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Jurisprudência


TJCE 0001454-56.2009.8.06.0034

Ementa
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÕES DE USUCAPIÃO E REIVINDICAÇÃO DE POSSE. CONEXÃO RECONHECIDA. SENTENÇA ÚNICA. JULGAMENTO SIMULTÂNEO. IMPROCEDÊNCIA DA USUCAPIÃO E PARCIAL PROCEDÊNCIA DA REIVINDICATÓRIA. INTERPOSIÇÃO DE DOIS RECURSOS DE APELAÇÃO DA MESMA DECISÃO. IMPOSSIBILIDADE. PRECLUSÃO CONSUMATIVA. NÃO CONHECIMENTO DO SEGUNDO RECURSO. CONHECIMENTO DO PRIMEIRO APELO. EFEITO TRANSLATIVO. APLICAÇÃO. USUCAPIÃO. NÃO COMPROVAÇÃO DOS REQUISITOS DO ARTIGO 1.238, DO CÓDIGO CIVIL. POSSE VICIADA. MERA DETENÇÃO DO PRIMEIRO ANTECESSOR DA CADEIA SUCESSÓRIA. TRANSMISSÃO DO VÍCIO AOS DEMAIS SUCESSORES. CONHECIMENTO DO ATUAL DETENTOR, DA POSSE VICIADA E DE OPOSIÇÃO. IMPROCEDÊNCIA DA AÇÃO RATIFICADA. AÇÃO DE REIVINDICAÇÃO DE POSSE. INDIVIDUAÇÃO DO IMÓVEL, COMPROVAÇÃO DO DOMÍNIO E DA POSSE VICIADA PELO AUTOR DA USUCAPIÃO. BENFEITORIAS REALIZADAS PELO RECORRENTE. INDENIZAÇÃO SOMENTE QUANTO ÀS ACESSÕES NECESSÁRIAS. INDENIZAÇÃO POR LUCROS CESSANTES DEVIDOS AO RECORRIDO EM RAZÃO DO IMPEDIMENTO DE USAR, GOZAR E DISPOR DO BEM. ÔNUS SUCUMBENCIAL, ESCORREITO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS, 20% (VINTE POR CENTO) SOBRE O VALOR DA CAUSA. RECURSOS, O PRIMEIRO, CONHECIDO E IMPROVIDO. O SEGUNDO, NÃO CONHECIDO. SENTENÇA CONFIRMADA. 1. Na hipótese, foi reconhecida a conexão das ações de Usucapião e Reivindicação de Posse e o Juízo de Planície proferiu um julgamento conjunto, mediante uma sentença una. Todavia, o promovente da Usucapião e demandado na Reivindicatória interpôs dois recursos da mesma decisão 2. De acordo com o princípio da unirrecorribilidade, singularidade ou unicidade recursal, a sentença única proferida no julgamento simultâneo de ações conexas, é passível de impugnação por apenas um só recurso. Assim, o ordenamento pátrio veda a interposição de mais de um recurso contra o mesmo provimento judicial, pela ocorrência de preclusão consumativa, sendo medida imperativa o não conhecimento do segundo recurso interposto pela mesma parte contra a sentença una. 3. Portanto, não se conhece do segundo recurso protocolado sob o Nº 403, em 05/02/2016, nos autos da Ação de Reivindicação de Posse. E, em razão disso, a Preliminar de Nulidade da Sentença arguida somente no recurso não conhecido, fica prejudicada. 4. E, por preencher os pressupostos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade, conhece-se do apelatório interposto nos autos da Ação de Usucapião, protocolado sob o Nº 402, em 05/02/2016 e passa-se ao exame do mérito recursal, aplicando-se o efeito translativo. 5. Cinge-se à controvérsia ao exame do adimplemento pelo recorrente dos pressupostos para fins de aquisição da propriedade, mediante a usucapião do imóvel descrito na exordial consistentes na posse mansa, pacífica e ininterrupta por mais de dez anos, assim como na análise da espécie de posse exercida, se apta a garantir a sua manutenção no imóvel reivindicado. 6. No caso posto no tablado, extrai-se que o transmitente da posse ao ora apelante, o Sr. Nilton Martins de Castro, asseverou na Ação de Usucapião por si ajuizada (Proc. 2307-80.200.8.06.0034/0 – fls. 100-102), cuja petição inicial foi indeferida, que adquiriu o imóvel litigioso, no dia 11 de junho de 2000, do caseiro Valderi Pacífico dos Santos e da sua esposa, Maria Naílde Ribeiro dos Santos, mediante a promessa de pagamento dos seus salários atrasados e contas de energia elétrica. 7. Observa-se da Declaração de Transferência de Responsabilidade acostada às fls. 105-106, que o Sr. Valderi Pacífico dos Santos e esposa declararam que o imóvel pertence a Klaus Walter Kostenzer e esposa Christina Kostenzer; que exercem a função de caseiro e que receberam do Sr. Nilton Martins de Castro, uma indenização de R$ 600,00 (seiscentos reais). 8. Assim, o caseiro exercia a mera detenção do imóvel usucapiendo e a sua posse era precária, uma vez que os mesmos ali se encontravam com a autorização dos seus proprietários, no caso, Klaus Walter Kostenzer e Christina kostenzer, para quem o casal prestava serviços ou era empregado. 9. Nos moldes do artigo 1.208, do Código Civil, a ocupação decorrente de mera tolerância não induz a posse efetiva sobre o bem, mas uma posse precária, que jamais convalesce pelo decurso do tempo, uma vez que há apenas permissão de utilização por terceiros. 10. Por outro lado, o Sr. Nilton Martins de Castro, tinha ciência da precariedade da posse exercida pelo caseiro, Sr. Valderi, tanto é que no documento de fls. 105-106, o mesmo se comprometeu a manter, cuidar, zelar e pagar todas as despesas referentes a casa, bem como "a devolver o imóvel aos verdadeiros donos, tão logo estes apareçam." 11. Logo dessume-se, que a posse adquirida pelo Sr. Nilton Martins de Castro, mantém as mesmas características da posse exercida pelo seu antecessor, ou seja, é revestida de precariedade. 12. De acordo com o artigo 1.203, do Código Civil, a posse mantém o mesmo caráter de quando foi adquirida, salvo disposição em contrário. Assim, se a posse foi adquirida violenta, clandestina ou precariamente, ela conservará esse caráter aos respectivos adquirentes. E, a posse precária não é computada para fins de aquisição da propriedade mediante a usucapião. 13. Ademais, houve oposição à posse exercida pelo Sr. Nilton Martins de Castro (de junho de 2000 a 2009), uma vez que o administrador do mencionado imóvel, o Sr. Francisco Mário Diniz Soares, ajuizou ação de Reintegração de Posse (Proc. Nº 1193-04.2003.8.06.0034/0). Inobstante, o Sr. Nilton permaneceu irregularmente no imóvel e, também de forma irregular, em 2009, transmitiu a posse ao autor/apelante Clairton Euclides dos Santos (fls. 14-15), o qual, no mesmo ano, ajuizou a presente ação, alegando haver adimplido os requisitos para obter a usucapião do bem, somando-se a sua posse com as dos seus antecessores. 14. Porém, extrai-se do depoimento pessoal do promovente/recorrente que à época da aquisição da posse, possuía conhecimento de que existia uma ação na justiça acerca da posse do imóvel. Logo, havia uma oposição à posse do seu antecessor, o que não o inibiu de adquirir o referido bem e ajuizar Ação de Usucapião, com a exposição de fatos distorcidos da realidade. 15. Destarte, o acervo probatório revela que a posse sobre o imóvel litigioso foi exercida de forma precária e injusta pelo recorrente e seus antecessores, a qual não se presta à obtenção do domínio, mediante a usucapião, uma vez que é requisito para a obtenção do reconhecimento do domínio da coisa, a posse, mansa, pacífica e com ânimo de dono. 16. Nesse contexto, corroboram as provas colacionadas aos fólios que o apelado, Christian Ingo Heinrich Hansen, possui o domínio sobre o imóvel objeto da matrícula nº 7.376, do Cartório do 2º Ofício da Comarca de Aquiraz/CE, denominado Alto da Prainha, situado no lugar Prainha, outrora Morrinho ou Barra do Catú, constituído pelos lotes 34, 46, 47 e 48, da Quadra H, de forma irregular, localizado no lado ímpar de uma rua sem denominação oficial, que separa a Quadra H da G, distando 45,00 metros para o lado esquerdo (nascente), do início de uma rua sem denominação oficial, com área de 2.100 metros quadrados, com os limites e confrontações descritas na inicial. 17. Em virtude desse domínio e não se revestindo de justa a posse exercida pelo ora recorrente, impõe-se a procedência da ação reivindicatória, ajuizada pelo apelado, uma vez que a mesma constitui o meio hábil para o proprietário do bem retomá-lo de quem injustamente o detenha ou possua. 18. No caso, o autor da ação reivindicatória comprovou o domínio sobre o imóvel e a sua individuação, mediante a Escritura Pública de Compra e Venda colacionada às fls. 12-14, assim como por todos os fundamentos de decidir da ação de usucapião, ficou constatada que a posse exercida pelo demandado, ora recorrente é precária, não subsistindo qualquer direito ao mesmo de permanecer no imóvel reivindicado. 19. Quanto às benfeitorias requeridas pelo recorrente na ação de reivindicação de posse, observa-se da prova colhida aos autos que, de fato, foram realizadas benfeitorias e acessões no imóvel litigioso, todavia, prescreve o artigo 1.220, do Código Civil que "Ao possuidor de má-fé serão ressarcidos somente as benfeitorias necessárias; não lhe assiste o direito de retenção pela importância destas, nem o de levantar as voluptuárias." 20. Dessa feita, o possuidor de má-fé não faz jus a indenização das benfeitorias úteis e voluptuárias, sendo que estas últimas, sequer poderá retirá-las, não se aplicando a regra do enriquecimento sem causa na hipótese (artigo 884, do Código Civil), em virtude de sua posse conter vícios de origem. 21. No caso, o possuidor, ora recorrente, possuía pleno conhecimento do vício quando adquiriu a posse do imóvel usucapiendo, razão pela qual somente faz jus ao recebimento de indenização pelas benfeitorias necessárias, a qual será estabelecida por arbitramento em fase de liquidação da sentença, conforme consta do decisum recorrido. 22. Quanto ao pleito do recorrido, autor da ação reivindicatória, de indenização pelos lucros cessantes, derivados da renda que o imóvel proporcionaria se estivesse ao seu dispor, reconhece-se o direito indenizatório, o qual deve ser apurado em liquidação de sentença por arbitramento, com base no valor locatício, como produto derivado da exploração racional e econômica do imóvel, a partir da data de sua aquisição, 10/12/2012. 23. Destarte, conclui-se pela improcedência da Ação de Usucapião e parcial procedência da Ação de Reivindicação de Posse, devendo o recorrente restituir o imóvel usucapiendo ao seu proprietário, o Sr. Christian Ingo Heinrich Hansen, bem como indenizá-lo pelos lucros cessantes, exteriorizados pelo valor da locação mensal, a partir da data da aquisição do bem, em 10/01/2012, a ser apurado em liquidação de sentença. Incidência dos artigos 402 e 403, do Código Civil. 24. Por outro lado, reconhece-se ao recorrente o direito à indenização pelas benfeitorias necessárias erguidas no imóvel, sem direito a retenção, a ser abatido do crédito devido ao recorrido pelos lucros cessantes, conforme for apurado em liquidação de sentença por arbitramento. 25. Custas processuais e honorários advocatícios, nos moldes fixados na decisão recorrida. 26. Recurso conhecido e improvido. Sentença ratificada em sua integralidade. ACÓRDÃO Acordam os integrantes da Segunda Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça do Estado do Ceará, por unanimidade, em não conhecer do segundo recurso interposto nos autos da Ação de Reivindicação de Posse e conhecer da Primeira Apelação na Ação de Usucapião, mas negar-lhe provimento, tudo em conformidade com o voto da e. Relatora.

Data do Julgamento : 28/03/2018
Data da Publicação : 28/03/2018
Classe/Assunto : Apelação / Usucapião Extraordinária
Órgão Julgador : 2ª Câmara Direito Privado
Relator(a) : MARIA DE FÁTIMA DE MELO LOUREIRO
Comarca : Aquiraz
Comarca : Aquiraz
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