TJAM 0613117-96.2015.8.04.0001
E M E N T A
APELAÇÕES CÍVEIS. CIVIL E PROCESSO CIVIL. 1) JUÍZO DE ADMISSIBILIDADE. 1.1) PRIMEIRO RECURSO. REGRA DA DIALETICIDADE. INOBSERVÂNCIA TOTAL. IRRESIGNAÇÃO QUE SE VOLTA UNICAMENTE A ATACAR SUPOSTA AUSÊNCIA DE CONDENAÇÃO DA REQUERIDA AO PAGAMENTO DE HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS À REQUERENTE. CONDENAÇÃO EXISTENTE NA SENTENÇA. 1.2) SEGUNDO RECURSO. REGRA DA DIALETICIDADE. INOBSERVÂNCIA PARCIAL. TÓPICO QUE SE LIMITA A DISCUTIR A RESPEITO DA ILEGALIDADE DA TRANSFERÊNCIA DO IMÓVEL. SENTENÇA QUE EXPRESSAMENTE AFIRMA QUE O ATO É ILEGAL, MAS DEVE SER MANTIDO PARA A DEVIDA TUTELA À SEGURANÇA JURÍDICA. FUNDAMENTO NÃO ATACADO. 2) JUÍZO DE MÉRITO. DEFENSORIA PÚBLICA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS EM FACE DE ENTIDADE ADMINISTRATIVA VINCULADA AO ENTE QUE INTEGRA. CABIMENTO. SUPERAÇÃO, PELO STF, DO ENTENDIMENTO DO STJ. AUTONOMIA FINANCEIRA DA DEFENSORIA EM FACE DO PODER EXECUTIVO. 3) PRIMEIRO RECURSO NÃO CONHECIDO. 4) SEGUNDO RECURSO PARCIALMENTE CONHECIDO E DESPROVIDO.
A regra da dialeticidade impõe que o Recorrente ataque de modo específico a decisão impugnada, dialogando com as razões decisórias. Ao não fazê-lo, incorre em vício processual impeditivo do conhecimento da irresignação. Requerer o que já foi deferido, assim como deixar de impugnar a efetiva razão de decidir da decisão, são condutas que ofendem a regra da dialeticidade, levando a um juízo negativo de admissibilidade.
Após sucessivas reformas constitucionais, a Defensoria Pública passou a ostentar status institucional análogo ao do Ministério Público. Gradativamente foi-lhe conferida cada vez maior autonomia como forma de melhor tutelar o interesse dos necessitados (art. 134 da CRFB). Dentro desse amplo espectro de autonomia encontra-se seu completo desligamento do Poder Executivo nos aspectos administrativo (gerência própria de seus serviços), orçamentário (possibilidade de propor seu próprio orçamento) e financeiro (separação de rubricas orçamentárias, tornando a instituição senhora de seus próprios gastos) a partir da Emenda Constitucional nº 45/04. A elevada autonomia do órgão defensorial culminou, em 2009, na inserção, na Lei Complementar nº 80/94, de disposição normativa permissiva de execução (e antecedente condenação) de honorários advocatícios mesmo em face do Ente Público que integra (art. 4º, XXI). O texto normativo, ao adotar a expressão "quaisquer entes públicos", não deixava dúvidas a respeito dessa possibilidade.
Todavia, o Superior Tribunal de Justiça, em dois precedentes dotados de força obrigatória (art. 927, II e III), chegou à conclusão de que citado preceito deveria ser lido em consonância com o art. 381 do Código Civil, consagrador do instituto da confusão. Por ter natureza orgânica, segundo o STJ, a Defensoria Pública não poderia ser credora do Ente Público que integra (enunciado sumular nº 421): polo ativo e passivo da relação obrigacional seriam ocupados pelo próprio Ente, e não por um de seus órgãos. Para o STJ, também haveria confusão na hipótese em que a Defensoria Pública estivesse litigando contra Entidade de Direito Público integrante da Administração Indireta do mesmo Ente Federativo, visto que, nessas hipótese, o dinheiro público que custeia as atividades da entidade autárquica seriam provenientes do Ente Federado (Resp. 1.199.715, submetido à sistemática do art. 543-C do então vigente CPC/73).
Em histórica decisão tomada nos autos da Ação Rescisória de nº 1.937, o Tribunal Pleno do Supremo Tribunal Federal posicionou-se, por unanimidade, de forma diversa. Diante da autonomia financeira da Defensoria Pública em face do Ente Público que integra, concluiu-se ser possível a condenação ao pagamento de verba honorária ao órgão defensorial.
Com efeito, a natureza orgânica da Defensoria Pública não pode ser levantada como óbice à condenação precisamente em virtude de sua autonomia, que afasta um dos requisitos necessários à caracterização da confusão: a efetiva confusão de patrimônios. Por contar com orçamento próprio, a Defensoria Pública, e não o próprio Estado, materializado em seu Poder Executivo, seria credora da verba honorária, que deve ser destinada aos Fundos geridos pela Defensoria, voltados exclusivamente ao aparelhamento do órgão e à capacitação profissional de seus membros e servidores (art. 4º, XXI, da LC nº 80/94 e art. 6º da Lei Complementar nº 01/90). Em outras palavras, nas hipóteses em que o Estado – materializado em seu Poder Executivo – é condenado ao pagamento de honorários advocatícios à Defensoria Pública, há unicidade de pessoas, mas distinção de patrimônios. A autonomia financeira faz com que continue a existir uma dualidade "credor-devedor" mesmo quando inexistente mais de uma pessoa jurídica.
Primeiro recurso não conhecido.
Segundo recurso parcialmente conhecido e desprovido.
Ementa
E M E N T A
APELAÇÕES CÍVEIS. CIVIL E PROCESSO CIVIL. 1) JUÍZO DE ADMISSIBILIDADE. 1.1) PRIMEIRO RECURSO. REGRA DA DIALETICIDADE. INOBSERVÂNCIA TOTAL. IRRESIGNAÇÃO QUE SE VOLTA UNICAMENTE A ATACAR SUPOSTA AUSÊNCIA DE CONDENAÇÃO DA REQUERIDA AO PAGAMENTO DE HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS À REQUERENTE. CONDENAÇÃO EXISTENTE NA SENTENÇA. 1.2) SEGUNDO RECURSO. REGRA DA DIALETICIDADE. INOBSERVÂNCIA PARCIAL. TÓPICO QUE SE LIMITA A DISCUTIR A RESPEITO DA ILEGALIDADE DA TRANSFERÊNCIA DO IMÓVEL. SENTENÇA QUE EXPRESSAMENTE AFIRMA QUE O ATO É ILEGAL, MAS DEVE SER MANTIDO PARA A DEVIDA TUTELA À SEGURANÇA JURÍDICA. FUNDAMENTO NÃO ATACADO. 2) JUÍZO DE MÉRITO. DEFENSORIA PÚBLICA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS EM FACE DE ENTIDADE ADMINISTRATIVA VINCULADA AO ENTE QUE INTEGRA. CABIMENTO. SUPERAÇÃO, PELO STF, DO ENTENDIMENTO DO STJ. AUTONOMIA FINANCEIRA DA DEFENSORIA EM FACE DO PODER EXECUTIVO. 3) PRIMEIRO RECURSO NÃO CONHECIDO. 4) SEGUNDO RECURSO PARCIALMENTE CONHECIDO E DESPROVIDO.
A regra da dialeticidade impõe que o Recorrente ataque de modo específico a decisão impugnada, dialogando com as razões decisórias. Ao não fazê-lo, incorre em vício processual impeditivo do conhecimento da irresignação. Requerer o que já foi deferido, assim como deixar de impugnar a efetiva razão de decidir da decisão, são condutas que ofendem a regra da dialeticidade, levando a um juízo negativo de admissibilidade.
Após sucessivas reformas constitucionais, a Defensoria Pública passou a ostentar status institucional análogo ao do Ministério Público. Gradativamente foi-lhe conferida cada vez maior autonomia como forma de melhor tutelar o interesse dos necessitados (art. 134 da CRFB). Dentro desse amplo espectro de autonomia encontra-se seu completo desligamento do Poder Executivo nos aspectos administrativo (gerência própria de seus serviços), orçamentário (possibilidade de propor seu próprio orçamento) e financeiro (separação de rubricas orçamentárias, tornando a instituição senhora de seus próprios gastos) a partir da Emenda Constitucional nº 45/04. A elevada autonomia do órgão defensorial culminou, em 2009, na inserção, na Lei Complementar nº 80/94, de disposição normativa permissiva de execução (e antecedente condenação) de honorários advocatícios mesmo em face do Ente Público que integra (art. 4º, XXI). O texto normativo, ao adotar a expressão "quaisquer entes públicos", não deixava dúvidas a respeito dessa possibilidade.
Todavia, o Superior Tribunal de Justiça, em dois precedentes dotados de força obrigatória (art. 927, II e III), chegou à conclusão de que citado preceito deveria ser lido em consonância com o art. 381 do Código Civil, consagrador do instituto da confusão. Por ter natureza orgânica, segundo o STJ, a Defensoria Pública não poderia ser credora do Ente Público que integra (enunciado sumular nº 421): polo ativo e passivo da relação obrigacional seriam ocupados pelo próprio Ente, e não por um de seus órgãos. Para o STJ, também haveria confusão na hipótese em que a Defensoria Pública estivesse litigando contra Entidade de Direito Público integrante da Administração Indireta do mesmo Ente Federativo, visto que, nessas hipótese, o dinheiro público que custeia as atividades da entidade autárquica seriam provenientes do Ente Federado (Resp. 1.199.715, submetido à sistemática do art. 543-C do então vigente CPC/73).
Em histórica decisão tomada nos autos da Ação Rescisória de nº 1.937, o Tribunal Pleno do Supremo Tribunal Federal posicionou-se, por unanimidade, de forma diversa. Diante da autonomia financeira da Defensoria Pública em face do Ente Público que integra, concluiu-se ser possível a condenação ao pagamento de verba honorária ao órgão defensorial.
Com efeito, a natureza orgânica da Defensoria Pública não pode ser levantada como óbice à condenação precisamente em virtude de sua autonomia, que afasta um dos requisitos necessários à caracterização da confusão: a efetiva confusão de patrimônios. Por contar com orçamento próprio, a Defensoria Pública, e não o próprio Estado, materializado em seu Poder Executivo, seria credora da verba honorária, que deve ser destinada aos Fundos geridos pela Defensoria, voltados exclusivamente ao aparelhamento do órgão e à capacitação profissional de seus membros e servidores (art. 4º, XXI, da LC nº 80/94 e art. 6º da Lei Complementar nº 01/90). Em outras palavras, nas hipóteses em que o Estado – materializado em seu Poder Executivo – é condenado ao pagamento de honorários advocatícios à Defensoria Pública, há unicidade de pessoas, mas distinção de patrimônios. A autonomia financeira faz com que continue a existir uma dualidade "credor-devedor" mesmo quando inexistente mais de uma pessoa jurídica.
Primeiro recurso não conhecido.
Segundo recurso parcialmente conhecido e desprovido.
Data do Julgamento
:
29/10/2017
Data da Publicação
:
31/10/2017
Classe/Assunto
:
Apelação / Obrigação de Fazer / Não Fazer
Órgão Julgador
:
Primeira Câmara Cível
Relator(a)
:
Paulo César Caminha e Lima
Comarca
:
Manaus
Comarca
:
Manaus
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