TJAC 0008846-82.2012.8.01.0001
APELAÇÃO. DIREITO CIVIL. CONTRATOS DE MÚTUO. NULIDADE POR OFENSA À LEI DE USURA. DEVOLUÇÃO SIMPLES DO VALOR EMPRESTADO. DESCABIMENTO. APROVEITAMENTO DO NEGÓCIO JURÍDICO NULO OU ANULÁVEL. MULTA MORATÓRIA. BIS IN IDEM. INOCORRÊNCIA. INCIDÊNCIA DISTINTA, UMA VEZ SOBRE O MONTANTE DEVIDO EM RAZÃO DO PRIMEIRO EMPRÉSTIMO, OUTRA EM RELAÇÃO AO SEGUNDO, E APENAS SOBRE OS RESPECTIVOS VALORES. VALOR DA MULTA. 10%. ART. 1336, § 1º, DO CC. INADEQUAÇÃO. CDC. INAPLICABILIDADE. PERCENTUAL CONFORME À LEI DE USURA. JUROS REMUNERATÓRIOS E MORATÓRIOS. LIMITAÇÃO A 6% AO ANO. IMPOSSIBILIDADE. AUTORIZAÇÃO LEGAL PARA FIXAÇÃO DE JUROS "ABAIXO OU ACIMA DA TAXA LEGAL" (ART. 1.262 DO CC/1916). BEM DE FAMÍLIA DADO EM GARANTIA DA OBRIGAÇÃO. IMPENHORABILIDADE. ALEGAÇÃO NÃO FORMULADA NA ORIGEM. INOVAÇÃO RECURSAL. SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA. IMPOSSIBILIDADE. SEGUNDO CONTRATO. PROVA DE REPASSE DO VALOR INTEGRAL DA AVENÇA. REFORMA DA SENTENÇA PARA FIXAR O VALOR DO EMPRÉSTIMO.
1. "O Código Civil de 1916, tal como o atual Codex (2002), e o Decreto 22.626/33 consagram o princípio do aproveitamento do negócio jurídico nulo ou anulável" (STJ, REsp 1046453/RJ). Demonstrado que o mutuante jamais desejou conceder os empréstimos a título gratuito, nem era essa a expectativa dos mutuários, deve ser preservada a essência do negócio por meio do qual se realizou empréstimo financeiro remunerado, adequando-se tão somente suas características às determinações legais.
2. Não se há falar em bis in idem na aplicação da multa moratória, porquanto reconhecida a legitimidade do segundo contrato pela sentença, que apenas revisou seu valor. As multas de mora incidirão separadamente, uma vez sobre o montante devido em razão do primeiro empréstimo, outra em relação ao segundo, e apenas sobre os respectivos valores.
3. Quanto ao valor da multa, o art. 1336, § 1º, do Código Civil, invocado pela recorrente, trata de assunto alheio aos autos (atraso no pagamento de taxa condominial). Também o CDC não socorre a apelante, porquanto firmados entre particulares os contratos, inexistindo prova de classificação do mutuante no conceito de fornecedor instituído pela Lei nº 8.078/1990.
4. Ainda que assim não fosse, a hipótese de aplicação do CDC autoriza a incidência do percentual fixado na sentença, conforme entendimento do STJ, porquanto celebrados em 26.06.1995 e 26.06.1996 os contratos, antes da entrada em vigor da Lei nº 9.298/1996, que diminuiu de 10% (dez por cento) para 2% (dois por cento) a multa contratual. Ademais, o percentual fixado está de acordo com a previsão do Decreto 22.626/1933 (Lei de Usura).
5. Os arts. 1.062 e 1.063 do Código Civil de 1916, vigente à época de assunção das avenças, não limitavam a aplicação de juros moratórios e remuneratórios a 6% (seis por cento) ao ano, mas apenas previam os índices aplicáveis ante a ausência de estipulação contratual, permitindo o art. 1.262 a fixação de juros "abaixo ou acima da taxa legal". Estabelecidos os juros dentro dos parâmetros legais, correta sua manutenção pela sentença.
6. Os arts. 1.013, § 1º, e 1.014 do CPC impedem a análise da questão da impenhorabilidade do bem dado em garantia pelo Tribunal, pois não foi apresentada ao Juízo de primeira instância, nem há prova de que a autora deixou de fazê-lo oportunamente por motivo de força maior.
7. Demonstrando o extrato bancário que o mutuante repassou ao tomador do empréstimo a quantia integral descrita no contrato, há de ser ela fixada como parâmetro para o cálculo do montante por ele devido.
8. Recurso do réu provido.
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação n. 0008846-82.2012.8.01.0001, ACORDAM os Senhores Desembargadores do Segunda Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Acre, à unanimidade, negar provimento ao apelo interposto por Raimunda da Silva Farias, bem como dar provimento ao apelo interposto por Acyr Mendes Cunha, nos termos do voto do relator e das mídias digitais gravadas.
Ementa
APELAÇÃO. DIREITO CIVIL. CONTRATOS DE MÚTUO. NULIDADE POR OFENSA À LEI DE USURA. DEVOLUÇÃO SIMPLES DO VALOR EMPRESTADO. DESCABIMENTO. APROVEITAMENTO DO NEGÓCIO JURÍDICO NULO OU ANULÁVEL. MULTA MORATÓRIA. BIS IN IDEM. INOCORRÊNCIA. INCIDÊNCIA DISTINTA, UMA VEZ SOBRE O MONTANTE DEVIDO EM RAZÃO DO PRIMEIRO EMPRÉSTIMO, OUTRA EM RELAÇÃO AO SEGUNDO, E APENAS SOBRE OS RESPECTIVOS VALORES. VALOR DA MULTA. 10%. ART. 1336, § 1º, DO CC. INADEQUAÇÃO. CDC. INAPLICABILIDADE. PERCENTUAL CONFORME À LEI DE USURA. JUROS REMUNERATÓRIOS E MORATÓRIOS. LIMITAÇÃO A 6% AO ANO. IMPOSSIBILIDADE. AUTORIZAÇÃO LEGAL PARA FIXAÇÃO DE JUROS "ABAIXO OU ACIMA DA TAXA LEGAL" (ART. 1.262 DO CC/1916). BEM DE FAMÍLIA DADO EM GARANTIA DA OBRIGAÇÃO. IMPENHORABILIDADE. ALEGAÇÃO NÃO FORMULADA NA ORIGEM. INOVAÇÃO RECURSAL. SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA. IMPOSSIBILIDADE. SEGUNDO CONTRATO. PROVA DE REPASSE DO VALOR INTEGRAL DA AVENÇA. REFORMA DA SENTENÇA PARA FIXAR O VALOR DO EMPRÉSTIMO.
1. "O Código Civil de 1916, tal como o atual Codex (2002), e o Decreto 22.626/33 consagram o princípio do aproveitamento do negócio jurídico nulo ou anulável" (STJ, REsp 1046453/RJ). Demonstrado que o mutuante jamais desejou conceder os empréstimos a título gratuito, nem era essa a expectativa dos mutuários, deve ser preservada a essência do negócio por meio do qual se realizou empréstimo financeiro remunerado, adequando-se tão somente suas características às determinações legais.
2. Não se há falar em bis in idem na aplicação da multa moratória, porquanto reconhecida a legitimidade do segundo contrato pela sentença, que apenas revisou seu valor. As multas de mora incidirão separadamente, uma vez sobre o montante devido em razão do primeiro empréstimo, outra em relação ao segundo, e apenas sobre os respectivos valores.
3. Quanto ao valor da multa, o art. 1336, § 1º, do Código Civil, invocado pela recorrente, trata de assunto alheio aos autos (atraso no pagamento de taxa condominial). Também o CDC não socorre a apelante, porquanto firmados entre particulares os contratos, inexistindo prova de classificação do mutuante no conceito de fornecedor instituído pela Lei nº 8.078/1990.
4. Ainda que assim não fosse, a hipótese de aplicação do CDC autoriza a incidência do percentual fixado na sentença, conforme entendimento do STJ, porquanto celebrados em 26.06.1995 e 26.06.1996 os contratos, antes da entrada em vigor da Lei nº 9.298/1996, que diminuiu de 10% (dez por cento) para 2% (dois por cento) a multa contratual. Ademais, o percentual fixado está de acordo com a previsão do Decreto 22.626/1933 (Lei de Usura).
5. Os arts. 1.062 e 1.063 do Código Civil de 1916, vigente à época de assunção das avenças, não limitavam a aplicação de juros moratórios e remuneratórios a 6% (seis por cento) ao ano, mas apenas previam os índices aplicáveis ante a ausência de estipulação contratual, permitindo o art. 1.262 a fixação de juros "abaixo ou acima da taxa legal". Estabelecidos os juros dentro dos parâmetros legais, correta sua manutenção pela sentença.
6. Os arts. 1.013, § 1º, e 1.014 do CPC impedem a análise da questão da impenhorabilidade do bem dado em garantia pelo Tribunal, pois não foi apresentada ao Juízo de primeira instância, nem há prova de que a autora deixou de fazê-lo oportunamente por motivo de força maior.
7. Demonstrando o extrato bancário que o mutuante repassou ao tomador do empréstimo a quantia integral descrita no contrato, há de ser ela fixada como parâmetro para o cálculo do montante por ele devido.
8. Recurso do réu provido.
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação n. 0008846-82.2012.8.01.0001, ACORDAM os Senhores Desembargadores do Segunda Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Acre, à unanimidade, negar provimento ao apelo interposto por Raimunda da Silva Farias, bem como dar provimento ao apelo interposto por Acyr Mendes Cunha, nos termos do voto do relator e das mídias digitais gravadas.
Data do Julgamento
:
28/04/2017
Data da Publicação
:
08/05/2017
Classe/Assunto
:
Apelação / Defeito, nulidade ou anulação
Órgão Julgador
:
Segunda Câmara Cível
Relator(a)
:
Marcelo Coelho de Carvalho
Comarca
:
Rio Branco
Comarca
:
Rio Branco
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