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Jurisprudência


TJCE 0001011-75.2007.8.06.0099

Ementa
DIREITO PENAL E PROCESSUAL. APELAÇÃO CRIME. PECULATO. TESES DA DEFESA: ABSOLVIÇÃO POR INEXISTÊNCIA DE PROVAS. PEDIDO DE DESCLASSIFICAÇÃO PARA O CRIME DE PREVARICAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. AUTORIA E MATERIALIDADE COMPROVADAS. REDIMENSIONAMENTO DA PENA-BASE. DOSIMETRIA DESPROPORCIONAL. RETIFICAÇÃO NECESSÁRIA. PRESCRIÇÃO. RECONHECIMENTO DE OFÍCIO. PUNIBILIDADE EXTINTA. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. 1. O recurso pleiteia a absolvição em face da inexistência de prova suficiente para a sua condenação. Em pedido alternativo, pugna pela reforma da dosimetria da pena, em face das circunstancias judicias, e reconhecida a prescrição a partir da reforma da pena aplicada. Por fim, a desclassificação do delito de peculato para o crime de prevaricação. 2. A materialidade está comprovada por meio dos recibos acostados às fls. 41/43, 45, 50/51. A autoria, por sua vez, está caracterizada não só pela confissão do acusado de estar de posse dos valores, mas também pelo conjunto probatório amealhado aos autos. 3. O apelante admitiu que ficou de posse dos valores, tendo inclusive pago os honorários advocatícios ao advogado do depositante. Nesse passo, vê-se que a tese apresentada pelo apelante não encontra amparo no caderno processual, pois sequer apresenta versão plausível dos fatos. Ademais, convém frisar, o dinheiro que apossou-se o acusado foi depositado em juízo somente depois de mais de cinco meses, após a denúncia feita pelo depositante ao Ministério Público (fls. 39/40). 4. Cumpre destacar que, tratando-se de acusação de crime de peculato/apropriação, a consumação se dá no momento em que o funcionário publico começa a dispor do dinheiro, pois assim entende do STJ "a consumação do crime de peculato - apropriação prevista no art. 312, caput, primeira parte, do Código Penal, ocorre no momento em que o funcionário publico, em virtude cargo, começa a dispor do dinheiro, valores ou qualquer outro bem móvel apropriado, como se proprietário fosse."(STJ – REsp 985.368 – SP, rel. Min. Laurita Vaz, 5ª t. 30.05.2008) 5. Portanto, impossível acolher o pedido de absolvição ou mesmo desclassificação para o delito de prevaricação, pois como visto o apelante estava de posse de mais de R$ 14.000,00 (catorze mil reais) e pelas provas amealhadas aos autos demonstram que utilizou de sua função pública para possuir a quantia supra, circunstâncias estas que caracterizam o dolo em sua conduta. 6. Relativamente ao quantum da reprimenda aplicada, cumpre pontuar que a dosimetria da pena não obedece a uma regra matemática rígida, mas se trata de uma operação realizada com base em elementos concretos dos autos, levada a efeito com certa discricionariedade, ainda que vinculada ao princípio do livre convencimento motivado do julgador, de forma que cada uma das circunstâncias individualmente valoradas pode ter maior ou menor influência no cômputo da pena-base. 7. Constata-se, assim, que a pena-base aplicada em 3 (três) anos e 3 (três) meses de reclusão resta desproporcional, por seus próprios fundamentos, o que a meu sentir deve ser revista, pois não se verifica fundamentação idônea para tanto, já que o magistrado utilizou somente das consequências do crime, majorando assim a pena-base em 1 (um) ano e 03 (três) meses. 8. As consequências do crime é o resultado ou o efeito em decorrência do ato praticado. Seria o mal causado pelo agente que transcende ao resultado típico. Esses danos podem ser de caráter material ou moral. O primeiro seria a diminuição do patrimônio da vítima e o segundo a dor causada. Para Schmitt "nesta circunstância judicial o que devemos analisar é o alarme social do fato, a sua maior ou menor repercussão e seus efeitos. Porém normalmente os tipos penais já possuem uma consequência que se encontra implícita, isto é, que lhe é inerente, razão pela qual deves ser sopesadas apenas as consequências que se projetam para além do fato típico, sob pena de incorrermos em dupla valoração (bis in idem)." 9. In casu, o comprometimento da imagem do Poder Judiciário perante os demais servidores e a comunidade do município de Itaitinga, não podem, de per si, servir de motivo de exasperação da pena-base, mesmo porque, não fora devidamente comprovados nos autos. Constato ainda que o dano material não é expressivo, tendo sido devidamente restituído aos cofres públicos, conforme já relatado acima, não havendo assim qualquer prejuízo material. 10. Da prova carreada aos autos, observa-se que as consequências do crime não ultrapassa os limites da norma penal, o que torna a sua conduta inserida no próprio tipo, nada havendo, portanto, a valorar, sob pena de desobediência ao princípio do non bis in idem. Por conseguinte, diante das fundamentações inidôneas utilizadas e dos necessários decotes que devem ser realizados, fica estabelecida a pena-base no mínimo legal, ou seja, 02 (dois) anos. 11. Sendo modificada a pena-base, passo às demais fases da dosimetria da pena, nas quais entendo permanecerem hígidas as ponderações do magistrado sentenciante. Inexistem circunstâncias agravantes. Apesar do reconhecimento da atenuante da confissão espontânea pelo juízo a quo, deixo de aplica-la pelo fato de ter sido modificada a pena-base para o mínimo previsto para o tipo, não podendo esta atenuante repercutir para diminuir a reprimenda aquém do mínimo legal, a teor do que dispõe a Súmula 231 do Superior Tribunal de Justiça. 12. Por fim, adentro a 3ª fase da dosimetria, sendo inexorável a identificação da causa de aumento constante do art. 327, § 2º, do Código Penal, crime praticado no exercício de cargo em comissão, no caso em exame, o acusado exercia o cargo de Diretor de Secretaria, razão pela qual aumento a pena à razão da sua terça parte, que equivale a 08 (oito) meses, passando a pena para 02 (dois) anos e 08 (oito) meses. Presente ainda a causa de diminuição consistente no arrependimento posterior, nos termos do art. 16, do CP, por ter o acusado restituído os valores antes do recebimento da denúncia, logo, reduzo a pena pela metade, ou seja, em 1 (um) ano e 04 (quatro) meses, finalizando a pena total e definitiva em 1(um) ano e 04 (quatro) meses. 13. Em face da pena in concreto agora aplicada, passo assim a analisar a prescrição da pretensão punitiva do Estado. A prescrição é a perda do direito de punir do Estado pelo não exercício em determinado lapso temporal. Existem duas maneiras para se computar a prescrição: 1. Pela pena in abstrato; 2. Pela pena in concreto. In casu, aplica-se a segunda hipótese, onde o cálculo da prescrição deve ser o da pena aplicada, nos termos da Súmula 146 do STF, verbis:"A prescrição da ação penal regula-se pela pena concretizada na sentença, quando não há recurso da acusação." 14. Na hipótese, verifico, de fato, a ocorrência da prescrição da pretensão punitiva concreta retroativa, haja vista que o apelante Miguel Ângelo de Oliveira Freire, foi condenado a penas de 01 (um) ano e 04 (quatro) meses de reclusão. Com base na pena in concreto aplicada, esta dar-se-ia após o transcurso de 04 (quatro) anos, conforme a previsão do art. 109, inc. V, do Código Penal, a contar do trânsito em julgado para a acusação. Portanto, sendo o prazo prescricional de 04 (quatro) anos, considerando pena in concreto aplicada ao recorrente, a data do recebimento da denúncia foi em 16/08/2007 (fls. 119), até a sentença de primeiro grau em 04.12.2013, percebo que houve, à desdúvida, o transcurso do prazo de mais de 04 (quatro) anos, restando, pois, mais que comprovada a prescrição da pretensão punitiva retroativa neste caso. 15. Por ser matéria de ordem pública, RECONHEÇO de ofício da EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE, sob os fundamentos da prescrição retroativa, nos termos do art. 110, § 1º, c/c art. 107, inc. I, art. 109, inciso V, todos do Código Penal, e art. 61 do Código de Processo Penal, declarando, assim, extinta a punibilidade do apelante Miguel Ângelo de Oliveira Freire. 16. Recurso conhecido e parcialmente provido. Reconhecimento ex offício da pretensão punitiva estatal em razão da prescrição. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Criminal nº 0001011-75.2007.8.06.0163, em que figura como recorrente Miguel Ângelo de Oliveira Freire e recorrido o Ministério Público do Estado do Ceará. ACORDAM os Desembargadores integrantes da 3ª Câmara Criminal deste Tribunal de Justiça do Estado do Ceará, por unanimidade de votos, em CONHECER do recurso e DAR-LHE PARCIAL PROVIMENTO, RECONHECENDO de ofício a EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE, nos termos do voto do eminente Relator. Fortaleza, 22 de agosto de 2017. Francisco Lincoln Araújo E Silva Presidente do Órgão Julgador Dr. Antônio Pádua Silva Relator - Port. 1369/2016

Data do Julgamento : 22/08/2017
Data da Publicação : 22/08/2017
Classe/Assunto : Apelação / Peculato
Órgão Julgador : 3ª Câmara Criminal
Relator(a) : ANTÔNIO PÁDUA SILVA - PORT 1369/2016
Comarca : Itaitinga
Comarca : Itaitinga
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