TJCE 0003023-31.2012.8.06.0085
DIREITO PROCESSUAL PENAL E DIREITO PENAL. APELAÇÃO CRIME. CONSTITUIÇÃO DE MILICIA PRIVADA. ART. 288-A. ABSOLVIÇÃO SUMÁRIA. IMPOSSIBILIDADE. APREENSÃO DE ARMA, MUNIÇÕES E OUTROS OBJETOS. MATERIALIDADE. INDICIOS DA PRATICA DE CRIMES DIVERSOS DAQUELE CAPITULADO NA DENÚNCIA. EMENTATIO OU MUTATIO LIBELLI. APLICAÇÃO PELO JUIZ A QUO NO MOMENTO DA SENTENÇA. INSTRUÇÃO NECESSÁRIA. APELO PROVIDO.
1. A insurgência recursal gira em torno da sentença de fls. 180/186, prolatada pelo Juiz de Direito da Vara Única da Comarca de Hidrolândia, que absolveu sumariamente os denunciados Marcos André Moreira, Antônio Marcus Gomes da Silva, Ires Moura Oliveira e Genil Araújo Camelo, da imputação posta na denúncia de fls. 2/7, com fundamento nos arts. 397, inciso III, do Código de Processo Penal.
2. O recorrente pugna pela reforma da sentença, nos sentido de manter o recebimento da inicial acusatória em todos os seus termos, e para que sejam regularmente processados os acusados como incursos no art. 288-A do Código Penal. Aduz que " o réu se defende dos fatos e não da capitulação dada ao crime, onde na mudança ou na hipótese de mero ajustamento do "nomem juris" dos fatos descritos é plenamente possível no processo criminal, principalmente pelos instituo do "emendatio" ou "mutatio libelli
)"
3. Assim, a lide recursal transita na decisão do magistrado de primeiro grau que decretou a absolvição sumária dos acusados em face da ausência de tipicidade da conduta.
4. In casu, foram denunciados Marcus André e Antonio Marcus Gomes, por terem sido flagrados no centro da cidade de Hidrolândia, por portarem 01 revolver calibre 38, 06 (seis) munições 38 intactas, 02 (duas) facas, dois rádios de comunicação de marca Motorola, e um par de algemas, aduzindo que ali estavam para garantir a segurança de uma candidata ao cargo de prefeito nas eleições de 2012. A materialidade acostada aos autos refere-se a apreensão de uma arma, munições intactas, dentre outros objetos, conforme restou comprovada pelo auto de apresentação e apreensão de fls. 12 e laudo pericial de fls. 53/55.
5. O magistrado a quo ao absolver sumariamente em face da inadequação típica imposta na denúncia pelo Parquet, tomou um caminho contrário ao devido processo legal, pois os acusados foram presos em flagrante portando armas, munições, dentre outros objetos, o que a meu sentir traz indícios de prática de crimes descritos na legislação penal, devendo assim a sentença de absolvição sumária ser anulada e a marcha processual seguida, nos termos estabelecidos no CPP.
6. Primeiramente é de se observar que há tempos já está mais do que consolidado na majoritária doutrina e na jurisprudência, que o acusado defende-se dos fatos e não contra o direito aplicado a eles ou sua capitulação descrita na denúncia. A definição jurídica do fato nada mais é do que a tipicidade, ou seja, o processo pelo qual o juiz subsume o fato ocorrido ao modelo legal abstrato de conduta proibida. Assim, dar a definição jurídica do fato significa transformar o fato ocorrido em juridicamente relevante.
7. A hipótese do art. 397, inciso III do CPP, utilizada como fundamento legal para a sentença ora recorrida, apresenta-se apenas quando o fato narrado evidentemente não constitui crime, vale dizer, refere-se à evidente atipicidade do fato. Ocorre que, como dito anteriormente, a narrativa da denúncia contém indícios da prática de crime, com a apreensão de arma e munições. Não se trata, portanto, de reconhecimento sumário de atipicidade do fato.
8. Fácil é constatar que no caso dos autos a tipificação descrita na denúncia não traz relação com os fatos até então apurados, e em face ao princípio da correlação, deve o magistrado impulsionar o processo para proceder a instrução processual e ao final aplicar, conforme o caso, a disciplina dos art. 383 ou 384, ambos do CPP. Se assim não o fizesse infringiria o julgador o devido processo legal, pois segundo Badaró, "o juiz não pode condenar o acusado, mudando as circunstâncias instrumentais, modais, temporais ou espaciais de execução do delito, sem dar-lhe a oportunidade de se defender da prática de um delito diverso daquele imputado inicialmente, toda vez que tal mudança seja relevante em face da tese defensiva, causando surpresa ao imputado.
9. Com base em tais fundamentos, entendo haver nos presentes autos suporte legitimador que revela a materialidade do fato delituoso e a existência de indícios suficientes de autoria, a conferir justa causa à acusação e sustentar-lhe a plausibilidade. Daí porque vejo como prematura a absolvição sumária dos acusados, devendo o juiz a quo proceder a instrução processual, assegurando aos acusados a ampla defesa e o contraditório.
10. Apelação conhecida e provida.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelações Crimes nº 0003023-31.2012.8.06.0064, em que é apelante Ministério Público do Estado do Ceará e apelados Marcos André Moreira, Antônio Marcus Gomes da Silva, Ires Moura Oliveira e Genil Araújo Camelo.
ACORDAM os Desembargadores integrantes da 3ª Câmara Criminal deste e. Tribunal de Justiça do Estado do Ceará, por unanimidade de votos, em conhecer do recurso, para julgar-lhe PROVIDO, nos termos do voto do eminente Relator.
Fortaleza, 03 de outubro de 2017.
Francisco Lincoln Araújo e Silva
Presidente do Órgão Julgador
Dr. Antônio Pádua Silva
Relator - Port. 1369/2016
Ementa
DIREITO PROCESSUAL PENAL E DIREITO PENAL. APELAÇÃO CRIME. CONSTITUIÇÃO DE MILICIA PRIVADA. ART. 288-A. ABSOLVIÇÃO SUMÁRIA. IMPOSSIBILIDADE. APREENSÃO DE ARMA, MUNIÇÕES E OUTROS OBJETOS. MATERIALIDADE. INDICIOS DA PRATICA DE CRIMES DIVERSOS DAQUELE CAPITULADO NA DENÚNCIA. EMENTATIO OU MUTATIO LIBELLI. APLICAÇÃO PELO JUIZ A QUO NO MOMENTO DA SENTENÇA. INSTRUÇÃO NECESSÁRIA. APELO PROVIDO.
1. A insurgência recursal gira em torno da sentença de fls. 180/186, prolatada pelo Juiz de Direito da Vara Única da Comarca de Hidrolândia, que absolveu sumariamente os denunciados Marcos André Moreira, Antônio Marcus Gomes da Silva, Ires Moura Oliveira e Genil Araújo Camelo, da imputação posta na denúncia de fls. 2/7, com fundamento nos arts. 397, inciso III, do Código de Processo Penal.
2. O recorrente pugna pela reforma da sentença, nos sentido de manter o recebimento da inicial acusatória em todos os seus termos, e para que sejam regularmente processados os acusados como incursos no art. 288-A do Código Penal. Aduz que " o réu se defende dos fatos e não da capitulação dada ao crime, onde na mudança ou na hipótese de mero ajustamento do "nomem juris" dos fatos descritos é plenamente possível no processo criminal, principalmente pelos instituo do "emendatio" ou "mutatio libelli
)"
3. Assim, a lide recursal transita na decisão do magistrado de primeiro grau que decretou a absolvição sumária dos acusados em face da ausência de tipicidade da conduta.
4. In casu, foram denunciados Marcus André e Antonio Marcus Gomes, por terem sido flagrados no centro da cidade de Hidrolândia, por portarem 01 revolver calibre 38, 06 (seis) munições 38 intactas, 02 (duas) facas, dois rádios de comunicação de marca Motorola, e um par de algemas, aduzindo que ali estavam para garantir a segurança de uma candidata ao cargo de prefeito nas eleições de 2012. A materialidade acostada aos autos refere-se a apreensão de uma arma, munições intactas, dentre outros objetos, conforme restou comprovada pelo auto de apresentação e apreensão de fls. 12 e laudo pericial de fls. 53/55.
5. O magistrado a quo ao absolver sumariamente em face da inadequação típica imposta na denúncia pelo Parquet, tomou um caminho contrário ao devido processo legal, pois os acusados foram presos em flagrante portando armas, munições, dentre outros objetos, o que a meu sentir traz indícios de prática de crimes descritos na legislação penal, devendo assim a sentença de absolvição sumária ser anulada e a marcha processual seguida, nos termos estabelecidos no CPP.
6. Primeiramente é de se observar que há tempos já está mais do que consolidado na majoritária doutrina e na jurisprudência, que o acusado defende-se dos fatos e não contra o direito aplicado a eles ou sua capitulação descrita na denúncia. A definição jurídica do fato nada mais é do que a tipicidade, ou seja, o processo pelo qual o juiz subsume o fato ocorrido ao modelo legal abstrato de conduta proibida. Assim, dar a definição jurídica do fato significa transformar o fato ocorrido em juridicamente relevante.
7. A hipótese do art. 397, inciso III do CPP, utilizada como fundamento legal para a sentença ora recorrida, apresenta-se apenas quando o fato narrado evidentemente não constitui crime, vale dizer, refere-se à evidente atipicidade do fato. Ocorre que, como dito anteriormente, a narrativa da denúncia contém indícios da prática de crime, com a apreensão de arma e munições. Não se trata, portanto, de reconhecimento sumário de atipicidade do fato.
8. Fácil é constatar que no caso dos autos a tipificação descrita na denúncia não traz relação com os fatos até então apurados, e em face ao princípio da correlação, deve o magistrado impulsionar o processo para proceder a instrução processual e ao final aplicar, conforme o caso, a disciplina dos art. 383 ou 384, ambos do CPP. Se assim não o fizesse infringiria o julgador o devido processo legal, pois segundo Badaró, "o juiz não pode condenar o acusado, mudando as circunstâncias instrumentais, modais, temporais ou espaciais de execução do delito, sem dar-lhe a oportunidade de se defender da prática de um delito diverso daquele imputado inicialmente, toda vez que tal mudança seja relevante em face da tese defensiva, causando surpresa ao imputado.
9. Com base em tais fundamentos, entendo haver nos presentes autos suporte legitimador que revela a materialidade do fato delituoso e a existência de indícios suficientes de autoria, a conferir justa causa à acusação e sustentar-lhe a plausibilidade. Daí porque vejo como prematura a absolvição sumária dos acusados, devendo o juiz a quo proceder a instrução processual, assegurando aos acusados a ampla defesa e o contraditório.
10. Apelação conhecida e provida.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelações Crimes nº 0003023-31.2012.8.06.0064, em que é apelante Ministério Público do Estado do Ceará e apelados Marcos André Moreira, Antônio Marcus Gomes da Silva, Ires Moura Oliveira e Genil Araújo Camelo.
ACORDAM os Desembargadores integrantes da 3ª Câmara Criminal deste e. Tribunal de Justiça do Estado do Ceará, por unanimidade de votos, em conhecer do recurso, para julgar-lhe PROVIDO, nos termos do voto do eminente Relator.
Fortaleza, 03 de outubro de 2017.
Francisco Lincoln Araújo e Silva
Presidente do Órgão Julgador
Dr. Antônio Pádua Silva
Relator - Port. 1369/2016
Data do Julgamento
:
03/10/2017
Data da Publicação
:
03/10/2017
Classe/Assunto
:
Apelação / Quadrilha ou Bando
Órgão Julgador
:
3ª Câmara Criminal
Relator(a)
:
ANTÔNIO PÁDUA SILVA - PORT 1369/2016
Comarca
:
Hidrolândia
Comarca
:
Hidrolândia
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