TJCE 0000587-06.2006.8.06.0087
DIREITO CIVIL. AGRAVO RETIDO. RITO SUMÁRIO. AUSÊNCIA DE APRESENTAÇÃO DO ROL DE TESTEMUNHAS NA PETIÇÃO INICIAL. PODER PROBATÓRIO DO JUIZ. PROVA IMPRESCINDÍVEL PARA APURAÇÃO DOS FATOS. POSSIBILIDADE DE ADMISSÃO DE INDICAÇÃO POSTERIOR. APELAÇÃO CÍVEL. ACIDENTE DE TRÂNSITO. RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA. NEXO DE CAUSALIDADE ENTRE ATO DO PREPOSTO DA EMPRESA E DANOS OCASIONADOS À VÍTIMA. INCAPACIDADE LABORAL. DANOS MORAIS CARACTERIZADOS. PENSÃO MENSAL CORRESPONDENTE A UM SALÁRIO MÍNIMO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. BASE DE CÁLCULO. PARCELAS VENCIDAS E DOZE VINCENDAS. AGRAVO RETIDO CONHECIDO E DESPROVIDO. APELAÇÃO CONHECIDA E PARCIALMENTE PROVIDA. SENTENÇA REFORMADA.
1. DO AGRAVO RETIDO. O recorrente interpôs Agravo Retido, devidamente ratificado nessa oportunidade, questionando decisão interlocutória exarada na primeira instância, que admitiu a apresentação posterior do rol testemunhal pelo autor, que não havia realizado essa indicação na própria petição inicial, conforme exigia o art. 276 do CPC/1973 nos feitos submetidos ao procedimento sumário.
2. Apesar de a jurisprudência pátria majoritária, de fato, considerar que há preclusão do direito da parte de arrolar testemunhas no procedimento sumário quando essa medida não é adotada na primeira oportunidade em que se manifesta nos autos, não há como se ignorar o poder probatório do julgador, que pode, inclusive, determinar a produção de provas de ofício, caso referida providência se mostre imprescindível para a apuração dos fatos, como na hipótese em exame, de modo que não merece reforma a decisão atacada.
3. DA APELAÇÃO. Trata-se de Apelação interposta por concessionária de energia elétrica em face de sentença que julgou procedentes os pedidos formulados na petição inicial por agricultor vítima de acidente de trânsito em que também estava envolvido preposto da empresa para: a) condenar a requerida ao pagamento da quantia de R$ 36.000,00 (trinta e seis mil reais), equivalente a 150 (cento e cinquenta) salários mínimos vigentes em 13/05/2003 (data do sinistro), a título de danos morais, acrescidos de juros de 1% ao mês, a contar do evento danoso e correção monetária com base no INPC, a contar da sentença; b) condenar a requerida ao pagamento de indenização por danos materiais, sob forma de pensionamento, sendo a pensão equivalente a um salário mínimo até a data em que a vítima complete sessenta e cinco anos de idade, acrescida de juros de 1% (um por cento) ao mês e correção monetária com base no INPC, ambos a contar do evento danoso; c) fixar os honorários advocatícios em 10% (dez por cento) do valor da condenação.
4. Na presente insurgência, a apelante defende a reforma da sentença com fundamento: a) na culpa exclusiva da vítima, que teria efetuado manobra para a esquerda de forma distraída e veio a chocar-se na parte frontal do caminhão; b) na ausência de comprovação de qualquer conduta irregular do seu preposto; c) na inexistência de comprovação de invalidez permanente do autor; d) na impossibilidade de fixação da pensão mensal na proporção de um salário mínimo inteiro, considerando que o laudo concluiu por perda laborativa em percentual inferior a 20% (vinte por cento); e) na exorbitância do valor fixado a título de indenização por danos morais; f) no estabelecimento de base de cálculo equivocada em relação aos honorários advocatícios; g) na necessidade de rateio das despesas sucumbenciais.
5. Pelos elementos acostados aos autos, pode-se concluir que o preposto da demandada assumiu o comportamento determinante para a ocorrência do sinistro, porquanto, conduzindo um veículo de grande porte, capaz de provocar acidentes de elevadas proporções, não adotou as cautelas necessárias para preservar a segurança e a vida de quem se encontrava em situação de vulnerabilidade, inobservando seu dever de cuidado ao promover, como bem destacou o magistrado a quo, o perigoso alinhamento que teria envolvido o seu próprio caminhão, uma caminhonete D20 e uma bicicleta ''em trecho que mal cabem dois carros pequenos, tanto pela maior vulnerabilidade da vítima, como pelo manto da noite e da chuva que a todos envolvia no momento''.
6. Além disso, há presunção relativa de culpa do condutor que colide frontalmente com veículo que transita à sua frente, conforme ocorreu na situação em exame, em que a frente do caminhão colheu a bicicleta, cabendo ao primeiro produzir provas capazes de desconstituir a presunção em comento, o que, todavia, não ocorreu.
7. Portanto, verificada a prática do ato ilícito culposo pelo preposto da concessionária de serviço público e o nexo de causalidade com o evento danoso, a empresa demandada possui o dever de reparar os danos causados à vítima.
8. O sofrimento, pelo autor, de lesões corporais que resultaram na perda da plena capacidade laboral enseja, indubitavelmente, danos morais, haja vista a aflição certamente vivenciada pela vítima ao constatar a condição em que se encontrava, sendo razoável o valor de R$ 36.000,00 (trinta e seis mil reais) fixado a esse título.
9. Restou comprovado, por meio de perícia elaborada em juízo e outras provas técnicas e testemunhais, que o autor não pode exercer atividades que demandam muito esforço físico em virtude do acidente, de modo que o mesmo faz jus à pensão correspondente à importância integral do trabalho de agricultor para o qual se inabilitou no valor de um salário mínimo.
10. De acordo com entendimento do STJ, a base de cálculo dos honorários advocatícios em ações reparatórias que envolvem prestações de trato sucessivo deve ser o somatório das parcelas vencidas, acrescida de doze parcelas vincendas (REsp 1452306/SP, Rel. Ministro RAUL ARAÚJO, QUARTA TURMA, julgado em 15/03/2016, DJe 06/04/2016).
11. Inexiste sucumbência recíproca, pois os pleitos autorais formulados na inicial foram integralmente acolhidos, não havendo que se falar em rateio das despesas sucumbenciais.
12. Agravo Retido conhecido e desprovido. Apelação conhecida e parcialmente provida.
ACÓRDÃO
Acordam os Desembargadores integrantes da Primeira Câmara de Direito Privado do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Ceará, nos autos do processo nº 0000587-06.2006.8.06.0087, por unanimidade, por uma de suas Turmas, em conhecer do Agravo Retido para negar-lhe provimento e em conhecer do recurso de apelação para dar-lhe parcial provimento, tudo de conformidade com o voto do e. Relator.
Fortaleza, 16 de maio de 2018.
Ementa
DIREITO CIVIL. AGRAVO RETIDO. RITO SUMÁRIO. AUSÊNCIA DE APRESENTAÇÃO DO ROL DE TESTEMUNHAS NA PETIÇÃO INICIAL. PODER PROBATÓRIO DO JUIZ. PROVA IMPRESCINDÍVEL PARA APURAÇÃO DOS FATOS. POSSIBILIDADE DE ADMISSÃO DE INDICAÇÃO POSTERIOR. APELAÇÃO CÍVEL. ACIDENTE DE TRÂNSITO. RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA. NEXO DE CAUSALIDADE ENTRE ATO DO PREPOSTO DA EMPRESA E DANOS OCASIONADOS À VÍTIMA. INCAPACIDADE LABORAL. DANOS MORAIS CARACTERIZADOS. PENSÃO MENSAL CORRESPONDENTE A UM SALÁRIO MÍNIMO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. BASE DE CÁLCULO. PARCELAS VENCIDAS E DOZE VINCENDAS. AGRAVO RETIDO CONHECIDO E DESPROVIDO. APELAÇÃO CONHECIDA E PARCIALMENTE PROVIDA. SENTENÇA REFORMADA.
1. DO AGRAVO RETIDO. O recorrente interpôs Agravo Retido, devidamente ratificado nessa oportunidade, questionando decisão interlocutória exarada na primeira instância, que admitiu a apresentação posterior do rol testemunhal pelo autor, que não havia realizado essa indicação na própria petição inicial, conforme exigia o art. 276 do CPC/1973 nos feitos submetidos ao procedimento sumário.
2. Apesar de a jurisprudência pátria majoritária, de fato, considerar que há preclusão do direito da parte de arrolar testemunhas no procedimento sumário quando essa medida não é adotada na primeira oportunidade em que se manifesta nos autos, não há como se ignorar o poder probatório do julgador, que pode, inclusive, determinar a produção de provas de ofício, caso referida providência se mostre imprescindível para a apuração dos fatos, como na hipótese em exame, de modo que não merece reforma a decisão atacada.
3. DA APELAÇÃO. Trata-se de Apelação interposta por concessionária de energia elétrica em face de sentença que julgou procedentes os pedidos formulados na petição inicial por agricultor vítima de acidente de trânsito em que também estava envolvido preposto da empresa para: a) condenar a requerida ao pagamento da quantia de R$ 36.000,00 (trinta e seis mil reais), equivalente a 150 (cento e cinquenta) salários mínimos vigentes em 13/05/2003 (data do sinistro), a título de danos morais, acrescidos de juros de 1% ao mês, a contar do evento danoso e correção monetária com base no INPC, a contar da sentença; b) condenar a requerida ao pagamento de indenização por danos materiais, sob forma de pensionamento, sendo a pensão equivalente a um salário mínimo até a data em que a vítima complete sessenta e cinco anos de idade, acrescida de juros de 1% (um por cento) ao mês e correção monetária com base no INPC, ambos a contar do evento danoso; c) fixar os honorários advocatícios em 10% (dez por cento) do valor da condenação.
4. Na presente insurgência, a apelante defende a reforma da sentença com fundamento: a) na culpa exclusiva da vítima, que teria efetuado manobra para a esquerda de forma distraída e veio a chocar-se na parte frontal do caminhão; b) na ausência de comprovação de qualquer conduta irregular do seu preposto; c) na inexistência de comprovação de invalidez permanente do autor; d) na impossibilidade de fixação da pensão mensal na proporção de um salário mínimo inteiro, considerando que o laudo concluiu por perda laborativa em percentual inferior a 20% (vinte por cento); e) na exorbitância do valor fixado a título de indenização por danos morais; f) no estabelecimento de base de cálculo equivocada em relação aos honorários advocatícios; g) na necessidade de rateio das despesas sucumbenciais.
5. Pelos elementos acostados aos autos, pode-se concluir que o preposto da demandada assumiu o comportamento determinante para a ocorrência do sinistro, porquanto, conduzindo um veículo de grande porte, capaz de provocar acidentes de elevadas proporções, não adotou as cautelas necessárias para preservar a segurança e a vida de quem se encontrava em situação de vulnerabilidade, inobservando seu dever de cuidado ao promover, como bem destacou o magistrado a quo, o perigoso alinhamento que teria envolvido o seu próprio caminhão, uma caminhonete D20 e uma bicicleta ''em trecho que mal cabem dois carros pequenos, tanto pela maior vulnerabilidade da vítima, como pelo manto da noite e da chuva que a todos envolvia no momento''.
6. Além disso, há presunção relativa de culpa do condutor que colide frontalmente com veículo que transita à sua frente, conforme ocorreu na situação em exame, em que a frente do caminhão colheu a bicicleta, cabendo ao primeiro produzir provas capazes de desconstituir a presunção em comento, o que, todavia, não ocorreu.
7. Portanto, verificada a prática do ato ilícito culposo pelo preposto da concessionária de serviço público e o nexo de causalidade com o evento danoso, a empresa demandada possui o dever de reparar os danos causados à vítima.
8. O sofrimento, pelo autor, de lesões corporais que resultaram na perda da plena capacidade laboral enseja, indubitavelmente, danos morais, haja vista a aflição certamente vivenciada pela vítima ao constatar a condição em que se encontrava, sendo razoável o valor de R$ 36.000,00 (trinta e seis mil reais) fixado a esse título.
9. Restou comprovado, por meio de perícia elaborada em juízo e outras provas técnicas e testemunhais, que o autor não pode exercer atividades que demandam muito esforço físico em virtude do acidente, de modo que o mesmo faz jus à pensão correspondente à importância integral do trabalho de agricultor para o qual se inabilitou no valor de um salário mínimo.
10. De acordo com entendimento do STJ, a base de cálculo dos honorários advocatícios em ações reparatórias que envolvem prestações de trato sucessivo deve ser o somatório das parcelas vencidas, acrescida de doze parcelas vincendas (REsp 1452306/SP, Rel. Ministro RAUL ARAÚJO, QUARTA TURMA, julgado em 15/03/2016, DJe 06/04/2016).
11. Inexiste sucumbência recíproca, pois os pleitos autorais formulados na inicial foram integralmente acolhidos, não havendo que se falar em rateio das despesas sucumbenciais.
12. Agravo Retido conhecido e desprovido. Apelação conhecida e parcialmente provida.
ACÓRDÃO
Acordam os Desembargadores integrantes da Primeira Câmara de Direito Privado do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Ceará, nos autos do processo nº 0000587-06.2006.8.06.0087, por unanimidade, por uma de suas Turmas, em conhecer do Agravo Retido para negar-lhe provimento e em conhecer do recurso de apelação para dar-lhe parcial provimento, tudo de conformidade com o voto do e. Relator.
Fortaleza, 16 de maio de 2018.
Data do Julgamento
:
16/05/2018
Data da Publicação
:
17/05/2018
Classe/Assunto
:
Apelação / Indenização por Dano Moral
Órgão Julgador
:
1ª Câmara Direito Privado
Relator(a)
:
HERACLITO VIEIRA DE SOUSA NETO
Comarca
:
Ibiapina
Comarca
:
Ibiapina
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