TJAC 1000035-46.2017.8.01.0000
V.V. DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL. REVISÃO CRIMINAL. CRIME DE ESTUPRO DE VULNERÁVEL. EXASPERAÇÃO DA PENA-BASE. FUNDAMENTAÇÃO INVÁLIDA. REDIMENSIONAMENTO DA PENALIDADE. IMPOSSIBILIDADE DE REAVALIAÇÃO DAS CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS. MEIO DE IMPUGNAÇÃO EXCLUSIVO DA DEFESA. PROIBIÇÃO DA REFORMATIO IN PEJUS DIRETA. PRECEDENTES. REVISÃO CRIMINAL PROCEDENTE.
1. In casu, esta Revisão Criminal questiona a exasperação da pena-base e a correlata fixação do regime de cumprimento da pena restritiva de liberdade, imposta ao revisionando em razão da sua condenação pelo crime de estupro de vulnerável, fixada em 09 anos de reclusão, em regime fechado, à medida que restaram valoradas negativamente 05 circunstâncias judiciais (culpabilidade, conduta social, personalidade do agente, circunstâncias do ilícito e consequências do crime), previstas no art. 59, caput, do Código Penal.
2. Quanto à culpabilidade, a primeira instância a reputou elevada, porque uma etapa da vida da vítima foi perdida e nunca mais se recuperará (a infância), ao tempo que o réu tinha plena consciência dos seus atos. Nesse ponto, o equívoco de interpretação consiste no fato de que o magistrado exasperou a pena mediante o exame da culpabilidade em sentido estrito, que já foi avaliada para configurar a existência do próprio crime, instante no qual se examinou a reprovação social, a imputabilidade e consciência da ilicitude.
3. A respeito da conduta social e personalidade do agente, a Sentença impugnada estabelece que estas circunstâncias justificam a majoração da pena, à medida que o revisionando se aproveitou da oportunidade de estar a sós com a vítima para praticar conjunção carnal. Mais uma vez incorreu em equívoco. O exame da conduta social pressupõe a valoração de provas atinentes ao papel desempenhado pelo revisionando na comunidade, o que não tem qualquer correlação com o fato dele ter se aproveitado de uma circunstância (estar sozinho com a vítima) para engendrar o ato criminoso.
4. O mesmo raciocínio vale para a personalidade do agente, que não pode ser negativamente valorada ante a completa ausência de indicação de elementos concretos e idôneos nos autos (como, por exemplo, laudo psicológico) que evidenciassem especial perversidade do agente, ou mesmo menor sensibilidade ético-moral.
5. Acerca das circunstâncias do crime, foi dito que estas merecem ser valoradas contra o revisionando, porquanto o fato aconteceu em cidade do interior, sendo a vítima menor de 12 (doze) anos de idade. Sucede que a fundamentação adotada não foi a mais correta, haja vista que, nesse critério, é preciso abordar dados secundários do crime, como, por exemplo, o modo de execução do ilícito ou o grau de relacionamento com a vítima.
6. No tocante às consequências do crime, ao invés de ponderar que a vítima foi forçada a se relacionar com o revisionando (o que já constitui elemento do tipo), ao Juízo a quo cabia destacar a existência de algum dano que transcendeu ao resultado natural da conduta criminosa. Havendo estupro de vulnerável, a consequência lógica é a ofensa à liberdade sexual e a própria inocência do menor de 14 (quatorze) anos, vulnerável pela sua condição peculiar de tenra idade. Então, uma consequência que transborda o resultado natural do crime é o ato sexual praticado, por exemplo, com estrema violência, causando danos físicos e psicológicos mais intensos do que o habitual. Como nada disso sequer foi cogitado pelo julgador, a fundamentação está divorciada dos parâmetros legais dessa circunstância judicial, sendo inválida para fins de majoração da pena-base.
7. Dessume-se que o art. 626, caput, parágrafo único, do CPP, ao dispor sobre a possibilidade de haver "modificação da pena" quis dizer que o Tribunal pode fazer a exclusão (decote) da fundamentação considerada inidônea, mas não está autorizado a efetuar a substituição por outra motivação, causando prejuízo à defesa, em meio de impugnação da condenação de uso exclusivo do réu. Na hipótese de recurso exclusivo da defesa, a instância recursal não pode manter a pena-base acima do mínimo legal por fundamentos diversos dos utilizados pela instância inferior, sob pena de incorrer em reformatio in pejus.
8. A jurisprudência dos Tribunais Superiores é torrencial no sentido de que, em recurso exclusivo da defesa, não se pode recrudescer a pena-base com motivação diferente da utilizada pela instância inferior. Precedentes: (STF, HC 98307, Relator Min. Ricardo Lewandowski, Julgado em 24/03/2010; STJ HC 151.197/RJ, Relator Ministro Jorge Mussi, Julgado em 15/02/2011).
9. No julgamento desta Revisão Criminal o Tribunal não pode descartar a fundamentação da instância originária para, na sequência, reavaliar as mesmas circunstâncias judiciais. Essa substituição configura em nítido prejuízo à defesa, implicando na manutenção da pena-base acima do mínimo legalmente previsto, na análise de recurso colocado à disposição exclusivamente do condenado. Numa palavra, o Tribunal não pode extrapolar os limites da Revisão Criminal, sopesando circunstâncias não analisadas pelo Juízo de origem para fixar a pena. Raciocinar em sentido oposto equivale a admitir que o condenado seja penalizado em via processual que foi criada para tutelar os interesses jurídicos da defesa.
10. Revisão Criminal procedente.
V.v. DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL. REVISÃO CRIMINAL. ART. 621, I, DO CPP. DOSIMETRIA. PENA-BASE. CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS. FUNDAMENTAÇÃO INIDÔNEA. PEDIDOS DE REDIMENSIONAMENTO DA PENA-BASE E ALTERAÇÃO DO REGIME DE CUMPRIMENTO DA PENA. VALORAÇÃO EQUIVOCADA DAS CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAS DE CULPABILIDADE, CONDUTA SOCIAL, PERSONALIDADE DO AGENTE, CIRCUNSTÂNCIAS DO DELITO E CONSEQUÊNCIAS DO CRIME. CULPABILIDADE E CIRCUNSTÂNCIAS DO CRIME QUE DEVEM, PORÉM, SER MANTIDAS EM DESFAVOR DO RÉU, FACE AO CONJUNTO PROBATÓRIO DOS AUTOS. PENA-BASE FIXADA EM JUÍZO REVISÓRIO QUE SUPERA A DA SENTENÇA, QUE DEVE, PORTANTO, SER MANTIDA EM RAZÃO DO PRINCÍPIO DO NON REFORMATIO IN PEJUS. REVISÃO CRIMINAL PARCIALMENTE PROCEDENTE.
1. Trata-se de Revisão Criminal fundamentada no art. 621, I, do Código de Processo Penal, por meio da qual se requer o redimensionamento da pena-base e a alteração do regime de cumprimento da pena, sob a alegação de ausência de fundamentação idônea da sentença quanto às circunstâncias judiciais do art. 59, do Código Penal.
2. As circunstâncias judiciais possuem caráter residual, somente podendo ser consideradas como tais aquelas que não se encontrarem expressamente previstas no tipo penal, tais como qualificadoras, privilegiadoras, causas de aumento e de diminuição de pena, agravantes e atenuantes, sob pena ofensa ao princípio do non bis in idem.
3. Hipótese em que a juíza sentenciante valorou desfavoravelmente as circunstâncias judicias de culpabilidade, conduta social, personalidade do agente, circunstâncias do delito e consequências do crime sem a devida fundamentação.
4. Todavia, o conjunto probatório dos autos indica como desfavoráveis as circunstâncias judiciais atinentes à (i) culpabilidade, ante à ação premeditada do crime e à frieza anormal ao tipo para a satisfação, a qualquer custo, do desejo sexual do agente, e às (ii) circunstâncias do crime, vez que, para praticar o delito, o acusado se aproveitou da relação de confiança mantida com a vítima e do fato de estarem a sós.
5. O reconhecimento de 02 (duas) circunstâncias desfavoráveis ao Revisionando, conforme explanado, impõe o redimensionamento da pena-base para 10 (dez) anos e 08 (oito) meses, haja vista a pena mínima de 08 (oito) anos e a atribuição de 1/6 para cada circunstância judicial desfavorável. Em observância, contudo, ao princípio do non reformatio in pejus, deixa-se de proceder o aludido redimensionamento para manter a pena-base fixada pela sentença.
6. Revisão Criminal que se julga parcialmente procedente, apenas para fins de integração dos fundamentos assentandos na sentença quanto às circunstâncias judiciais valoradas negativamente ao réu, sem alteração, todavia, da pena e do regime de cumprimento ali fixados, tudo nos termos do presente voto.
Ementa
V.V. DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL. REVISÃO CRIMINAL. CRIME DE ESTUPRO DE VULNERÁVEL. EXASPERAÇÃO DA PENA-BASE. FUNDAMENTAÇÃO INVÁLIDA. REDIMENSIONAMENTO DA PENALIDADE. IMPOSSIBILIDADE DE REAVALIAÇÃO DAS CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS. MEIO DE IMPUGNAÇÃO EXCLUSIVO DA DEFESA. PROIBIÇÃO DA REFORMATIO IN PEJUS DIRETA. PRECEDENTES. REVISÃO CRIMINAL PROCEDENTE.
1. In casu, esta Revisão Criminal questiona a exasperação da pena-base e a correlata fixação do regime de cumprimento da pena restritiva de liberdade, imposta ao revisionando em razão da sua condenação pelo crime de estupro de vulnerável, fixada em 09 anos de reclusão, em regime fechado, à medida que restaram valoradas negativamente 05 circunstâncias judiciais (culpabilidade, conduta social, personalidade do agente, circunstâncias do ilícito e consequências do crime), previstas no art. 59, caput, do Código Penal.
2. Quanto à culpabilidade, a primeira instância a reputou elevada, porque uma etapa da vida da vítima foi perdida e nunca mais se recuperará (a infância), ao tempo que o réu tinha plena consciência dos seus atos. Nesse ponto, o equívoco de interpretação consiste no fato de que o magistrado exasperou a pena mediante o exame da culpabilidade em sentido estrito, que já foi avaliada para configurar a existência do próprio crime, instante no qual se examinou a reprovação social, a imputabilidade e consciência da ilicitude.
3. A respeito da conduta social e personalidade do agente, a Sentença impugnada estabelece que estas circunstâncias justificam a majoração da pena, à medida que o revisionando se aproveitou da oportunidade de estar a sós com a vítima para praticar conjunção carnal. Mais uma vez incorreu em equívoco. O exame da conduta social pressupõe a valoração de provas atinentes ao papel desempenhado pelo revisionando na comunidade, o que não tem qualquer correlação com o fato dele ter se aproveitado de uma circunstância (estar sozinho com a vítima) para engendrar o ato criminoso.
4. O mesmo raciocínio vale para a personalidade do agente, que não pode ser negativamente valorada ante a completa ausência de indicação de elementos concretos e idôneos nos autos (como, por exemplo, laudo psicológico) que evidenciassem especial perversidade do agente, ou mesmo menor sensibilidade ético-moral.
5. Acerca das circunstâncias do crime, foi dito que estas merecem ser valoradas contra o revisionando, porquanto o fato aconteceu em cidade do interior, sendo a vítima menor de 12 (doze) anos de idade. Sucede que a fundamentação adotada não foi a mais correta, haja vista que, nesse critério, é preciso abordar dados secundários do crime, como, por exemplo, o modo de execução do ilícito ou o grau de relacionamento com a vítima.
6. No tocante às consequências do crime, ao invés de ponderar que a vítima foi forçada a se relacionar com o revisionando (o que já constitui elemento do tipo), ao Juízo a quo cabia destacar a existência de algum dano que transcendeu ao resultado natural da conduta criminosa. Havendo estupro de vulnerável, a consequência lógica é a ofensa à liberdade sexual e a própria inocência do menor de 14 (quatorze) anos, vulnerável pela sua condição peculiar de tenra idade. Então, uma consequência que transborda o resultado natural do crime é o ato sexual praticado, por exemplo, com estrema violência, causando danos físicos e psicológicos mais intensos do que o habitual. Como nada disso sequer foi cogitado pelo julgador, a fundamentação está divorciada dos parâmetros legais dessa circunstância judicial, sendo inválida para fins de majoração da pena-base.
7. Dessume-se que o art. 626, caput, parágrafo único, do CPP, ao dispor sobre a possibilidade de haver "modificação da pena" quis dizer que o Tribunal pode fazer a exclusão (decote) da fundamentação considerada inidônea, mas não está autorizado a efetuar a substituição por outra motivação, causando prejuízo à defesa, em meio de impugnação da condenação de uso exclusivo do réu. Na hipótese de recurso exclusivo da defesa, a instância recursal não pode manter a pena-base acima do mínimo legal por fundamentos diversos dos utilizados pela instância inferior, sob pena de incorrer em reformatio in pejus.
8. A jurisprudência dos Tribunais Superiores é torrencial no sentido de que, em recurso exclusivo da defesa, não se pode recrudescer a pena-base com motivação diferente da utilizada pela instância inferior. Precedentes: (STF, HC 98307, Relator Min. Ricardo Lewandowski, Julgado em 24/03/2010; STJ HC 151.197/RJ, Relator Ministro Jorge Mussi, Julgado em 15/02/2011).
9. No julgamento desta Revisão Criminal o Tribunal não pode descartar a fundamentação da instância originária para, na sequência, reavaliar as mesmas circunstâncias judiciais. Essa substituição configura em nítido prejuízo à defesa, implicando na manutenção da pena-base acima do mínimo legalmente previsto, na análise de recurso colocado à disposição exclusivamente do condenado. Numa palavra, o Tribunal não pode extrapolar os limites da Revisão Criminal, sopesando circunstâncias não analisadas pelo Juízo de origem para fixar a pena. Raciocinar em sentido oposto equivale a admitir que o condenado seja penalizado em via processual que foi criada para tutelar os interesses jurídicos da defesa.
10. Revisão Criminal procedente.
V.v. DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL. REVISÃO CRIMINAL. ART. 621, I, DO CPP. DOSIMETRIA. PENA-BASE. CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS. FUNDAMENTAÇÃO INIDÔNEA. PEDIDOS DE REDIMENSIONAMENTO DA PENA-BASE E ALTERAÇÃO DO REGIME DE CUMPRIMENTO DA PENA. VALORAÇÃO EQUIVOCADA DAS CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAS DE CULPABILIDADE, CONDUTA SOCIAL, PERSONALIDADE DO AGENTE, CIRCUNSTÂNCIAS DO DELITO E CONSEQUÊNCIAS DO CRIME. CULPABILIDADE E CIRCUNSTÂNCIAS DO CRIME QUE DEVEM, PORÉM, SER MANTIDAS EM DESFAVOR DO RÉU, FACE AO CONJUNTO PROBATÓRIO DOS AUTOS. PENA-BASE FIXADA EM JUÍZO REVISÓRIO QUE SUPERA A DA SENTENÇA, QUE DEVE, PORTANTO, SER MANTIDA EM RAZÃO DO PRINCÍPIO DO NON REFORMATIO IN PEJUS. REVISÃO CRIMINAL PARCIALMENTE PROCEDENTE.
1. Trata-se de Revisão Criminal fundamentada no art. 621, I, do Código de Processo Penal, por meio da qual se requer o redimensionamento da pena-base e a alteração do regime de cumprimento da pena, sob a alegação de ausência de fundamentação idônea da sentença quanto às circunstâncias judiciais do art. 59, do Código Penal.
2. As circunstâncias judiciais possuem caráter residual, somente podendo ser consideradas como tais aquelas que não se encontrarem expressamente previstas no tipo penal, tais como qualificadoras, privilegiadoras, causas de aumento e de diminuição de pena, agravantes e atenuantes, sob pena ofensa ao princípio do non bis in idem.
3. Hipótese em que a juíza sentenciante valorou desfavoravelmente as circunstâncias judicias de culpabilidade, conduta social, personalidade do agente, circunstâncias do delito e consequências do crime sem a devida fundamentação.
4. Todavia, o conjunto probatório dos autos indica como desfavoráveis as circunstâncias judiciais atinentes à (i) culpabilidade, ante à ação premeditada do crime e à frieza anormal ao tipo para a satisfação, a qualquer custo, do desejo sexual do agente, e às (ii) circunstâncias do crime, vez que, para praticar o delito, o acusado se aproveitou da relação de confiança mantida com a vítima e do fato de estarem a sós.
5. O reconhecimento de 02 (duas) circunstâncias desfavoráveis ao Revisionando, conforme explanado, impõe o redimensionamento da pena-base para 10 (dez) anos e 08 (oito) meses, haja vista a pena mínima de 08 (oito) anos e a atribuição de 1/6 para cada circunstância judicial desfavorável. Em observância, contudo, ao princípio do non reformatio in pejus, deixa-se de proceder o aludido redimensionamento para manter a pena-base fixada pela sentença.
6. Revisão Criminal que se julga parcialmente procedente, apenas para fins de integração dos fundamentos assentandos na sentença quanto às circunstâncias judiciais valoradas negativamente ao réu, sem alteração, todavia, da pena e do regime de cumprimento ali fixados, tudo nos termos do presente voto.
Data do Julgamento
:
11/04/2018
Data da Publicação
:
04/05/2018
Classe/Assunto
:
Revisão Criminal / Estupro de vulnerável
Órgão Julgador
:
Tribunal Pleno Jurisdicional
Relator(a)
:
Cezarinete Angelim
Comarca
:
Plácido de Castro
Comarca
:
Plácido de Castro
Mostrar discussão