TJCE 0003143-63.2005.8.06.0071
PENAL E PROCESSO PENAL. APELAÇÃO. DOSIMETRIA DA PENA. CULPABILIDADE, CONSEQUÊNCIAS E MOTIVOS DO CRIME. FUNDAMENTAÇÃO GENÉRICA. DECOTE DO TRAÇO NEGATIVO DOS VETORES ATINENTES ÀS CONSEQUÊNCIAS E MOTIVOS. MANUTENÇÃO DA CULPABILIDADE POR OUTROS FUNDAMENTOS. CONDUTA SOCIAL. CERTIDÃO DE ANTECEDENTES QUE NÃO CONDUZ À VALORAÇÃO NEGATIVA. PERSONALIDADE. AUSÊNCIA DE ELEMENTOS PARA A VALORAÇÃO. REDIMENSIONAMENTO DA PENA. NECESSIDADE. REGIME. CIRCUNSTÂNCIAS DESFAVORÁVEIS. ELEMENTOS CONCRETOS QUE IMPEDEM A FIXAÇÃO DO REGIME INICIAL PREVISTO NO ART. 33, §2º, 'C', DO CPB.
1. Condenada à pena privativa de liberdade de 5 (cinco) anos de reclusão e à sanção pecuniária de 50 salários mínimos pelo cometimento do crime de tráfico de entorpecentes tipificado à época no art. 12 da Lei n. 6.368/76, a defesa interpôs recurso de apelação, requerendo a (a) redução da pena aplicada e (b) a fixação do regime aberto para o início de cumprimento da sanção corporal.
2. O juízo a quo deu traço negativo às circunstâncias atinentes à culpabilidade, às consequências e aos motivos do crime, utilizando-se de alegações genéricas e de elementos inerentes ao próprio tipo penal, o que se mostra inidôneo, pois, no processo de individualização da pena, não basta dizer que a "culpabilidade é reprovável" que as "consequências foram relevantes" e que os "motivos não justificam a conduta", é imprescindível a demonstração de quais elementos constantes nos autos levaram o sentenciante às referidas conclusões.
3. Inexistindo elementos nos autos para manter o traço negativo dado aos vetores das consequências e motivos do crime, devem ser eles considerados neutros.
4. Por outro lado, resta demonstrado nos autos elementos que denotam maior reprovabilidade da conduta da apelante e justificam a manutenção do traço negativo do vetor da culpabilidade, na medida em que traficava drogas em local, no mínimo, bastante frequentado por crianças (sua residência).
5. Embora a recorrente tenha dito que sua filha morava com a madrinha, resta demonstrado nos autos que a casa sempre era frequentada por uma criança, sendo que, nas duas prisões que ocorreram na residência, uma criança esteve presente no local, seja durante o flagrante ou logo depois.
6. Em que pese o magistrado de piso ter apontado os registros constantes na certidão de fl. 76 para concluir que a conduta social da recorrente era "voltada à prática de atos de relevância penal", tem-se que, das três anotações constantes na referida certidão (fl. 76), uma diz respeito a esta ação penal (2005.0017.9744-2 número do SPROC), outra a um processo cuja ré teve sua punibilidade extinta pela prescrição (2000.0146.8965-1) e outra na qual foi absolvida com base no art. 386, II, CPP (2002.0007.5576-9), não servindo, portanto, para exasperar a pena-base.
7. Ademais, a conduta social diz respeito ao convívio familiar, social e profissional do agente, não tendo relação com eventuais fatos ilícitos praticados pelo sentenciado.
8. No que concerne a personalidade, por sua vez, tem-se que o argumento de que a recorrente é usuária de drogas não pode ser utilizado para exasperar a pena-base, uma vez que o atual tratamento dado ao usuário de drogas possui víeis terapêutico em vez de repressivo. Precedentes STJ.
9. Ademais, ainda que se tenha reconhecido que a recorrente fazia de sua residência um local de comercialização de drogas, não vislumbro a possibilidade de, com base nesse fato, concluir que sua personalidade era voltada para a comercialização de drogas, na medida que a personalidade é composta por uma infinidade de fatores que não se resumem a um único momento da vida pregressa do agente.
10. Na primeira fase, remanescendo apenas uma circunstância judicial desfavorável (culpabilidade), a pena-base deve ser fixada em 3 (três) anos, 4 (quatro) meses e 24 (vinte e quatro) dias de reclusão e 88 (oitenta e oito) dias-multa, sendo a sanção corporal fixada com base no critério utilizado na primeira instância, por ser mais favorável ao réu e por força da vedação do reformatio in pejus.
11. Na segunda fase, apesar de a defesa requerer a aplicação da atenuante prevista no art. 65, III, 'd', do CPB, a acusada, durante o interrogatório policial (fl. 54), negou a propriedade dos papelotes de maconha apresentados na delegacia pelos policiais, o que também o fez durante o interrogatório prestado em juízo (fl. 122), razão pela qual não deve incidir a atenuante da confissão espontânea, permanecendo a pena intermediária no quantum de 3 (três) anos e 4 (quatro) meses e 24 dias de reclusão e 88 dias-multa.
12. Na terceira fase, não incidindo nenhuma causa de aumento ou diminuição de pena, redimensiono a pena definitiva de 5 (cinco) anos de reclusão e 50 (cinquenta) salário mínimos para 3 (três) anos, 4 (quatro) meses de 24 dias de reclusão e 88 dias-multa, fixando para cada dia-multa o valor mínimo de 1/30 do salário mínimo vigente à época do fato, haja vista inexistirem elementos para aferir as condições socioeconômicas da ré.
13. Mantém o regime de cumprimento de pena no semiaberto, uma vez que, no presente caso, a recorrente, além ostentar circunstância judicial desfavorável, fazia de sua residência um ponto de comércio de entorpecentes, o que impõe a fixação de regime mais gravoso do que o previsto para quantum de pena aplicado (art. 33, §2º, 'c', CPB), o que se faz em atenção ao disposto no art. 33, §3º, do CPB.
RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO.
ACORDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos de apelação criminal nº 0003143-63.2005.8.06.0071, ACORDAM os desembargadores da 1ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado do Ceará, à unanimidade e em dissonância com o parecer ministerial, em conhecer do recurso de apelação e dar-lhe parcial provimento, nos termos do voto do relator.
Fortaleza, 03 de julho de 2018
DESEMBARGADOR MÁRIO PARENTE TEÓFILO NETO
Relator
Ementa
PENAL E PROCESSO PENAL. APELAÇÃO. DOSIMETRIA DA PENA. CULPABILIDADE, CONSEQUÊNCIAS E MOTIVOS DO CRIME. FUNDAMENTAÇÃO GENÉRICA. DECOTE DO TRAÇO NEGATIVO DOS VETORES ATINENTES ÀS CONSEQUÊNCIAS E MOTIVOS. MANUTENÇÃO DA CULPABILIDADE POR OUTROS FUNDAMENTOS. CONDUTA SOCIAL. CERTIDÃO DE ANTECEDENTES QUE NÃO CONDUZ À VALORAÇÃO NEGATIVA. PERSONALIDADE. AUSÊNCIA DE ELEMENTOS PARA A VALORAÇÃO. REDIMENSIONAMENTO DA PENA. NECESSIDADE. REGIME. CIRCUNSTÂNCIAS DESFAVORÁVEIS. ELEMENTOS CONCRETOS QUE IMPEDEM A FIXAÇÃO DO REGIME INICIAL PREVISTO NO ART. 33, §2º, 'C', DO CPB.
1. Condenada à pena privativa de liberdade de 5 (cinco) anos de reclusão e à sanção pecuniária de 50 salários mínimos pelo cometimento do crime de tráfico de entorpecentes tipificado à época no art. 12 da Lei n. 6.368/76, a defesa interpôs recurso de apelação, requerendo a (a) redução da pena aplicada e (b) a fixação do regime aberto para o início de cumprimento da sanção corporal.
2. O juízo a quo deu traço negativo às circunstâncias atinentes à culpabilidade, às consequências e aos motivos do crime, utilizando-se de alegações genéricas e de elementos inerentes ao próprio tipo penal, o que se mostra inidôneo, pois, no processo de individualização da pena, não basta dizer que a "culpabilidade é reprovável" que as "consequências foram relevantes" e que os "motivos não justificam a conduta", é imprescindível a demonstração de quais elementos constantes nos autos levaram o sentenciante às referidas conclusões.
3. Inexistindo elementos nos autos para manter o traço negativo dado aos vetores das consequências e motivos do crime, devem ser eles considerados neutros.
4. Por outro lado, resta demonstrado nos autos elementos que denotam maior reprovabilidade da conduta da apelante e justificam a manutenção do traço negativo do vetor da culpabilidade, na medida em que traficava drogas em local, no mínimo, bastante frequentado por crianças (sua residência).
5. Embora a recorrente tenha dito que sua filha morava com a madrinha, resta demonstrado nos autos que a casa sempre era frequentada por uma criança, sendo que, nas duas prisões que ocorreram na residência, uma criança esteve presente no local, seja durante o flagrante ou logo depois.
6. Em que pese o magistrado de piso ter apontado os registros constantes na certidão de fl. 76 para concluir que a conduta social da recorrente era "voltada à prática de atos de relevância penal", tem-se que, das três anotações constantes na referida certidão (fl. 76), uma diz respeito a esta ação penal (2005.0017.9744-2 número do SPROC), outra a um processo cuja ré teve sua punibilidade extinta pela prescrição (2000.0146.8965-1) e outra na qual foi absolvida com base no art. 386, II, CPP (2002.0007.5576-9), não servindo, portanto, para exasperar a pena-base.
7. Ademais, a conduta social diz respeito ao convívio familiar, social e profissional do agente, não tendo relação com eventuais fatos ilícitos praticados pelo sentenciado.
8. No que concerne a personalidade, por sua vez, tem-se que o argumento de que a recorrente é usuária de drogas não pode ser utilizado para exasperar a pena-base, uma vez que o atual tratamento dado ao usuário de drogas possui víeis terapêutico em vez de repressivo. Precedentes STJ.
9. Ademais, ainda que se tenha reconhecido que a recorrente fazia de sua residência um local de comercialização de drogas, não vislumbro a possibilidade de, com base nesse fato, concluir que sua personalidade era voltada para a comercialização de drogas, na medida que a personalidade é composta por uma infinidade de fatores que não se resumem a um único momento da vida pregressa do agente.
10. Na primeira fase, remanescendo apenas uma circunstância judicial desfavorável (culpabilidade), a pena-base deve ser fixada em 3 (três) anos, 4 (quatro) meses e 24 (vinte e quatro) dias de reclusão e 88 (oitenta e oito) dias-multa, sendo a sanção corporal fixada com base no critério utilizado na primeira instância, por ser mais favorável ao réu e por força da vedação do reformatio in pejus.
11. Na segunda fase, apesar de a defesa requerer a aplicação da atenuante prevista no art. 65, III, 'd', do CPB, a acusada, durante o interrogatório policial (fl. 54), negou a propriedade dos papelotes de maconha apresentados na delegacia pelos policiais, o que também o fez durante o interrogatório prestado em juízo (fl. 122), razão pela qual não deve incidir a atenuante da confissão espontânea, permanecendo a pena intermediária no quantum de 3 (três) anos e 4 (quatro) meses e 24 dias de reclusão e 88 dias-multa.
12. Na terceira fase, não incidindo nenhuma causa de aumento ou diminuição de pena, redimensiono a pena definitiva de 5 (cinco) anos de reclusão e 50 (cinquenta) salário mínimos para 3 (três) anos, 4 (quatro) meses de 24 dias de reclusão e 88 dias-multa, fixando para cada dia-multa o valor mínimo de 1/30 do salário mínimo vigente à época do fato, haja vista inexistirem elementos para aferir as condições socioeconômicas da ré.
13. Mantém o regime de cumprimento de pena no semiaberto, uma vez que, no presente caso, a recorrente, além ostentar circunstância judicial desfavorável, fazia de sua residência um ponto de comércio de entorpecentes, o que impõe a fixação de regime mais gravoso do que o previsto para quantum de pena aplicado (art. 33, §2º, 'c', CPB), o que se faz em atenção ao disposto no art. 33, §3º, do CPB.
RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO.
ACORDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos de apelação criminal nº 0003143-63.2005.8.06.0071, ACORDAM os desembargadores da 1ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado do Ceará, à unanimidade e em dissonância com o parecer ministerial, em conhecer do recurso de apelação e dar-lhe parcial provimento, nos termos do voto do relator.
Fortaleza, 03 de julho de 2018
DESEMBARGADOR MÁRIO PARENTE TEÓFILO NETO
Relator
Data do Julgamento
:
03/07/2018
Data da Publicação
:
03/07/2018
Classe/Assunto
:
Apelação / Tráfico de Drogas e Condutas Afins
Órgão Julgador
:
1ª Câmara Criminal
Relator(a)
:
MARIO PARENTE TEÓFILO NETO
Comarca
:
Crato
Comarca
:
Crato
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