o então Governador e os Secretários de Estado estão sendo demandados na qualidade de agentes políticos, que são regidos pela Lei n. 1.079 / 50, norma especial que tipifica os crimes de responsabilidade e regula o respectivo processo, não praticaram aquelas autoridades ato de improbidade administrativa, não se lhes aplicando, ipso facto, a Lei 8.429 / 92". Disse ainda a Relatora: "Em se tratando de crimes de responsabilidades praticados em conexão, tanto o então Governador, quanto os Secretários de Estado, deveriam ter sido julgados, na época em que ocupavam os respectivos cargos, pela ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA ESTADUAL, nos termos do art. 44, VII, da Constituição do Estado do Acre. Não se tratando, portanto, de ato de improbidade administrativa, mas de crime de responsabilidade, voto no sentido de ser extinta a demanda com relação ao ex-Governador ORLEIR MESSIAS CAMELI e aos ex-Secretários de Estado RAIMUNDO NONATO DE QUEIROZ e LUIS CARLOS NALIN REIS, agentes políticos apontados como réus na Ação Civil Pública". Esse assunto foi examinado pelo Supremo Tribunal Federal, nos autos da Reclamação nº 2.138-6, do Distrito Federal, relatada pelo Ministro Nelson Jobim, cujo Acórdão foi redigido pelo Ministro Gilmar Mendes. A Ementa do Acórdão é a seguinte: "Reclamação. Usurpação da competência do Supremo Tribunal Federal. Improbidade Administrativa. Crime de Responsabilidade. Agentes Políticos. i. Preliminares. Questões de Ordem. I.1. Questão de ordem quanto à manutenção da competência da Corte que justificou, no primeiro momento do julgamento, o conhecimento da reclamação, diante do fato novo da cessação do exercício da função pública pelo interessado. Ministro de Estado que posteriormente assumiu cargo de Chefe de Missão Diplomática Permanente do Brasil perante a Organização das Nações Unidas. Manutenção da prerrogativa de foro perante o STF, conforme o art. 102, I, "c", da Constituição. Questão de ordem rejeitada. I.2. Questão de ordem quanto ao sobrestamento do julgamento até que seja possível realizá-lo em conjunto com outros processos sobre o mesmo tema, com participação de todos os Ministros que integram o Tribunal, tendo em vista a possibilidade de que o pronunciamento da Corte não reflita o entendimento de seus atuais membros, dentre os quais quatro não têm direito a voto, pois seus antecessores já se pronunciaram. Julgamento que já se estende por cinco anos. Celeridade processual. Existência de outro processo com matéria idêntica na seqüência da pauta de julgamentos do dia. Inutilidade do sobrestamento. Questão de ordem rejeitada. II. MÉRITO. II.1.Improbidade administrativa. Crimes de responsabilidade. Os atos de improbidade administrativa são tipificados como crime de responsabilidade na Lei n° 1.079/1950, delito de caráter político-administrativo. II.2.Distinção entre os regimes de responsabilização político-administrativa. O sistema constitucional brasileiro distingue o regime de responsabilidade dos agentes políticos dos demais agentes públicos. A Constituição não admite a concorrência entre dois regimes de responsabilidade político-administrativa para os agentes políticos: o previsto no art. 37, § 4º (regulado pela Lei n° 8.429/1992) e o regime fixado no art. 102, I, "c", (disciplinado pela Lei n° 1.079/1950). Se a competência para processar e julgar a ação de improbidade (CF, art. 37, § 4º) pudesse abranger também atos praticados pelos agentes políticos, submetidos a regime de responsabilidade especial, ter-se-ia uma interpretação ab-rogante do disposto no art. 102, I, "c", da Constituição. II.3.Regime especial. Ministros de Estado. Os Ministros de Estado, por estarem regidos por normas especiais de responsabilidade (CF, art. 102, I, "c"; Lei n° 1.079/1950), não se submetem ao modelo de competência previsto no regime comum da Lei de Improbidade Administrativa (Lei n° 8.429/1992). II.4.Crimes de responsabilidade. Competência do Supremo Tribunal Federal. Compete exclusivamente ao Supremo Tribunal Federal processar e julgar os delitos político-administrativos, na hipótese do art. 102, I, "c", da Constituição. Somente o STF pode processar e julgar Ministro de Estado no caso de crime de responsabilidade e, assim, eventualmente, determinar a perda do cargo ou a suspensão de direitos políticos. II.5.Ação de improbidade administrativa. Ministro de Estado que teve decretada a suspensão de seus direitos políticos pelo prazo de 8 anos e a perda da função pública por sentença do Juízo da 14ª Vara da Justiça Federal - Seção Judiciária do Distrito Federal. Incompetência dos juízos de primeira instância para processar e julgar ação civil de improbidade administrativa ajuizada contra agente político que possui prerrogativa de foro perante o Supremo Tribunal Federal, por crime de responsabilidade, conforme o art. 102, I, "c", da Constituição. III. Reclamação julgada procedente". Desse modo, ao invés de ter sido proposta a Ação Civil Pública por ato de improbidade administrativa, os réus deveriam ter sido acionados pela prática de crime de responsabilidade, observando o procedimento previsto no artigo 74 e seguintes da Lei nº 1.079/50. Afasto a alegação de possibilidade de impunidade dos atos supostamente praticados pelos apelantes e descritos na Lei nº 8.429/92, como de improbidade administrativa, vez que também se encontram previstos na Lei nº 1.079/50 e nela tipificados como crime de responsabilidade. Dispõe o artigo 267, VI, do Código de Processo Civil, que o processo será extinto, sem resolução de mérito, se o Juiz verificar ausente qualquer das condições da ação. Dentre elas, o interesse de agir, que é identificado pelo binômio necessidade-adequação. Necessidade concreta do processo, adequação do provimento e do procedimento para a solução do litígio. Assim, vejo que a via eleita Ação Civil Pública - é inadequada, não se prestando para a apreciação dos atos praticados pelos apelantes, razão pela qual voto pelo acolhimento da preliminar de carência de ação, para declarar extinta a demanda com relação ao apelante, estendendo a Decisão a Raimundo Nonato de Queiroz. 2. Apelação do Estado do Acre. Insurge-se contra o item 6 do dispositivo da Sentença, que não acolheu a sua pretensão para condenar os apelados Marco Antônio Brazauskas e Cláudio Gastão Kipper. Consta da petição inicial que o apelado Marco Antônio Brazauskas fez medições falsas e Cláudio Gastão Kipper atestou tais medições, concorrendo ambos para a lesão ao Erário. Note-se que a contratação do apelado Cláudio Gastão Kipper para desempenhar o trabalho de fiscalização das obras e serviços ocorreu quando já estavam concretizadas as irregularidades descritas na petição inicial. Conquanto reconheça a existência de irregularidades na celebração do Contrato de prestação de serviço nº 001/98, juntado às fls. 190 a 193, constato que as provas produzidas nos autos não demonstram a existência de má-fé do apelado. Nesse contexto, eventual descumprimento total ou parcial da obrigação assumida pelo apelado Cláudio Gastão Kipper, no tocante ao seu objeto é questão a ser analisada nos limites da respectiva contratação. Chamo atenção para a Segunda cláusula que trata do objeto do referido contrato. Nela ficou assinalado que a finalidade "é a prestação, pelo contratado, de serviços de assessoramento técnico, acompanhamento e fiscalização das obras do Programa Estadual de Infra-Estrutura Urbana e Habitação Popular". Aqui não se lê que o pagamento será realizado com medições e atestos apresentados pelo apelado. Logo, não há como responsabilizá-lo, uma vez que sua conduta não se amolda a norma prevista no artigo 10, inciso I, da Lei nº 8.429/92. Observe-se que o próprio contrato prevê na Cláusula sétima as penalidades a serem aplicadas pela Administração ao contratado, no caso de descumprimento. Nesse ponto, não há reparo a ser feito como pretende o apelante. Quanto a pretensa condenação do apelado Marco Antônio Brazauskas, tenho que não merece acolhida. Em que pese o apelante afirmar que "os valores foram sendo liberados consoante as medições apresentadas pela Consilux, subscritas pelo Engenheiro Marcos Antônio Brazauskas", não é isso que se lê do Contrato nº 008/98. Nele está previsto que o pagamento será realizado em parcelas mensais e sucessivas. Ali não há qualquer condição do pagamento a realização de atestos e medições. Eis o que diz a Cláusula quarta – Do preço e do pagamento, do qual transcrevo: "4.2 – Do pagamento a) O pagamento da obra e serviços, objeto deste Contrato, será efetuado em moeda corrente, em 04 (quatro) parcelas mensais e sucessivas de R$ 280.652,00 (duzentos e oitenta mil, seiscentos e cinquenta e dois reais), vencendo-se a primeira parcela em 10 (dez) de setembro do corrente ano, e as demais, nos mesmos dias dos meses subsequentes, reajustadas em conformidade com a Cláusula Quinta. b) Os pagamentos serão efetuados no Departamento Financeiro da Contratante, em Rio Branco-Acre". (fl. 134) Afora isso, recordo que o empregador responde civilmente pelos atos ilícitos praticados por seus prepostos. É o que dispõe o artigo 932, inciso III, do Código Civil: "São também responsáveis pela reparação civil: - o empregador ou comitente, por seus empregados, serviçais e prepostos, no exercício do trabalho que lhes competir, ou em razão dele" E pela redação do artigo 933, vê-se que a responsabilidade é objetiva: "As pessoas indicadas nos incisos I a V do artigo antecedente, ainda que não haja culpa de sua parte, responderão pelos atos praticados pelos terceiros ali referidos". Nesse ponto, a Sentença deve permanecer inalterada. As razões trazidas pelo apelante não são suficientes para modificar a Decisão da Juíza singular. Frente a essas considerações, nego provimento ao Recurso do Estado do Acre. Requerimento de Cláudio Gastão Kipper. No dia 27 de fevereiro de 2013, o apelado compareceu na Corregedoria Geral da Justiça e assinou o Termo de Declaração nº 17/13, no qual postulou providências no sentido de que fosse deferido o levantamento da indisponibilidade de seus bens decretada nestes autos. Afirma que está com setenta e três anos de idade e que foi absolvido pelo Juízo de Primeiro Grau. Consta do Contrato de Prestação de Serviço nº 001/98, celebrado entre a Secretaria de Estado de Planejamento e o ora requerente, cujo objeto era "a prestação pelo contratado de serviços de assessoramento técnico, acompanhamento e fiscalização das obras do Programa Estadual de Infra-estrutura Urbana e Habitação Popular", o valor de sete mil reais. Submeto o requerimento a julgamento desta Câmara. Relembro que o apelado foi absolvido pela Juíza singular. Em que pese haver indeferimento do seu pedido, sob a fundamentação de não ter havido o trânsito em julgado da Sentença, conforme Decisão de fl. 2.300v, tenho que deve ser sopesado que o requerente conta com setenta e três anos de idade e que tal medida está lhe causando graves prejuízos de ordem financeira, uma vez que a Decisão de indisponibilidade atingiu todo o seu patrimônio, pois não houve individuação dos bens. Há inúmeros precedentes do Superior Tribunal de Justiça delimitando a indisponibilidade dos bens do agente aos danos praticados. Em outras palavras, o artigo 7º, da Lei nº 8.429/92, não determina o bloqueio ilimitado dos bens, como ocorreu na hipótese dos autos. Levo em consideração que o requerente celebrou um contrato com a Administração Pública no valor de sete mil reais e o gravame que lhe foi imposto é excessivo. Atento aos princípios da dignidade da pessoa humana, proporcionalidade e razoabilidade, defiro o pedido para revogar a Decisão de indisponibilidade dos bens do requerente.

Data do Julgamento : 02/09/2013
Data da Publicação : 20/09/2013
Classe/Assunto : Apelação / Improbidade Administrativa
Órgão Julgador : Segunda Câmara Cível
Relator(a) : Samoel Evangelista
Comarca : Cruzeiro do Sul
Comarca : Cruzeiro do Sul
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