TJAM 0050110-13.2003.8.04.0001
APELAÇÃO CÍVEL. VEICULO ZERO QUILÔMETRO. DIVERSOS DEFEITOS EM MENOS DE UM ANO DE USO. ULTRAPASSADO O PRAZO DE 30 (TRINTA) DIAS PARA SANÁ-LOS. LEI 8.078/90, ART. 18, § 1.º. RESCISÃO CONTRATUAL E DEVOLUÇÃO DA QUANTIA PAGA. INVIABILIDADE. CONTRATOS COLIGADOS. COMPRA E VENDA E FINANCIAMENTO. O JUÍZO A QUO EXCLUIU DA LIDE A INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. A APELADA NÃO SE INSURGIU. PERDA DO VEÍCULO EM CONSEQUÊNCIA DE AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO. POSTERIOR ALIENAÇÃO A TERCEIRO. VENIRE CONTRA FACTUM PROPRIUM. DANO MORAL CARACTERIZADO. INDENIZAÇÃO FIXADA EM PATAMAR RAZOÁVEL E PROPORCIONAL. JUROS DE MORA SOBRE O DANO MORAL. TERMO INICIAL. CITAÇÃO. JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA. QUESTÃO DE ORDEM PÚBLICA. DEVE SER APLICADA A TAXA SELIC. CCB/2002, ART. 406.
i. Nos casos de veículo adquirido através de financiamento bancário, celebram-se dois contratos: o contrato principal de compra e venda; e o contrato acessório de financiamento. Trata-se de contratos coligados, vinculados indissociavelmente, razão por que a rescisão do contrato principal de compra e venda implica, necessariamente, a rescisão do contrato acessório de financiamento.
ii. Alegando que o veículo zero quilômetro por si adquirido, em 16.09.2002, havia apresentado sucessivos defeitos, menos de um ano depois da compra, a apelada, invocando o art. 18, § 1.º, II, da Lei 8.078/90, requereu a devolução da quantia paga. No entanto, a ação fora proposta apenas contra a fornecedora do veículo, muito embora a própria apelada afirmasse ter sido celebrado um contrato de financiamento para viabilizar a compra. Obviamente, o desfazimento do contrato principal (compra e venda), implicando, também, o desfazimento do contrato acessório (financiamento), tornava indispensável a citação da instituição financeira.
iii. A apelada, por meio de aditamento, veio a requerer a citação da instituição financeira. Ocorre que o juízo a quo, por decisão proferida em audiência de conciliação, excluiu-a da lide, declarando a sua ilegitimidade. Ao fazê-lo, impediu a rescisão do contrato acessório de financiamento e inviabilizou a devolução das partes ao estado anterior, decorrência lógica inevitável da rescisão dos contratos coligados. A apelada não se insurgiu contra a exclusão da instituição financeira.
iv. Além disso, a perda do veículo, posteriormente alienado a terceiro, consequência de uma ação de busca e apreensão, deve ser compreendida como fato impeditivo da rescisão do contrato de compra e venda, porquanto restou inviabilizada, por culpa da apelada, a devolução das partes ao estado anterior.
v. Tolerando que o veículo fosse retomado pela instituição financeira e alienado a terceiro, a apelada aceitou o cumprimento/execução do contrato de financiamento, adotando conduta incompatível com a intenção de rescindir os contratos coligados. Portanto, o interesse de agir fora fulminado pela necessária aplicação superveniente da barreira fixada pelo venire contra factum proprium.
vi. O veículo fora levado à fornecedora para fins de reparos em 11 (onze) ocasiões, antes de completar 1 (um) ano de uso. O primeiro defeito surgiu em 25.10.2002, pouco mais de 1 (um) mês após a compra do veículo, e dizia respeito às canaletas dos vidros das portas, problema que somente foi solucionado em 06.12.2002, tendo sido extrapolado o prazo de 30 (trinta) dias previsto pelo art. 18, § 1.º, da Lei 8.078/90.
vii. Os tribunais têm reconhecido a caracterização de dano moral nos casos em que o adquirente de automóvel zero quilômetro necessita retornar, diversas vezes, à concessionária para consertar defeitos, não se podendo falar em mero aborrecimento.
viii. A indenização por dano moral, fixada pela r. sentença, no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais), não se revela desproporcional, nem exagerada, estando em consonância com a jurisprudência do c. STJ.
ix. Os juros de mora, quando se tratar de responsabilidade contratual, como sói ser o caso, incidem a partir da citação, impondo-se afastar a data do evento danoso (Súmula 54/STJ) fixada pela r. sentença.
x. Determinou a r. sentença que a correção monetária sobre o dano moral deveria incidir a partir da data em que proferida, ou seja, a partir do momento em que, ocorrendo o seu arbitramento, tornou-se líquido o seu valor. Tal raciocínio reflete a jurisprudência do c. STJ.
xi. Consolidou-se a jurisprudência do c. STJ no sentido de considerar como de ordem pública as questões concernentes a juros de mora e correção monetária, cuja alteração, de ofício, não importa em reformatio in pejus, nem em julgamento ultra ou extra petita.
xii. A r. sentença determinou que os juros de mora seriam de 1% (um por cento) ao mês, e que a correção monetária deveria observar o INPC. Divergiu da jurisprudência do c. STJ, segundo a qual, ex vi do art. 406, do CCB/2002, deve ser aplicada a taxa SELIC, a qual inclui juros de mora e correção monetária.
xiii. Apelações conhecidas e parcialmente providas.
Ementa
APELAÇÃO CÍVEL. VEICULO ZERO QUILÔMETRO. DIVERSOS DEFEITOS EM MENOS DE UM ANO DE USO. ULTRAPASSADO O PRAZO DE 30 (TRINTA) DIAS PARA SANÁ-LOS. LEI 8.078/90, ART. 18, § 1.º. RESCISÃO CONTRATUAL E DEVOLUÇÃO DA QUANTIA PAGA. INVIABILIDADE. CONTRATOS COLIGADOS. COMPRA E VENDA E FINANCIAMENTO. O JUÍZO A QUO EXCLUIU DA LIDE A INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. A APELADA NÃO SE INSURGIU. PERDA DO VEÍCULO EM CONSEQUÊNCIA DE AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO. POSTERIOR ALIENAÇÃO A TERCEIRO. VENIRE CONTRA FACTUM PROPRIUM. DANO MORAL CARACTERIZADO. INDENIZAÇÃO FIXADA EM PATAMAR RAZOÁVEL E PROPORCIONAL. JUROS DE MORA SOBRE O DANO MORAL. TERMO INICIAL. CITAÇÃO. JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA. QUESTÃO DE ORDEM PÚBLICA. DEVE SER APLICADA A TAXA SELIC. CCB/2002, ART. 406.
i. Nos casos de veículo adquirido através de financiamento bancário, celebram-se dois contratos: o contrato principal de compra e venda; e o contrato acessório de financiamento. Trata-se de contratos coligados, vinculados indissociavelmente, razão por que a rescisão do contrato principal de compra e venda implica, necessariamente, a rescisão do contrato acessório de financiamento.
ii. Alegando que o veículo zero quilômetro por si adquirido, em 16.09.2002, havia apresentado sucessivos defeitos, menos de um ano depois da compra, a apelada, invocando o art. 18, § 1.º, II, da Lei 8.078/90, requereu a devolução da quantia paga. No entanto, a ação fora proposta apenas contra a fornecedora do veículo, muito embora a própria apelada afirmasse ter sido celebrado um contrato de financiamento para viabilizar a compra. Obviamente, o desfazimento do contrato principal (compra e venda), implicando, também, o desfazimento do contrato acessório (financiamento), tornava indispensável a citação da instituição financeira.
iii. A apelada, por meio de aditamento, veio a requerer a citação da instituição financeira. Ocorre que o juízo a quo, por decisão proferida em audiência de conciliação, excluiu-a da lide, declarando a sua ilegitimidade. Ao fazê-lo, impediu a rescisão do contrato acessório de financiamento e inviabilizou a devolução das partes ao estado anterior, decorrência lógica inevitável da rescisão dos contratos coligados. A apelada não se insurgiu contra a exclusão da instituição financeira.
iv. Além disso, a perda do veículo, posteriormente alienado a terceiro, consequência de uma ação de busca e apreensão, deve ser compreendida como fato impeditivo da rescisão do contrato de compra e venda, porquanto restou inviabilizada, por culpa da apelada, a devolução das partes ao estado anterior.
v. Tolerando que o veículo fosse retomado pela instituição financeira e alienado a terceiro, a apelada aceitou o cumprimento/execução do contrato de financiamento, adotando conduta incompatível com a intenção de rescindir os contratos coligados. Portanto, o interesse de agir fora fulminado pela necessária aplicação superveniente da barreira fixada pelo venire contra factum proprium.
vi. O veículo fora levado à fornecedora para fins de reparos em 11 (onze) ocasiões, antes de completar 1 (um) ano de uso. O primeiro defeito surgiu em 25.10.2002, pouco mais de 1 (um) mês após a compra do veículo, e dizia respeito às canaletas dos vidros das portas, problema que somente foi solucionado em 06.12.2002, tendo sido extrapolado o prazo de 30 (trinta) dias previsto pelo art. 18, § 1.º, da Lei 8.078/90.
vii. Os tribunais têm reconhecido a caracterização de dano moral nos casos em que o adquirente de automóvel zero quilômetro necessita retornar, diversas vezes, à concessionária para consertar defeitos, não se podendo falar em mero aborrecimento.
viii. A indenização por dano moral, fixada pela r. sentença, no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais), não se revela desproporcional, nem exagerada, estando em consonância com a jurisprudência do c. STJ.
ix. Os juros de mora, quando se tratar de responsabilidade contratual, como sói ser o caso, incidem a partir da citação, impondo-se afastar a data do evento danoso (Súmula 54/STJ) fixada pela r. sentença.
x. Determinou a r. sentença que a correção monetária sobre o dano moral deveria incidir a partir da data em que proferida, ou seja, a partir do momento em que, ocorrendo o seu arbitramento, tornou-se líquido o seu valor. Tal raciocínio reflete a jurisprudência do c. STJ.
xi. Consolidou-se a jurisprudência do c. STJ no sentido de considerar como de ordem pública as questões concernentes a juros de mora e correção monetária, cuja alteração, de ofício, não importa em reformatio in pejus, nem em julgamento ultra ou extra petita.
xii. A r. sentença determinou que os juros de mora seriam de 1% (um por cento) ao mês, e que a correção monetária deveria observar o INPC. Divergiu da jurisprudência do c. STJ, segundo a qual, ex vi do art. 406, do CCB/2002, deve ser aplicada a taxa SELIC, a qual inclui juros de mora e correção monetária.
xiii. Apelações conhecidas e parcialmente providas.
Data do Julgamento
:
02/10/2016
Data da Publicação
:
04/10/2016
Classe/Assunto
:
Apelação / Obrigações
Órgão Julgador
:
Segunda Câmara Cível
Relator(a)
:
Ari Jorge Moutinho da Costa
Comarca
:
Manaus
Comarca
:
Manaus
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