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Jurisprudência


TJCE 0000857-08.2009.8.06.0125

Ementa
CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA POR ATOS DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. EX-PREFEITO. CONTRATAÇÃO IRREGULAR DE SERVIDORES. PREENCHIMENTO DE CARGOS PERMANENTES DO MUNICÍPIO. EXCEPCIONAL INTERESSE PÚBLICO. INOCORRÊNCIA. VIOLAÇÃO AOS PRINCÍPIOS DA LEGALIDADE, ISONOMIA, IMPESSOALIDADE E MORALIDADE. ELEMENTO SUBJETIVO CONFIGURADO (DOLO GENÉRICO). PRÁTICA DA MODALIDADE DE IMPROBIDADE PREVISTA NO CAPUT DO ART. 11 DA LEI Nº. 8.429/92 (LIA). IMPOSIÇÃO DAS SANÇÕES PREVISTAS NO ART. 12, INCISO III, DA LIA. PROVIDÊNCIA ACERTADA. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. SENTENÇA MANTIDA. 1. Cuida-se de de apelação cível adversando Sentença proferida pelo MM. Juiz de Direito da Vara Única da Comarca de Missão Velha/CE que, nos autos da ação civil pública autuada sob o nº. 0000857-08.2009.8.06.0125, julgou parcialmente procedente a pretensão autoral, no sentido de condenar o demandante por ato de improbidade administrativa, aplicando-lhe as sanções previstas no art. 12, inciso III, da Lei nº. 8.429/92: (a) suspensão dos direitos políticos, pelo prazo de 05 (cinco) anos; (b) pagamento de multa civil fixada em 100 (cem) vezes o valor da última remuneração percebida pelo agente; e (c) proibição de contratar com o Poder Público, ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de 03 (três) anos. 2. Na peça preambular, sustentou o órgão ministerial que o demandado (aqui apelante), na condição de Prefeito do Município de Missão Velha/CE, no período de 1997 a 2004, fez várias admissões de servidores públicos sem prévia aprovação em concurso público, em desacordo com art. 37, inciso II, da CF/88; que mesmo existindo servidores contratados irregularmente por gestões anteriores, em vez de demiti-los para cumprir o texto constitucional, o promovido teria ratificado o ato nulo; e que, tal postura, constituiria ato de improbidade administrativa (art. 11, caput, LIA), justificando a condenação do agente nas sanções previstas no art. 12 da Lei nº. 8.429/92. 3. Entende-se por ato de improbidade administrativa, toda conduta corrupta, nociva ou inepta do agente público, dolosa ou culposa, ofensiva aos princípios constitucionais que regem a Administração Pública, independentemente da ocorrência de lesão ao erário ou de enriquecimento ilícito. 4. Por ação ou omissão dolosa passível de sancionamento pela LIA, compreende-se o comportamento consciente do agente que, prevendo o resultado ímprobo, direciona a sua atuação nesse sentido ou assume tal risco (dolo genérico), independentemente da existência de uma finalidade específica motivadora (dolo específico). Já a culpa se faz presente quando o agente, descurando-se do dever objetivo de cuidado, incorre em negligência, imprudência ou imperícia, que culmina na prática de ato ímprobo que lhe era previsível. 5. Feitas tais digressões, assento que a título de exceção ao regime jurídico único, a CF/88, no artigo 37, IX, previu, em caráter de excepcionalidade, para atender à necessidade temporária de excepcional interesse público, a possibilidade de contratação por tempo determinado. Logo, esses servidores não devem exercer funções como integrantes de um quadro permanente, paralelo ao dos cargos públicos, mas em caráter transitório e excepcional. Com isso, fica explicada a razão de ter o constituinte exigido concurso público só para a investidura em cargo ou emprego. 6. Pois bem. Volvendo ao caso dos autos, colhe-se do robusto manancial probatório, que o demandado manteve nos quadros do ente epigrafado, durante a sua gestão enquanto Chefe do Poder Executivo Municipal, de 1997 a 2004, o total de 33 (trinta e três) servidores contratados sem prévia aprovação em concurso público, para desenvolver atividades de necessidade permanente e não temporária, em clara afronta ao precitado art. 37, inciso II, da Carta Magna vigente. 7. Extrai-se, outrossim, que os servidores contratados irregularmente em gestões anteriores, a exemplo de Eliana Rodrigues Soares, Cícero Gonçalves Nascimento e Samuel Moreira Cruz, não foram demitidos pelo recorrente, com o propósito de cumprir os preceitos constitucionais. Pelo contrário, o promovido deu continuidade aos referidos ajustes, perpetuando as ilegalidades apontadas pelo órgão ministerial, em evidente abuso ofensivo aos princípios da legalidade, isonomia, impessoalidade e moralidade administrativa. 8. Em suma, ficou demonstrado que o réu durante os seus dois mandatos manteve a promoveu contratações temporárias para atividades permanentes, passando ao largo dos requisitos da temporariedade e do excepcional interesse público, como exige o texto constitucional, configurando a modalidade de improbidade administrativa prevista no art. 11, caput, da LIA. 9. Demais disso, assevero que a lei municipal mencionada no apelo, não convalida a ilegalidade constatada, até porque o referido diploma foi de iniciativa do próprio Alcaide e só restou aprovado depois de várias contratações precárias. Forçoso reconhecer, nessa medida, que a norma foi elaborada apenas com o intuito de consolidar as irregularidades levadas a efeito, não havendo se falar, portanto, em ausência de dolo genérico do ex gestor, apto a descaracterizar o ato improbidade perpetrado. 10. Em verdade, a postura em referência evidencia ainda mais o dolo, por representar artifício para burlar o princípio constitucional do concurso público, e desse modo passar o verniz da legalidade à prática do clientelismo político. Tal prática, constitui, respeitosa vênia, a escola do ardil para uma lei menor trapacear uma lei maior, através de procedimento rotineiro com disfarce de contratação emergencial, desde as atividades mais simples, às mais complexas, não merecendo prosperar, portanto, a pretensão recursal. 11. Nessa perspectiva, considerada a gravida da conduta, diante das circunstâncias do caso concreto e do intuito deliberado do agente de conferir aparência de legalidade às contratações irregulares levadas a efeito, agiu com o costumeiro acerto o douto Magistrado sentenciante ao aplicar ao recorrente as sanções previstas na norma de regência: i) a suspensão dos direitos políticos pelo prazo de 5 (cinco) anos; ii) o pagamento de multa civil no valor de 100 (cem) vezes o valor da remuneração que percebia enquanto Prefeito do Município Missão Velha/CE; e, ainda, iii) a proibição de contratar com o Poder Público, ou de receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de 3 (três) anos. 12. Apelação cível conhecida e desprovida. Sentença mantida. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº. 0000857-08.2009.8.06.0125, em que são partes as acima relacionadas, acordam os Desembargadores que compõem a 1ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça do Estado do Ceará, por unanimidade de votos, em conhecer do recurso, mas para desprovê-lo, nos termos do voto da eminente Relatora, parte integrante deste. Fortaleza/CE, 25 de junho de 2018.

Data do Julgamento : 25/06/2018
Data da Publicação : 25/06/2018
Classe/Assunto : Apelação / Improbidade Administrativa
Órgão Julgador : 1ª Câmara Direito Público
Relator(a) : LISETE DE SOUSA GADELHA
Comarca : Missão Velha
Comarca : Missão Velha
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