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Jurisprudência


TJCE 0002214-34.2014.8.06.0000

Ementa
PENAL E PROCESSO PENAL. APELAÇÃO. HOMICÍDIO QUALIFICADO TENTADO. ABSOLVIÇÃO. JULGAMENTO MANIFESTAMENTE CONTRÁRIO À PROVA DOS AUTOS. INOCORRÊNCIA. DECISÃO DO TRIBUNAL POPULAR COMPROVADA EM SUPORTE FÁTICO-PROBATÓRIO. 1. Irresignado com a decisão do Conselho de Sentença que culminou na absolvição do réu da imputação de crime de homicídio qualificado tentado, o Ministério Público interpôs o presente recurso requerendo, em síntese, a anulação do veredicto, por ter sido, ao seu ver, manifestamente contrário à prova dos autos. 2. Adentrando no mérito, tem-se que os jurados, ao analisarem o caso concreto, reconheceram a materialidade do fato e a autoria delitiva, respondendo afirmativamente aos quesitos nº 01 e 02. Ocorre que, no que tange ao quesito nº 03, referente à série do homicídio qualificado tentado, tem-se que o Conselho de Sentença respondeu negativamente quando perguntado se o "réu, da forma que agiu, iniciou a execução do crime de homicídio que somente não se consumou por circunstâncias alheias à sua vontade, consistente no fato de a vítima ter sido socorrida por vizinhos". 03. Aqui, importante ressaltar que a tese sustentada pela defesa durante os debates em plenário foi a de "atipicidade da conduta do crime de homicídio tentado", conforme se extrai das fls. 283, tese esta que, se acolhida, culminaria na consequente absolvição do acusado, pois a ninguém poderia ser imputada condenação criminal decorrente de fato atípico. 04. Pois bem. De acordo com a teoria tripartite, crime é fato típico, ilícito e culpável. O fato típico, por sua vez, de acordo com a doutrina, possui quatro elementos: conduta, nexo causal, resultado e tipicidade. 05. Analisando o primeiro elemento, qual seja, a "conduta", e aplicando a ela a teoria finalista, que segundo doutrina majoritária é a adotada pelo Código Penal, tem-se que esta seria "o comportamento humano, consciente e voluntário, dirigido a um fim", ou seja, toda conduta seria orientada por um querer. Mencione-se que o dolo e a culpa, que antes integravam a culpabilidade, passam a fazer parte da conduta. 06. Neste contexto, infere-se que para que exista "conduta" referente ao homicídio, é necessário que haja não só o reconhecimento da materialidade e da autoria, mas também a presença do elemento subjetivo, consubstanciado no dolo, no presente caso. Assim, uma vez ausente o elemento subjetivo, mostrar-se-ia inviável a imputação do delito de homicídio. 07. In casu, a denúncia atribuiu ao réu o dolo em sua modalidade direta. O acusado, contudo, negou em seus interrogatórios que tenha agido com a intenção de matar a vítima. Após, o Conselho de Sentença, ao apreciar o mérito da causa, entendeu que ainda que estivessem presentes a materialidade e a autoria delitivas, não se estava diante de um crime doloso contra a vida na modalidade tentada, fazendo-se inferir, dada a ausência de fundamentação albergada pelo princípio da íntima convicção, que tal se deu pelo fato de o réu ter negado sua intenção de matar a vítima – negativa esta que, no caso em tela, culminaria na absolvição do acusado, já que a tese da defesa era de atipicidade. 08. Relembre-se que esta opção dos membros do júri, ao contrário do que sustentou o Parquet, não apresenta contradição hábil a ensejar a anulação do veredicto, pois repita-se: a comprovação da materialidade e da autoria não autorizam, por si sós, a condenação do réu, sendo necessária a presença do elemento subjetivo, sob pena de responsabilidade objetiva. 09. De certo, foram produzidos elementos probatórios que corroboravam a tese acusatória, tais como depoimentos de testemunhas que sustentaram que o acusado agiu deliberadamente com a intenção de ceifar a vida da vítima. Ocorre que, mesmo assim, não há como acolher a alegação de que houve decisão manifestamente contrária à prova dos autos, pois se está apenas diante do acolhimento, por parte dos jurados, de uma das teses, qual seja a da defesa, que encontrava arrimo no teor dos interrogatórios do réu, cabendo aqui relembrar que os aludidos interrogatórios, além de atos de defesa, também constituem meio de prova, não havendo impedimento para que sejam utilizados na formação do convencimento do Conselho de Sentença. Precedentes. 10. Dessa forma, a decisão vergastada é irretocável e merece permanecer intacta, tendo em vista que não foi verificada a contrariedade do veredicto em relação às provas coligidas nos autos, as quais sustentam a tese defensiva a que se afiliaram os jurados, rejeitando a tese da acusação, sem qualquer vício que ocasione dúvidas quanto à legitimidade e soberania características da decisão do Júri. RECURSO CONHECIDO E IMPROVIDO ACORDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos de apelação criminal nº 0002214-34.2014.8.06.0000, ACORDAM os desembargadores da 1ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado do Ceará, à unanimidade, em conhecer do recurso e lhe dar improvimento, nos termos do voto do Relator. Fortaleza, 24 de abril de 2018 DESEMBARGADOR MÁRIO PARENTE TEÓFILO NETO Relator

Data do Julgamento : 24/04/2018
Data da Publicação : 24/04/2018
Classe/Assunto : Apelação / Homicídio Qualificado
Órgão Julgador : 1ª Câmara Criminal
Relator(a) : MARIO PARENTE TEÓFILO NETO
Comarca : Cariús
Comarca : Cariús
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