TJAL 0023533-42.2009.8.02.0001
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS. RECONHECIMENTO DA PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO DA PARTE AUTORA. PRINCÍPIO DA ACTIO NATA. NARRATIVA QUE AFIRMA TER O FATO OCORRIDO EM 1993. APLICAÇÃO DA REGRA DE TRANSIÇÃO CONSTANTE NO ARTIGO 2.028 DO CC/02. NÃO DECURSO DE MAIS DA METADE DO PRAZO PREVISTO NA LEGISLAÇÃO ANTIGA. INCIDÊNCIA DO PRAZO DE 10 ANOS PREVISTO NO ARTIGO 205 DO CC/02. CONTAGEM DO PRAZO DECENAL A PARTIR DA ENTRADA EM VIGOR DO CC/02. AFASTAMENTO DA PRESCRIÇÃO. CARACTERIZAÇÃO DO DANO MORAL. CONDUTA ILÍCITA QUE ULTRAPASSA O MERO DISSABOR. NECESSIDADE DE ARBITRAMENTO DE INDENIZAÇÃO. FIXAÇÃO DE REPARAÇÃO PELOS DANOS MATERIAIS, EQUIVALENTE AO MONTANTE DO VALOR PAGO. DESCABIMENTO DA FIXAÇÃO DE LUCROS CESSANTES. NÃO COMPROVAÇÃO DA DESTINAÇÃO LOCATÍCIA DO BEM.
01 Nunca é demais a lembrança de que a pretensão nascida com o inadimplemento da obrigação deve ser exercida em ato contínuo ou, então, dentro do prazo que a Lei fixa para tanto. Isso nada mais é senão que decorrência do princípio da actio nata.
02 Em se tratando de direito intertemporal, deve-se aplicar o disposto no artigo 2.028 do CC/02, cuja redação afirma que "serão os da lei anterior os prazos, quando reduzidos por este Código, e se, na data de sua entrada em vigor, já houver transcorrido mais da metade do tempo estabelecido na lei revogada".
03 Na sua petição inicial onde a demanda é delimitada em sua extensão , a parte autora requereu o ressarcimento pelos danos decorrentes da mora na entrega do bem, na esfera material danos emergentes e lucros cessantes e na órbita imaterial (danos morais), remetendo, sempre, ao período no qual o imóvel deveria ter sido entregue, marco este apontado como o início da sua pretensão.
04 Daí se observa que, a despeito da apelante, em suas razões recursais, ter apontado como fato ensejador de sua pretensão o cancelamento da incorporação, que somente ocorreu em 15 de fevereiro de 2007, a verdade é que toda a sua narrativa, construída desde a petição inicial, aponta como momento caracterizador do ato ilícito o mês de julho de 1993, data prevista para a conclusão e entrega da unidade imobiliária.
05 Como já afirmado anteriormente, o mencionado dispositivo legal é taxativo ao afirmar que, para a aplicação do prazo previsto na legislação anterior, devem estar presentes, de forma conjunta, os seguintes requisitos: o prazo ter sido diminuído no novo diploma e, até a entrada em vigor deste último, ter decorrido mais da metade do prazo estipulado anteriormente, o que equivaleria, no caso concreto, ao decurso de mais de 10 (dez) anos.
06 No caso concreto, entre o período da efetivação da mora julho de 1993 (data da entrega do imóvel), fato este que fez surgir para a apelante a pretensão de ser ressarcida dos danos sofridos e a data de entrada em vigor do Código Civil de 2002 (11/01/2003), houve o decurso de menos da metade do prazo de 20 (vinte) anos, situação que impõe a aplicação do prazo previsto no CC/02, que afirma ser de 10 (dez) anos o prazo prescricional para as chamadas ações pessoais, na forma do caput do artigo 205.
07 Uma vez assentada a aplicabilidade do prazo prescricional constante no CC/02, deve-se ter como termo inicial da contagem do prazo decenal a data de entrada em vigor do mencionado diploma, a saber, 11 de janeiro de 2003.
08 Dentro desse contexto, tendo a presente demanda sido proposta em 20 de agosto de 2009, forçoso é o reconhecimento que a busca da tutela jurisdicional se deu em tempo oportuno, pois levando em consideração a data de entrada em vigor do CC/02, ainda não havia transcorrido o prazo de 10 (dez) anos, o que afasta a ocorrência da prescrição.
09 Em se tratando de contrato bilateral, com reciprocidade de direitos e deveres, o não cumprimento da obrigação de uma das partes gera para a outra a pretensão de ser ressarcida, de modo a recompor a parte lesada pelos danos sofridos e, no caso em comento, correspondente àquilo que ela efetivamente dispendeu para a aquisição do imóvel, evitando, assim, a figura do enriquecimento ilícito, razão pela qual deve a parte ré arcar com a devolução, devidamente corrigida, daquilo que a autora investiu.
10 A despeito de a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça adotar entendimento de haver uma presunção de caracterização de lucros cessantes na hipótese de atraso/não entrega do imóvel, entende-se que tal conclusão não pode ser absoluta, sobretudo quando a destinação do bem não é a de moradia do próprio adquirente, como aparenta ser o caso dos autos, sob pena de se condenar a parte adversa a reparar danos hipotéticos e convenientes, o que afasta a condenação ao pagamento dessa verba.
11 Em que pese os apelados defenderem a inocorrência dos danos de caráter extrapatrimonial, a verdade é que o contexto aqui veiculado aponta para a sua caracterização, pois o ato ilícito não se resumiu ao mero atraso na entrega do bem, mas à própria ausência da conclusão da obra, culminando, mais tarde, com o desfazimento da incorporação e a posterior alienação do esqueleto do imóvel para uma rede de hotéis.
12 Ou seja, houve uma legítima e manifesta frustração na expectativa gerada com a aquisição do imóvel, o que suplanta e muito a tese de mero aborrecimento ou de um infortúnio qualquer, havendo nítida violação ao direito da personalidade da parte autora, pois um direito de envergadura constitucional moradia , restou vulnerado face à conduta da parte ré.
RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. DECISÃO UNÂNIME.
Ementa
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS. RECONHECIMENTO DA PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO DA PARTE AUTORA. PRINCÍPIO DA ACTIO NATA. NARRATIVA QUE AFIRMA TER O FATO OCORRIDO EM 1993. APLICAÇÃO DA REGRA DE TRANSIÇÃO CONSTANTE NO ARTIGO 2.028 DO CC/02. NÃO DECURSO DE MAIS DA METADE DO PRAZO PREVISTO NA LEGISLAÇÃO ANTIGA. INCIDÊNCIA DO PRAZO DE 10 ANOS PREVISTO NO ARTIGO 205 DO CC/02. CONTAGEM DO PRAZO DECENAL A PARTIR DA ENTRADA EM VIGOR DO CC/02. AFASTAMENTO DA PRESCRIÇÃO. CARACTERIZAÇÃO DO DANO MORAL. CONDUTA ILÍCITA QUE ULTRAPASSA O MERO DISSABOR. NECESSIDADE DE ARBITRAMENTO DE INDENIZAÇÃO. FIXAÇÃO DE REPARAÇÃO PELOS DANOS MATERIAIS, EQUIVALENTE AO MONTANTE DO VALOR PAGO. DESCABIMENTO DA FIXAÇÃO DE LUCROS CESSANTES. NÃO COMPROVAÇÃO DA DESTINAÇÃO LOCATÍCIA DO BEM.
01 Nunca é demais a lembrança de que a pretensão nascida com o inadimplemento da obrigação deve ser exercida em ato contínuo ou, então, dentro do prazo que a Lei fixa para tanto. Isso nada mais é senão que decorrência do princípio da actio nata.
02 Em se tratando de direito intertemporal, deve-se aplicar o disposto no artigo 2.028 do CC/02, cuja redação afirma que "serão os da lei anterior os prazos, quando reduzidos por este Código, e se, na data de sua entrada em vigor, já houver transcorrido mais da metade do tempo estabelecido na lei revogada".
03 Na sua petição inicial onde a demanda é delimitada em sua extensão , a parte autora requereu o ressarcimento pelos danos decorrentes da mora na entrega do bem, na esfera material danos emergentes e lucros cessantes e na órbita imaterial (danos morais), remetendo, sempre, ao período no qual o imóvel deveria ter sido entregue, marco este apontado como o início da sua pretensão.
04 Daí se observa que, a despeito da apelante, em suas razões recursais, ter apontado como fato ensejador de sua pretensão o cancelamento da incorporação, que somente ocorreu em 15 de fevereiro de 2007, a verdade é que toda a sua narrativa, construída desde a petição inicial, aponta como momento caracterizador do ato ilícito o mês de julho de 1993, data prevista para a conclusão e entrega da unidade imobiliária.
05 Como já afirmado anteriormente, o mencionado dispositivo legal é taxativo ao afirmar que, para a aplicação do prazo previsto na legislação anterior, devem estar presentes, de forma conjunta, os seguintes requisitos: o prazo ter sido diminuído no novo diploma e, até a entrada em vigor deste último, ter decorrido mais da metade do prazo estipulado anteriormente, o que equivaleria, no caso concreto, ao decurso de mais de 10 (dez) anos.
06 No caso concreto, entre o período da efetivação da mora julho de 1993 (data da entrega do imóvel), fato este que fez surgir para a apelante a pretensão de ser ressarcida dos danos sofridos e a data de entrada em vigor do Código Civil de 2002 (11/01/2003), houve o decurso de menos da metade do prazo de 20 (vinte) anos, situação que impõe a aplicação do prazo previsto no CC/02, que afirma ser de 10 (dez) anos o prazo prescricional para as chamadas ações pessoais, na forma do caput do artigo 205.
07 Uma vez assentada a aplicabilidade do prazo prescricional constante no CC/02, deve-se ter como termo inicial da contagem do prazo decenal a data de entrada em vigor do mencionado diploma, a saber, 11 de janeiro de 2003.
08 Dentro desse contexto, tendo a presente demanda sido proposta em 20 de agosto de 2009, forçoso é o reconhecimento que a busca da tutela jurisdicional se deu em tempo oportuno, pois levando em consideração a data de entrada em vigor do CC/02, ainda não havia transcorrido o prazo de 10 (dez) anos, o que afasta a ocorrência da prescrição.
09 Em se tratando de contrato bilateral, com reciprocidade de direitos e deveres, o não cumprimento da obrigação de uma das partes gera para a outra a pretensão de ser ressarcida, de modo a recompor a parte lesada pelos danos sofridos e, no caso em comento, correspondente àquilo que ela efetivamente dispendeu para a aquisição do imóvel, evitando, assim, a figura do enriquecimento ilícito, razão pela qual deve a parte ré arcar com a devolução, devidamente corrigida, daquilo que a autora investiu.
10 A despeito de a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça adotar entendimento de haver uma presunção de caracterização de lucros cessantes na hipótese de atraso/não entrega do imóvel, entende-se que tal conclusão não pode ser absoluta, sobretudo quando a destinação do bem não é a de moradia do próprio adquirente, como aparenta ser o caso dos autos, sob pena de se condenar a parte adversa a reparar danos hipotéticos e convenientes, o que afasta a condenação ao pagamento dessa verba.
11 Em que pese os apelados defenderem a inocorrência dos danos de caráter extrapatrimonial, a verdade é que o contexto aqui veiculado aponta para a sua caracterização, pois o ato ilícito não se resumiu ao mero atraso na entrega do bem, mas à própria ausência da conclusão da obra, culminando, mais tarde, com o desfazimento da incorporação e a posterior alienação do esqueleto do imóvel para uma rede de hotéis.
12 Ou seja, houve uma legítima e manifesta frustração na expectativa gerada com a aquisição do imóvel, o que suplanta e muito a tese de mero aborrecimento ou de um infortúnio qualquer, havendo nítida violação ao direito da personalidade da parte autora, pois um direito de envergadura constitucional moradia , restou vulnerado face à conduta da parte ré.
RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. DECISÃO UNÂNIME.
Data do Julgamento
:
20/07/2016
Data da Publicação
:
01/08/2016
Classe/Assunto
:
Apelação / Perdas e Danos
Órgão Julgador
:
1ª Câmara Cível
Relator(a)
:
Desembargador Fernando Tourinho de Omena Souza
Comarca
:
Maceió
Comarca
:
Maceió
Mostrar discussão